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A responsabilidade do fiscal

22/2/2007
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Osvaldo Martins Rizzo*

 

No início da tarde de 12 de janeiro deste ano – uma sexta-feira quase 13 –, a sofrida população da cidade de São Paulo viveu outra experiência dantesca com o desmoronamento ocorrido nas obras de construção da Estação Pinheiros do Metrô paulistano, que ceifou a vida de sete pessoas, inocentes vítimas da provável irresponsabilidade de alguns profissionais.

 

Logo após a tragédia tornar-se uma nova atração televisiva, e no desesperado afã de isentar o órgão estatal estadual – e seus prepostos técnicos – das penalidades decorrentes do fatal acontecimento, ocupantes temporários de cargos públicos declararam à imprensa em uníssono que, como decorrência da modalidade escolhida para a contratação das obras (“turn key”), a responsabilidade pelo letal desabamento recaia integralmente sobre o consórcio construtor.

 

Pode-se entender que na afoita prestação de satisfação à opinião pública, autoridades mal assessoradas possam cometer arbitrariedades, todavia, nunca podemos olvidar do estado de direito tão penosamente restabelecido em nossa Pátria após um longo período de cruel autoritarismo.

 

Com a devida vênia, a afirmação dessas autoridades é insustentável por contrariar o arcabouço legal vigente, além da doutrina e jurisprudência, pois em seu artigo 67 a Lei de Licitações e Contratos Administrativos (n° 8.666/93) explicitamente regra que:

 

“A execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição”.

 

Portanto, a atividade de fiscalizar obra pública é atribuição indelegável do administrador público nomeado como gestor do contrato, cuja designação obedece à lei administrativa correspondente ao Decreto Federal nº 2.271/97 que, em seu artigo 6º, determina:

 

“A administração indicará um gestor do contrato, que será responsável pelo acompanhamento e fiscalização da sua execução, procedendo ao registro das ocorrências e adotando as providências necessárias ao seu fiel cumprimento, tendo por parâmetro os resultados previstos no contrato”.

 

Na impensável hipótese de o Metrô paulistano ter delegado ao construtor a função de fiscalizar a si próprio, estaria caracterizada a violação dos ditames legais supramencionados tornando nulo de pleno direito o contrato celebrado entre as partes.

 

A jurisprudência pátria afastou a possibilidade de qualquer outra interpretação divergente da norma ao se manifestar que:

 

“Responsabilidade do Engenheiro Civil – Construção – Responsabilidade do engenheiro civil, projetista e fiscal da obra – Responde solidariamente pelos danos causados em razão de falhas da construção o engenheiro fiscal que negligencia em suas atividades profissionais”. (RT,584,92).

 

O prestigiado doutrinador Marçal Justen Filho assim prelecionou sobre o tema:

 

“A Administração tem o poder-dever de acompanhar atentamente a atuação do particular. O interesse público não se coaduna com uma atuação passiva da Administração (...) A atividade permanente de fiscalização permite à Administração detectar, de antemão, práticas irregulares ou defeituosas (...) As regras contratuais destinam-se a disciplinar atividade de fiscalização. Visam evitar que a fiscalização seja desenvolvida de modo inconstante ou não sistemático”.(em ‘Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos’).

 

Por fim, em seu artigo 9o – “f” - III, o Código de Ética Profissional da Engenharia, Arquitetura e Agronomia (de 6/11/2002) regula que:

 

“No exercício da profissão são deveres do profissional: (...) alertar sobre os riscos e responsabilidades relativos às prescrições técnicas e às conseqüências presumíveis de sua inobservância”.

 

Resta, assim, sucintamente demonstrada a incontestável co-responsabilidade do fiscal nas ações e omissões praticadas pelo construtor no transcurso de uma obra pública, e a sociedade espera que os eventuais desvios de conduta de cúmplices que contribuíram para o mortal desastre sejam exemplarmente punidos a bem do interesse público.

           

*Osvaldo Martins Rizzo é engenheiro e ex-conselheiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

 

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