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"Nunca houve um escândalo dessa ordem"

Congresso em Foco

2/2/2006 | Atualizado 8/2/2006 às 9:11

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Tarciso Nascimento

Poucos jornalistas ostentam tanta experiência na cobertura política como Tarcísio Holanda. São 54 anos de jornalismo, 30 deles dedicados à crônica política diária. Mesmo tendo testemunhado um dos períodos mais conturbados da história brasileira, quando os militares tomaram o poder e alguns jornalistas até pegaram em armas, Holanda não lembra de nenhum outro episódio tão estarrecedor quanto o mensalão. "Nunca houve um escândalo dessa ordem", afirma ele em entrevista ao Congresso em Foco. "Com essas características, não, porque o problema não é só o caixa dois. Existe um esquema para comprar a fidelidade".

Acostumado há décadas com convocações legislativas extraordinárias, pagamentos em dobro a congressistas e troca de favores entre parlamentares, Holanda desanima-se com a queda de qualidade na representação. "Já virou lugar comum dizer que essa legislatura atingida pelo mensalão vai ser melhor do que a próxima. A próxima sempre é pior que a atual".

Ele lastima, acima de tudo, a falta de compromisso dos políticos com os partidos. Para moralizar a representação, defende a reforma política, com a adoção do sistema de voto distrital ou de lista de candidaturas fechadas. Na sua opinião, a medida poderia fortalecer os partidos, que hoje, segundo ele, não existem mais.

"Esse sistema favorece o individualismo e a corrupção. Não há partido político no Brasil. Não existe. O PT era o único, mas decepcionou agora com esse escândalo".

Tarcísio Holanda sabe do que está falando. Em Brasília há mais de 30 anos, passou pelas redações do Jornal do Brasil, do Jornal de Brasília e do Correio Braziliense e de diversas emissoras de TV, como Rede Globo, TV Tupi e TV Rio, sempre cobrindo política. Atualmente, ele assina uma coluna sobre os fatos do Congresso para o Diário do Nordeste; apresenta o programa Brasil em Debate, na TV Câmara; e em parceria com os jornalistas Carlos Chagas e Haroldo Holanda, seu irmão, produz um noticiário eletrônico - sobre política, é claro.

Ele não guarda boas recordações dos militares e revela algumas histórias inéditas daquele tempo - como a conta no exterior do "presidente vassourinha" Jânio Quadros -, além de outras do livro O Congresso em Meio Século (Ed. Plenarium), que lançou com o ex-secretário geral da Mesa Diretora Paulo Affonso Martins de Oliveira, morto antes da publicação da obra.

Certo de que o presidente Lula ainda não é um "gato morto" e de que o prefeito paulistano José Serra é o melhor candidato do PSDB para a disputa presidencial, Tarcísio Holanda desfia, nas linhas abaixo, saborosas histórias de tempos passados e presentes, épocas em que, tanto lá como cá, os políticos sempre atropelaram a ética.

Congresso em Foco - Quais foram as mudanças mais significativas nesses 50 anos de política que o senhor narra em seu livro O Congresso em Meio Século?
Tarcísio Holanda
- Houve uma mudança muito grande. A elite política do país tinha mais qualidade. O ensino público tinha muito mais qualidade. Houve uma decadência muito grande na formação das pessoas e dos estudantes. No meu tempo, por exemplo, eu estudava num colégio público em Fortaleza, que ainda existe, chamado Liceu, que era no mesmo estilo do colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, onde estudou o Paulo Afonso. No ginasial, ele tinha o ensino de latim, inglês e francês. Isso tudo acabou. Não existe mais no Brasil.

O que mudou na forma de fazer política?
No livro do Paulo Affonso (O Congresso em Meio Século), dá para notar o processo de decadência que se verificou na elite política do país. Há 40 anos, o Adauto Lúcio Cardoso, que foi presidente da Câmara, disse ao general Carlos de Meira Matos, quando ele invadiu o Congresso no Ato Institucional nº 2: "Eu sou o representante do poder civil". O outro respondeu: "Eu sou o representante do poder militar". Aquilo definia toda uma situação existente no Brasil um ano depois do golpe que depôs o presidente João Goulart.

Essa decadência era previsível?
O Adauto, há mais de 40 anos, dizia: "Olha, Tarcísio, dentro de algum tempo não haverá mais bacharéis de classe média como eu aqui na Câmara. Haverá sempre os ricos ou os seus testas-de-ferro, porque as eleições vão se tornar cada vez mais caras e as pessoas de classe média não terão condições de suportar. Os ricos é que vão tomar conta do Congresso". Isso está se verificando. Além disso, há uma queda de qualidade na representação. Já virou lugar comum se dizer que a atual legislatura - esta mesma, atingida pelo mensalão - vai ser melhor do que a próxima. A próxima sempre é pior do que a atual, porque, a cada legislatura, cai a qualidade dos representantes.

O senhor acredita que haverá uma grande renovação na Câmara e no Senado nessas eleições?
Vai haver uma grande renovação, mas todo mundo acha que vai ser para pior.

Apesar de tudo o que aconteceu, o senhor acredita que o eleitor ainda não está consciente?
O nível educacional da população é muito baixo. O nível de carência é muito grande. O dinheiro resolve muito da posição do eleitor. Isso não é só no Nordeste, no Norte, no Centro-Oeste, não. Na periferia de São Paulo, a relação do candidato com os eleitores é parecida com a do Nordeste e a do interior do Brasil. A carência das pessoas é grande.

Hoje existem mais problemas de natureza ética do que quatro décadas atrás?
Muito mais. Claro que naquele tempo também se infringia a ética. Freqüentemente havia convocações extraordinárias, com pagamento em dobro, com ganhos extraordinários e tudo, mas também havia figuras que devolviam o dinheiro, como o Adauto Lúcio Cardoso, o Pedro Aleixo e o Milton Dantas.

Em 2005, o Congresso paralisou depois das denúncias do mensalão. O senhor já havia testemunhado um escândalo semelhante?
Não. Nunca houve um escândalo dessa ordem. Com essas características não, porque o problema não é só o caixa dois. Existe um esquema para comprar a fidelidade. Também se demonstrou que muitas liberações coincidiram com transferências de um deputado de um partido para outro. Os partidos que foram alvo dessas transferências foram o PTB, o PP e o PL, que incharam. O PTB elegeu uns 28 deputados e passou a ter mais de 50. A cada transferência desses parlamentares, havia liberação de recursos. Não todos, claro, mas muitos foram financiados ou comprados.

E a troca de favores por votos? Era uma prática que já acontecia no Congresso?
Isso sempre aconteceu. A corrupção faz parte da natureza humana. Você pode reduzir, desde que haja instituições sérias. Tudo começa com o sistema de votação criado pela Constituição de 1946 e que até hoje não se conseguiu mudar. São duas as causas de todo o problema: uma é o sistema de votação, que é o voto proporcional em lista aberta. O parlamentar se candidata a deputado federal e não tem nenhuma obrigação para com o partido pelo qual se elegeu. Ele chega aqui e negocia o voto dele, inclusive com uma multinacional, se quiser. Ele negocia freqüentemente com o governo, à revelia do partido. Se você não tem partido político, porque o parlamentar dispõe de seu voto à revelia do partido, você já está com um regime capenga. Isso de um lado. Do outro lado, o sistema de financiamento é obscuro, favorece muito o caixa dois e a corrupção, porque permite que o político misture a conta pessoal dele com as doações de campanha. E eles vão fazendo fortuna pessoal através disso.
 
Quem, por exemplo?
Há histórias contadas por políticos de políticos que fizeram fortuna. Há uma história de que o Jânio Quadros, por exemplo, que era um moralista, o homem da vassoura, construiu uma fortuna fabulosa de US$ 90 milhões em um banco suíço cuja conta ele teria transferido para a Inglaterra. Quando a Margareth Teacher assumiu (como primeira-ministra do Reino Unido, em 1979) procurou estimular a ida de capitais para a Inglaterra, cortando imposto de renda. Muitos caras que tinham dinheiro na Suíça transferiram para a Inglaterra. Isso, aliás, eu não devia nem falar, porque não tenho provas. Eu fiquei sabendo por meio de um colega, que era alto funcionário da Câmara. Esse sistema de financiamento obscuro permite que o sujeito misture a conta pessoal dele com as doações de campanha. E eles vão fazendo fortuna pessoal através disso. Por quê? Porque não existe um mecanismo claro de consulta de campanha eleitoral, favorecendo o caixa dois, que é sonegação e crime eleitoral.

Então, o que precisa ocorrer para que essa situação mude?
Implantar ou o voto distrital ou o voto em lista fechada. O eleitor passa a votar no partido e não no candidato. Aí dizem que o eleitor não gostaria de deixar de votar no candidato. Tem é que ter partido. Esse sistema favorece o individualismo e a corrupção. Não há partido político no Brasil. Não existe. O PT era o único, mas decepcionou agora com esse escândalo. Foi o único que se formou de baixo para cima, que era uma organização popular. Os outros são todos iguais: PSDB, PMDB, PFL... O PT decepcionou com esses escândalos e transformou o partido em outro qualquer. Não era não. Era um partido diferente.

No Congresso, a cobertura jornalística melhorou ou piorou nesses últimos anos?
Ela é adequada a cada época.

Mas hoje ela está mais eficiente?
Não. Eu acho que ela já foi muito mais brilhante. E mais crítica.

O escândalo do mensalão mostrou que a imprensa em diversos casos estava correta, mas em alguns casos houve puro denuncismo, não? O que o senhor pensa sobre isso?
Se a atividade política, que é a causa da cobertura, empobreceu, é claro que a cobertura jornalística empobreceu também. Evidentemente, temos jornalistas políticos de boa qualidade, não só repórteres, como comentaristas políticos também.

Como foi fazer jornalismo na época dos militares?
Era muito difícil. Eu não peguei em armas, não tinha sentido. Era você lutando com uma bala e os caras com um canhão. Era uma estupidez. Alguns sacrificaram a vida, outros estão até hoje inutilizados pelas torturas que sofreram. Os militares acham que qualquer meio é legítimo para sacar a informação do inimigo. Militar não pode assumir o poder, porque o militar é educado para matar. Enquanto o político civil trata o adversário como adversário mesmo, o militar tem uma deformação profissional que o torna incapaz de assumir o comando político de um país, porque ele é muito violento.

O senhor testemunhou alguma história de briga entre parlamentares, ameaça de morte?
Sim. Certa vez, na década de 60, o Tenório Cavalcanti (deputado conhecido como o Homem da Capa Preta e que morreu em 1987, aos 82 anos) ameaçou atirar no Antonio Carlos Magalhães no plenário da Câmara. O João Mendes, que era um baiano corajoso, foi quem, em nome da Bahia, desafiou o Tenório: "Atira, bandido". E abriu o peito. João Mendes era um cara de direita, ultraconservador, mas corajoso. Mas a turma do deixa-disso interveio. Tenório era chamado de "o homem da Lurdinha". A Lurdinha era uma metralhadora que ele carregava. O Tenório era o senhor de Caxias, na Baixada Fluminense. Teve até uma briga entre ele e o delegado Imparato. O Imparato foi assassinado e disseram que foi ele que mandou matar (no dia 28 de agosto de 1953, o delegado paulista Albino Imparato foi encontrado metralhado, dentro de seu carro, no Centro do Rio).

Voltando ao livro, o senhor poderia narrar um acontecimento relevante do período da ditadura?
A história mais expressiva do tempo do regime militar que o Paulo Affonso conta é que na noite de 13 de dezembro, quando foi editado o Ato Institucional nº 5, ele era o secretário-geral da Câmara. Luciano Brandão Alves de Souza era o diretor-geral da Câmara. Umas duas horas da manhã, eles são chamados para ir ao comando militar na Esplanada dos Ministérios, no Ministério do Exército. Recebeu os dois o general Antônio Bandeira, que já foi acusado de tortura, envergando uma pistola 45, cercado de oficiais. O general disse: "Eu tenho informação de que os senhores não são políticos, são servidores da Casa, e eu os responsabilizo pela ordem na Casa. Se houver reunião lá no Congresso, nós invadimos militarmente o prédio". Essa história expressa bem a situação de medo que se vivia naquele tempo no Brasil.

A imagem do Legislativo ficou muito desgastada no ano passado. O que fazer para mudar a má impressão que deixou para a sociedade?
O certo era fazer uma reforma política, mas agora não há mais tempo. Vai ter que fazer para a outra eleição. Pela lei, não se pode mais fazer mudança para esta eleição de 2006. Sobre a reforma política, existe um projeto do deputado Ronaldo Caiado (PFL-GO). Foi aprovado em uma comissão especial que estudou o assunto, já foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara e está pronto para ser votado, mas existe uma reação da Casa contra. Por quê? Porque muda o sistema de votação. Introduz o voto em listas previamente elaboradas. O voto em lista fechada. O que é isso? O eleitor vota no partido, não no candidato. O partido elabora uma lista, e as cadeiras serão preenchidas na ordem definida pelos convencionais que elaboraram a lista. Por exemplo: o partido tem direito a cinco cadeiras, quem está no sexto lugar não vai assumir. Isso é fundamental para a gente ter partido político no Brasil, já que eles não querem o voto distrital misto que existe na Alemanha e nos Estados Unidos.

Sobre a sucessão presidencial, o senhor acha que o presidente Lula ainda tem chances de sair vitorioso?
Eu acho que é muito difícil a reeleição, mas ninguém pode achar que Lula é um gato morto. Ele tem chances. Outra coisa. A reeleição do Fernando Henrique Cardoso mostrou que quem está exercendo o poder no Brasil, ou em qualquer outro lugar, tem caneta e Diário Oficial na mão. É ele quem gera fatos e notícia. Ele pode melhorar muito a posição dele na classe média. A classe média abandonou o Lula, mas ele pode reconquistar uma parte. Se o país crescer 4% a 5% neste ano, como estão dizendo os economistas, melhora muito. Eu acho que o pessoal está partindo do pressuposto de que o Lula já está derrotado. Isso é um erro de avaliação grave. Ele não está derrotado previamente.

O senhor acredita que o presidente Lula pode se beneficiar da briga entre Geraldo Alckmin e José Serra pela candidatura do PSDB à presidência da República?
Ele já está aproveitando. Agora, eu acho que o candidato será o Serra. O partido não vai desprezar um candidato que, em duas simulações, ganha de Lula no primeiro e no segundo turno.

A escolha do vice será fundamental? O PT ficaria mais forte se tivesse um vice do PMDB?
Fundamental eu não digo, mas é muito importante para ampliar a aliança. Seria ideal uma aliança com o PMDB, mas é inviável. A aliança do PT com o PMDB seria boa porque ele ganharia tempo de televisão. Junto com o PDT, ele teria muito espaço na TV, mas o apoio pedetista também é inviável.

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