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Saúde mental
29/9/2025 9:00
O suicídio é um problema de saúde pública no Brasil e no mundo. Embora afete homens e mulheres, os dados mostram que os homens têm taxas de suicídio mais altas, o que torna necessário incluir a masculinidade no debate quando o tema é analisado sob a perspectiva de gênero. Não existe um "homem universal": diferentes contextos sociais, culturais e identitários moldam de maneira distinta os riscos e as vivências relacionadas à saúde mental. Reconhecer essas diferenças e atuar de forma conjunta para preveni-las é uma responsabilidade que cabe a toda a sociedade.
Segundo o Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância Sanitária e do Ministério da Saúde, publicado em 2021, os homens apresentaram um risco 3,8 vezes maior de morte por suicídio do que as mulheres. Entre os homens, a taxa de mortalidade por suicídio em 2019 foi de 10,7 por 100 mil, enquanto entre as mulheres esse valor foi de 2,9.
Neste contexto, é fundamental questionar de quais homens estamos falando. Somos múltiplos no que é ser homem: brancos, negros, indígenas, gays, bissexuais, trans e periféricos vivenciam condições sociais distintas que impactam diretamente o risco de suicídio. Fatores como o bullying na infância, as discriminações de raça e gênero, o assédio no ambiente de trabalho e a violência nas ruas atravessam de formas diversas essas experiências.
É necessário avançar na inclusão dos determinantes sociais da saúde na discussão, ampliando o olhar para além da clínica individual. Não podemos reduzir o debate ao indivíduo isolado, pois o suicídio está intrinsecamente relacionado ao contexto social, cultural e econômico em que vivemos.
Há méritos nas iniciativas da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e do Conselho Federal de Medicina (CFM), como o treinamento de profissionais de saúde e de diferentes áreas para identificar e tratar tendências suicidas, além da formulação e do apoio à Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio (Lei nº 13.819/2019). O Centro de Valorização da Vida (CVV), por sua vez, oferece apoio emocional gratuito e sigiloso 24 horas por dia, via telefone, chat e e-mail, tendo registrado 940 mil atendimentos apenas no primeiro semestre de 2025. Apesar desses avanços, ainda há espaço para avançar significativamente na prevenção do suicídio.
O suicídio não pode ser compreendido a partir de uma causa única. Os padrões sociais de masculinidade funcionam como uma "camisa de força" que limita as expressões emocionais e reforça a ideia de que o homem deve ser forte, invulnerável e provedor. Esse modelo normativo impõe cobranças que afetam desde a infância até a vida adulta, gerando pressões emocionais e psicológicas que, muitas vezes, resultam em sofrimento silencioso.
Além disso, o modo como educamos, cuidamos ou negligenciamos o cuidado e como estabelecemos expectativas sociais molda trajetórias masculinas marcadas pelo isolamento afetivo e pela dificuldade em pedir ajuda. Esses padrões dificultam a prevenção, pois afastam os homens de práticas de autocuidado e de apoio psicológico.
Alguns estados americanos têm demonstrado preocupação especial com a educação de meninos, buscando prevenir o isolamento social e afetivo que tende a se intensificar na fase adulta e que representa sérios riscos, incluindo o suicídio. O governo da Califórnia, por exemplo, emitiu uma ordem executiva em julho deste ano com medidas específicas para enfrentar a crise de saúde mental entre jovens homens e meninos. O foco é a prevenção do suicídio, a saúde comportamental e o apoio para que encontrem propósito por meio da educação, da família e do trabalho. O decreto visa criar novos caminhos para ajudar a reconectar homens e meninos com o apoio, a assistência e a ajuda de que precisam.
Uma questão muito marcante que deve ser evidenciada é que as políticas públicas devem ser transversais e considerar múltiplos marcadores sociais: raça, gênero, classe, território, sexualidade e geração. O suicídio, embora seja uma questão de saúde pública, também é profundamente social, educacional e econômica.
Por isso, é preciso um olhar ampliado: estratégias de cuidado não podem se restringir ao setor da saúde. Devem articular-se com a educação, com políticas de combate à violência, com iniciativas de fortalecimento da paternidade responsável e com programas de inclusão social.
Um dado alarmante reforça essa urgência: o Brasil, país que mais mata pessoas trans, também registra índices elevados de ideação suicida entre esse grupo. Isso mostra que as políticas precisam enfrentar desigualdades estruturais para serem eficazes. Logo, a prevenção só será efetiva se for intersetorial e comprometida com os direitos humanos.
No contexto do Setembro Amarelo, o debate sobre suicídio não deve recair unicamente sobre a responsabilidade individual. É necessário enfatizar os aspectos coletivos e estruturais que afetam a saúde mental, vinculando-a a políticas de cuidado, educação e combate às desigualdades.
Campanhas de conscientização devem ser contínuas, ultrapassando o mês de setembro, e envolver escolas, empresas, instituições públicas e privadas. O foco não deve ser apenas evitar mortes, mas promover a cultura do cuidado coletivo e do autocuidado.
Uma comunicação efetiva precisa evitar reforçar estigmas ligados à masculinidade. Isso significa substituir discursos centrados em fraqueza ou vulnerabilidade por narrativas que valorizem a coragem de buscar apoio e que mostrem que pedir ajuda é um ato de responsabilidade consigo mesmo e com a comunidade.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].