A Câmara dos Deputados aprovou, nessa quarta-feira (13), um projeto de lei que insere o crime de assédio sexual no Código Penal Militar e estabelece um conjunto robusto de medidas protetivas e preventivas para vítimas. A proposta segue agora para análise no Senado.
O texto aprovado é um substitutivo ao projeto de lei 582/15, de autoria do falecido deputado e senador Major Olímpio, e estende sua aplicação não apenas aos militares das Forças Armadas, polícias militares e corpos de bombeiros, mas também a pessoas sob jurisdição administrativa ou disciplinar dessas instituições, independentemente do local onde se encontrem.
A proteção também alcança militares da reserva, reformados ou em licença, desde que o assédio esteja relacionado a fatos ocorridos durante a atividade ou produza efeitos concretos dessa relação funcional.
A relatora Coronel Fernanda (PL-MT), que revelou ter sido vítima de assédio na carreira militar, afirmou que o texto "reconhece as assimetrias de poder e os obstáculos estruturais no ambiente militar".
Definição do crime e penas
O projeto define assédio sexual como conduta verbal, não verbal ou física, de conotação sexual, indesejada e reiterada, praticada no contexto funcional ou institucional, com abuso dos princípios de hierarquia ou disciplina e que gere constrangimento, humilhação ou intimidação.
No Código Penal Militar, será crime constranger alguém com intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua posição hierárquica ou ascendência funcional. A pena prevista é de detenção de 2 a 4 anos, podendo ser aumentada em até um terço se a vítima for menor de 18 anos, se houver emprego de violência física ou se o autor for superior imediato.
Quando a lei se aplica
As regras valerão para situações ocorridas:
- nas dependências das instituições militares;
- durante atividades externas, deslocamentos de serviço, treinamentos, operações ou instruções;
- em quaisquer circunstâncias derivadas da função militar ou da relação hierárquica.
Medidas protetivas
O texto estabelece a adoção de ações imediatas para preservar a integridade física, psicológica, funcional e moral da vítima. Entre elas:
- transferência do acusado para outra unidade ou setor, sem prejuízo da remuneração e sem interromper o processo administrativo ou judicial;
- restrição de contato entre acusado e vítima, inclusive por canais hierárquicos;
- proibição de acesso do acusado a locais frequentados pela vítima, inclusive treinamentos obrigatórios;
- transferência funcional a pedido da vítima, com garantia de direitos e progressões;
- direito de a vítima estar acompanhada por pessoa de confiança em todos os atos administrativos ou processuais, podendo haver audiência sem a presença do acusado;
- acompanhamento psicológico e terapêutico do agressor.
O descumprimento dessas medidas será comunicado ao Ministério Público Militar e à ouvidoria competente, e caracterizará crime militar de recusa de obediência.
Afastamento e restrições
Se houver indícios suficientes de autoria e materialidade, o militar acusado poderá ser afastado provisoriamente. Caso a condenação se torne definitiva, esse afastamento se transforma em movimentação compulsória, e o condenado ficará impedido de exercer função com ascensão funcional sobre a vítima por quatro anos.
Acolhimento e escuta qualificada
O projeto garante às vítimas:
- atendimento psicológico e assistência social por profissionais capacitados;
- transferência imediata em caso de risco à integridade física ou psicológica;
- acesso direto à ouvidoria, com sigilo e proteção contra retaliações;
- prioridade em todas as fases do inquérito e do processo.
Prevenção e mudança de cultura
A proposta impõe às Forças Armadas e demais instituições militares a adoção de ações permanentes de prevenção, como:
- inclusão de temas sobre ética, limites da hierarquia e combate ao assédio sexual nos cursos de formação e capacitação;
- fortalecimento de canais internos de denúncia com sigilo e proteção;
- campanhas de sensibilização periódicas;
- diagnósticos sobre a cultura organizacional e o clima de assédio;
- protocolos claros para encaminhamento das reclamações, vedando interferência hierárquica indevida.