O Congresso Nacional concluiu em 2025 os debates da regulamentação da reforma tributária, aprovando nas duas Casas o segundo projeto de lei complementar que trata sobre o tema. O texto, que segue para sanção presidencial, abre caminho para a primeira etapa de implementação do novo sistema tributário, que promete ser mais transparente, menos burocrático e mais progressivo.
O texto aprovado prevê as regras de funcionamento de uma nova autarquia, o Comitê Gestor do IBS. O órgão, com natureza de autarquia, ficará responsável pelos repasses financeiros envolvendo o novo tributo, que substituirá os atuais ISS e ICMS, devendo abastecer os cofres públicos dos Estados e municípios.
Novo modelo
A lei complementar aprovada pelo Congresso estabelece o desenho institucional do Imposto sobre Bens e Serviços e define como se dará sua administração. O texto concentra no Comitê Gestor atribuições hoje exercidas separadamente por Estados e municípios, criando um órgão nacional para operacionalizar o imposto.
A gestão do IBS será compartilhada entre os entes federados, sem subordinação a um único nível de governo. A lei fixa que o comitê terá autonomia administrativa, financeira e orçamentária para exercer as competências previstas no próprio texto aprovado.
Com isso, a legislação busca substituir o atual arranjo fragmentado da tributação sobre o consumo por um modelo baseado em regras comuns e procedimentos padronizados.
Funções definidas
A lei complementar atribui ao Comitê Gestor a arrecadação do IBS, a realização de compensações e retenções previstas na legislação e a distribuição dos recursos arrecadados entre Estados, Distrito Federal e municípios. Também caberá ao órgão editar o regulamento único do imposto e uniformizar a aplicação da norma em todo o território nacional.
O texto aprovado prevê fiscalização coordenada, com atuação integrada das administrações tributárias estaduais e municipais. As ações poderão ocorrer de forma conjunta, inclusive quando envolverem operações realizadas em diferentes unidades da federação.
A legislação também estabelece que o contencioso administrativo do IBS ficará sob responsabilidade do comitê, com instâncias de julgamento organizadas nacionalmente.
Conselho superior
O Comitê Gestor será dirigido por um Conselho Superior, instância máxima de decisão prevista na lei complementar. O colegiado será composto por representantes dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, em número igual entre as duas esferas.
Os representantes estaduais serão indicados pelos governadores, enquanto os representantes municipais serão escolhidos por meio de processo eleitoral organizado por entidades representativas das prefeituras. O mandato dos conselheiros será de dois anos.
As entidades municipais já existem, e são duas instituições com anos de atividade na política nacional. São elas a Confederação Nacional de Municípios, especializada na representação de pequenos e médios municípios frente aos órgãos federais; e a Frente Nacional de Prefeitos, especializada na representação das grandes cidades.
As deliberações exigirão quórum qualificado, considerando tanto o número de votos quanto critérios populacionais no caso das decisões que envolvam os Estados.
Estrutura interna
Além do Conselho Superior, a lei complementar cria uma diretoria executiva responsável pela gestão cotidiana do Comitê Gestor. O texto prevê diretorias específicas para áreas como arrecadação, fiscalização, tecnologia da informação, tesouraria e julgamento administrativo.
Também estão previstos órgãos de controle interno, como corregedoria e auditoria interna, com regras específicas sobre deveres funcionais, sigilo fiscal e conflitos de interesse. A legislação estabelece ainda período de quarentena para ocupantes de cargos estratégicos.
O comitê poderá contar com servidores cedidos das administrações tributárias estaduais e municipais, além de empregados públicos contratados por concurso, sob regime celetista.
Custeio inicial
A lei complementar autoriza a utilização de recursos da União para custear a instalação e o funcionamento inicial do Comitê Gestor durante o período de transição do novo sistema tributário. Esses repasses estão previstos para os primeiros anos de operação do órgão. Posteriormente, o custeio deverá ocorrer por meio da retenção de uma parcela da arrecadação do IBS.
A legislação também determina a divulgação periódica de relatórios de arrecadação, distribuição de recursos e execução orçamentária, com fiscalização externa exercida pelos tribunais de contas.
Split-payment
A lei atribui ao Comitê Gestor a implantação do sistema de split payment. O mecanismo prevê a separação automática do valor do imposto no momento da operação, com registro integrado das transações realizadas por empresas. A arrecadação passa a ocorrer de forma imediata, reduzindo a dependência de recolhimentos posteriores. Isso ao mesmo tempo desburocratiza a arrecadação e torna mais difícil a sonegação.
O modelo também permite o compartilhamento de informações fiscais entre administrações tributárias, com impacto direto sobre o acompanhamento das operações e a fiscalização do IBS. A adoção do sistema será gradual e dependerá da estrutura tecnológica a ser implementada pelo Comitê Gestor.
O Comitê Gestor também ficará responsável por operar o sistema de cashback, devolvendo ao contribuinte de baixa renda o valor arrecadado na aquisição de produtos ou contratação de serviços.
Período de transição
A lei complementar aprovada define que a migração do modelo atual de tributação sobre o consumo para o IBS ocorrerá entre 2026 e 2033. O processo começa em 2026, com a instalação do Comitê Gestor, preparação administrativa e tecnológica do novo sistema e início dos testes contábeis.
A partir de 2027, tem início a fase de convivência entre o IBS e os tributos hoje cobrados por Estados e municípios. Nesse intervalo, ICMS e ISS seguem em vigor, mas com participação reduzida gradualmente, enquanto o novo imposto passa a ganhar peso na arrecadação.
O cronograma se estende até 2033, quando o IBS passa a substituir integralmente os tributos atuais sobre o consumo nos Estados e municípios. Durante todo o período, a lei prevê mecanismos de compensação e repartição de receitas, que ficarão sob responsabilidade do Comitê Gestor.
Fim da guerra fiscal
Com a unificação de todos os tributos estaduais e municipais na forma do IBS, as alíquotas também serão igualmente aplicadas em todo o território nacional. Um produto comprado em São Paulo, por exemplo, passará a receber os mesmos tributos de um produto adquirido em Goiás.
Um dos principais objetivos dessa unificação é acabar com a chamada "guerra fiscal", na qual Estados e municípios disputam entre si por investimentos privados por meio de isenções fiscais, muitas vezes às custas das suas próprias necessidades orçamentárias. Com a tributação unificada, a corrida por investimentos deverá seguir parâmetros mais sustentáveis, como melhor oferta de infraestrutura ou de mão-de-obra qualificada.
O novo modelo também amplia a oferta de recursos para a maioria dos municípios. Os valores são, em maior parte, repassados ao município onde foi feita a compra do produto, buscando assim manter o dinheiro do contribuinte próximo ao local onde habita, evitando a concentração de recursos nas grandes capitais.