Publicidade
Expandir publicidade
[fotografo] Pixabay [/fotografo]
Por Joelson Dias* e Marcelli Pereira**
Em que pese a legislação brasileira contemplar cotas de gênero para candidaturas desde 1995 e dos visíveis esforços nacionais em estimular a participação política feminina, mediante a definição de regras referentes também ao tempo de propaganda eleitoral e à distribuição dos fundos partidário e de financiamento de campanha, passados oitenta e oito anos desde a conquista dos seus direitos políticos, ainda há um lamentável déficit de representatividade política das mulheres.
> Cadastre-se e acesse de graça, por 30 dias, o melhor conteúdo político premium do país
Em uma república estabelecida como uma sociedade livre, justa e solidária, e que tem como fundamentos, dentre outros, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e o pluralismo político, não se pode admitir a sub-representatividade de contingente humano equivalente à mais da metade da população e do eleitorado na amostra política dos representantes de toda a sociedade no parlamento.
A histórica e persistente gravidade desse quadro exigiu e segue exigindo políticas públicas de promoção de igualdade de gênero na representação política da sociedade, inclusive as chamadas ações afirmativas.
Daí porque, não obstante a reserva de candidaturas femininas, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deram passo decisivo no incremento da efetividade das cotas de gênero ao interpretarem que os partidos políticos devem destinar recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha em percentual no mínimo idêntico ao número de mulheres candidatas.
Mas o fato é que, na exata proporção dos seus números na população e no eleitorado, não encontramos ainda uma forma efetiva de incluir as mulheres nas arenas oficiais de decisão.
Sabemos que as desigualdades sociais afetam a participação de determinados grupos na vida pública e política, diminuindo suas chances de exercerem uma função pública ou mesmo influenciarem no resultado das decisões políticas.
Daí a importância de se garantir a presença de mulheres nas esferas representativas oficiais, o que significa assegurar a sua presença também nas cúpulas partidárias.
Afinal, na sua democracia interna, e sem qualquer contrariedade a sua autonomia, mesmo os partidos políticos devem refletir a multiplicidade de vozes, incluindo as femininas, que caracterizam as sociedades pluralistas contemporâneas.
Com efeito, ao responder a Consulta nº 0603816-39, da relatoria da ministra Rosa Weber, o TSE passou a entender que o percentual mínimo de 30% de candidaturas por gênero, estabelecido no art. 10, § 3º, da Lei nº 9.504/97, alcança também a composição dos órgãos dirigentes partidários, como comissões executivas e diretórios nacionais, estaduais e municipais.
Não obstante, conquanto tenha sido louvável a deliberação, para reafirmar a importância da participação política das mulheres, o TSE perdeu, na ocasião, a oportunidade de emprestar efeito vinculante a sua decisão, tendo ficado vencido o ministro Edson Fachin, no entendimento de que a Justiça Eleitoral não deveria anotar os respectivos órgãos de direção dos partidos que não observassem a reserva mínima de gênero na escolha de seus dirigentes.
Com referida decisão, portanto, em caráter meramente abstrato e sem natureza sancionatória, o que se viu foi apenas uma recomendação aos partidos políticos.
Em outros países, porém, como no México, por exemplo, os partidos políticos devem observar a paridade de gênero na composição de seus órgãos de direção, em respeito ao regime democrático, conforme decidido pela Sala Superior do Tribunal Eleitoral do Poder Judiciário da Federação:
[..] o princípio da paridade de gênero não se esgota quando os partidos políticos nomeiam seus candidatos para os cargos eletivos, mas, além disso, transcende à conformação de seus órgãos internos, de acordo com um de seus objetivos constitucionalmente designados, consiste em promover a participação do povo na vida democrática, uma vez que a paridade de gênero na participação política é uma das peças fundamentais que enriquecem a vida democrática.
Voltando-se ao caso brasileiro, o que se espera, agora, é que, no exercício da sua competência, e com a relevância que o caso requer, o Congresso Nacional regulamente a matéria atinente à obrigatoriedade do cumprimento da reserva de gênero de 30% nas candidaturas dos órgãos internos de partidos, com a previsão, inclusive, de sanções às legendas que não a cumprirem.