Os deputados que foram reembolsados pela Câmara por gastos excessivos com gasolina serão investigados pela Corregedoria da Câmara e poderão vir a responder a processo de cassação de mandato, informa
O Globo. O presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), disse que encaminhará ainda hoje para a Corregedoria a denúncia publicada ontem pelo jornal de mau uso do dinheiro da verba indenizatória, os R$ 15 mil mensais a que os deputados têm direito para ressarcimento de gastos com a manutenção do escritório parlamentar nos estados.
Reportagem publicada ontem por
O Globo revela que, no ano passado, os deputados receberam R$ 41 milhões da Câmara por reembolso com gastos em gasolina. É dinheiro suficiente para comprar 20,5 milhões de litros de combustível e rodar 2.560.000 quilômetros em carro médio que percorre oito quilômetros por litro. Nas contas dos autores da matéria, José Casado e Maria Lima, é bastante para dar 64 voltas ao redor da Terra. "Vou mandar o que foi publicado para a Corregedoria analisar", disse Aldo.
Esse valor tornou-se um recorde em compensações aos parlamentares desde 2001, quando eles criaram um salário-extra, a "verba indenizatória", de R$ 15 mil mensais - 17% maior que o salário/subsídio regular dos 513 deputados (R$ 12. 847,20). Tem sido usada para reembolso de despesas como combustível, aluguel, alimentação, hospedagem e material de escritório, entre outros. Em tese, o deputado só recebe se apresentar a nota fiscal correspondente.
Câmara não checa as notas
Em 2005, a Câmara gastou R$ 91,2 milhões em indenizações, volume de dinheiro similar a todo o investimento feito pelo governo, no mesmo período, em serviços especializados de saúde. Do total, cerca de 45% (R$ 41 milhões) foram usados exclusivamente na compensação de despesas com as supostas compras de combustível. A Câmara não divulga as notas fiscais correspondentes, mas expõe as contas individuais na internet.
Há cinco anos, quando a verba foi aprovada, criou-se um núcleo de fiscalização para auditar a documentação fiscal apresentada pelos deputados. Mas a Câmara alega que não tem como checar a idoneidade de todas as notas fiscais. O próprio corregedor da Câmara,
Ciro Nogueira (PP-PI), é um dos que concentram os gastos em combustível e é reembolsado em valores entre R$ 9 mil e R$ 12 mil mensais.
Nos três primeiros meses de 2006, o campeão de reembolsos com combustível foi o deputado Francisco Rodrigues (PFL-RR). Apresentou notas de R$ 30 mil (janeiro), R$ 15 mil (fevereiro) e R$ 15 mil (março) e embolsou R$ 60 mil -- quantia suficiente para comprar gasolina e rodar 240 mil quilômetros, equivalente a 26 viagens entre Manaus e Porto Alegre, ida e volta.
Rodrigues é dono de empresas de transporte de carga e terraplanagem, além de manter uma fundação, a
Chico Rodrigues. Tornou-se um dos maiores clientes do Posto Trevo, em Boa Vista, que, segundo ele, fornece-lhe as notas. "O instrumento mais fácil para justificar os gastos é com notas de combustíveis", admite. "Um almoço, por exemplo, que não consigo nota, justifico como combustível."
Cássio Gomes, gerente do posto predileto de Rodrigues, conta que no dia 25 de cada mês emite uma nota fiscal única, com a soma dos serviços prestados à frota do deputado - carros particulares, caminhões e utilitários das empresas e da fundação: "Às vezes é R$ 3 mil, R$ 7 mil ou R$ 12 mil. Ele gasta muito diesel por causa da empresa de terraplanagem. Eu mando a nota para o secretário dele, certinho com o valor que ele manda. Tenho que fechar no valor da requisição que ele manda."