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Comportamento e política
14/11/2025 | Atualizado às 14:53
O Brasil caminha para 2026 com um eleitorado que já não se encaixa no molde tradicional das campanhas políticas. O país que envelhece também se torna, aceleradamente, um país de solteiros. E isso muda o jogo - das pautas prioritárias ao jeito de fazer política. Segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), 52,6% dos eleitores são mulheres e 59,4% são solteiros. É uma guinada silenciosa, mas poderosa, que começa a empurrar as campanhas para longe da velha lógica centrada na "família tradicional".
Entre 2020 e 2024, o número de brasileiros solteiros cresceu 7,4%: foram de 84,6 milhões para 90,9 milhões. No mesmo período, caiu 3% o total de eleitores casados. E esse fenômeno não está distribuído igualmente: em seis estados (todos no Norte e Nordeste), mais de 70% do eleitorado é solteiro, com destaque para o Amapá (79,3%) e o Amazonas (74,7%). Já os estados com maior proporção de casados estão concentrados no Sul e Sudeste, como Paraná (41,2%) e Santa Catarina (37,8%). A geografia eleitoral do estado civil desenha também uma geografia de prioridades.
Campanhas sempre partiram de uma premissa: o eleitor vive num arranjo familiar convencional, com demandas homogêneas. Só que não dá mais para sustentar isso. Uma sociedade majoritariamente solteira muda o cardápio de expectativas. As políticas pensadas para casais (como benefícios fiscais e incentivos patrimoniais compartilhados) simplesmente não respondem à vida real da maioria. Já temas como moradia acessível para indivíduos, igualdade salarial, segurança no trabalho informal e flexibilidade laboral ganham tração. Pessoas que vivem sozinhas ou que não planejam casar tendem a priorizar autonomia, oportunidades de crescimento pessoal e políticas públicas que reduzam a dependência de redes familiares.
Há também um fator de comportamento eleitoral que pesa. Pesquisas internacionais mostram que indivíduos solteiros votam de forma distinta dos casados. Nos Estados Unidos, mulheres solteiras votam majoritariamente em candidatos democratas e se alinham a pautas mais progressistas. Isso não significa importar modelos, mas aponta uma tendência: quanto maior o contingente de solteiros, maior a abertura para agendas que dialoguem com direitos individuais, proteção social inclusiva e igualdade de gênero.
E há um pano de fundo cultural que ajuda a explicar o impacto político desse grupo. Apesar das diferenças regionais, o mundo inteiro compartilha uma expectativa: todo adulto deveria buscar um relacionamento, e quem não busca é tratado como exceção. Solteiros no Reino Unido relatam trabalhar mais horas; nos Estados Unidos, pagam mais pelo seguro do carro; nos países do Leste Asiático, casar é quase um rito de passagem para a vida adulta; em culturas islâmicas, o casamento é símbolo de responsabilidade religiosa. Ou seja: o solteiro, muitas vezes, paga um "custo social" (financeiro, emocional ou simbólico). No Brasil, esse custo aparece na falta de políticas públicas pensadas para vidas independentes.
A explosão do número de solteiros desmonta a lógica eleitoral tradicional. Obriga partidos e candidaturas a revisarem plataformas, linguagem e prioridades. Exige campanhas menos focadas na vida doméstica e mais atentas à multiplicidade de arranjos e expectativas. Em 2026, quem insistir em falar apenas com a "família tradicional brasileira" vai falar sozinho.
O eleitor mudou, agora cabe à política correr atrás.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].
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