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Congresso em Foco
2/5/2007 | Atualizado 3/5/2007 às 0:00
Paulo Kramer*
Lugar de intelectual de centro-direita é no PFL, hoje DEM; por isso, na quinta-feira da semana passada, lá estava eu, disciplinadamente às 9h da manhã, no 26º andar do Anexo I do Senado, para uma reunião na presidência do partido. O presidente da legenda, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), a havia convocado para uma palestra do economista Cláudio Adilson, da MCM Consultoria, destinada a abastecer o partido de argumentos atraentes e persuasivos para o combate à renovação, no final deste ano, da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras), cujo P há muito deveria servir para designar permanente, já que o tributo data do primeiro governo FHC, introduzido a pretexto de financiar a saúde pública, alimentando o sempre subnutrido SUS.
Como lembrou o economista, a CPMF, que começou, em 1997, com 0,20% sobre o valor das movimentações bancárias, hoje arranca 0,38%. Se o leitor acha que é pouco, fique então sabendo que istso correspondeu a R$ 32 bilhões, ou 1,4% do PIB, em 2006. Em 2007, o valor arrecadado até o momento ultrapassa R$ 10,4 bi.
Ainda me lembro dos artigos dominicais do saudoso Roberto Campos, nos quais o meu guru, se, de uma parte, criticava a CPMF por acrescentar um item à interminável lista de impostos, contribuições e taxas que arrancam o couro do contribuinte brasileiro, engordam um Estado já doentiamente balofo e, assim, vampirizam as energias empreendedoras do setor privado; de outra, elogiava a desburocratização inerente ao processo de arrecadação eletrônica, em contraste com os vetustos impostos declaratórios, condenáveis pela papelada e pelo tempo que consomem, a par das inúmeras possibilidades de sonegação.
Recordo, ainda, que na eleição presidencial de 1994, vencida por Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o jovem candidato do PL, agora PR, Flávio Rocha, resumiu sua pregação de campanha ao Imposto Único, cobrado eletronicamente. Como dizia, à época, o próprio Campos, secundando o pai intelectual da idéia-força de Rocha, Marcos Cintra, professor de economia da FGV/SP, "o grande erro da CPMF é ser mais um imposto , ao invés de substituir outros impostos" (em entrevista ao número de setembro de 1998 da revista do Instituto Liberal, Think-Tank, mais tarde rebatizada como Banco de Idéias, página 17).
Bem diferente foi a visão apresentada pelo conferencista do DEM, que mobilizou argumentos fornecidos pela mais abalizada literatura econômica internacional para rotular a CPMF como o "pior dos impostos". Veremos por quê. Mas, antes, um pouco de história.
O falecido professor de Yale e Nobel de Economia (1981) James Tobin defendia um tipo de imposto sobre transações financeiras (ITF), não com a finalidade de vitaminar o Erário, mas sim para reduzir a volatilidade dos negócios no mercado de câmbio. Já bem antes do neokeynesiano Tobin, o próprio John Maynard Keynes, com objetivos semelhantes, propusera um imposto sobre as transações em bolsa. Como acontece naquelas piadinhas malvadas em que o gênio da lâmpada se revela um sacana juramentado ou desastrado de carteirinha, a Grã-Bretanha terminou por acatar o conselho de lorde Keynes apenas para assistir, hoje em dia, à metade do movimento bursátil da City londrina ser exportada para as praças de Nova York e Frankfurt...
De acordo com o professor Cláudio Adilson, nem mesmo para o fim proposto por Tobin (limitação da volatilidade), seria o ITF eficaz, como o provam as recorrentes bolhas especulativas que inflacionam o mercado imobiliário nos Estados Unidos e em outros países.
Se não é jabuticaba...
No passado, quase todos os membros do clube dos desenvolvidos (Austrália, França, Alemanha, Itália, Japão, Holanda, Suécia) adotaram o ITF, apenas para arquivá-lo mais tarde. Os Estados Unidos foram os pioneiros, durante a Guerra Civil (1860 a 1865), na tributação de transações a termo no mercado de ouro. E, no século passado, no auge da grande Depressão (1932 a 1934), foi a vez do experimento com um imposto sobre os débitos bancários (IDB) que chegou a abalar o sistema financeiro por estimular a desintermediação.
Na nuestra América, acostumada a cultivar o fracasso com sincero fervor, o Brasil de hoje está praticamente sozinho, na companhia apenas da Colômbia (0,40%) e, claro, da Venezuela (0,50%), depois de Argentina, Equador, Peru e outros vizinhos terem pulado fora do ITF. "Epa", reagiu, da platéia, o deputado Paulo Bornhausen (DEM-SC), "mas jabuticaba chavista?!?", numa referência à noção, popularizada na imprensa pelo veterano jornalista Márcio Moreira Alves, de que tudo aquilo que só existe no Brasil e não é jabuticaba tende a ser uma instituição ou uma prática de eficiência e seriedade duvidosas.
Segundo Cláudio Adilson, o repúdio praticamente universal a tributos como a CPMF se justifica pela redução da produtividade geral da economia, pelo desestímulo à expansão do mercado de crédito, pela retração dos investimentos produtivos (menos capital injetado na economia significa salários menores e empregos mais raros), pelo aumento da sonegação e da informalidade, pela fuga de recursos para bancos no exterior, pela perda da competitividade das exportações, pelo agravamento das desigualdades regionais e, por último, mas não em último, pela manutenção dos juros em patamares elevados, algo que a esquerda em geral e os petistas em particular costumam tomar como causa, quando, na verdade, não passa de conseqüência de nossa burrice econômica. Vamos por partes.
Êta, imposto malvado!
A CPMF é um imposto ruim (bad tax, em economês) porque, contrariamente às aparências, não é muito difícil de sonegar, e o esforço empregado por produtores e consumidores na evasão desvia preciosas energias e atenção que poderiam ser investidas na criação de riqueza, na inovação em busca de maior produtividade, qualidade, competitividade, custos mais baixos e menor preço.
A CPMF é um imposto ruim porque é um imposto em cascata, tributa outros tributos encarecendo cada etapa de produção de qualquer bem, e, sem conseguir taxar a informalidade, pune o contribuinte zeloso. Empresas formalizadas, que operam na legalidade, não têm como fugir dos bancos, muito menos daqueles tributos de sonegação quase impossível até para os informais, como o IPVA e o IPTU, o que equivale a dizer que sua carga tributária é injustamente maior que a dos concorrentes clandestinos. A informalidade, por seu turno, ademais de fomentar a lassidão ética na cultura econômica, piora o déficit da previdência ao criar (sub)empregos sem carteira assinada.
A CPMF é um imposto ruim por gerar o que os economistas rotulam de peso morto (dead-weight loss), gastando, no próprio processo do seu recolhimento, cerca de um quarto do total que arrecada, sem redução, ao contrário, com aumento, da burocracia fazendária.
A CPMF é um imposto ruim porque, ao transferir aos bancos a responsabilidade por seu recolhimento, eleva as taxas de serviços bancários; isso para não falar da bête-noire dos juros altos. Ela representa 0,9 ponto percentual a mais nas taxas dos títulos públicos, uma despesa adicional, com juros, de aproximadamente R$ 9 bi. E não é só: 3,3% ao ano a mais nos empréstimos pessoais e 6,6% por ano no cheque especial!
A CPMF é um imposto ruim porque engrossa a despesa pública, com o aumento dos juros pagos pelo governo para financiar uma dívida ainda da ordem de 50% do PIB. Eis aí o grande entrave à expansão do crédito para empresários, trabalhadores e consumidores em geral, crédito que é o motor de economias vigorosas como a americana. Para driblar a taxação, as indústrias brasileiras a partir de certo porte aprofundam a verticalização, procurando produzir os próprios insumos, o que prejudica a eficiência e a competitividade da economia como um todo, as quais, como lecionou Adam Smith há mais de 200 anos, na Riqueza das nações (1776), dependem de especialização, cada segmento concentrado no que sabe fazer melhor.
A CPMF é um imposto ruim porque não consegue ser desonerado nas exportações, entranhado que está no custo final dos produtos. E, caso o governo tente compensá-lo na forma de crédito tributário, o Brasil incorre em punição prevista nas regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), por prática protecionista.
A CPMF é um imposto ruim porque agudiza as disparidades regionais e pessoais de renda, na medida em que obriga as regiões atrasadas a pagar mais imposto em razão de sua necessidade de importar grande volume de matérias-primas do sul-maravilha. Também faz com que os pobres gastem mais por causa do sobrepreço que embute nos bens de consumo popular.
Um discurso... uma bandeira, por favor
Agora que o PSDB dos governadores José Serra e Aécio Neves decidiu trocar a militância oposicionista por um caminho tranqüilo até a sucessão presidencial, e que os tucanos conterrâneos do presidente da legenda, senador Tasso Jereissati, barganham o seu apoio ao governo federal pelo gás subsidiado pela Petrobras para a futura indústria siderúrgica da Ceará Steal, os Democratas, reduzidos a menos de 20% das cadeiras na Câmara dos Deputados e a um único governador (José Roberto Arruda, no DF), precisam como nunca de propostas que os ajudem a romper o isolamento falando ao cidadão comum e, em especial, ao seu bolso.
O movimento Xô, CPMF! (www.xocpmf.com.br), liderado pelo deputado Bornhausen, é a aposta do DEM para tentar desafinar o coro de contentes que, nas pesquisas de opinião, em setores influentes da mídia, em parcelas do empresariado beneficiadas pela política econômica do governo e nas análises de economistas obsessivamente fixados em indicadores financeiros, celebra o céu de brigadeiro ora atravessado pelo governo Lula, muito embora um indicador muito concreto como o do desemprego continue nas alturas, como mostra o IBGE.
Já dizia o poeta romântico alemão Heinrich Heine, na primeira metade do século XIX, que, na política, as idéias precedem à ação como, na natureza, o relâmpago precede à trovoada. A palestra de Cláudio Adilson para a cúpula Democrata sugeriu maneiras de traduzir as complexidades do labirinto tributário nacional em discurso de apelo popular. E parece que o mote já está pegando.
Na manhã de 12 de maio, véspera do Dia das Mães, o Xô, CPMF! reunirá mais de 20 entidades – dentre as quais, a Fecomércio/SC, a Federação das Câmaras de Diretores Lojistas Catarinenses, a Associação Comercial de São Paulo, a Federação Nacional de Distribuição de Veículos Automotores-Fenabrave, o Pensamento Nacional das Bases Empresariais-PNBE e a OAB de Santa Catarina – nas ruas de Florianópolis para mostrar ao povo como esse imposto ruim comprime o emprego, arrocha o consumo e garroteia as classes média e baixa. "Vamos lembrar às pessoas que a saúde não se beneficiou com os bilhões arrecadados pela CPMF, que essa montanha de dinheiro foi quase toda engolida pelos bancos no pagamento dos juros da dívida pública!", exortou Bornhausen.
O objetivo manifesto da mobilização de Florianópolis e de outras que seu exemplo pretende inspirar Brasil afora é pressionar o Congresso nacional para que recuse a renovação da CPMF, cujo prazo de validade expira em 31 de dezembro próximo; parada duríssima, pois que a base governista detém esmagadora maioria na Câmara e chega a quase metade do Senado. Na prática, o que os Democratas pretendem, ao menos por ora, é 'esticar a corda' (o dicionário PTês/português preferiria 'tensionar a relação'...) ao confrontar o governo com algo mais amargo que os atuais frutos do ibope presidencial.
(Aos seus prefeitos, temerosos de uma receita que sonham em partilhar com a União, a direção do DEM pretende esclarecer que a pressão sobre o Planalto poderá lhes trazer uma fatia mais generosa do que poderiam esperar na ausência dessa luta.)
A empreitada pode servir para o resgate do elo perdido entre, de um lado, a pregação liberal em prol do corte de impostos e, em conseqüência, dos gastos de custeio da máquina pública e da retomada das privatizações, bem assim como o fortalecimento das agências reguladoras em face do governo como requisito à atração de investimentos privados, nacionais e estrangeiros; e, de outro, a compreensão generalizada dos benefícios do receituário antiestatizante para a economia e a cidadania.
Como, ao final do evento, concluiu o líder do DEM na Câmara, deputado Onyx Lorenzoni (RS): "Não podemos perder essa oportunidade de comunicação com o povo. Temos que esclarecer que lutamos pelo fim da CPMF em nome do barateamento da comida do aposentado, da roupa da pensionista, do emprego para o trabalhador, do alívio para o micro e o pequeno empresariado – e não para favorecer os grandes grupos econômicos, que sempre souberam se defender muito bem..."
Acima de tudo, com toda essa movimentação, o DEM quer mudar a imagem de um oposicionismo engravatado, meramente congressual, sem chance de empolgar as massas se permanecer restrito a entrevistas no Salão Verde (Câmara) ou Azul (Senado), enquanto Lula se esbalda em comícios nos canteiros de obras ao sol tropical.
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