Veja como Odorico Paraguaçu ainda vive, e bem perto
Congresso em Foco
30/1/2010 6:20
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[caption id="attachment_37293" align="alignleft" width="300" caption="Odorico Paraguaçu, o eterno "Bem Amado". Série de vídeos mostra que, 40 anos depois, personagem de Dias Gomes continua atual"][/caption]Edson Sardinha
"Como dizia Rui Barbooosa, o grande baiano, bom governante é o que governa com o pé fincado na terra e o olho fincado no futuro, ou vice-versa." A frase bem poderia ter saído de um recente discurso dos senadores brasileiros. Do senador Mão Santa (PMDB-PI), por exemplo. Mas foi extraída de uma fala do eterno "coronel" Odorico Paraguaçu durante sua campanha à prefeitura do fictício município baiano de Sucupira em 1973.
Político corrupto e demagogo, o personagem que botava de lado "os entretantos" e partia direto para os "finalmentes" continua atualíssimo quase quatro décadas depois de ter ido ao ar pela primeira vez na TV Globo. A partir de hoje (30), o Congresso em Foco apresenta uma pequena mostra de vídeos de "O Bem Amado" disponíveis na internet que reproduzem, de maneira tragicômica, o noticiário político e o horário eleitoral deste começo de século 21. Uma bem-humorada crítica política e dos costumes assinada pelo dramaturgo Dias Gomes e imortalizada pelo ator Paulo Gracindo e grande elenco.
"Porque o futuro de todos nós é o campo santo - e por que não dizer -, o cemitério. Meus amigos, é preciso pensar no depois de amanhã pra ter sossego no agora", ensinava Odorico, ao justificar sua plataforma de campanha: a construção do cemitério municipal de Sucupira, a "pérola do Norte", o "orgulho do estado da Bahia".
"Balançando sua difuntice"
"Vejam este pobre homem, vetusto cidadão desta cidade. Morreu com quase cem anos. Aqui viveu, aqui nasceu, aqui teve filho, aqui constituiu família. Nunca saiu daqui. Mas agora depois de morto ele é obrigado a emigrar. Botam o corpo dele dentro de uma rede e lá vai ele balançando sua difuntice, através de três léguas para ser enterrado em terra estrangeira, em meio a estranha gente. Pode este homem dormir sossegado, em sonho eterno? Pode sua pobre alma ter paz?"
Dono de uma retórica vazia, empolada e marcada por neologismos, Odorico encarnava o típico "coronel" brasileiro sem farda, adversário da "imprensa escrita, falada e televisada" e dos "cachacistas juramentados", o político adorado e temido pelo povo ao mesmo tempo. O Congresso em Foco, representante da imprensa "internetizada", que não existia no tempo de Odorico, faz aqui essa homenagem ao atualíssimo personagem.
Duas cachaças para o povo
Contraditório por natureza, o personagem se mostrava à frente do seu tempo ao contratar, em plenos anos 70, um consultor de imagens para fazer o seu marketing político. Para se eleger, Odorico fazia de tudo: inclusive pagar duas cachaças para os eleitores só para mostrar que era "gente como a gente".
"Me xingam, mas me acham simpático"
Corrupto, oportunista, reacionário, machista, despótico, autoritário. Tudo isso, mas simpático. Assim definiam Odorico os entrevistados ouvidos em "um pesquisamento" contratado pelo velho coronel. "Carisma é algo simpático a quase todos os ditadores", explicava o consultor ao então candidato.
Eleito com o slogan "Vote em um homem sério e ganhe um cemitério", o prefeito Odorico passaria todo o mandato atormentado com uma constante ameaça à sua promessa: ninguém morria após a construção da "grande obra".
Uma frustração compensada pelas barganhas políticas que lhe rendiam uma vantagem aqui, e outra acolá. "Não faço política por interesses particulares", dizia o prefeito ao receber umas ambulâncias de Brasília em troca do apoio de um deputado aliado no colégio eleitoral. "Gratíssimo pelas ambulâncias. Agora vamos esperar que aconteçam alguns desastres, algumas epidemias para que possamos usá-las", agradecia ao responsável pelo envio do "presente".
No mesmo telefonema, após uma breve troca de elogios e afagos, a rigidez moral do velho "coronel" tombava diante de um convite para ser ministro dos Bons Costumes, cargo criado exclusivamente para ele.
"Ele se lembrou do aniversário da minha primeira comunhão"
Não perca amanhã: Odorico por Odorico, o "milagre" do prefeito e a inauguração do cemitério de Sucupira.