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O fim do outono do patriarca

Celso Lungaretti

Celso Lungaretti

28/11/2016 | Atualizado às 22:51

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[caption id="attachment_273096" align="alignleft" width="390" caption=""Fidel durou até os 90 anos, mas os últimos dez não contam: tornara-se um inativo político""]Ismael Francisco/Cubadebate" src="https://static.congressoemfoco.com.br/2016/11/Fidel1.jpg" alt="" width="390" height="270" />[fotografo]Ismael Francisco/Cubadebate[/fotografo][/caption]Fidel Castro, o comandante da revolução cubana falecido na noite de 6ª feira (25), foi personagem marcante da segunda metade do século 20, mas sua estrela vinha se apagando desde o fim da União Soviética e do bloco socialista por ela encabeçado. Em seguida foram suas forças físicas que declinaram, a partir da primeira hemorragia que sofreu em 2006, como consequência de uma doença nos intestinos. Foi então que, sabendo-se impossibilitado de "assumir uma responsabilidade que requer mobilidade e entrega total", ele, dignamente, trocou a farda pelo pijama, após comandar o país durante 47 anos. Havia liderado uma heroica revolução em 1959 e depois tentou romper o isolamento a que os Estados Unidos submeteram Cuba incentivando guerrilhas similares noutros países do continente americano (enquanto Che Guevara tentava a sorte no Congo, igualmente em vão). O resultado acabou sendo o mais indesejado possível: a ocorrência de banhos de sangue e a proliferação de ditaduras direitistas, pois os EUA cuidaram ciosamente de evitar a propagação do mau exemplo no seu quintal. [Êxitos verdadeiros, Cuba só colheu em lutas de libertação nacional, ao ajudar, com tropas, munições e outros recursos, países africanos que confrontavam o colonialismo português.] Curvando-se à evidência dos fatos, Castro foi obrigado a domesticar sua revolução para garantir-lhe a sobrevivência, ainda que desfigurada. Desistiu de exportá-la e a institucionalizou, repetindo os mesmos desvios autoritários e burocráticos que engessaram a congênere soviética (a qual, com seu ímpeto transformador estancado, acabou sendo retirada de cena em 1989). Aposentado compulsoriamente, Fidel durou até os 90 anos, mas os últimos dez não contam: tornara-se um inativo político. Foi grande um dia, mas decerto não se interessava pelo rock, daí ter passado batido pelos conselhos de Pete Townshend ("Prefiro morrer antes de envelhecer") e Neil Young ("É melhor consumir-se em chamas do que definhar aos poucos"). Che escutou: morreu na hora certa. Perfil liberador Castro nunca pretendeu revolucionar o mundo, como Marx, Lênin ou Trotsky. Aspirava apenas a ser o libertador de Cuba, livrando-a da ditadura corrupta de Fulgêncio Batista, que fizera da ilha um centro de entretenimento para turistas ricos interessados em prostituição, jogatina, canciones calientes, drogas... e discrição. Os tão alardeados paredóns (as execuções de inimigos, durante a guerra de guerrilhas e depois da tomada do poder) inserem-se perfeitamente na tradição sanguinária das rebeliões latino-americanas. Até então Fidel pouco mais era do que um caudilho típico da região, o filho de latifundiários que abraça a causa dos pobres e se torna seu general. Chegou a declarar enfaticamente que não havia "comunismo nem marxismo em nossas ideias, só democracia representativa e justiça social". A hostilidade exacerbada dos EUA ao novo governo acabou jogando-o nos braços da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), pois só a outra potência mundial poderia dar-lhe alguma chance de sobrevivência face ao poderoso vizinho que lhe impunha um embargo comercial, apoiava invasões armadas e promovia atentados terroristas (vários planos mirabolantes da CIA para matar ou desmoralizar Castro fracassaram). A contrapartida ao guarda-chuva protetor foi a completa submissão da ilha às imposições soviéticas, com a adoção do modelo stalinista de socialismo num só país: economia totalmente estatizada, autoritarismo político e submissão da classe trabalhadora à burocracia que a deveria, isto sim, representar. Aparentemente, Castro ainda tentou escapar dessa armadilha, ao concordar com os planos de Che Guevara para levar a revolução à África e, principalmente, levantar a América do Sul. Com a execução a sangue-frio do Che e o extermínio dos principais movimentos revolucionários latino-americanos, Fidel teve de se conformar com o isolamento em relação a seus vizinhos e a dependência de um aliado distante e arrogante. Ao monumental sapo engolido em 1962, quando Nikita Kruschev nem se deu ao trabalho de consultar Cuba antes de acertar com os EUA a desmontagem das bases de mísseis instaladas na ilha, seguiram-se outros, sempre indigestos e, ainda assim, digeridos. Para compensar, Fidel Castro obtinha ajuda econômica que lhe permitiu oferecer condições de existência minimamente dignas para o conjunto da população, com destaque para as realizações marcantes em educação e saúde. Se pessoas mais capazes e empreendedoras se ressentiam por estarem sendo impedidas de obter a condição diferenciada que seu potencial lhes asseguraria alhures, acabando por emigrar de um jeito ou de outro, é certo também que a grande maioria considerava sua situação melhor do que era antes. Daí a gratidão e carinho que tantos cubanos tributavam a Fidel, apesar da falta de liberdade e da gestação de uma odiosa nomenklatura, reproduzindo a distorção soviética: onde todos deveriam ser iguais, a burocracia partidária e governamental concedia privilégios indevidos aos seus membros, tornando-os mais iguais. Após o fim da URSS, a agonia lenta A situação, que começara a mudar com a perestroika, tornou-se crítica após a derrubada do muro de Berlim e o fim do socialismo real no Leste europeu. Ao deixar de ser sustentada pela União Soviética, que lhe injetava recursos e a utilizava como um cartão postal do (que ela pretendia ser o) comunismo, Cuba atravessou uma gravíssima crise econômica, até reaprender a andar por suas próprias pernas. Daí as fugas da ilha com barcos improvisados terem chegado ao auge na década de 1980, para júbilo da mídia ocidental. Até o remake de "Scarface" (dirigido por Brian De Palma, 1983) a incluiu, fazendo uma marota atualização do filme original (dirigido por Howard Hawks, 1932). O pior acabou passando, mas os tempos heroicos também. O povo cubano não era o mesmo que se orgulhava de haver reconquistado sua dignidade, com a ilha deixando de ser bordel dos estadunidenses. Tais lembranças haviam se tornado muito distantes. E a penúria, muito presente. Então o debilitamento da saúde de Fidel veio a calhar para que Raul Castro, governante menos carismático mas também menos identificado com excessos do passado, lançasse e fosse implementando sua abertura lenta, gradual e segura (o paralelo com a flexibilização do regime militar brasileiro sob Ernesto Geisel tem tudo a ver...), visando ir normalizando pouco a pouco suas relações econômicas com os países capitalistas. Quanto a Fidel, acabou tendo seu destino atrelado à bipolarização do poder mundial, que, enquanto durou, permitiu-lhe inflar demais o balãozinho cubano. Mas os ventos mudaram e, no fim da linha, o esperava a agonia lenta. Em circunstâncias quase sempre dificílimas, Castro fez o melhor que pôde por seu povo e seu país - não pelo marxismo ou pela revolução mundial, que nunca foram suas verdadeiras devoções. Quando se puder avaliar seu papel sem exageros propagandísticos e tiroteios ideológicos, deverá ser reconhecida, sobretudo, sua vontade inquebrantável, que o fez ser reconhecido como um titã, apesar da ínfima importância geopolítica da nação que representava. O século 20 finalmente terminou. E o atual, em termos de grandes personagens históricos, é um deserto. Mais textos de Celso Lungaretti   Mais sobre Cuba
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