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Congresso em Foco
14/10/2025 | Atualizado às 11:18
O diretor-executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), Francisco Christovam, avalia que o debate sobre a tarifa zero, política que prevê o transporte público gratuito em todo o país, "escalou para outro nível" com a decisão do governo federal de estudar a viabilidade da implantação do modelo em todo o país. Christovam afirma que o setor apoia a tarifa zero em âmbito nacional, desde que haja fontes permanentes de financiamento.
"Nós não somos contrários à tarifa zero. Mas a nossa preocupação é o seguinte: você implanta a tarifa zero, depois o município passa a ser o contratante direto e pagador, aí chega no final do ano, o município diz: acabou o orçamento, eu não tenho mais recursos de orçamento para poder bancar o serviço", disse o diretor ao Congresso em Foco.
Ele lembra que a gratuidade deve vir acompanhada de qualidade. "Tarifa Zero, ótimo. Agora, tem fonte? Garante? Garante em qualidade? Não adianta você oferecer o transporte gratuito para a população e degradar o serviço. A demanda cresceu três vezes, e a prefeitura diz: eu não vou aumentar o custo, eu não tenho recursos para isso. Mas então você facilitou o acesso, mas degradou a qualidade."
Segundo a NTU, 170 municípios adotam algum formato de isenção (total ou parcial) em seus sistemas de ônibus. Somente neste ano, 15 cidades aderiram à gratuidade integral e 34, ao modelo parcial, com tarifa zero em dias, linhas ou públicos distintos. Ao todo, ao menos 132 cidades brasileiras garantem o transporte público urbano gratuito integralmente aos seus moradores.
Custos e ganhos: o desafio de mensurar
De acordo com estimativas da NTU, o custo anual da tarifa zero para o transporte por ônibus no Brasil seria da ordem de R$ 75 bilhões, valor que pode chegar a R$ 90 bilhões com a inclusão dos sistemas metroferroviários.
"As estimativas que nós andamos fazendo [...] para o setor de transporte por ônibus, só por ônibus no Brasil, seria a necessidade atual de algo como 75 bilhões de reais por ano. Acresça-se a esse valor alguma coisa como 15 [...] o custo de prestação do serviço pelos sistemas metroferroviários. Então, 75 com mais 15, nós já chegamos a R$ 90 bilhões. Isso sem considerar o aumento de demanda que sempre acontece quando se implanta tarifa zero", observa Christovam.
Ele observa, porém, que os ganhos sociais e econômicos também precisam ser contabilizados. "A tarifa zero como política social não há o que discutir. Ela é inclusiva, cria acessibilidade e universalidade, faz cumprir aquele direito constitucional de ir e vir. O transporte passa a ser um direito do cidadão."
Nas cidades que adotaram o modelo, a demanda disparou: "Em algumas cidades dobrou, em outras triplicou e nós chegamos até em algumas cidades, Calcaia é um exemplo, onde quadruplicou a demanda. [...] A hora que liberou, as pessoas começaram a usar para as mais diversas finalidades - para ir a uma consulta médica, no comércio, fazer um curso, vender um produto".
Como mostrou o Congresso em Foco, estudo preliminar feito por pesquisadores da Universidade de Brasília (UnB) e da Universidade de São Paulo (USP) revela os desafios para se estimar o impacto da medida. Entre eles, falta de dados completos do setor e dificuldade para projetar o crescimento da demanda e os efeitos econômicos positivos da tarifa zero. O estudo foi encaminhado ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, após determinação do presidente Lula para que avaliasse a viabilidade de implantação da gratuidade no transporte urbano público.
Para onde vai o dinheiro?
A NTU defende a criação de um Fundo Nacional de Mobilidade Urbana, com participação da União, dos estados e dos municípios, semelhante ao modelo do SUS.
"O projeto da deputada Erundina se refere à criação de um Serviço Único de Mobilidade, à semelhança do Serviço Único de Saúde. [...] A essência é que os entes federativos criem uma fonte de recurso. Vou aqui imaginar: a União entra com 40%, os estados com 40% e o município com 20%. Pronto, formou um fundo nacional de custeio do transporte coletivo urbano de passageiros", afirma o diretor-executivo da entidade.
Ele reforça que o sistema atual, em que o município arca sozinho com o transporte coletivo, é insustentável. "Desde a Constituição de 1988 [...] isso ficou na conta do município. [...] Só que os municípios começaram a não ter mais condição, não têm recurso pra isso. [...] Agora a União começa a se manifestar dizendo: espera aí, vamos pelo menos estudar, porque o transporte é diferente dos outros serviços públicos."
Outras fontes possíveis
Christovam cita ainda fontes alternativas e complementares de financiamento, como a revitalização do Vale-Transporte, a contribuição sobre o uso do automóvel e a cobrança pelo estacionamento em vias públicas.
"A gente também trabalha com a possibilidade das chamadas receitas extra-tarifárias. Seria a revitalização do Vale-Transporte. [...] Ele foi criado em 1987 e teve importância fundamental como fonte para garantir a prestação do serviço. [...] Poderíamos resgatar esse papel, sem criar imposto novo."
E defende o uso de instrumentos de mobilidade sustentável. "A Cide municipal [Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, um tributo federal criado para financiar intervenções específicas do governo na economia] sempre foi uma expectativa. O transporte privado individual é o que causa congestionamento, polui as cidades, causa estresse. Se você vai usar a via pública, você vai pagar também. E esse dinheiro seria carregado para um fundo de mobilidade que teria várias fontes."
Viabilidade e limites
O dirigente afirma que a tarifa zero é mais viável em cidades pequenas, com menos de 50 mil habitantes e boa arrecadação própria.
"A tarifa zero funciona muito bem em cidades com população de até 50 mil e também em cidades que têm uma arrecadação diferenciada. [...] Cidade de porte médio ou grande não vai ter condição de fazê-lo."
Como exemplo, Francisco Christovam cita Caucaia (CE), com 340 mil habitantes, onde "a demanda cresceu quatro vezes" e o município enfrenta dificuldades para manter o serviço.
Já em grandes capitais, o custo comprometeria boa parte do orçamento. "São Paulo tem uma frota de 13 mil ônibus. O custo da produção do serviço supera 12 bilhões de reais por ano. [...] Estamos próximos de 10% do orçamento. A cidade não tem esse espaço para oferecer o serviço gratuito. Mas se vier dinheiro da União e do Estado, aí faz sentido."
Debate em "outro patamar"
Christovam considera positivo que o tema tenha chegado ao alto escalão do governo federal. "Agora nós estamos vendo que o Ministério da Fazenda, a Casa Civil, o Ministério das Cidades, todo mundo está discutindo o transporte. Impossível que dessa discussão a gente não tire decisões que venham melhorar a prestação do serviço", destaca.
Ele avalia que o momento é de reconhecimento da importância do transporte coletivo.
"O transporte doente não chega no hospital, o estudante não chega na escola, o trabalhador não chega no serviço. [...] É um serviço público essencial e estratégico, só que não era tratado dessa forma."
Francisco Christovam conclui com uma defesa de diálogo e modernização. "Nós precisamos conversar mais com os nossos clientes, os passageiros. [...] O que que eles atribuem como importante? Regularidade, confiabilidade, preço, conforto? Se a gente conseguisse atender os anseios, já estava de ponta pra ir."
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