Entrar
Cadastro
Entrar
Publicidade
Publicidade
Receba notícias do Congresso em Foco:
Congresso em Foco
6/11/2016 8:00
 [fotografo]Agência Brasil[/fotografo][/caption]Devido ao açodamento típico das legislações de emergência, o projeto carece de coerência, algo que fica claro quando em nome da agilidade processual se extingue um recurso exclusivo da defesa enquanto cria dois outros recursos exclusivos para a acusação. É falaciosa a atribuição de eventuais letargias processuais ao uso do direito de defesa - que, aliás, ao contrário do juiz, tem prazo para falar nos autos. Onde há eventual abuso, é evidente que um Ministério Público atento e um Judiciário minimamente diligente já dispõem de mecanismos legais capazes de imprimir celeridade aos processos. Para tanto, não se faz necessária a limitação estrutural do direito de defesa, menos ainda quando vem acompanhada da ampliação e da facilitação do poder punitivo estatal.
Mais preocupante do que pôr a letargia judicial na conta da defesa é, em nome do combate à impunidade, desconsiderar solenemente a seletividade do sistema de justiça criminal brasileiro. Dos cerca de 1,5 mil tipos penais previstos na legislação codificada e esparsa apenas cinco crimes são responsáveis pelo encarceramento de cerca 80% dos brasileiros privados de liberdade: homicídio, roubo, furto, tráfico de drogas e posse/porte de armas de fogo. Nenhum deles se relaciona com a criminalidade do colarinho branco que se pretende ver punida, além de evidenciar os estratos sociais-alvo da malha criminal. É o que torna possível antever que a limitação do direito de defesa e a ampliação dos poderes acusatórios (nos planos processual e penal) representarão o aprofundamento da referida seletividade, num continuum de hiper-encarceramento das camadas vulneráveis e periféricas e de cristalização das conhecidas mazelas do sistema penitenciário brasileiro.
O exponencial aumento da massa carcerária ocorrida nos últimos anos (mais de 600% desde 1998) não foi acompanhado de impacto significativo nos índices de violência urbana, problemas atravessados por determinações alheias ao recrudescimento das leis penais. A última vez na história em que se ceifaram instrumentos jurídicos à disposição do cidadão sob o argumento de que eles estariam servindo de meio para a impunidade foi com o AI nº 5, em dezembro de 1968, inaugurando os anos de chumbo da ditadura militar brasileira. O legítimo combate à corrupção não pode estar atrelada à perda de direitos.
Por mais bem intencionada que uma campanha publicitária emergencial e pouco transparente como a das "10 medidas" venha a ser, não se pode admitir que sejam aprovadas, de atropelo, proposições reformadoras de todo o sistema processual e penal brasileiro. Espera-se que legítimo manto do combate à corrupção não faça as vezes de um Cavalo de Tróia a permitir que a história se repita como farsa.
* Subcoordenador de Defesa Criminal da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro e integrante do grupo de defensores mobilizados na campanha Dez Medidas em Xeque - Pelo Fim da Corrupção, Sem Perda de Direitos.
 
Mais sobre corrupção
Mais sobre as dez medidas contra a corrupção
[fotografo]Agência Brasil[/fotografo][/caption]Devido ao açodamento típico das legislações de emergência, o projeto carece de coerência, algo que fica claro quando em nome da agilidade processual se extingue um recurso exclusivo da defesa enquanto cria dois outros recursos exclusivos para a acusação. É falaciosa a atribuição de eventuais letargias processuais ao uso do direito de defesa - que, aliás, ao contrário do juiz, tem prazo para falar nos autos. Onde há eventual abuso, é evidente que um Ministério Público atento e um Judiciário minimamente diligente já dispõem de mecanismos legais capazes de imprimir celeridade aos processos. Para tanto, não se faz necessária a limitação estrutural do direito de defesa, menos ainda quando vem acompanhada da ampliação e da facilitação do poder punitivo estatal.
Mais preocupante do que pôr a letargia judicial na conta da defesa é, em nome do combate à impunidade, desconsiderar solenemente a seletividade do sistema de justiça criminal brasileiro. Dos cerca de 1,5 mil tipos penais previstos na legislação codificada e esparsa apenas cinco crimes são responsáveis pelo encarceramento de cerca 80% dos brasileiros privados de liberdade: homicídio, roubo, furto, tráfico de drogas e posse/porte de armas de fogo. Nenhum deles se relaciona com a criminalidade do colarinho branco que se pretende ver punida, além de evidenciar os estratos sociais-alvo da malha criminal. É o que torna possível antever que a limitação do direito de defesa e a ampliação dos poderes acusatórios (nos planos processual e penal) representarão o aprofundamento da referida seletividade, num continuum de hiper-encarceramento das camadas vulneráveis e periféricas e de cristalização das conhecidas mazelas do sistema penitenciário brasileiro.
O exponencial aumento da massa carcerária ocorrida nos últimos anos (mais de 600% desde 1998) não foi acompanhado de impacto significativo nos índices de violência urbana, problemas atravessados por determinações alheias ao recrudescimento das leis penais. A última vez na história em que se ceifaram instrumentos jurídicos à disposição do cidadão sob o argumento de que eles estariam servindo de meio para a impunidade foi com o AI nº 5, em dezembro de 1968, inaugurando os anos de chumbo da ditadura militar brasileira. O legítimo combate à corrupção não pode estar atrelada à perda de direitos.
Por mais bem intencionada que uma campanha publicitária emergencial e pouco transparente como a das "10 medidas" venha a ser, não se pode admitir que sejam aprovadas, de atropelo, proposições reformadoras de todo o sistema processual e penal brasileiro. Espera-se que legítimo manto do combate à corrupção não faça as vezes de um Cavalo de Tróia a permitir que a história se repita como farsa.
* Subcoordenador de Defesa Criminal da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro e integrante do grupo de defensores mobilizados na campanha Dez Medidas em Xeque - Pelo Fim da Corrupção, Sem Perda de Direitos.
 
Mais sobre corrupção
Mais sobre as dez medidas contra a corrupçãoTags
Temas
Câmara dos Deputados
Comissão debate isenção de registro para professor de educação física