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A PEC 65/2023, senhoriagem e corte de gastos: qual a relação?

Proposta de autonomia do BC tem embutida uma agenda escondida de desmonte do Estado de Bem-Estar Social no Brasil

Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central)

Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central)

12/11/2024 | Atualizado às 10:36

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Visão superior da sede do Banco Central em Brasília. Foto: Raphael Ribeiro/BCB

Visão superior da sede do Banco Central em Brasília. Foto: Raphael Ribeiro/BCB
José Luis Oreiro * A ideia basilar da PEC 65/2023 é que a autonomia do Banco Central do Brasil só estará assegurada de fato se a autoridade monetária puder dispor de um orçamento próprio, protegido de chantagens políticas do Executivo e/ou do Legislativo que teriam por objetivo forçar mudanças populistas na condução da política monetária. Para tanto, o art. 1º da PEC nº 65/2023 altera o art. 164 da Constituição Federal de 1988 (CF/1988), acrescentando parágrafos e incisos, fazendo com que o Banco Central (BC) seja uma transformado numa empresa pública com atividade estatal. Adiciona também o § 4º, em que confere ao Banco Central uma natureza especial com autonomia técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira, organizada sob a forma de empresa pública e dotada de poder de polícia, incluindo poderes de regulação, supervisão e resolução, na forma da lei. Neste artigo irei argumentar que (i) a autonomia financeira não é um requisito necessário para que o Banco Central do Brasil exerça, de forma autônoma com respeito ao poder Executivo ou Legislativo, a sua função de instituição responsável pela execução da política monetária e de regulação do sistema financeiro. Na verdade essas funções  devem ser exercidas por uma instituição do Estado brasileiro, como é o Banco Central atualmente, não por uma empresa pública; (ii) a autonomia financeira prevista pela PEC 65/2023 tem por objetivo privar o Tesouro Nacional da receita de senhoriagem, definida como a receita obtida com a emissão (fluxo) de base monetária - a qual decorre da diferença entre o valor de face do meio circulante e seu custo de produção, ao invés da (sic) aplicação da taxa de juros sobre o estoque de base monetária, como aparece na justificativa da PEC 65/2023, definição essa que está em completo desacordo com a literatura internacional sobre o tema[1] - tendo como efeito uma redução não-desprezível do resultado primário do governo central, o que obrigará o governo, dada a lógica do assim chamado novo arcabouço fiscal, a aprofundar os cortes das despesas obrigatórias, notadamente nos gastos de assistência social, para garantir sustentabilidade desse arcabouço e, com isso, a sustentabilidade da dívida pública no médio e longo-prazo. Em suma, a PEC 65/2023 tem embutida uma agenda escondida de desmonte do Estado de Bem-Estar Social no Brasil, o que não tem nenhuma relação com a questão da autonomia financeira do Banco Central do Brasil. Com relação àquestão da autonomia financeira é mister dizer que não há registro histórico de uma situação na qual o poder Executivo ou o poder Legislativo tenham ameaçado o Banco Central do Brasil com cortes orçamentários até porque os salários dos funcionários da autoridade monetária são despesa obrigatória que não está sujeita a discricionariedade seja do poder executivo ou do poder legislativo. Além disso, os funcionários de carreira do Banco Central têm estabilidade no cargo, e toda a diretoria do Banco está protegida contra demissão arbitrária devido ao mandato fixo já definido em lei pelo Congresso Nacional. Se o Banco Central do Brasil deixar de ser uma autarquia e se tornar uma empresa pública, os funcionários da autoridade monetária perdem a estabilidade e poderiam, em tese, ser ameaçados pela diretoria do Copom a cumprir suas ordens, mesmo quando elas não forem do interesse público. A proteção contra demissão arbitrária é um elemento basilar na constituição de uma burocracia estatal meritocrática e focada no atendimentos dos interesses gerais da sociedade. Isso precisa ser preservado. O artigo 164 da Constituição Federal de 1988 confere ao Banco Central o status de uma Instituição Típica de Estado ao estabelecer que a competência da União para a emissão de meio circulante será exercida exclusivamente pelo Banco Central. A moeda é criada pelo Estado por intermédio do Banco Central, ao menos desde o momento em que as economias capitalistas abandonaram o sistema de moeda-mercadoria, no qual o instrumento utilizado para a liquidação de contratos eram moedas de ouro e prata cunhadas pelo Estado, em prol do sistema de moeda fiduciária, no qual o meio de pagamento é constituído de notas de papel cujo valor intrínseco é zero. A senhoriagem nada mais é da que a diferença entre o valor de face das notas de papel (digamos uma nota de 100 reais) e o custo de produção da mesma pela Casa da Moeda (alguns míseros centavos). Essa diferença entre o valor de face e o custo de produção das cédulas é apropriada pelo Estado pois o mesmo dispõe do monopólio legal de emissão de moeda. Além disso o § 2º ao artigo 164 diz que "O banco central poderá comprar e vender títulos de emissão do Tesouro Nacional, com o objetivo de regular a oferta de moeda ou a taxa de juros".  Mas de que forma o Banco Central consegue esses títulos se de acordo com o § 1º "É vedado ao banco central conceder, direta ou indiretamente, empréstimos ao Tesouro Nacional e a qualquer órgão ou entidade que não seja instituição financeira". Muito simples, o Tesouro Nacional, ao invés de vender seus títulos ao Banco Central, o que está vedado pela Constituição Federal, faz um aporte de capital nessa instituição na forma de títulos da dívida pública. Daqui se segue que o patrimônio líquido do Banco Central é constituído fundamentalmente por aportes de capital feitos pelo Tesouro Nacional. Nesse sentido, transformar o Banco Central numa empresa pública seria o equivalente a expropriar o Tesouro Nacional de ativos que lhe pertencem por direito. O Tesouro Nacional, na qualidade de proprietário do capital do Banco Central do Brasil, tem direito de receber a assim chamada receita de senhoriagem, que no Brasil possui um valor relevante, em torno de 0,4% do PIB, ou seja, aproximadamente R$ 43 bilhões com base no PIB de 2023. Apenas para apresentar ordens de grandeza, o orçamento para 2024 do Banco Central é da ordem de R$ 4 bilhões, ou seja, menos de 10% do histórico das receitas de senhoriagem. Daqui se segue que, sob o pretexto de conceder autonomia financeira ao Banco Central, a PEC 65/2023 irá criar um privilégio exorbitante (na expressão criada por Valéry Giscard d'Estaing) para um estamento da sociedade brasileira, possibilitando que os diretores do Copom recebam salários milionários, dada a magnitude do aumento do orçamento da autoridade monetária, algo injustificável do ponto de vista moral ou econômico, ou seja, um caso claríssimo de patrimonialismo exacerbado. A PEC 65/2023 no seu artigo 1º estabelece que a relação entre o Tesouro e o Banco Central será definida em lei complementar, criando uma incerteza jurídica ao anular a legislação vigente sobre o tema, definido tanto na Lei de Responsabilidade Fiscal, como na Lei 13.820/2019. A depender de como será definida essa relação, a sustentabilidade da dívida pública poderá ficar comprometida pois a receita de senhoriagem - em torno de 0,4% do PIB - é atualmente apropriada pelo Tesouro, possibilitando um menor esforço fiscal para a estabilização da dívida pública. Devemos lembrar que para 2025, o Arcabouço Fiscal prevê um superávit primário de 0,5% do PIB, valor praticamente idêntico a receita de senhoriagem obtida anualmente pelo Tesouro Nacional. Aqui temos um grave problema de economia política. Num contexto em que o Ministério da Fazenda se defronta com dificuldades não desprezíveis para cumprir o arcabouço fiscal - cogitando fazer, segundo notícias vinculadas na grande mídia, cortes nos gastos assistenciais como o BPC - a aprovação da PEC 65/2023 irá demandar um esforço fiscal ainda maior do governo para garantir a sustentabilidade do novo arcabouço fiscal e assim estabilizar a relação dívida pública/PIB no médio-prazo. Sendo assim, a pergunta relevante a ser feita é saber de onde vai sair o dinheiro para pagar pelo privilégio exorbitante do novo Banco Central do Brasil? A resposta me parece bastante clara, com uma nova rodada de "revisão de gastos" na qual os trabalhadores, os aposentados e pensionistas do INSS e os pobres seriam obrigados a pagar a conta por intermédio de um novo "pacote de maldades" que, pode incluir, como já foi cogitado no governo Bolsonaro, a desindexação das aposentadorias e pensões do reajuste pela inflação passada. Claro que, nesse caso, seria necessária uma nova PEC. Mas para um país que ano sim e outro também se fazem várias emendas a CF de 1988, não seria nenhuma novidade. Em suma, a PEC 65/2023 é mais uma peça na estratégia das elites e dos rentistas brasileiros no sentido de desmontar o Estado do Bem-Estar Social brasileiro porque o mesmo não cabe no PIB. Enquanto isso, a política monetária conduzida pela atual diretoria do Copom compromete 7,5% do PIB com o pagamento de juros da dívida pública, um valor superior a R$ 855 bilhões. Para que o "bolsa rentista" continue a ser pago é necessário reduzir os (sic) privilégios dos trabalhadores, dos aposentados e dos pobres. Referências: Blanchard, O; Fischer, S. (1989). Lectures on Macroeconomics. The MIT Press: Cambridge (EUA). Romer, D. (2006). Advanced Macroeconomics. McGraw-Hiil Irwin: Nova Iorque. Walsh, C. (2001). Monetary Theory and Policy. The MIT Press: Cambridge (EUA). [1] A esse respeito ver Walsh (2001, p. 132), Romer (2006, p. 496), Blanchard e Fischer, 1989, p.195). * Professor Associado do Departamento de Economia da Universidade de Brasília, Professor do Doutorado em Integração Econômica da Universidade do País Basco (Bilbao/Espanha), Professor do Doutorado em Economia, Administração e Métodos Quantitativos da Universidade de Tuscia (Viterbo/Itália), Pesquisador Nível I do CNPq e Coordenador do Grupo de Pesquisa Macroeconomia Estruturalista do Desenvolvimento. E-mail: [email protected] Leia ainda: Não à PEC 65/2023
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