Entrar
Cadastro
Entrar
Publicidade
Publicidade
Receba notícias do Congresso em Foco:
JOGO DE PODER
Congresso em Foco
15/7/2025 19:30
Além de reivindicar para si os louros pela disputa comercial entre Brasil e Estados Unidos, o deputado licenciado Eduardo Bolsonaro caminha para iniciar um novo conflito interno em seu grupo político. Nesta segunda-feira (15), o parlamentar atacou o governador Tarcísio de Freitas, um dos principais cotados para a herança do capital político de Jair Bolsonaro em 2026, por defender o protagonismo do Governo Federal nas negociações com Washington.
O atrito entre Eduardo e Tarcísio reacende um antigo padrão na atuação política da família Bolsonaro: o descarte brusco de aliados. O ciclo recorrentemente se repete: começa com uma divergência entre Bolsonaro ou um de seus filhos com determinado aliado sobre a articulação do grupo. A divergência se transforma em uma disputa mais ampla, até que, por fim, a aliança se torna insustentável, culminando na ruptura.
A repetição recorrente do ciclo resultou na autofagia do grupo político do ex-presidente: durante e após o seu mandato presidencial, Bolsonaro colecionou uma lista incontável de rachaduras, que conta com o presidente de seu antigo partido, a primeira líder de seu governo, ministros de Estado, deputados ideologicamente alinhados à sua base, governadores e prefeitos.
Se mantido o padrão, Bolsonaro corre o risco de chegar isolado às eleições de 2026, pleito em que necessariamente precisará indicar um nome de peso para preencher o espaço deixado por sua inelegibilidade.
Rachadura inaugural
O primeiro rompimento relevante no núcleo político de Jair Bolsonaro ocorreu ainda em fevereiro de 2019, menos de dois meses após a posse presidencial. Gustavo Bebianno, então ministro da Secretaria-Geral da Presidência e coordenador da campanha presidencial, foi demitido após atrito direto com Carlos Bolsonaro. O vereador o acusou publicamente de mentir sobre conversas com o presidente. A crise expôs a influência dos filhos de Bolsonaro no governo e culminou na saída de Bebianno, que passou a criticar abertamente o ex-aliado.
Bebianno afirmou que Bolsonaro havia abandonado as promessas de campanha para proteger os filhos, a quem culpava por destruir o governo com "palhaçadas" e "beligerância". Disse ainda que o presidente governava com desequilíbrio emocional, cercado por "loucos", e previu que seu mandato terminaria em renúncia, impeachment ou tentativa de golpe institucional.
Quatro meses depois, em junho, foi a vez do general Santos Cruz, então ministro-chefe da Secretaria de Governo, seguir com a ruptura. Tal como Bebianno, o militar afirmou ter sido alvo de ataques virtuais promovidos por Carlos Bolsonaro.
No Legislativo, a ruptura veio em bloco, começando pela ex-deputada Joice Hasselmann, até então líder do governo no Congresso Nacional. Ela foi afastada da posição de liderança em outubro daquele ano, após se opor à tentativa de Eduardo Bolsonaro de assumir o comando da bancada do PSL na Câmara. Em resposta, ela depôs contra o presidente na CPI das Fake News, acusando-o de usar verba pública para disparar desinformação nas redes sociais.
A briga envolveu o presidente do partido, Luciano Bivar (União-PE), com quem Bolsonaro disputava o controle da sigla. Com a vitória de Eduardo na liderança da Câmara, o deputado pernambucano retaliou com um pedido judicial para que o presidente e 19 parlamentares fossem afastados do PSL. Bolsonaro saiu do partido, permanecendo sem uma legenda até 2021, quando se juntou ao PL.
Rupturas na pandemia
A chegada da pandemia da covid-19 trouxe um novo ciclo de rupturas e descartes de aliados. Em abril de 2020, o então ministro da Justiça, Sergio Moro, pediu demissão após acusar o presidente de tentar interferir politicamente na Polícia Federal. Moro afirmou que Bolsonaro queria acesso a investigações sigilosas e passou a ser alvo de ataques do bolsonarismo nas redes sociais. O ex-juiz da Lava Jato, que fora um dos principais pilares da campanha em 2018, virou inimigo declarado da base do ex-presidente.
Pouco antes, em março, Luiz Henrique Mandetta foi demitido do Ministério da Saúde por defender medidas de isolamento social e seguir recomendações da Organização Mundial da Saúde. Bolsonaro, que minimizava os efeitos do coronavírus e pregava o fim das restrições, contrariou sistematicamente o titular da pasta. Mandetta resistiu enquanto pôde, mas acabou afastado após sucessivas divergências públicas com o presidente.
Com a saída de Mandetta, Bolsonaro nomeou o oncologista Nelson Teich para o comando do ministério. A convivência, porém, durou menos de um mês. Teich deixou o cargo após recusar-se a endossar o uso irrestrito da cloroquina no tratamento da covid-19, defendido pelo presidente sem respaldo científico. Também resistiu à pressão para ampliar a liberação do medicamento por decreto, o que acelerou sua saída.
No campo estadual, a ruptura mais simbólica envolveu João Doria. Aliado em 2018, quando adotou o slogan "BolsoDoria", o então governador de São Paulo se afastou do presidente ainda no primeiro ano de mandato. Durante a pandemia, o rompimento se consolidou com o embate em torno da vacina. Doria liderou o Instituto Butantan na produção da Coronavac e foi duramente atacado por Bolsonaro, que transformou a imunização em palco de disputa política.
Ciclo de abandonos
Em 2021, os episódios de afastamento no grupo político de Jair Bolsonaro começaram a incluir uma nova forma: aliados passaram a ser descartados mesmo sem confronto direto ou rupturas públicas. O movimento coincidiu com o início da construção de alianças para as eleições de 2022 e com as negociações para a entrada do presidente ao PL, seu atual partido.
Entre os nomes excluídos desse novo arranjo estiveram a ex-ativista Sara Winter e o ex-deputado Roberto Jefferson. Ambos haviam se projetado como vozes firmes na defesa do governo e de pautas radicais, mas perderam espaço à medida que passaram a representar desgaste ou instabilidade.
Sara Winter liderava o grupo autodenominado "300 do Brasil" e protagonizou manifestações com ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF). Após ser presa por decisão da Corte, esperava respaldo do Planalto. Ele nunca veio. Ignorada por integrantes do governo, ela se afastou e, posteriormente, acusou o presidente e sua equipe de abandono e covardia.
Roberto Jefferson rompeu com o presidente por conta da aproximação com partidos de centro-direita. Preso por decisão do Supremo em investigações sobre ataques às instituições, passou a cobrar solidariedade pública. Não obteve. Em 2022, após reagir com tiros a uma ação da Polícia Federal, foi definitivamente isolado. O presidente condenou o episódio e evitou qualquer associação.
Outra antiga aliada foi silenciosamente descartada em 2022: a deputada Carla Zambelli (PL-SP). Flagrada na véspera do segundo turno perseguindo com arma em punho um eleitor rival nas ruas de São Paulo, a parlamentar, que antes fazia parte do círculo próximo de Bolsonaro, foi gradualmente afastada. Nos bastidores, era consenso o sentimento mantido por membros da família Bolsonaro de que ela seria a culpada por sua derrota. Essa leitura foi confirmada pelo ex-presidente em 2025.
Também ganhou notoriedade o abandono de seu antigo ajudante de ordens, o tenente-coronel Mauro Cid. No último mês de junho, em áudio vazado, o militar revelou sua frustração ao ver todos os demais réus na ação penal do golpe recebendo amplo apoio do grupo político de Bolsonaro, incluindo doações milionárias de eleitores, enquanto ele próprio via sua carreira ruir.
Farpas com Tarcísio
O mais recente atrito entre figuras centrais do bolsonarismo teve como protagonistas Eduardo Bolsonaro e o governador Tarcísio de Freitas. Em postagem nas redes sociais, o deputado licenciado criticou duramente a iniciativa de Tarcísio de se reunir com representantes da Embaixada dos Estados Unidos para tratar das tarifas impostas por Donald Trump, bem como por reconhecer a primazia do Planato nas tratativas. Eduardo ironizou o discurso do governador, acusando-o de agir com "subserviência servil às elites" e de abandonar a defesa da indústria nacional.
O episódio acirra a disputa interna por espaço no bolsonarismo e expõe o desconforto de Eduardo com a visibilidade alcançada por Tarcísio. Mesmo negando a intenção de disputar ao Planalto, o governador é visto entre partidos de centro-direita como um dos nomes mais viáveis para substituir Bolsonaro em 2026: posição que o coloca, ao mesmo tempo, como possível herdeiro e possível concorrente.
Apesar do clima hostil, ainda não há indícios de uma ruptura definitiva: o governador já se desentendeu com o clã no passado, durante a discussão da reforma tributária, se reconciliando logo em seguida. Além disso, Tarcísio não responde às críticas no mesmo tom, não expondo desejo de confronto. Por outro lado, a tendência autofágica não deixou de ser uma constante no histórico da família Bolsonaro.
LEIA MAIS
Câmara dos Deputados
Diante de exílio de Eduardo, projeto prevê exercício remoto do mandato
CÂMARA DOS DEPUTADOS
Hugo Motta exonera servidores remotos para encerrar especulações
AGENDA DA SEMANA
Veja cinco assuntos na mira do Congresso na semana antes do recesso