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DITADURA
Congresso em Foco
13/12/2025 | Atualizado às 17:11
Foram menos de cinco minutos de discurso. Em resposta, o Congresso Nacional foi fechado, mandatos parlamentares foram cassados em massa e o país mergulhou no período mais repressivo da ditadura militar. Assim começou a vigência do Ato Institucional nº 5, decretado em 13 de dezembro de 1968, há 57 anos — um marco que redefiniu o papel do Legislativo e esvaziou por quase uma década a representação política no Brasil.
O estopim foi o pronunciamento do deputado Márcio Moreira Alves (MDB-RJ), feito em setembro daquele ano. Da tribuna da Câmara, o parlamentar denunciou a violência do regime, criticou a invasão da Universidade de Brasília (UnB) por tropas militares e sugeriu que a população boicotasse os desfiles do 7 de Setembro. Pediu, ainda, que jovens se recusassem a manter relações com oficiais envolvidos na repressão.
"Os militares vão pedir aos colégios que desfilem junto com os algozes dos estudantes. Que cada um boicote esse desfile. Esse boicote deve passar também às moças que dançam com cadetes e namoram jovens oficiais."
O discurso teve baixa repercussão no Plenário, mas foi interpretado pelo governo como afronta direta às Forças Armadas.
O Palácio do Planalto solicitou licença à Câmara para processar o deputado por injúria. Em 12 de dezembro de 1968, por ampla maioria, os parlamentares negaram o pedido. A decisão foi vista pelos militares como um desafio institucional. Na noite seguinte, o presidente Artur da Costa e Silva reuniu o Conselho de Segurança Nacional e decretou o AI-5.
"Editado o Ato 5", estampou O Globo em letras garrafais na edição de 14 de dezembro, listando as medidas: Congresso em recesso, suspensão do habeas corpus para crimes políticos, cassações e censura prévia.
Congresso fechado por tempo indeterminado
No mesmo dia em que o AI-5 foi editado, Costa e Silva decretou o recesso do Congresso Nacional por tempo indeterminado. As portas do Legislativo foram fechadas sem data para reabertura. Segundo registros oficiais da Câmara dos Deputados, o Parlamento só voltaria a funcionar dez meses depois, em outubro de 1969 — já profundamente mutilado.
Durante o recesso, o país passou a ser governado por decretos-lei, editados diretamente pelo Executivo, sem qualquer debate parlamentar. A Constituição de 1946 permaneceu formalmente em vigor, mas foi esvaziada na prática. O AI-5 se sobrepunha a ela.
O próprio Márcio Moreira Alves teve o mandato cassado ainda em dezembro de 1968 e passou à clandestinidade antes de se exilar. Anos depois, resumiria o episódio com amargura: "Meu discurso foi apenas o pretexto. O AI-5 já estava decidido".
Cassações em massa e esvaziamento do Legislativo
Ao longo de sua vigência, o AI-5 fundamentou a cassação de 110 deputados federais e sete senadores, além de 161 deputados estaduais, 22 prefeitos e 22 vereadores. No total, mais de seis milhões de votos foram descartados arbitrariamente. Entre os deputados cassados, Rubens Paiva, que seria assassinado por agentes militares em 1971.
No Congresso Nacional, as cassações atingiram sobretudo parlamentares do MDB, partido de oposição consentida ao regime, mas também alcançaram políticos conservadores que passaram a divergir da linha dura militar.
Além dos mandatos, o AI-5 permitiu a suspensão dos direitos políticos por até dez anos, a demissão sumária de servidores públicos e até a cassação de três ministros do Supremo Tribunal Federal — algo inédito na história republicana. Foram eles: Vitor Nunes Leal, Hermes Lima e Evandro Lins e Silva. Em solidariedade, outros dois deixaram o tribunal: Gonçalves de Oliveira e Antônio Carlos Lafayette de Andrada.
O ex-deputado Ulysses Guimarães (MDB-SP), que permaneceria como uma das principais vozes da resistência institucional, definiria o período anos depois:
"Não foi apenas um ato de exceção. Foi o rompimento definitivo com o Estado de Direito."
Reabertura tutelada e Congresso sob vigilância
Quando o Congresso foi reaberto, em outubro de 1969, não retomou sua autonomia. A reabertura ocorreu exclusivamente para referendar a eleição indireta do general Emílio Garrastazu Médici à Presidência da República e de Augusto Rademaker à Vice-Presidência.
O Parlamento funcionava sob censura, com forte autocontrole dos discursos, presença de parlamentares escolhidos por suplência após cassações e um sistema bipartidário imposto (Arena e MDB). Projetos considerados sensíveis sequer eram pautados.
O AI-5 ainda seria usado novamente para fechar o Congresso em abril de 1977, durante o governo Ernesto Geisel, quando o Executivo impôs o chamado "pacote de abril" para alterar regras eleitorais e conter o avanço da oposição.
Violência política e efeitos humanos
Embora o AI-5 não mencione explicitamente a tortura, historiadores e pesquisadores são unânimes em afirmar que ele criou o ambiente jurídico e político que permitiu sua prática sistemática.
Segundo dados consolidados por órgãos oficiais e pela Comissão Nacional da Verdade:
Na prática, o AI-5 funcionou como um sinal verde para a repressão sem limites.
A revogação e a volta incompleta da normalidade
O AI-5 foi formalmente revogado em 13 de outubro de 1978, por meio da Emenda Constitucional nº 11, já no contexto da abertura política conduzida por Geisel. A emenda restaurou o habeas corpus, mas deixou claro que os atos praticados sob o AI-5 não poderiam ser questionados judicialmente.
A normalidade institucional só começaria a ser reconstruída com a Lei da Anistia, em 1979, e seria plenamente restabelecida apenas com o fim da ditadura, em 1985, e a promulgação da Constituição de 1988.
O AI-5 não fechou apenas o Congresso. Ele silenciou a política, destruiu a mediação institucional e mostrou como a ruptura democrática pode ser rápida quando a representação popular é tratada como obstáculo.
Cinco décadas depois, sua história permanece como alerta permanente: autoritarismos não começam com tanques nas ruas, mas com o esvaziamento gradual, ou abrupto, do Parlamento.
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