Muito mais do que o destino de embriões congelados, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) terão de definir hoje (5), ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (
Adin 3510) contra o artigo 5° da Lei de Biossegurança (
Lei 11.105/2005), o que pode ser considerado um ser humano com direito à vida e às proteções do Estado brasileiro.
No julgamento, que começará às 14h e tem previsão para continuar amanhã (6), os ministros precisarão responder aos questionamentos feitos pelo ex-procurador-geral da República Claudio Fonteles em seu
parecer. Ele pergunta quando começa a vida humana para fins legais: se na fecundação, após a implantação do embrião no útero ou após o nascimento.
Com isso, Fonteles pede ao STF que decida se os embriões considerados inviáveis ou que estejam congelados há mais de três anos, como citados no artigo em questão, podem ser considerados vidas humanas e usados em pesquisas com células-tronco embrionárias.
Direito à vida
Para que sejam realizadas as pesquisas, é preciso sacrificar o embrião. Por isso, o ex-procurador argumenta que a Lei de Biossegurança está violando o artigo 5° da Constituição Federal que garante “aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à igualdade, à liberdade e à propriedade”.
Os que defendem as pesquisas, por outro lado, alegam que essas células embrionárias são as únicas com potencial para se transformar em qualquer outra célula do corpo humano. Justamente por isso, elas teriam maior chance de gerar resultados positivos na busca pela cura de doenças degenerativas, genéticas e causadas por lesões medulares.
Portanto, caberá aos ministros definirem, em primeiro lugar, se os embriões descritos na Lei de Biossegurança – embriões humanos produzidos por fertilização
in vitro, não utilizados no respectivo processo e que sejam “inviáveis” ou estejam congelados há três anos ou mais – são protegidos pelos direitos constitucionais.
“O STF terá uma responsabilidade muito grande. Há segmentos que acham que o direito à vida será violado ali [na morte dos embriões para pesquisas], outros acreditam que os direitos serão violados caso as pesquisas não sejam feitas”, explica o advogado Joelson Dias. Ele representará, no julgamento de hoje, o Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero (Anis), que defende a constitucionalidade das pesquisas com células-tronco embrionárias.
Duas correntes
Sobre a ética de se utilizar, em pesquisas, embriões considerados inviáveis ou que estejam congelados há mais de três anos, é possível perceber duas correntes bem definidas. Uma delas – e é esta a defendida por Cláudio Fonteles (
leia entrevista) – argumenta que a vida começa no momento da fecundação e que, portanto, aquele aglomerado de células que formam o embrião deve ser considerado vida humana. Neste caso, portanto, o embrião também deveria ter seu direito à vida preservado.
A segunda corrente defende que os embriões descritos na Lei de Biossegurança teriam pouco ou praticamente nenhum potencial para se tornarem seres humanos. Além disso, alegam que a morte desses embriões não pode ser considerada aborto, pois o aborto é a interrupção da gravidez e, neste caso, como o embrião não está no útero, ainda não há uma gestação em curso.
“No aborto temos vida no útero que só será interrompida por intervenção humana. Mas é preciso haver intervenção humana para a formação do embrião”, destacou a pesquisadora Mayana Zatz, professora de Genética Humana e Médica e pró-reitora de Pesquisas da Universidade de São Paulo (USP), durante audiência realizada em abril do ano passado no STF sobre o tema.
Alerta
Embora a presença de cientistas seja mais maciça na defesa das pesquisas com células-tronco embrionárias, há grupos que concordam com a tese de que a vida começa na fecundação. Esses grupos também argumentam que há métodos alternativos para se estudar as células-tronco sem que, para isso, seja preciso “matar” um embrião.
“Nenhum artigo científico foi publicado comprovando que células-tronco embrionárias são mais eficientes do que as células-tronco adultas [encontradas na medula-óssea e no sangue dos cordões umbilicais]. Pelo contrário, em alguns testes essas células se transformaram em câncer, porque uma célula-tronco embrionária pode virar qualquer coisa, inclusive um câncer”, afirma o deputado Dr. Talmir (PV-SP), que é pediatra, trabalha há 25 anos com deficientes físicos e é coordenador da Frente Parlamentar contra a Legalização do Aborto.
Na opinião do deputado, que também representa a América Latina na Federação Internacional do Direito de Viver, o STF irá manter a decisão do Congresso e declarar a constitucionalidade das pesquisas com células-tronco embrionárias. Ele reclama, no entanto, que ainda há muita desinformação sobre o assunto e que os argumentos de que o uso de embriões é essencial para a pesquisa, na verdade, esconde interesses econômicos de determinados grupos como, por exemplo, o das clínicas de fertilização artificial.
“Hoje, no debate, nós perdemos. Mas daqui a dez anos vamos ver que foi um erro”, garante. “Quando fazem a fertilização assistida muitos casais não têm a consciência de que com 18 dias a criança já tem um coração que bate”, destaca.
Dr. Talmir compara o descarte de embriões, entre outras coisas, à seleção de raças feita pelos nazistas. Ele argumenta que a opção pela pesquisa com células-tronco embrionárias é muito mais uma desculpa para se solucionar o problema de embriões desprezados por pais e laboratórios do que uma possibilidade de solução para problemas de saúde graves como o Mal de Parkinson e a es