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Crise Brasil-EUA

Brasil e EUA: retomando o debate sobre soberania, pressão externa e o papel do país no cenário global

À luz de novos fatos e práticas diplomáticas questionáveis, revisitamos o tema para analisar por que a autonomia brasileira segue sob teste e quais caminhos o país deve adotar para se proteger.

Eduardo Vasconcelos

Eduardo Vasconcelos

15/8/2025 16:00

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Retomando um debate necessário

No artigo anterior publicado no Congresso em Foco - "O que a crise com os EUA revela sobre o lugar do Brasil no mundo" - discutimos como a tensão diplomática recente com os Estados Unidos expõe fragilidades e dilemas estratégicos da política externa brasileira. Retomamos agora esse debate porque o contexto geopolítico evoluiu: tarifas punitivas, ameaças veladas e disputas monetárias indicam que a soberania do Brasil segue sob teste.

A conjuntura exige mais do que respostas pontuais: pede visão estratégica, capacidade de articulação e clareza de propósito. Não se trata apenas de resistir a pressões imediatas, mas de reposicionar o país num tabuleiro internacional em rápida transformação.

O encontro de dois chefes de Estado: diplomacia ou confronto?

Quando dois chefes de Estado se reúnem, o mundo observa mais do que gestos protocolares. Analisa intenções, estratégias e concessões. A relação entre líderes deve ser guiada pelo respeito mútuo e pelo princípio da igualdade soberana, mas sem confundir diplomacia com submissão. Divergências são normais, mas devem ser tratadas no campo das ideias - não em arenas de ataques pessoais que corroem pontes antes mesmo da negociação começar.

A força da palavra e o limite da liberdade de expressão diplomática

A liberdade de expressão é um direito fundamental, mas no tabuleiro internacional as palavras têm o peso de tratados. Como alertou Kofi Annan, "a diplomacia é mais do que a arte de dizer coisas agradáveis; é a habilidade de dizer a verdade sem causar guerra" (ANNAN, 2012).

Declarações intempestivas podem acionar crises diplomáticas, inviabilizar acordos e servir de combustível para políticas retaliatórias. A regulação dessa liberdade, no plano diplomático, deve ser uniforme, preservando a estabilidade internacional. Nesse jogo, o que é dito não pode ser "desdito" - e líderes precisam entender que, na diplomacia, cada palavra é também um ato.

Acordos soberanos: quando assinar, quando negar

A assinatura de tratados internacionais exige preparo. A Convenção de Viena estabelece que "pactos devem ser cumpridos" (pacta sunt servanda), mas também que um Estado pode recusar compromissos que violem sua Constituição ou soberania.

Como adverte Antônio Augusto Cançado Trindade, "o consentimento de um Estado para obrigar-se por um tratado deve ser expresso livremente e com pleno conhecimento de suas implicações" (TRINDADE, 2017). Sem essa diligência, um acordo pode transformar-se numa armadilha de longo prazo, comprometendo a autonomia decisória.

Interferência e golpes de Estado: limites do direito internacional

O direito internacional é claro: nenhum Estado pode ameaçar ou usar força contra a integridade territorial ou a independência política de outro. Apoiar ou promover golpes em nações soberanas é violação grave, historicamente associada à instabilidade crônica e conflitos armados.

A carta de Trump: pressão, coerção e a linha vermelha da soberania

A carta enviada por Donald Trump em 9 de julho ao governo brasileiro acendeu alertas em círculos diplomáticos. A imposição de tarifas como moeda de troca para forçar negociações é, como já dissemos, uma prática sórdida e desrespeitosa. Na diplomacia, respeito não se impõe; conquista-se. E acordos forjados sob coerção carecem de legitimidade e devem ser recusados.

"Na política externa, crises não admitem marcha à ré: o único caminho é avançar com firmeza e clareza de propósitos, pois recuar diante de pressões é abdicar da soberania" (VASCONCELOS, 2025).

Subestimação e risco estratégico

Subestimar líderes que atuam com assertividade ou agressividade pode custar caro. Henry Kissinger sintetizou: "Em crises, a ousadia é o caminho mais seguro. A hesitação encoraja o adversário a perseverar, talvez até a aumentar a aposta" (KISSINGER, 1994).

A lição é simples: prudência estratégica não é sinônimo de passividade. É construir capacidade de resposta antes da crise, para que nenhuma decisão seja tomada sob improviso ou desvantagem.

O papel do BRICS e a reação americana

O BRICS reúne mais de 40% da população mundial e 27% do PIB global. Sua expansão recente (BRICS+) e a crescente adoção de moedas locais em transações internacionais apontam para um movimento de desdolarização parcial.

Para Washington, isso significa perda gradual do monopólio sancionatório. Como afirma Barry Eichengreen, "o privilégio exorbitante do dólar" não é eterno se for usado como arma política de forma excessiva. Tarifas e sanções têm efeito bumerangue: aproximam os países-alvo e incentivam alternativas monetárias e comerciais.

Fonte: FMI, Banco Mundial, UNCTAD (2024).

Fonte: FMI, Banco Mundial, UNCTAD (2024).

Dólar, dependência e autonomia monetária

O dólar ainda domina as reservas globais (58,9%), mas a tendência de queda é clara. Joseph Stiglitz lembra que "a diversificação das moedas de reserva é fundamental para um sistema mais estável e menos vulnerável a decisões unilaterais" (STIGLITZ, 2010).

A consolidação de mecanismos financeiros do BRICS, como o New Development Bank financiando projetos em moedas locais, é mais que simbólica: é um antídoto prático contra a volatilidade imposta de fora.

O presidente e o dever constitucional de defender a soberania

A Constituição de 1988, art. 4º, consagra a independência nacional como princípio. Como aponta Celso Lafer, "a soberania, no sentido moderno, não se exerce apenas sobre o território, mas sobre as decisões que um Estado toma em política externa" (LAFER, 2001).

Negociar sem preparo técnico e respaldo político é abrir mão dessa soberania. Por isso, timing e estratégia são tão importantes quanto firmeza.

Unilateralismo ou multilateralismo?

Amado Luiz Cervo lembra: "a inserção internacional bem-sucedida depende do uso inteligente dos fóruns multilaterais" (CERVO; BUENO, 2011). O multilateralismo não é apenas idealismo: é um escudo contra pressões assimétricas e uma forma de projetar poder de forma cooperativa.

Diplomacia como Defesa Nacional

Da carta de Trump ao avanço do BRICS, passando pela pressão econômica e pelo debate sobre desdolarização, uma lição se impõe: diplomacia é defesa. Não há soberania sem capacidade de dizer "não" a acordos injustos e "sim" a parcerias equilibradas.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva resumiu em uma frase: "sem soberania, o Brasil não existiria" (CNN Brasil, 2025). Essa não é apenas uma constatação retórica - é uma diretriz de política externa que deve guiar cada decisão estratégica.

Num mundo em disputa, o Brasil precisa afirmar: soberania não se negocia - se exerce.

Lula encara tarifaço e sanções dos EUA como teste de autonomia.

Lula encara tarifaço e sanções dos EUA como teste de autonomia.Ricardo Stuckert/PR


Referências

ANNAN, Kofi. Interventions: A Life in War and Peace. New York: Penguin Books, 2012.

CERVO, Amado Luiz; BUENO, Clodoaldo. História da Política Exterior do Brasil. 4. ed. Brasília: Editora UnB, 2011.

CNN BRASIL. Lula afirma que sem soberania Brasil não existiria. São Paulo, 15 jan. 2025. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br. Acesso em: 13 ago. 2025.

EICHENGREEN, Barry. Exorbitant Privilege: The Rise and Fall of the Dollar and the Future of the International Monetary System. Oxford: Oxford University Press, 2011.

KISSINGER, Henry. Diplomacy. New York: Simon & Schuster, 1994.

LAFER, Celso. A Identidade Internacional do Brasil e a Política Externa Brasileira: passado, presente e futuro. São Paulo: Perspectiva, 2001.

STIGLITZ, Joseph E. Freefall: America, Free Markets, and the Sinking of the World Economy. New York: W. W. Norton & Company, 2010.

TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. O Direito Internacional em um Mundo em Transformação. Belo Horizonte: Del Rey, 2017.

VASCONCELOS, Eduardo S. Brasil e EUA: retomando o debate sobre soberania, pressão externa e o papel do país no cenário global. 2025.


O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].

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