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Congresso em Foco
15/6/2006 | Atualizado 16/6/2006 às 13:46
Albert Steinberger, de Slovice, Polônia*
Slobice fica exatamente na fronteira entre a Alemanha e a Polônia e a 500 quilômetros de distância de Dortmund, onde aconteceu o jogo entre as seleções dos dois países na última quarta-feira. Estar ali com dois alemães durante a partida foi como estar no olho de um furacão, já que a relação tempestuosa entre os dois países já dura séculos. "Auto stohlen, schon in Polen" (Carro roubado, já na Polônia), afirma um preconceituoso ditado alemão. A coisa começa logo cedo. Nas escolas germânicas, as crianças se chamam de poloneses como se tivessem se xingando, uma espécie de sinônimo pra ladrão. A própria segunda guerra mundial começou com a invasão dos alemães nesta fronteira polonesa. Hoje em dia, o movimento é contrário e muitos poloneses vão para o país vizinho em busca de emprego e uma vida melhor.
Ao cruzar a ponte sobre rio Oder, que divide os dois países, a primeira loja que vi foi uma tabacaria. Coisas de uma União Européia que ainda tem muitas desigualdades. O tabaco na Polônia chega a sair por menos da metade do preço pelo qual é vendido na Alemanha. Logo sentamos em um restaurante e experimentamos um pouco da culinária local, que se parece um pouco com a alemã, com direito a muito repolho e salsicha.
Em seguida, seguimos para o local onde o jogo seria transmitido. Uma espécie de tenda que mais parecia uma taverna. Se a primeira impressão é a que fica, o clima não era nada amigável. Logo ao sentar recebi um cutucão nas costas por estar na frente de um cara que tinha, no mínimo, o dobro do meu tamanho. Ele cuspiu meia dúzia de palavras incompreensíveis, mas, para bom entendedor, somente uma cara feia basta e eu fui procurar outro lugar para me sentar.
Depois, fui tirar algumas fotos do local e o dono do bar veio até mim com uma cara de poucos amigos. Tentei gastar todos os idiomas possíveis e imagináveis, mas nada colava. Então, eu falei um despretensioso "ok". Ele deve ter retrucado algo como "nada ok" e saiu me xingando, imagino eu.
Assisti ao jogo em uma mesa de alemães. A sensação era de ser um herege em terra santa. No momento do hino nacional polonês, todos com uma disposição espartana se puseram de pé, e ai de quem ficasse sentado. "Nie dac Nemcom, Nie dac!" (algo como: sem medo dos alemães), gritavam eufóricos os moradores de Slobice antes do jogo. A linguagem do futebol é uma coisa universal, já que os sentimentos levantados no âmago de cada um são muito semelhantes. Já a forma de expressá-los, assusta. A quantidade de consoantes que um ser humano pode falar de uma só vez é impressionante e os poloneses, durante o jogo, não paravam de cantar nem um segundo.
Embalados pela Lech e a Tyskie, as principais cervejas do país, eles subiam sobre mesas e cadeiras do bar. "Nazdrowie" (Saúde), diziam eles. A cada defesa e a cada ataque eles urravam ensandecidos, mas o êxtase vinha durante as faltas contra os jogadores alemães, que, quanto mais violentas, mais arrancavam aplausos dos torcedores.
Intervalo de jogo e a partida continuava 0 a 0. Uma das garçonetes perguntou na nossa mesa se éramos alemães e deu a entender que devíamos ir embora. O clima ficava cada vez mais pesado. Consideramos a hipótese, mas resolvemos pagar pra ver.
No 2º tempo, o barulho de garrafas quebradas parecia ser o som ambiente do local. Talvez fosse uma espécie de premonição do que estava por vir. Aos 42 minutos do segundo tempo, o placar continuava inalterado. Foi quando um torcedor, daqueles que mais parecem lutadores de vale-tudo, começou a confusão que acabaria por atingir uma criança que devia ter os seus dez anos de idade. Garrafas, cadeiras e mesas voavam pelo bar afora. Dez segundos depois, sai em disparada o polonês, antes valente, seguido por outros dois que o seguiram pela ruas da cidade. O motivo, como em toda a briga, não poderia ser mais esdrúxulo: um deles estava em cima do banco e quem estava atrás não conseguia assistir ao jogo.
Assim que a pancadaria começou, saímos andando apressadamente pelas ruas da pequena cidade de 16 mil habitantes. Temíamos o pior, já que os poloneses têm a fama de serem os hooligans mais violentos do mundo. Melhor não ficar lá pra conferir. Com a atenção dispersa após a confusão, muitos moradores de Slovice mal viram o gol de Oliver Neuville aos 46 do segundo tempo, mas certamente irão escutar durante toda a noite os fogos do outro lado do rio, onde os alemães de Frankfurt (Oder) comemoraram o resultado contra os vizinhos.
*Agradecimentos especiais à tradutora Gosia Owcaorek
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