Entrar
Cadastro
Entrar
Publicidade
Publicidade
Receba notícias do Congresso em Foco:
LOBBY
Congresso em Foco
21/10/2025 | Atualizado às 12:43
Nos corredores do Congresso Nacional circulam ideias, causas e interesses. É assim no Brasil e em qualquer democracia consolidada. Mas, de tempos em tempos, o país reage com espanto ao descobrir que projetos de lei nasceram de sugestões vindas de entidades empresariais, associações de classe ou escritórios técnicos.
A reação, quase automática, é a desconfiança. A noção de que o contato entre parlamentares e setores organizados seria algo "impróprio" ainda persiste na cultura política brasileira. Mas essa relação, quando pública, legítima e transparente, é justamente o que caracteriza uma democracia madura, onde múltiplas vozes disputam espaço e argumentos dentro das regras do jogo.
Representar é mediar interesses
Deputados e senadores são eleitos para representar pessoas - e essas pessoas estão ligadas a categorias, atividades e visões de mundo. O papel do parlamentar é mediar essas demandas, convertendo-as em normas e políticas públicas.
Por isso, é natural que recorra a quem entende do assunto. Um projeto sobre energia solar, produção agrícola ou medicamentos precisa de embasamento técnico. Muitas vezes, as entidades de classe ou associações especializadas oferecem esse conteúdo. Isso não contamina o processo - ao contrário, o fortalece, dando densidade técnica às proposições.
O parlamentar, no entanto, mantém a prerrogativa final. Ele decide se apresenta, adapta ou rejeita uma proposta. A origem de uma ideia não define sua legitimidade. O que a define é o debate público que se segue.
O tabu brasileiro do diálogo
Em democracias mais maduras, o diálogo entre o Poder Público e os grupos de interesse é visto como um instrumento essencial de representação. No Brasil, porém, a palavra "lobby" ainda carrega um peso moral, quase um sinônimo de "corrupção".
Essa visão distorcida impede o país de encarar o lobby pelo que ele é: uma forma organizada de participação política. Movimentos sociais, sindicatos, igrejas, universidades, associações empresariais e entidades civis fazem lobby diariamente - pedem, argumentam, pressionam e negociam. É assim que se constrói o consenso possível em uma sociedade complexa.
Normalizar o lobby significa reconhecer o direito de todos os grupos de se manifestarem, dentro da lei e com visibilidade. Não é criar novos controles, mas aceitar que a política é feita de interação constante entre o público e o privado.
Particular também é público
Há um viés curioso no debate público. Quando uma organização social ou movimento popular propõe uma mudança legislativa, costuma-se aplaudir a mobilização. Mas, quando a proposta vem de um setor produtivo, o gesto é tachado de "pressão indevida".
Em uma democracia, não há interesses ilegítimos por natureza - há meios legítimos ou ilegítimos de manifestá-los. Um empresário e um sindicalista ocupam o mesmo território cívico: ambos defendem causas. O que se espera é transparência, não silêncio.
O público não é sinônimo de "popular" - é o conjunto de todas as vozes que compõem a sociedade. A democracia é justamente o espaço onde esses interesses se enfrentam e se conciliam. O papel das instituições é garantir que todos possam participar, sem culpa, sem segredo e sem hipocrisia.
Quando uma entidade técnica oferece subsídios para um texto legislativo, está participando do debate. Quando um parlamentar acolhe uma proposta porque ela é bem fundamentada, está exercendo representação. O risco está na opacidade e na troca indevida, não na interlocução em si.
O mito do financiamento de campanhas
Desde que o STF proibiu o financiamento empresarial de campanhas, em 2015, criou-se a ilusão de que a política poderia se livrar dos interesses privados. A medida foi celebrada como um passo ético, mas teve efeitos colaterais: encareceu as campanhas, reduziu a competitividade e empurrou a conta para o fundo partidário - bancado pelo contribuinte.
A tentativa de "purificar" o sistema político, ao eliminar o contato direto entre empresas e candidatos, não eliminou a influência econômica; apenas a deslocou para outras arenas.
Talvez seja hora de o STF rever essa decisão, considerando novas regras de transparência e limites mais claros. Criminalizar o financiamento não elimina o interesse privado.
O caminho não é o isolamento moral, mas o reconhecimento prático de que a convivência entre diferentes interesses é a base da vida democrática.
A defesa da institucionalidade
O Congresso é o palco institucional das divergências. É ali que o país se reconhece múltiplo: ruralistas e ambientalistas, empresários e sindicalistas, liberais e progressistas. Essa pluralidade é a força, não a fraqueza, da democracia.
Defender o papel do Parlamento é defender o próprio princípio da democracia representativa. O Congresso não é um santuário isolado da sociedade, mas uma arena de interesses legítimos. O lobby - ou, se preferir, as forças corporativas - faz parte disso. O que o país precisa é de institucionalidade, não de demonização.
Há algo profundamente humano na política. Ela é feita de pessoas, crenças, projetos e disputas. E, como ensinou Terêncio, "nada do que é humano deve ser estranho ao homem".
No fim das contas, o problema não está em quem fala com o Congresso. Está em quem o Congresso ouve - e em como transforma o diálogo em lei.
{ "datacode": "NOTICIAS_LEIA_MAIS", "exhibitionresource": "NOTICIA_LEITURA", "articlekey": 113135, "viewed": [ "113135" ], "context": "{\"articlekey\":113135,\"originalarticlekey\":\"113135\"}" }