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Congresso em Foco
22/7/2009 15:07
Bajonas Teixeira de Brito Júnior*
Lemos no Congresso em Foco a manchete: DEM entra com ação no STF contra cotas raciais. Lemos ainda que a Procuradora do Distrito Federal Roberta Fragoso Kaufmann atua como advogada voluntária do DEM. A sensação que temos em primeiro lugar é a de estranheza. Isso porque, nos parece, trata-se de uma atuação imprópria. Se a procuradora exerce uma atividade profissional pública, remunerada com recursos públicos, como pode atuar em proveito dos interesses ou da ideologia de um partido? Um partido, a designação já o diz, é a representação de uma parte da sociedade, de um determinado corpo de interesses que, por definição, não é universal. Se os interesses representados pelos partidos coincidissem, não haveria necessidade de partidos, bastaria "O Partido". Mas o Partido Único é característica das sociedades fascistas.
Por isso, não vemos, de modo algum, como um funcionário público, remunerado com verbas públicas, pode, em nome de um pretenso interesse público universal, atuar sob a bandeira de um partido. Pouco importa aqui a palavra "voluntário". O fato é que ao voluntariar-se ao DEM, partido que aliás possui plena disponibilidade financeira para pagar honorários advocatícios, a procuradora empresta sua função pública, isto é, o nome e o prestígio do Ministério Público, para uma causa que é particular. Partidária. Bastaria isso para, ao nosso ver, mostrar que a atitude em questão é inteiramente ilegítima. Não se pode em hipótese alguma confundir os "interesses sociais" com os interesses de um partido. O Ministério Público tem a missão de defender os interesses sociais, entre outros, mas, de modo algum, o programa ou os interesses de um partido. Por isso, esta associação entre a procuradora e o DEM nos soa inteiramente insustentável. A idéia de que o interesse social coincida com o interesse de um partido é a marca distin
tiva dos totalitarismos.
No plano do interesse público e da ética pública, cremos que essa iniciativa deva ser questionada e repudiada. Agora, num outro plano, no plano intelectual, já tivemos oportunidade de questionar a procuradora e apresentar claros indícios de simplificações e distorções na sua forma de compreender a questão racial no Brasil. Esta é uma questão complexa e sutil que, até onde vemos, passa longe do esquematismo primário que conduz os raciocínios da procuradora. Leia-se esse trecho da lavra da procuradora apresentada na matéria do Congresso em Foco:
"`No Brasil, ninguém é excluído pelo simples fato de ser negro, diferentemente do que aconteceu em outros países. Aqui, a dificuldade de acesso à educação e a posições sociais elevadas decorre, sobretudo, da precária situação econômica´, justifica também a procuradora." Haverá truísmo mais elementar? Em que país do mundo capitalista aqueles que encontram-se em "precária situação econômica" não deparam "dificuldade de acesso à educação"? O que é específico do Brasil, que a procuradora parece não ter notado, nem o DEM, é que há uma curiosa coincidência: os mais negros são os mais pobres. Curioso, não? Mas é possível dizer mais.
Por que, perguntamos, o racismo foi classificado na Constituição Federal como crime inafiançável se, como entende a procuradora, ninguém aqui é excluído pelo fato de ser negro? Ora, se isso é verdade, se a afirmação da procuradora for mais que uma afirmação irrefletida ou preconceituosa, então a Constituição Federal é inconstitucional porque, tal como os que defendem as cotas, por julgarem que uma forte muralha de preconceito exclui os negros no Brasil, ela, a Constituição, em seu art. 5º - inc. XLII, tornou o racismo crime inafiançável.
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei.
Então, se assim é, e assim certamente continuará sendo, ou a procuradora desconhece as implicações da natureza dessa determinação da Constituição Federal ou, ao contrário, a Constituição não foi feita por brasileiros para ser a lei instituinte de um país chamado Brasil. Se não existe racismo no Brasil, legislar sobre ele foi tão supérfluo quanto seria, por exemplo, inserir na Constituição um artigo que tornasse obrigatória a lei da gravidade.
Quando questionamos a procuradora alguns meses atrás mostrando, sem qualquer chances à dúvidas, que seus argumentos tinham uma matiz nitidamente preconceituosa, ela se furtou a responder e, ao invés de contrapor seus argumentos aos nossos, apresentou ao Congresso em Foco a sua dissertação de mestrado. Ou seja: fugiu da discussão no que se refere à seriedade acadêmica, já que é assim que pretende fundamentar o seu pensamento, isto é, como idéias oriundas da pesquisa acadêmica. Evitou, desse modo, confrontar-se com as consequências evidentes do seu próprio pensamento, um pouco como faz a sociedade brasileira que, em diversas oportunidades, recusa-se a enfrentar os seus preconceitos e, assim, garante que a dissimulação os perpetue.
Mas cito aqui alguns comentários que fizemos ao artigos da procuradora publicado naquele momento no Congresso em Foco:
"Mas, para piorar ainda mais as coisas, a procuradora Roberta Kaufmann cria um vilão oportunista e aproveitador, o negro rico. Ela não se pergunta se ele existe ou pode existir, ou seja, se para além dos delírios verbais, a situação sócio-econômica brasileira criou verdadeiramente uma camada social que possa ser designada como a dos negros ricos. Não se pergunta também se, em existindo, este grupo social seria imoral ao ponto de se aproveitar das cotas. Ao invés de refletir sobre isso, ela já nos convida a pensar que esta camada existe, e que está a espreita pronta para se apropriar delas - "Essas cotas favorecem que negros ricos entrem na universidade". Veja-se por aí o absurdo a que está disposta a procuradora em sua argumentação: as cotas se destinavam a amenizar precariamente a situação de marginalidade dos negros que vivem na miséria, mas, como descobriu a procuradora, servirá apenas para um grupo de malandros aproveitadores, os negros ricos, se dar bem.
Mas ainda há algo pior. Este algo é a matriz de todo esse raciocínio da procuradora: que os negros, mesmo ricos, não têm capacidade para entrar na universidade pública por mérito próprio e, por isso, vão se aproveitar das Cotas. Isso, para o bom entendedor, é dito em alto e bom som. E é fácil entender. Se existem negros ricos, ou melhor, se existissem, por que não fariam estudos prévios sólidos capazes de garantirem o acesso seguro à Universidade Pública? Por que precisariam sorrateiramente valer-se da brecha das Cotas para entrarem na Universidade Pública?
Assim, a procuradora cria uma categoria imaginária de negros que: 1) tem dinheiro mas não quer gastá-lo com estudo; 2) tem chance de estudar mas não o faz (Por preguiça? Por incapacidade para aprender? Por acomodação? Por imoralidade congênita?); 3) não se vexa de, mesmo sabendo que as cotas se destinam aos destituídos, se aproveitar da oportunidade de usufruir delituosamente delas; 4) sequer possui qualquer solidariedade com os outros negros, sendo capazes de tomar deles o que seria um direito."
A questão racial brasileira é, como já dissemos, relativamente complexa. Se trata de uma sociedade que recobre grande parte de suas práticas, de suas relações sociais, de suas transações políticas e econômicas, com uma espessa camada de dissimulação. Isso significa que, para si mesma, esta sociedade camufla as matrizes determinantes do seu pensamento e da sua ação. Na camada mais superficial da sociedade brasileira, mas evidente, não existem os elementos da dura discriminação racial que foi conhecida nos EUA ou na África do Sul. Estas sociedades, durante muito tempo, sustenta
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