A maioria dos novos integrantes da Comissão de Minas e Energia (CME) da Câmara, que assumiu como o colegiado em março, teve parte da campanha eleitoral paga por empresas do setor. Dos 30 titulares que compõem a CME, 20 deputados receberam cerca de R$ 3,5 milhões em doações nas últimas eleições. Entre os beneficiados, estão o presidente da comissão,
Luiz Fernando Faria (PP-MG), e a vice-presidente, Rose de Freitas (PMDB-ES).
Cada um recebeu, respectivamente, R$ 355 mil e R$ 130 mil. Para o cientista político Leonardo Barreto, da Universidade de Brasília (UnB), a ligação entre empresas e parlamentares que atuam nas comissões da Casa é um fato “corriqueiro”, que iguala as votações a um "jogo de cartas marcadas".
Entre as doadoras, estão 49 empresas que atuam no setor de distribuição de derivados de petróleo, de instalação de gás, de fundição, de administração de usinas elétricas, de siderurgia, de destilação de combustíveis e de criação de linhas de energia.
A CME atua na realização de políticas e modelos para o setor mineral e energético brasileiro. Trata da busca de fontes convencionais e alternativas de energia, de pesquisa e exploração de recursos energéticos, da política e estrutura de preços, da comercialização e industrialização de minérios, e do regime jurídico do setor.
As empresas ligadas à mineração são as maiores financiadoras das campanhas dos parlamentares da comissão, tendo desembolsado cerca de R$ 2,9 milhões nas eleições passadas, ou cerca de 80% do total. As empresas de energia doaram os outros 20%.
Do montante doado pela mineração, os governistas receberam R$ 1,8 milhão; já os parlamentares da oposição ficaram com R$ 1,1 milhão.
DEPUTADOS DA COMISSÃO DE MINAS E ENERGIA
QUE RECEBERAM DOAÇÕES DO SETOR
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*Valores incluem doações feitas tanto pelo setor de mineração quanto de energia
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral
Mineiros
As mineradoras têm como principal alvo os deputados eleitos por Minas Gerais. Os principais beneficiados por elas são os mineiros José Santana de Vasconcellos Moreira (PR), com R$ 770 mil,
Paulo Abi-Ackel (PSDB), com R$ 635 mil,
Luiz Fernando Faria (PP), com R$ 355 mil, e José Fernando Aparecido (PV), com 130 mil.
Juntos, os quatro receberam R$ 1,9 milhão, ou 65% do montante desembolsado pelas mineradoras a todos os integrantes da CME.
Para cientista político Leonardo Barreto, o fato de os deputados mineiros serem os que receberam a maior quantia não é por acaso.
“As empresas não escolhem qualquer um. Elas escolhem as autoridades do setor que normalmente são procurados por outros deputados que buscam algum tipo de subsídio sobre os temas mais complexos. Essas autoridades têm o poder de persuasão dentro das comissões”, avaliou Barreto.
Segundo o especialista, a constatação de os parlamentares terem recebido recursos de campanha e atuarem em uma comissão relacionada ao setor da empresa doadora é “corriqueira”. “Você vai verificar esse tipo de relacionamento em quase toda as comissões. O problema é que todo o processo [de votação de propostas] fica como um jogo de cartas marcadas”, criticou.
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O deputado
Arnaldo Jardim (PPS-SP), que recebeu R$ 96,5 mil de empresas do setor de minas e energia, confirma a tese de Barreto.
"Parece-me óbvio que setores organizados, segmentos da população, que priorizam determinado assunto, busquem representantes que concentrem suas atividades na mesma questão", avalia o deputado que no próximo dia 24 de abril organiza audiência pública para discutir a bioeletricidade.
Oposição
As empresas que atuam no setor de energia doaram mais para a oposição. Seis deputados de fora da base aliada foram contemplados com R$ 356 mil. Já os governistas tiveram os caixas abastecidos com R$ 313 mil.
Entre esses, o primeiro da lista é o deputado Eduardo Sciarra (DEM-PR), com um total de R$ 150 mil. O segundo maior beneficiado é o petista Fernando Ferro (PE), contemplado com R$ 100 mil, doados pela empresa Cavan Pré-Moldado, que fabrica estruturas de concreto para linhas de transmissão e tem entre os principais clientes as centrais elétricas.
Para o pernambucano, o fato de ter recebido os recursos não influência na tomadas de decisão na comissão. “É tudo legal, está na prestação de contas. Não tenho nenhum compromisso com as empresas que me doaram”, afirmou Ferro ao Congresso em Foco. Segundo o deputado, ele irá se empenhar na criação de uma legislação para “organizar” o setor de mineração e em projetos no setor elétrico relacionados ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Já o deputado José Fernando Aparecido (PV-MG), cujo cofre eleitoral foi ampliado em R$ 180 mil com as doações do setor de minas e energia, disse à reportagem que desconhecia o recebimento dos recursos. “Isso para mim é irrelevante. Eu nem sabia, não fui o diretor-financeiro da minha campanha”, alegou. Segundo Aparecido, no entanto, o fato de ter parte da campanha paga pelas empresas do setor não irá influenciar sua conduta frente à Comissão de Minas e Energia.
Por outro lado, assim como Fernando Ferro, Aparecido defende uma nova reformulação na política mineral, com a criação, inclusive, de uma agência reguladora para o setor.
A reportagem não recebeu retorno dos deputados
Paulo Abi-Ackel, José Santana, Fernando Faria, Eduardo Sciarra e Rose de Freitas.