Entrar
Cadastro
Entrar
Publicidade
Publicidade
Receba notícias do Congresso em Foco:
Congresso em Foco
17/5/2008 | Atualizado às 10:49
Veja
O lado escuro da Força
A promiscuidade do sindicalismo com o poder, empresários, dinheiro e mordomias está na gênese da Força Sindical, criada em 1991, quando o ex-presidente Fernando Collor de Mello reuniu um grupo de empresários para financiar o modelo de representação dos trabalhadores que ele considerava ideal. O resultado não poderia ser outro: a central, que hoje agrega quase 1 000 sindicatos, um partido político, o PDT, e controla de cima a baixo um dos ministérios mais importantes do governo, o do Trabalho, está no epicentro de um escândalo que envolve a participação direta de seus líderes em casos de corrupção, desvio de dinheiro público, tráfico de influência e enriquecimento ilícito.
As investigações da Operação Santa Tereza, que desmontou recentemente um esquema de fraudes no Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES), conduziram a Polícia Federal às portas do cofre clandestino da Força Sindical e do PDT. Duas das principais lideranças da central, o lobista João Pedro de Moura e o advogado Ricardo Tosto, foram presas pela PF, acusadas de cobrar propina para liberar empréstimos no banco estatal (o segundo foi solto, por força de um habeas corpus). O deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, presidente da Força e filiado ao PDT, pode ter recebido parte do butim, como mostram grampos telefônicos autorizados pela Justiça. Suspeitíssimo, ele agora luta para salvar o mandato. Já está claro que, hoje, Força e PDT são duas organizações siamesas também no plano financeiro. O próximo passo é revelar como essa perigosa simbiose tomou conta do Ministério do Trabalho, pasta fatiada entre políticos pedetistas e sindicalistas da Força, sob o controle do mesmo grupo acusado de rapinar uma linha de crédito do BNDES.
Uma semana ruim para os políticos
Denúncias de pagamento e recebimento de propina, desvios de verbas públicas, enriquecimento ilícito de políticos, impunidade. Nunca, como nos últimos tempos, se viu uma relação tão extensa de casos com o mesmo enredo. Na semana passada, um senador, dois governadores, um deputado, um ex-ministro e três ex-governadores – personagens que quase sempre terminam a história ricos e felizes – experimentaram alguns dissabores. A Procuradoria da República denunciou o ex-ministro de Minas e Energia Silas Rondeau e outras sessenta pessoas envolvidas em fraudes de obras públicas. De uma só tacada, foram acusados, além do ex-ministro, os governadores Teotonio Vilela Filho, de Alagoas, Jackson Lago, do Maranhão, e os ex-governadores José Reinaldo Tavares e João Alves. O arrastão pegou também o deputado Jader Barbalho, que teve os bens bloqueados numa tentativa da Justiça de recuperar 18 milhões de reais roubados dos cofres da Sudam, e o ex-governador Zeca do PT, que mantinha um mensalão de 30 milhões de reais em Mato Grosso do Sul.
Numa aparente inflexão da impunidade, a polícia pediu ao Supremo Tribunal Federal autorização para investigar o líder do PMDB no Senado, Valdir Raupp, depois da apreensão de papéis, na casa de um funcionário do senador, que citavam o parlamentar como destinatário de propina de uma empresa fabricante de turbinas. A chance de algum dos senhores abaixo visitar a cadeia pelos saques aos cofres públicos, porém, continua no remoto terreno das hipóteses. "É mais um show de pirotecnia do Ministério Público contra mim", explicou Jader Barbalho, que ficou milionário fazendo política. Seu caso já dura mais de uma década e não há previsão de julgamento. Os outros estão apenas começando. Foi apenas uma boa semana de caça.
O desafio de crescer sem devastar
O Brasil tem um desafio: conciliar desenvolvimento com preservação. O desmatamento desenfreado da Amazônia, a maior floresta tropical do planeta, não pode continuar. Quase um quinto da vegetação original já desapareceu, metade disso nos últimos vinte anos, quando o avanço das motosserras passou a ser monitorado com imagens feitas por satélites. O pedido de demissão da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, na semana passada, ocorreu no contexto desse debate central para o futuro – como conciliar o crescimento econômico com a proteção ambiental, sobretudo na região amazônica, que abrange mais da metade do território nacional. Marina teve de sair porque não soube solucionar essa equação. Sua saída, porém, não muda em nada o dilema colocado diante dos brasileiros.
Para dar o salto econômico de que necessita, o Brasil não pode abrir mão de seu potencial agropecuário ou de investir na geração de energia. Tampouco pode destruir um bioma que é ao mesmo tempo um patrimônio nacional a ser preservado e um foco de interesse internacional. Pela diversidade biológica e pelo papel que a floresta tropical brasileira desempenha no equilíbrio climático do planeta, seu destino desperta preocupação global. A reação no exterior ao pedido de demissão da ministra foi de susto. O jornal inglês The Guardian qualificou a saída de Marina Silva como "uma ameaça ao futuro da maior floresta tropical do mundo". Marina Silva nunca passou de um ícone, uma peça de marketing exibida pelo governo Lula para mostrar uma suposta vocação ambientalista. Muito antes de ser ministra, ela era reconhecida internacionalmente como defensora da preservação da Floresta Amazônica, com excelente trânsito entre as ONGs mais barulhentas do planeta. No cargo de ministra, porém, mostrou pouca intimidade com a burocracia, a começar pela montagem da equipe. Seus principais assessores eram quase todos militantes de organizações dogmáticas, que viviam em atrito permanente com setores do próprio governo.
Um golpe na impunidade
Dois episódios recentes – o assassinato da menina Isabella e a absolvição do fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, que havia sido condenado no ano passado pela morte da missionária americana Dorothy Stang – fizeram com que os parlamentares brasileiros dessem, na semana passada, um passo importante para acabar com a impunidade no país. Na quarta-feira, a Câmara aprovou um pacote de mudanças no Código Penal que, entre outras coisas, elimina a possibilidade de um segundo julgamento, em tribunal do júri, no caso de réus acusados de homicídio. Até então, todos os réus condenados a pena igual ou superior a vinte anos de prisão tinham direito a um segundo júri. Foi com base nessa legislação que o fazendeiro Moura, condenado a trinta anos no ano passado por ter encomendado o assassinato da freira Dorothy Stang, conseguiu se safar da sentença. Julgado pela segunda vez no início do mês, no Pará, Moura acabou absolvido depois que uma testemunha (mediante suborno de 100 000 reais, segundo denúncia da promotoria) voltou atrás em seu depoimento e o inocentou.
Outra medida importante aprovada pela Câmara foi o estabelecimento de um prazo máximo para a realização de julgamentos de homicídio. Hoje, em estados como São Paulo, o "engarrafamento" de processos é tamanho que alguns casos demoram até cinco anos para chegar ao tribunal. O julgamento do jornalista Antonio Pimenta Neves, condenado por matar a ex-namorada, levou quase seis anos para ocorrer. O de Suzane von Richthofen, que confessou ter matado os pais, demorou quatro. Agora, não haverá mais desculpa para atrasos. Se em seis meses o juiz de uma determinada vara não julgar um processo – seja por acúmulo de trabalho ou qualquer outro motivo –, o caso será automaticamente remetido para outro fórum, com prioridade para a realização do julgamento. Essa medida terá impacto imediato no caso Isabella. Graças a ela, Alexandre Nardoni e Ana Carolina Jatobá deverão estar sentados no banco dos réus, no máximo, até o início do ano que vem. Antes, especialistas estimavam que o julgamento do pai e da madrasta de Isabella só seria realizado em 2010.
IstoÉ
A angustia de Serra...
O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), mal teve tempo para comemorar o acordo firmado entre o PMDB de Orestes Quércia e o prefeito Gilberto Kassab (DEM) na disputa pela prefeitura paulistana. Na interpretação dos tucanos que defendem a aliança com o DEM, o acordo seria um tiro certeiro em Geraldo Alckmin, que insiste em ser candidato do PSDB à prefeitura.
Na noite da sexta-feira 2, depois de receber uma visita do secretário estadual de Relações Institucionais e presidente do Diretório Municipal do PSDB, José Henrique Reis Lobo, no Palácio dos Bandeirantes, a alegria de Serra deu lugar à angústia. Lobo informou ao governador que os alckmistas iriam vencer com folga a disputa no Diretório e que na segunda-feira 5 Geraldo Alckmin seria referendado como o pré-candidato do partido à sucessão municipal. Foi mais uma derrota na sucessão de contratempos vividos ultimamente por Serra (leia quadro à pág. 30).
A candidatura de Alckmin afeta fortemente os entendimentos do PSDB com o DEM, com reflexos diretos no projeto presidencial de Serra em 2010. Serra também não pode esticar demais a corda na disputa com Alckmin, sob pena de provocar um racha de difícil colagem no próprio partido, uma vez que entre os principais entusiastas da candidatura Alckmin está o governador mineiro Aécio Neves, também forte presidenciável tucano. “O Serra erra porque esse negócio de cálculo de longo prazo em política não dá certo”, diz o deputado José Aníbal (SP), líder do PSDB na Câmara e escudeiro de Alckmin.
... e o ânimo de Alckmin
Depois de ser referendado pelo Diretório Municipal como o précandidato do PSDB à prefeitura paulistana, na noite da segunda-feira 5, o ex-governador Geraldo Alckmin não contém a euforia. Está tão animado que chega a desprezar o fato de que em São Paulo, berço do PSDB, está nascendo uma nova espécie de tucanos: os kassabistas, lideranças ligadas ao governador José Serra que procuram impedir que o partido tenha um candidato próprio na disputa municipal e defendem uma aliança com o atual prefeito, Gilberto Kassab (DEM), já projetando a sucessão presidencial de 2010.
"Não existe racha no PSDB. O que há é apenas uma pequena lasca", disse um bem-humorado Alckmin, na tarde da quinta-feira 8. "Vamos transformar a convenção no final de junho em um ato de consolidação da unidade partidária", completou. Na convenção, alckmistas e kassabistas irão disputar os votos de 1.228 delegados. Em política, os quase 40 dias que faltam para a convenção é prazo suficiente para muita coisa mudar, mas o que assegura o ânimo do ex-governador são os primeiros resultados concretos de uma briga interna, desnudados na noite da segunda- feira 5.
A pré-candidatura de Alckmin foi aprovada por unanimidade na Executiva Municipal, por 47 dos 51 representantes zonais e por 63 dos 71 membros do Diretório Municipal. Esses números indicam que, enquanto os kassabistas buscam acertos de cúpula, os alckmistas trabalham as bases do partido. "Essa política de cúpula é atrasada. Política moderna se faz ouvindo a sociedade e os partidos precisam ouvir a militância", afirma o ex-governador.
O dia do Brasil em Nova York
Mario Garnero, presidente do grupo Brasilinvest, é um homem de sorte. Um dia antes de receber empresários, políticos, governadores, autoridades e celebridades em Nova York para seus tradicionais encontros de promoção de negócios, no começo de maio, o Brasil foi promovido ao status de destino seguro para investimentos pela agência de classificação de riscos de crédito Standard & Poor’s. Pela primeira vez, o País deixou de ser visto oficialmente como caloteiro pela S&P, o que abre mais portas para novos investimentos diretos e indiretos. As ações de companhias brasileiras na Bolsa de Nova York dispararam, enquanto os convidados chegavam para a conferência Brasil, 27 Países, Uma Nação, promovida pelo Fórum das Américas, fundado por Garnero, e o Council of the Americas, presidido por David Rockefeller.
Cinco governadores e dois vice-governadores foram ao evento mostrar os potenciais de seus Estados para receber os dólares e euros dos investidores presentes. Marcelo Miranda, do Tocantins, engrossou o coro em defesa do etanol de cana, injustamente atacado nas semanas anteriores como um dos vilões dos aumentos de preços de alimentos mundo afora. E aproveitou para fazer marketing ecológico, uma das principais ferramentas para atrair investimentos na nova era do petróleo hipercaro – o preço do barril ultrapassou a marca de US$ 120 dólares na semana passada. “O Tocantins foi um dos primeiros Estados a investir e produzir o ecologicamente correto petróleo verde, o biocombustível”, destacou Miranda. Também participaram Yeda Crusius, do Rio Grande do Sul; Waldez Góes, do Amapá; André Pucinelli, de Mato Grosso do Sul; e Luiz Henrique, de Santa Catarina.
Paulinho nas cordas
Desembarcou no Supremo Tribunal Federal, na semana passada, o relatório da PF sobre o desvio de verbas públicas no BNDES – e é a partir daí que a vida do deputado federal Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho, pode azedar. Há no papelório da polícia a transcrição da gravação de uma conversa entre o principal assessor de Paulinho, João Pedro de Moura, e uma secretária da Força Sindical de prenome Valéria. A conversa se deu no dia 22 de fevereiro, às 11h20, e está na página 495 do relatório (ofício nº 5096/DRE/SR/SP). João Pedro e Valéria falam sobre irregularidades nos contratos da Força Sindical com o Instituto Paulista de Ensino e Cultura (Ipec) e o Ministério do Trabalho. Valéria diz a João Pedro que o Ministério está dando “bomba” no contrato acertado entre as partes e que a Força teria de devolver R$ 59 milhões aos cofres públicos.
Valéria – Cheguei ontem do Ministério. Aquela comissão especial está reprovando todos os contratos que a gente fez com o Ipec e pedindo a devolução do dinheiro...
João Pedro – Meu Deus do céu.
Valéria – Temos 15 dias para responder. A devolução está em torno de R$ 59 milhões.
João Pedro – Tem que marcar uma reunião com o pessoal do Tosto.Valéria – (O Ministério) reprovou porque o Ipec não apresentou nota. Contratamos o Ipec com dispensa de licitação.
Esse diálogo e mais dezenas de documentos apreendidos pela PF na Operação Santa Tereza reforçam a suspeita de irregularidades cometidas pelo deputado e seu grupo de amigos envolvendo ONGs e o governo federal. A suspeita da PF ganhou força depois que os investigadores apreenderam no apartamento de João Pedro o comprovante de um depósito bancário no valor de R$ 37,5 mil em favor da ONG Meu Guri Centro de Atendimento Biopsicossocial, presidida por Elza de Fátima Costa Pereira, mulher de Paulinho e tesoureira do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Para a polícia, o dinheiro do depósito, feito no dia 1º de abril, pode ter sido desviado do BNDES e “lavado” em um núcleo de ONGs.
Época
De Ipanema para a floresta
Aos 56 anos, o economista carioca Carlos Minc Baumfeld é um homem que viveu as experiências mais radicais de sua geração. Nascido de uma família de imigrantes judeus poloneses em 1951, o adolescente Carlos Minc foi um dos líderes do movimento estudantil no Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro na década de 1960. Dali para a luta armada contra a ditadura militar, foi um passo. Militante da organização clandestina VAR-Palmares, participou de roubos de armas e assaltos a bancos com apenas 17 anos. Prisão, torturas e exílio em Cuba, Chile, França e Portugal completaram o primeiro ciclo de sua vida. Quando a anistia o trouxe de volta ao Brasil, em 1979, ele já era um crítico dos velhos métodos da esquerda, inoculado pelas idéias do movimento ecológico europeu. Ao lado de Alfredo Sirkis e Fernando Gabeira, entre outros retornados “verdes”, foi um dos líderes da revolução de costumes que, no Brasil, correu paralelamente ao processo de redemocratização. Minc fundou o PV e depois se filiou ao PT, pelo qual se elegeu cinco vezes deputado estadual no Rio. Em 2007, o governador Sérgio Cabral o nomeou secretário do Meio Ambiente do Estado do Rio.
Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convidou Carlos Minc para assumir o Ministério do Meio Ambiente, substituindo a demissionária Marina Silva. A nova função vai exigir dele muito mais que a disciplina de guerrilheiro urbano e a ousadia do militante a favor da liberação da maconha e dos direitos dos homossexuais. No novo cargo, que deve assumir na semana que vem, Minc será responsável pela preservação da Amazônia, maior floresta tropical do planeta e, para muitos, a última trincheira contra o desastre do aquecimento global. Dentro do governo, terá de conciliar a legislação ambiental com as obras de infra-estrutura exigidas pelo plano de investimentos de Lula – o PAC. Lula também espera que o futuro ministro o ajude a convencer o mundo de que a aposta do Brasil nos biocombustíveis não seria uma ameaça à floresta nem à produção de alimentos.
Carta Capital
A ditadura do judiciário e o espanto de Montesquieu
O barão de Montesquieu, morto em 1755, foi um dos pensadores que ajudaram a moldar o ideal de separação, independência e harmonia entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Inspirou também a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, elaborada pela Revolução Francesa de 1789, a Constituição dos Estados Unidos de 1787 e inúmeras e vigentes constituições republicanas, inclusive a nossa. Com o passar do tempo e os aperfeiçoamentos democráticos, foi identificada pela doutrina como patologia nos mecanismos montesquieunianos de freios e contrapesos a invasão de competência de um poder sobre o outro. Em outras palavras, a ditadura por um dos poderes do Estado. Como aquela que se assistiu, por exemplo, no Estado Novo de Vargas ou nos anos de chumbo dos governos militares, com o impedimento para o Judiciário examinar certos pedidos de habeas corpus em razão da matéria: crimes políticos.
Para muitos constitucionalistas europeus, a pior das ditaduras é a do Judiciário, um poder que não tem exércitos nem generais ou armas de fogo. Fiel à doutrina e ao princípio da separação dos poderes e ao texto constitucional, o Supremo Tribunal Federal (STF), durante anos, entendeu que as medidas provisórias editadas pelo Executivo eram atos de natureza administrativa que só cabiam ao Legislativo chancelar ou recusar. Portanto, as questões de urgência, de relevância e de imprevisibilidade, bases constitucionais para edição de MPs, ficariam a juízo do Executivo e sujeitas ao referendo ou à recusa do Legislativo.
No governo FHC, pródigo como o de Lula na edição de MPs, em especial as de créditos extraordinários, prevaleceu essa lógica. Como garantia fixou-se o prazo de 60 dias para, com possibilidade de prorrogação, a caducidade de uma medida provisória e o bloqueio da pauta do Legislativo, a partir do 45º dia, para forçar o seu exame e evitar prejuízos. Na quarta-feira 14, por 6 votos a 5, a jurisprudência do STF se alterou e a Justiça passará a examinar, numa subversão de atribuições, se uma MP é ou não emergencial. Em resumo, a atribuição típica do Executivo, com controle do Parlamento, passa a ser, em instância de cassação, examinada pelo Judiciário, na condição de fiscal de tudo. O STF abriu uma senda perigosa. Do desequilíbrio entre os poderes e da invasão de competências. Aquilo que conduz à chamada Ditadura do Judiciário.
Os tiros da Toneleros ecoam?
Os esqueletos deveriam estar bem guardados nos armários e os fantasmas engolidos pelo tempo. Ou não? A oposição demo-tucana e seu porta-voz, a mídia nativa, ainda ouvem o eco dos tiros da rua Toneleros como os astrônomos o ruído do Big Bang difuso no universo. E 54 anos demonstram valer, à escuta dos opositores da nossa política, mais que os 10 bilhões, ou mais anos, percebidos em Jodrell Bank e adjacências. A memória não é o forte das gerações mais recentes, e nem tanto. Vale a pena, portanto, recordar que os tiros da Toneleros, rua carioca, remontam aos começos de agosto de 1954 e foram dirigidos contra o grande acusador do governo constitucional de Getúlio Vargas, Carlos Lacerda. Um o atingiu no pé, outro matou seu acompanhante, o major Vaz, da Aeronáutica.
Foi o lance crucial de uma crise que vinha desde o início do governo Vargas, combatido em duelo ao último sangue não somente porque não lhe perdoavam a ditadura estadonovista, mas também, e sobretudo, a política nacionalista. À sombra de Vargas nasceram, por exemplo, Volta Redonda e a Petrobras, e leis trabalhistas que há tempo soam como obsoletas, embora à época fossem revolucionárias aqui na terrinha. Tio Sam sempre contou com magníficos advogados na Terra Brasilis. A tocaia urdida na Toneleros por profissionais contratados pelo “anjo negro” de Vargas, númeno e fenômeno dos guarda-costas, Gregório Fortunato, é episódio digno do Oeste selvagem, e a campanha liderada pelo tribuno da aristocracia udenista, a denunciar desmando e corrupção, ganhou fôlego e substância. O Palácio do Catete, sede do governo nacional no Rio capital, segundo Lacerda, fora submergido por um “mar de lama”.
A tragédia tropical encerra-se com outro tiro, aquele do suicídio de Getúlio, direto ao coração, na noite de 24 de agosto de 1954. O povo chorou muito a morte do “velhinho” e os planos da elite foram realizados, a rigor, somente com o golpe de dez anos depois. E nem mesmo a contento de Lacerda e companhia. Rondavam o território raposas mais espertas. Os intérpretes da pantomima dos dias de hoje, 54 anos depois, não figuram na família das raposas, embora suponham nascer do conúbio entre estas e os lobos. Creio que Dante colocaria Lacerda no Inferno. Não existe, porém, um único, escasso personagem na oposição demo-tucana que se pareça com ele, mesmo vagamente, em cultura e oratória.
Não há semelhança, tampouco a mais pálida, entre os tiros da Toneleros e o chamado dossiê anti-FHC, que devora as energias oposicionistas na tentativa de manter o assunto nas primeiras páginas. Como se deu em outras ocasiões quando se pretendeu provar que um mar de lama invade o Palácio do Planalto, o Alvorada, a Granja do Torto, a patética expectativa por uma situação capaz de derrubar Lula acaba por se esvair em sua própria fragilidade.
Eleições: ataque e defesa
O prefeito Cesar Maia acredita que eleição é a arte do cálculo político. Baseado nesse princípio, ele criou agora uma cartilha: “31 dicas para a campanha eleitoral”. O decálogo abaixo traduz a essência do pensamento do burgomestre carioca. Um verdadeiro manual de ataque e defesa.
1. O seu adversário de votos é quem pensa como você ou se dirige ao mesmo perfil de eleitor.
2. Primeiro o eleitor decide em quem não se deve votar. Ajude.
3. Discuta só o tema que você propôs. O tema proposto pelo adversário deve ser simples ponte para você chegar ao seu.
4. Defina o “inimigo”. Depois dê nitidez a ele. Só você pode desmontá-lo.
5. O tema honestidade é visto pelo eleitor de outra forma. O tema certo é confiança.
6. O centro é o alvo, não é o ponto de partida. Ou seja, se parte desde posições nítidas para se atingir espaços políticos de centro.
7. As pesquisas mexem com o animus de campanha. E com o financiamento.
8. Os ataques devem ser desconcertantes, surpreendentes. As agressões – gritos e palavras chulas – ofendem o eleitor.
9. Não ataque todas as candidaturas no primeiro turno. Você precisará de uma delas – pelo menos – no segundo turno.
10. Em debates, perguntar é sempre mais arriscado que responder.
O item 10 parece inspirado pela pergunta do senador Agripino Maia à ministra Dilma Rousseff.
Conversa sobre a cegueira
Embora a democracia seja o regime da desconfiança institucionalizada apoiada no princípio legal da fiscalização, a classe média brasileira, atiçada pela mídia, anda desconfiada demais. Uma desconfiança sustentada pela perigosa manipulação de um moralismo que não é outra coisa senão a manipulação hipócrita da ética. O Brasil, nesse sentido, faz um vôo cego.
Não se trata de tentar obstruir a ação da Justiça e de seus agentes. Mas é sabido que, se todos os crimes fossem descobertos, não somente o rei, mas, também, os homens mais comuns estariam nus, como argumenta o sociólogo Ralf Dahrendorf, que vê um sentido positivo em certo nível de ignorância. “Popitz sustenta com magnífica ironia um ponto importante, segundo o qual nenhum sistema de normas agüentaria o conhecimento total de todas as violações”, cita Dahrendorf no livro A Lei e a Ordem, publicado pelo Instituto Tancredo Neves. E tome mais uma magnífica ironia. O Tancredo Neves é um órgão de ação partidária dos Democratas (ex-PFL). Nada mais, nada menos.
Planeja-se agora, às vésperas da eleição, o atentado a um dos mais caros princípios das leis democráticas: a presunção de inocência. É uma seqüência, quase que natural, dos aplausos à decisão do deputado Roberto Jefferson de acusar sem apoio em provas. Os cidadãos podem julgar, na hora de votar, a partir de convicções pessoais. A Justiça tem de se apoiar em provas para julgar e condenar. A Igreja amplia e pavimenta esse caminho antidemocrático ao propor o veto a candidatos que estejam sendo processados judicialmente. Os Tribunais Regionais Eleitorais engrossam o movimento e, surpreendentemente, o ministro Carlos Britto, do Supremo Tribunal Federal, apóia a causa. Resta a pergunta: e se um candidato vetado por responder a processo, ao fim do julgamento, for declarado inocente? Quem vai ressarci-lo dos danos morais e materiais? E, no caso, com a posição que a Igreja tomou, não dá nem mesmo para reclamar com o bispo.
É sabido que, no Brasil, o assalto aos cofres públicos é um vício ancestral. Vício que desembarcou por aqui numa das caravelas de Cabral. Em qualquer cantinho escuro que for iluminado arrisca-se a flagrar uma orgia com o dinheiro público. Políticos, juízes e jornalistas, entre tantos outros, parecem buscar cegamente a ruína da validade das normas. É possível datar essa sofreguidão a partir da eleição de Lula. A entrada do operário no Clube dos Eleitos, onde só se tinha acesso com diploma ou com espada, empurrou os derrotados para uma posição de confronto com as instituições democráticas. O ataque ao Congresso pressupõe que o País seria melhor sem ele. Mas, resta pensar, que nome se daria ao regime?
Temas
REAÇÃO AO TARIFAÇO
Leia a íntegra do artigo de Lula no New York Times em resposta a Trump
MANOBRA NA CÂMARA
Eduardo Bolsonaro é indicado a líder da Minoria para evitar cassação
VIOLÊNCIA DE GÊNERO
Filha de Edson Fachin é alvo de hostilidade na UFPR, onde é diretora