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Judiciário
Congresso em Foco
9/9/2025 | Atualizado às 16:08
A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) chega ao seu terceiro dia de audiências voltadas ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e demais membros do Núcleo 1 da ação penal do golpe de Estado. Ele e outros sete aliados são acusados de coordenar uma campanha de descredibilização do sistema eleitoral em 2022, e de depois terem tentado impedir o efeito de sua derrota eleitoral.
Esta é a primeira reunião voltada à leitura dos votos dos ministros, começando pelo do relator, Alexandre de Moraes. Já foram concluídas a leitura tanto das manifestações finais do procurador-geral da República, Paulo Gonet, quanto dos advogados de todos os respectivos réus. Após Moraes, votarão, em sequência, os ministros Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
O julgamento está previsto para ser longo: o calendário original previa audiências nesta terça (9), bem como na quarta e sexta-feira (12). Para dar maior celeridade, o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, cancelou a sessão plenária de quinta-feira (11), disponibilizando o dia para mais uma audiência da turma presidida por Zanin.
Assista ao terceiro dia de julgamento e continue a leitura logo abaixo:
Capítulo do dia
Zanin abre a sessão
O presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin, abriu a sessão às 9h11. Depois da leitura da ata da sessão anterior, a palavra é concedida ao relator, Alexandre de Moraes.
Moraes inicia voto, confirmando a validade da delação de Mauro Cid
O ministro Alexandre de Moraes iniciou nesta terça-feira (9) a leitura de seu voto no julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete réus acusados de participação em tentativa de golpe de Estado. Relator do caso na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), Moraes começou pela análise das questões preliminares levantadas pelas defesas.
Uma das principais controvérsias era a validade do acordo de delação premiada de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. A defesa havia questionado a legalidade do acordo, mas o ministro destacou que o próprio advogado do réu confirmou, em sustentação oral, a voluntariedade e regularidade da colaboração.
"Ressalto que a própria defesa do réu colaborador, em sustentação oral, reafirmou a total voluntariedade e regularidade da delação premiada e afastou qualquer indício de coação", afirmou Moraes. Ele lembrou que "todos os depoimentos, sejam policiais, sejam judiciais, foram gravados em áudio e vídeo", o que afasta suspeitas de irregularidades.
O ministro validou toda a delação premiada de Mauro Cid, rejeitando todos os questionamentos das defesas. Segundo o ministro, não há vício na colaboração do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro fechada com a Política Federal.
"A colaboração premiada não é privativa do Ministério Público. As discussões foram longas do plenário e, por ampla, a maioria, de 8 votos a 3, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a colaboração premiada é um meio de obtenção de prova. Como meio de obtenção de prova, a polícia também tem o direito de realizar o acordo com o investigado colaborador", afirmou.
Outro ponto contestado pelas defesas foi a alegação de que Mauro Cid teria prestado "oito delações contraditórias" em agosto de 2023. Moraes classificou essa tese como "litigância de má-fé", explicando que houve um único depoimento, fracionado em oito partes por estratégia da Polícia Federal para abordar fatos distintos - como joias, vacinação falsa e a própria tentativa de golpe.
"São oito depoimentos que poderiam estar em um único mega depoimento com capítulos. Não há contradições, apenas diferentes temas tratados no mesmo dia", afirmou. Segundo ele, depoimentos posteriores também foram regulares, determinados pela PF à medida que surgiam novos fatos.
Quanto a eventuais omissões de informações por parte do colaborador, Moraes disse que não invalidam a delação, mas podem impactar a concessão de benefícios, conforme análise futura.
Relator rejeita tese de cerceamento da defesa
Outro ponto levantado pelos advogados dizia respeito ao volume de provas reunidas no processo. As defesas alegaram cerceamento por não conseguirem analisar adequadamente a quantidade de arquivos. Moraes respondeu que esse argumento também já havia sido apreciado e rejeitado pela Turma.
Durante a sessão, o ministro Luiz Fux interrompeu para afirmar que pretende retomar a discussão dessas preliminares em seu voto. Moraes, no entanto, ressaltou que "as duas preliminares já foram votadas e rejeitadas por unanimidade".
O relator ainda mencionou a preliminar apresentada pela defesa do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), que contestava a tipificação do crime de organização criminosa. Moraes enfatizou que a matéria também já foi examinada e rejeitada pela Primeira Turma em votações anteriores.
A defesa de Anderson Torres havia questionado a negativa de diligências para identificar quem publicou na internet uma minuta golpista. Moraes lembrou que o pedido foi deferido e encaminhado ao Google, mas a empresa informou não ter condições técnicas de fornecer a informação. Posteriormente, a própria defesa do ex-ministro deixou de insistir na pertinência da prova.
Da mesma forma, alegações envolvendo o suposto uso de perfis falsos em redes sociais e o vazamento de informações não foram consideradas relevantes para o mérito da ação.
"Todas as defesas tiveram pleno acesso a provas", diz relator
Moraes afirmou que todas as defesas tiveram pleno acesso às provas reunidas pela Polícia Federal, inclusive as solicitadas pelos próprios advogados. "Todas as provas estão no processo e as defesas tiveram pleno acesso. Do recebimento à fase das alegações finais foram quatro meses, e nenhuma defesa juntou um único print, uma única gravação pertinente para o processo", disse.
O ministro citou ainda que uma das defesas alegou ter gasto R$ 25 mil para obter cópias do material. Para ele, o argumento não demonstra cerceamento, mas sim que os advogados receberam o que pediram: "Isso mostra que tiveram total acesso ao que solicitaram e nada de importante foi juntado". Ele ainda questionou por que a defesa não pediu acesso gratuito aos documentos.
Outro ponto questionado pelas defesas foi a participação de Moraes nos interrogatórios, especialmente a quantidade de perguntas feitas em comparação à Procuradoria-Geral da República. A defesa do general Augusto Heleno chegou a sugerir que Moraes extrapolou sua atuação.
O ministro reagiu duramente: "É esdrúxulo, não cabe a nenhum advogado censurar o magistrado dizendo o número de perguntas que ele deve fazer. Há argumentos jurídicos muito mais importantes do que ficar contando perguntas".
"Meu querido diário": Moraes ironiza caderno de Augusto Heleno
O ministro Alexandre de Moraes dedicou uma parte central de sua fala ao caderno de anotações do general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). O documento, apreendido pela Polícia Federal, é considerado uma das peças mais sensíveis do processo.
Segundo Moraes, não é possível naturalizar o fato de que um general quatro estrelas do Exército, que ocupava um dos cargos mais estratégicos do governo, tenha produzido anotações que indicam preparação de atos golpistas e planos de permanência no poder.
"Não é razoável achar normal um general quatro estrelas do Exército, um ministro do GSI, ter uma agenda com anotações golpistas. Dizer que as anotações feitas no documento eram particulares, uma espécie de 'meu querido diário, não é razoável", ironizou o relator.
O peso do caderno no processo
O ministro lembrou que a própria defesa de Augusto Heleno confirmou a titularidade da agenda. Para Moraes, tratava-se de um instrumento de planejamento político, e não de um registro pessoal. O conteúdo, frisou, mostra discussões sobre como atacar a Justiça Eleitoral, desacreditar as urnas e criar as condições para questionar o resultado das eleições de 2022.
Além disso, o caderno aparece como peça de ligação entre altos dirigentes do governo Bolsonaro e a utilização indevida de órgãos de Estado, como a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e o próprio GSI, para monitorar adversários e alimentar uma estratégia de desinformação.
Planos golpistas e minuta do golpe
Na sequência de sua exposição, Moraes citou outros documentos e planos investigados:
Todos esses materiais, segundo o relator, mostram que o núcleo político do governo Bolsonaro não apenas cogitava, mas planejava detalhadamente medidas para impedir a alternância democrática no poder.
A cronologia da conspiração
Moraes apresentou uma linha do tempo daquilo que chamou de "cronologia criminosa lógica":
"A organização criminosa se reuniu e, a partir de junho de 2021, passou a utilizar a Abin, o GSI e outros órgãos públicos para estruturar e divulgar essa narrativa mentirosa que ameaçava a integridade da Justiça Eleitoral", declarou Moraes.
Provas, acusações e defesas
Durante a sessão, Moraes exibiu uma apresentação que comparava as provas reunidas pela investigação, as acusações da PGR e os argumentos das defesas. O ministro destacou que a tentativa de classificar o caderno como "um diário pessoal" não resiste à análise do conteúdo:
"O conjunto mostra que não se tratava de anotações privadas, mas de um plano de ação para perpetuar no poder um grupo político derrotado nas urnas", concluiu.
Moraes sobre mensagens de Bolsonaro e Ramagem: "Não é de um delinquente do PCC"
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu nesta terça-feira (9) um dos pontos mais duros de seu voto no julgamento de Jair Bolsonaro e outros sete réus acusados de tentativa de golpe de Estado. Ele destacou a gravidade de mensagens trocadas entre Alexandre Ramagem, então diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e hoje deputado federal (PL-RJ), e o ex-presidente.
Para Moraes, o conteúdo dos diálogos mostra alinhamento direto entre os dois na estratégia de desacreditar o sistema eletrônico de votação e na preparação de ataques contra o Supremo Tribunal Federal.
As mensagens de Ramagem, apreendidas pela Polícia Federal, defendiam a massificação de argumentos sobre fraude nas urnas, a publicidade constante da vulnerabilidade do sistema eletrônico e ataques à reputação de ministros do STF. O então diretor da Abin chegou a afirmar a Bolsonaro que estava convencido de que ele havia vencido em primeiro turno em 2018, mas que o resultado teria sido fraudado.
Segundo Moraes, o material foi utilizado por Bolsonaro em lives de 2021, em que passou a atacar abertamente a Justiça Eleitoral e a instigar apoiadores contra o Judiciário.
"Isso não é uma mensagem de um delinquente do PCC para outro. Isso é uma mensagem do diretor da Abin para o então presidente da República. A organização criminosa já iniciava os atos executórios para se manter no poder a qualquer custo e para afastar o controle judicial previsto constitucionalmente", afirmou.
"Não é conversa de bar"
O relator também lembrou o discurso de Bolsonaro no 7 de Setembro de 2021, quando o então presidente afirmou que não mais cumpriria ordens judiciais assinadas por Moraes e incitou ataques ao STF.
"Isso não é conversa de bar, não é conversa com um amigo no clube. Isso é o presidente da República, no 7 de Setembro, data da Independência do Brasil, instigando pessoas contra o Supremo Tribunal Federal", disse.
Defesa questionada
Moraes rebateu os argumentos da defesa de Ramagem, que tentou tratar as mensagens como um "diário privado". "Não é possível dizer que era um mero diário, porque foi uma mensagem no WhatsApp enviada diretamente ao presidente", disse.
Segundo o ministro, é "inaceitável" classificar como pessoais as comunicações que, dois dias antes de uma live de Bolsonaro contra as urnas, já estruturavam a linha de ataque que seria adotada publicamente.
Convergência entre provas
O relator destacou a "convergência total" entre: as mensagens de Ramagem; as anotações do caderno de Augusto Heleno, ex-ministro do GSI; e a live de Bolsonaro em julho de 2021, quando o então presidente questionou a integridade do sistema eletrônico de votação. "Tudo estava realmente dentro do âmbito da Abin e do GSI: a clara otimização dos órgãos de Estado para corromper a República e a democracia", afirmou Moraes.
O ministro lembrou ainda que nas anotações de Heleno constavam ideias como a de prender em flagrante autoridades policiais que cumprissem ordens judiciais, além da primeira citação ao então comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, sem menção aos chefes do Exército e da Aeronáutica.
Com as citações, Moraes reforçou a linha de que não se tratava de opiniões isoladas, mas de uma estrutura organizada que utilizou órgãos de Estado para desacreditar o sistema eleitoral e corroer a democracia. O tom incisivo do relator indica que o julgamento do chamado núcleo crucial da trama golpista tende a ser desfavorável aos réus, desmontando a narrativa construída pelas defesas na semana passada.
Moraes aponta Bolsonaro como líder de organização golpista em organograma
Em um dos momentos mais marcantes de seu voto, até o momento, o ministro Alexandre de Moraes apontou o ex-presidente Jair Bolsonaro como o líder da organização criminosa e apresentou um organograma detalhando a função de cada réu no esquema.
Moraes exibiu um slide com a estrutura do grupo acusado de articular a permanência de Bolsonaro no poder após a derrota de 2022. Segundo ele, desde julho de 2021 até 8 de janeiro de 2023, os réus atuaram de forma permanente, hierarquizada e organizada, características que configuram o crime de organização criminosa.
"Sob a liderança de Jair Messias Bolsonaro, essa organização criminosa praticou diversos atos executórios para atentar contra o Estado Democrático de Direito e tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído", afirmou Moraes.
Ele também rejeitou a tese das defesas de que os crimes de tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito deveriam ser tratados como um só. "São dois crimes autônomos, ambos previstos em ordenamentos de países democráticos. Um visa a impedir o livre exercício dos Poderes, o outro busca derrubar um governo constituído. Não se confundem", disse.
Para Moraes, os atos golpistas começaram a se materializar ainda em 2021, com episódios públicos de ataques às instituições. "Eram atos executórios, já públicos, com graves ameaças à Justiça Eleitoral e ampla divulgação de desinformação", reforçou o ministro.
Moraes vê confissão de culpa de Bolsonaro e núcleo crucial
O ministro Alexandre de Moraes declarou, durante a leitura de seu voto, que uma reunião ministerial de julho de 2022 comprova a intenção deliberada do governo Bolsonaro de romper com a ordem democrática. Para o relator, as falas de integrantes do chamado núcleo crucial da trama golpista configuram uma "confissão de culpa" dos réus que hoje enfrentam julgamento na Primeira Turma do STF.
A gravação, encontrada pela Polícia Federal no computador do tenente-coronel Mauro Cid, mostra falas explícitas sobre ações golpistas:
Segundo Moraes, esses discursos são a prova de que havia unidade entre os membros do governo na preparação de um golpe. "Tudo isso constou da minuta do golpe: prisões, fechamento do TSE, criação de comissão eleitoral e gabinete pós-golpe. Tudo já dito claramente, confessado na reunião ministerial de 5 de julho de 2022", disse o relator.
Moraes ainda resgatou o discurso de Bolsonaro no 7 de Setembro de 2021, em São Paulo, quando o então presidente declarou que não cumpriria ordens do STF, atacando diretamente o próprio Moraes. Para o ministro, esse episódio transformou Bolsonaro em um "réu confesso", ao deixar registrado em público seu desrespeito às instituições.
"Não é conversa de bar, não é conversa entre amigos. É o presidente da República, em palanque, atacando a democracia e o Supremo", ressaltou Moraes.
PRF no dia das eleições
Outro ponto destacado no voto foi a atuação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no segundo turno de 2022, quando houve operações de bloqueio em estradas no Nordeste, região de maioria pró-Lula.
"A cronologia comprova a ilicitude dessa conduta liderada por Bolsonaro, com participação de Anderson Torres, a quem a PRF estava subordinada. Foi um ato de absurdo total, de desespero dessa organização criminosa", disse Moraes, lembrando que vídeos exibidos no Tribunal Superior Eleitoral mostraram eleitores impedidos ou atrasados para votar.
Reunião com embaixadores
Moraes também citou o encontro de Bolsonaro com embaixadores estrangeiros em julho de 2022, no Palácio da Alvorada. Para ele, o episódio representou outro ato executório de ataque à democracia, ao tentar desencorajar missões internacionais de observação eleitoral.
Com exemplos e provas, Moraes reforçou que desde 2021 já havia atos executórios para minar a democracia e criar as condições para a perpetuação de Bolsonaro no poder. Seu voto, que deve se estender por horas, estabelece desde o início um cenário adverso para os réus.
Alexandre de Moraes mostra escalada
o ministro Alexandre de Moraes ampliou a narrativa de que Jair Bolsonaro foi o centro de um projeto continuado de ruptura institucional. Para o relator, os crimes não se resumiram ao 8 de Janeiro: eles foram preparados em etapas, com atos executórios sucessivos desde 2021, intensificados após a derrota no segundo turno de 2022.
Relator mostra escalada de atos golpistas sob Bolsonaro
Para Alexandre de Moraes, o grupo liderado por Bolsonaro articulou um projeto continuado de ruptura institucional. Segundo o relator, os crimes não se resumiram ao 8 de Janeiro: eles foram preparados em etapas, com atos executórios sucessivos desde 2021, intensificados após a derrota no segundo turno de 2022.
Moraes descreveu uma linha de continuidade que une discursos, notas oficiais e operações de Estado em uma mesma estratégia. "Foram tantos e tão absurdos que acabamos esquecendo. Tivemos atos violentíssimos após o 2º turno", disse.
Entre os pontos citados:
Pressão sobre Paulo Sérgio Nogueira
O relator apontou um episódio que considera decisivo: a ordem de Bolsonaro ao então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, para emitir uma nota questionando a Justiça Eleitoral.
"Foi uma das mais esdrúxulas notas que um ministro da Defesa do Brasil pode ter emitido. Tentava disfarçar a própria conclusão das Forças Armadas. Foi vergonhosa a conduta. Seria só vergonhosa se não fosse também criminosa", disse Moraes.
Para o ministro, a relação entre Bolsonaro e Paulo Sérgio revela alinhamento estratégico na propagação do discurso de fraude, peça-chave para preparar a base política e social que sustentaria o golpe.
"Sou vítima, sim, mas isso não me desqualifica"
Moraes resgatou ainda o discurso de 7 de Setembro de 2021, em que Bolsonaro anunciou que não cumpriria decisões judiciais de Moraes. A defesa do ex-presidente argumentou que, por ter sido alvo do ataque, o ministro estaria impedido de relatar o processo. Mas Moraes rebateu: "Sou vítima, sim, mas isso não me desqualifica. O Supremo já reconheceu que não há impedimento."
Segundo ele, as palavras do então presidente equivalem a uma confissão pública da intenção de afrontar o Judiciário. "É um verdadeiro réu confesso, ao anunciar em praça pública que não cumpriria ordens judiciais", afirmou.
A estratégia por trás da crise
Ao reconstruir os fatos, Moraes sugeriu que havia uma lógica criminosa por trás de cada ato:
Moraes aponta Abin como "célula clandestina" a serviço de Bolsonaro
Em mais um trecho duro de seu voto no julgamento de Jair Bolsonaro e outros sete réus do chamado núcleo crucial da tentativa de golpe de Estado, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) foi transformada em uma "célula clandestina" durante o governo do ex-presidente.
Segundo Moraes, a estrutura da Abin, sob comando de Alexandre Ramagem, foi usada para espionar ministros do Supremo Tribunal Federal, parlamentares, jornalistas e até interferir nas eleições de 2022. "Durante a gestão de Ramagem, foram registradas inúmeras entradas no sistema First Mile. As investigações comprovaram que, sob seu comando, a Abin funcionou como uma célula clandestina", declarou o ministro.
Monitoramento de autoridades e adversários
Moraes apresentou provas reunidas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) que mostram como a agência foi usada fora de sua função legal. Entre os alvos de monitoramento estavam os ministros Luiz Fux, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso e o próprio relator. Também foram espionados o senador Renan Calheiros (MDB-AL) e o ex-governador João Doria, além de diversos jornalistas.
Um ex-agente da Abin, ouvido pela investigação, confirmou que Ramagem demandava levantamentos constantes e chegou a realizar 887 consultas no software da agência.
Órgãos públicos contra a democracia
O relator sustentou que Bolsonaro utilizou órgãos de Estado para monitorar opositores e executar sua estratégia de deslegitimação das eleições e do Judiciário. O objetivo, disse Moraes, era "corromper a democracia", criando narrativas de fraude que sustentariam a não aceitação do resultado das urnas.
Ele lembrou que o general Augusto Heleno, ex-ministro do GSI, chegou a anotar em sua agenda a hipótese de acionar a Advocacia-Geral da União (AGU) para emitir um parecer que permitiria ao presidente descumprir ordens judiciais.
Milícias digitais e atos executórios
Moraes também destacou o papel de Bolsonaro em incentivar milícias digitais, por meio de lives e discursos que espalhavam desinformação em massa contra as urnas e contra o STF.
O ministro listou 13 atos sequenciais atribuídos ao grupo, desde a manipulação da Abin e o uso indevido da Polícia Rodoviária Federal no segundo turno das eleições até a elaboração e apresentação da minuta do golpe aos comandantes militares e os atos de 8 de janeiro de 2023.
"Não se tratou de excessos isolados, mas de uma organização criminosa com divisão de tarefas e alinhamento hierárquico sob a liderança de Jair Bolsonaro", concluiu.
Moraes lista 13 atos preparatórios para tentativa de golpe
Durante a leitura de seu voto no julgamento da trama golpista, o ministro Alexandre de Moraes, apresentou o que chamou de "13 atos sequenciais", episódios que, segundo ele, comprovam a atuação coordenada de Bolsonaro e aliados como uma organização criminosa para manter o ex-presidente no poder.
Moraes seguiu a interpretação da Procuradoria-Geral da República, que vê a tentativa de golpe não apenas como planejamento, mas como execução. Segundo o ministro, as ações do grupo já continham violência ou grave ameaça antes mesmo dos ataques de 8 de janeiro de 2023.
Os 13 atos explicados
Moraes ressaltou que sua análise segue a linha do procurador-geral da República, Paulo Gonet, que defendeu uma visão ampliada de violência: não apenas física, mas também institucional, contra a própria democracia.
A defesa de Bolsonaro, por outro lado, insiste em dissociá-lo dos ataques do 8 de janeiro e sustenta que ele apenas fez uso da palavra em um contexto político.
Almir Garnier: um conhecido golpista
Moraes citou que, ao longo das investigações, se revelou que o Almirante Almir Garnier, comandante da Marinha na época dos fatos, já "era conhecido" entre os comandantes das demais forças como adepto das teses de teor golpista e simpático à trama. Ele citou a colaboração com Bolsonaro para pressionar a aprovação da PEC do voto impresso no Congresso Nacional, tendo realizado um desfile de tanques na Esplanada dos Ministérios no mesmo dia.
Ele também relembrou que Almir Garnier foi o primeiro comandante na história da Marinha a recusar a passagem de comando para o seu sucessor. Retomou também os depoimentos do General Freire Gomes, então comandante do Exército, e do Brigadeiro Baptista Júnior, que manifestaram a concordância do almirante a respeito do conteúdo da minuta do golpe, tendo deixado sua força à disposição.
Sem os comandantes
Após a negativa dos comandantes do Exército e Aeronáutica ao plano golpista, Moraes argumenta que Bolsonaro mudou sua estratégia para permanecer no poder, manifestando seu não reconhecimento da legitimidade da justiça eleitoral e da vitória do presidente Lula, incitando seus apoiadores a tomarem o poder em seu nome. Essa manobra teria culminado nos ataques de 8 de janeiro de 2023.
"Se perdesse, também golpe de Estado. Se ganhasse, iria acabar com a independência do Poder Judiciário de vez para o próximo mandato, isso se não quisesse a perpetuação do poder".
Tentativa x Consumação
O ministro considera que a consumação da tentativa de golpe se deu na reunião realizada no Ministério da Defesa, onde o então ministro e hoje réu, General Paulo Sérgio Nogueira, tentou pela última vez convencer Freire Gomes e Baptista Júnior a aceitarem os termos da minuta do golpe.
Ele explica que, mesmo com o fracasso, o crime estava consumado. "Não confundamos consumação do golpe com consumação do crime de golpe de Estado. O crime de Golpe de Estado e o crime de abolição do Estado Democrático de Direito têm como elementares do crime 'tentar'. (...) A tentativa consuma o crime. Todos esses atos executórios, desde junho de 2021 até esse momento, e prosseguindo até 8 de janeiro de 2023 foram atos executórios que consumaram os crimes de abolição do Estado de Direito e Golpe de Estado. Não consumaram o golpe, mas não há necessidade de consumação do golpe. Repito: tentar abolir, tentar o golpe. Ninguém aqui na história da humanidade viu golpista que deu certo se auto-colocar no banco dos réus"
Viagem ao exterior
Mesmo em meio ao caos social dos meses que sucederam as eleições e à pressão dos acampamentos em frente aos quartéis, Moraes considera que o golpe falhou. Com isso, viajou para os Estados Unidos. "Qual o melhor disfarce para um líder de organização criminosa, para efetivar o golpe que não conseguiu nesse período todo, o que viajar para o exterior? 'Ah, eu não estava lá'. Mas o direito penal, já há alguns séculos prevê a autoria mediata. (...) Obviamente, quando o soldado da máfia comete um crime a mando do capo da máfia, não está lá o chefe da organização criminosa. Mas responde, porque ele determinou".
Os ataques de 8 de janeiro, segundo Moraes, foram "a tentativa final dessa organização criminosa de concretizar o que lá atrás, na live de 2021, foi dito pelo réu Jair Bolsonaro: 'as Forças Armadas nunca faltaram ao chamamento do povo brasileiro'. Ou ainda: 'chega, é o último aviso que dou ao Poder Judiciário'".
Proximidade de Heleno
Em sua conclusão, Moraes recapitulou seu voto. "A organização criminosa, portanto, desde o início de julho de 2021, iniciou uma sequência de atos executórios que consumaram a prática dos delitos de organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. (...) Os réus tentaram, com emprego de grave ameaça, abolir o Estado de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos Poderes Constitucionais, em especial do Poder Judiciário brasileiro, com o claro intuito de manutenção de seu grupo político no poder", resumiu, reconhecendo todas as condutas acusadas pela PGR.
Ele aproveitou para para rebater a tese levantada pela defesa de Augusto Heleno de que ele e Bolsonaro teriam se distanciado diante da aproximação do então presidente aos partidos do centrão.
"A alegação de que durante o governo o réu Augusto Heleno se afastou de Jair Bolsonaro é desmentida tanto pelo próprio réu Augusto Heleno, que disse em seu interrogatório que isso não ocorreu, que ele tinha livre acesso a qualquer momento, que ele não precisaria em momento algum avisar que iria ao gabinete do presidente", relembrou, citando também o momento em que Heleno se retirou da formatura militar de seu próprio neto, em dezembro de 2022, para atender a um chamamento do presidente.
Noite da agonia
Moraes comparou a tentativa de golpe de Estado, atribuída ao Núcleo 1, a outros episódios da história brasileira, citando a Noite da Agonia, em 1823, quando o imperador D. Pedro I determinou a prisão de deputados da assembleia constituinte para impor seu próprio colegiado para outorgar sua versão da Constituição. O ministro equipara a prática ao texto da minuta do golpe, que extingue o TSE e o substitui por um colegiado político.
Ele também trouxe à tona o golpe de 1930, que impediu a posse do presidente eleito, Júlio Prestes, bem como o de 1964, que derrubou a presidência de João Goulart. Moraes considera que esses episódios seriam puníveis à época se houvesse vigência da norma atual. A ausência de punição aos autores, segundo o ministro, foi exatamente o motivo pelo qual o Brasil manteve a frequência de tentativas e consumações de golpe de Estado.
"Diante de todo exposto, voto no sentido da procedência total da ação penal", concluiu Moraes, reconhecendo Bolsonaro como líder da organização criminosa e deixando de lado a apreciação, no caso de Ramagem, das acusações de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado, suspensas por determinação da Câmara dos Deputados.
Voto de Dino: um julgamento qualquer
Flávio Dino é o primeiro a votar após Moraes. Ele abriu seu pronunciamento destacando que, apesar da importância histórica, o julgamento em questão não difere de qualquer outra ação penal em tramitação no STF, seguindo as mesmas regras. Também comentou sobre a origem dos crimes contra o Estado de Direito, que "recebem do legislador uma dosimetria similar à dos crimes contra o patrimônio", não vendo razão para que sejam considerados excessivos ou distintos dos demais.
"Esse portanto não é um julgamento excepcional, ele não é um julgamento diferente do que nossos colegas magistrados fazem pelo país afora. Por isso meu voto, sobretudo, é um voto de lógica aristotélica, de premissas e conclusões. Subsunção, vou descrever a moldura jurídica, e os fatos, que como magistrado me cabe valorar como incidentes na previsão legal abstrata", disse Dino.
Por ser um julgamento normal, Dino esclareceu que "não há nos votos, e no voto que vou proferir, nenhum tipo de recado, mensagem, nada desse tipo. O que há é o exame estrito daquilo que está nos autos".
Forças Armadas dentro e fora do debate
Dino ressaltou que o julgamento trata das condutas de um conjunto de réus dos quais alguns são militares, e não das forças armadas como um todo, e que as forças são necessárias para a preservação da soberania nacional. Por outro lado, promove a reflexão sobre como elas devem agir enquanto instituições.
"Não é normal que a cada 20 anos (...) nós tenhamos eventos de tentativas de tentativa ou de ruptura do tecido constitucional. Então creio que, para muito além do julgamento criminal que nos cabe, não há dúvida que as consideração que constam das denúncias, das defesas, do julgamento, devem se prestar a um conjunto de reflexões de Estado para que elas se mantenham isentas e apartidárias. Isso é algo fundamental, e friso: não só as Forças Armadas, mas todas as instituições de Estado", ponderou.
Papel do Judiciário
O ministro aproveitou para comentar sobre as críticas recorrentes ao julgamento de Bolsonaro e às acusações de que o STF estaria agindo de forma tirânica contra seu grupo político. Ele reafirmou o papel do Judiciário, tanto no Brasil quanto em outros países, de barreira contra tentativas de apropriação do Estado.
"É no mínimo exótico ouvir-se que um tribunal constitucional é tirânico. (...) No pós Segunda Guerra, o que nós estamos aqui vivenciando se consolidou na Europa Ocidental: tribunais constitucionais, constituições rígidas, cláusulas pétreas, desdobramento do plano penal. Tanto é que praticamente todos os países democráticos do mundo, cito Estados Unidos, cito Alemanha, contém legislações bastantes similares a essas que nós estamos aqui a aplicar", apontou,
Ele também relembrou que, apesar dos crimes contra o Estado de Direito serem relativamente novos, eles não são os primeiros a definir culpabilidade na forma tentada, portanto não representando uma novidade em sua aplicação.
Sem anistia
Flávio Dino comentou sobre a possibilidade de anistia a Bolsonaro demais réus de 8 de janeiro, relembrando que já existe entendimento de que os crimes contra o Estado de Direito não são passíveis de perdão, conforme já foi anteriormente definido na ação penal contra o ex-deputado Daniel Silveira.
"Esses tipos penais são insuscetíveis de anistia, de modo inequívoco. Nós tivemos já muitas anistias no Brasil. Certas ou não, não nos cabe esse juízo, nós não somos o tribunal da história. (...) Mas é certo que jamais houve anistia feita em proveito dos altos escalões do poder. Nunca a anistia se prestou a uma espécie de auto-anistia de quem exercia o poder dominante. O nosso plenário já teve a oportunidade de se pronunciar sobre isso, quanto ao descabimento de anistia", declarou.
Ele acrescentou que os tipos penais em questão não fazem distinção entre diferentes tipos de autores, cabendo a mesma dosimetria para todas as condutas enquadradas dentro do fim, seja de golpe de Estado, seja de abolição violenta do Estado de Direito.
Confira a leitura do voto de Moraes, realizada mais cedo:
Capítulos anteriores
O julgamento teve início na última terça (2), com a 1ª Turma do STF analisando acusações de tentativa de golpe para reverter o resultado das eleições de 2022. O relator Alexandre de Moraes abriu a sessão afirmando que a impunidade não é aceitável e que a corte julgará com base em provas robustas. Classificou a articulação como obra de uma organização criminosa que envolveu integrantes do governo, das Forças Armadas e de órgãos de inteligência.
Moraes validou a delação de Mauro Cid, apontando que foi firmada dentro da legalidade e com acompanhamento de advogados. Segundo ele, a denúncia da PGR reúne minutas golpistas, mensagens e depoimentos que comprovam a tentativa de ruptura institucional. O ministro rejeitou pedidos de absolvição sumária e disse que as garantias processuais foram respeitadas durante toda a instrução.
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, sustentou que punir até tentativas fracassadas é imperativo para a preservação da democracia. Afirmou que Bolsonaro e aliados mobilizaram a cúpula das Forças Armadas e usaram a máquina do Estado para corroer a confiança no sistema eleitoral. Disse ainda que a ofensiva só não teve êxito porque os comandantes do Exército e da Aeronáutica se recusaram a aderir ao plano.
Ainda no primeiro dia, a defesa de Mauro Cid afirmou que sua colaboração foi voluntária e sem coação, negando participação ativa do militar em conspirações. A defesa de Alexandre Ramagem alegou que documentos encontrados eram simples anotações pessoais, sem nexo com Bolsonaro. Já a defesa de Almir Garnier negou sua presença em reunião citada pela PGR e disse que a defesa do voto impresso não poderia ser tratada como crime.
A defesa de Anderson Torres ocupou espaço relevante ao argumentar que a acusação distorceu fatos para associá-lo a planos golpistas. O advogado disse que sua viagem aos Estados Unidos em janeiro de 2023 era férias programadas desde o ano anterior, e não fuga. Também destacou que a minuta golpista encontrada em sua casa já circulava na internet antes de 8 de janeiro, não podendo ser considerada prova direta contra ele.
O defensor acrescentou que Torres, como secretário de Segurança do DF, assinou protocolos para impedir a entrada de manifestantes na Praça dos Três Poderes e até convocou reuniões para desmobilizar acampamentos bolsonaristas. Argumentou que não houve omissão dolosa e classificou a denúncia como uma perseguição política, sem base em provas concretas.
O segundo dia, em 3 de setembro, foi aberto com a defesa de Augusto Heleno. Seu advogado, Matheus Milanez, criticou Moraes por extrapolar funções durante interrogatórios, pedindo a absolvição do general por falta de provas. Alegou que Heleno perdeu espaço no governo após a aliança de Bolsonaro com o Centrão e que documentos como sua caderneta pessoal foram manipulados pela Polícia Federal para sugerir ligações inexistentes com planos golpistas.
Na sequência, a defesa de Bolsonaro, conduzida por Celso Vilardi e Paulo Amador Cunha Bueno, afirmou que não há provas contra o ex-presidente. Questionaram a delação de Mauro Cid, que consideraram contraditória, e disseram que atos como reuniões e lives não configuram execução de crime. Argumentaram ainda que Bolsonaro determinou a transição de governo após as eleições, o que afastaria a tese de conspiração.
Vilardi rejeitou qualquer vínculo entre Bolsonaro e os ataques de 8 de janeiro, lembrando que centenas de processos sobre os atos golpistas já foram julgados sem citação ao ex-presidente. Disse que instigar pessoas indeterminadas não configura crime e que a chamada minuta do golpe não foi transmitida a Bolsonaro. Para a defesa, a acusação se apoia em recortes descontextualizados e em versões frágeis do delator.
As sustentações do segundo dia foram concluídas com as defesas de Paulo Sérgio Nogueira, que disse ter tentado dissuadir Bolsonaro de aderir a medidas de exceção, e de Braga Netto, cuja defesa pediu a anulação da delação de Mauro Cid por alegada coação.
Moraes: STF não julga se houve golpe, mas os autores do crime
O ministro Alexandre de Moraes usou parte do início de seu voto para contextualizar o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete réus acusados de tentativa de golpe de Estado. Segundo o relator, não há mais dúvida sobre a materialidade dos delitos - ou seja, sobre a existência dos crimes em si -, já reconhecida pelo Supremo em outras ações. A tarefa agora é identificar a autoria e a responsabilidade individual de cada um dos acusados.
Moraes recordou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) imputou aos réus cinco crimes:
Segundo ele, a materialidade desses crimes já foi atestada em mais de 474 ações penais e cerca de 500 acordos de não persecução penal homologados pelo Supremo. "Não se discute mais se houve ou não tentativa de golpe, se houve ou não tentativa de abolição do Estado de Direito. O que se discute aqui é a autoria", afirmou Moraes.
Ele lembrou que o plenário do STF, por 9 votos a 2, e a própria Primeira Turma já se pronunciaram em julgamentos anteriores confirmando a existência das condutas criminosas.
Estrutura da organização criminosa
De acordo com a denúncia da PGR, a organização criminosa foi estruturada e hierarquizada sob a liderança de Jair Bolsonaro, atuando entre julho de 2021 e 8 de janeiro de 2023. Durante esse período, o grupo teria se dividido em núcleos de atuação com funções específicas - mobilização política, disseminação de desinformação, pressão sobre as Forças Armadas e tentativa de deslegitimar o sistema eleitoral.
Segundo Moraes, essa estrutura criminosa deu sustentação a atos executórios que culminaram na depredação das sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023, em Brasília.
Diferença entre os crimes de abolição e golpe
O relator fez questão de esclarecer a diferença entre os dois principais crimes imputados - frequentemente confundidos, mas juridicamente distintos. As defesas dos réus pedem que os dois crimes sejam considerados um só, na tentativa de reduzir a pena no caso de condenação.
Abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L): ocorre quando um governo legitimamente constituído busca, por meio de violência ou grave ameaça, restringir ou suprimir a atuação de outros Poderes, minando o sistema de freios e contrapesos. Exemplo citado: um Executivo que tenta fechar o Congresso ou limitar a atuação do Supremo.
Golpe de Estado (art. 359-M): configura-se quando há tentativa de impedir a posse de um governo eleito democraticamente ou depor um governo legitimamente constituído. O objetivo é a perpetuação no poder à revelia da vontade popular.
"São condutas diversas e previstas em tipos penais autônomos. No primeiro crime, o sujeito passivo é o Estado Democrático de Direito; no segundo, o alvo é o próprio governo eleito, com a intenção de substituí-lo ou impedir sua posse. Ambos existiram no caso em julgamento", explicou Moraes.
Cronologia criminosa
O ministro destacou que as provas reunidas - relatórios da Polícia Federal, depoimentos de colaboradores e documentos juntados ao processo - demonstram uma cronologia criminosa lógica.
Julho de 2021: início das movimentações do grupo, com discursos e atos voltados a descredibilizar o sistema eleitoral.
2022: intensificação das pressões sobre instituições, ataques verbais a ministros do STF e TSE, e a tentativa de incitar militares contra a ordem democrática.
8 de janeiro de 2023: consumação de atos de violência contra os prédios dos Três Poderes em Brasília, considerados o ponto culminante da organização.
"O conjunto probatório mostra uma atuação continuada e organizada, com divisão de tarefas e objetivo comum: restringir a atuação do Judiciário e impedir a alternância no poder após a derrota eleitoral de Bolsonaro", afirmou o relator.
Com a rejeição das preliminares levantadas pelas defesas e a reafirmação da materialidade dos crimes, Moraes prossegue para a parte central de seu voto: a análise da autoria. Será nesse ponto que indicará, individualmente, se vota pela condenação ou absolvição de cada um dos oito réus, incluindo Bolsonaro.
Todos respondem pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado por violência e ameaça, e deterioração de patrimônio tombado.
No caso de Alexandre Ramagem, a Constituição prevê a suspensão de parte das acusações por ele exercer mandato parlamentar. Assim, ele responde apenas por três crimes: golpe de Estado, organização criminosa armada e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa de Bolsonaro, é o único réu do núcleo central da trama golpista presente no Supremo neste primeiro dia de julgamento.
Próximas etapas
Moraes possui todo o tempo disponível para a sessão para proferir seu voto. Na sequência, cada um dos ministros deverá informar se acompanha ou diverge, total ou parcialmente, de sua posição, podendo expor seus respectivos argumentos.
A condenação ou absolvição será definida por maioria simples, ou seja, pelo voto de ao menos três dos cinco ministros da Turma.
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