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Congresso em Foco
13/6/2007 0:00
Lúcio Lambranho *
O país descobriu há pouco que o presidente do Congresso, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), é um prodígio como pecuarista. Acumulou nos últimos quatro anos R$ 1,9 milhão em rendimentos com vendas de gado, procedente de quatro fazendas em Alagoas.
Os bois de Renan, a julgar pelas informações por ele prestadas, foram vendidos por valores capazes de fazer inveja aos campeões de produtividade nessa área. E são peça fundamental em sua defesa quanto à origem dos elevados recursos pagos à jornalista Mônica Veloso, com quem o senador teve uma filha, hoje com três anos.
A busca por informações oficiais que comprovem tais rendimentos esbarra, porém, no frágil controle que o governo alagoano exercia até o ano passado no campo do controle animal.
Três fontes informaram ao Congresso em Foco que nem a Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária de Alagoas (Adeal), órgão responsável pelo controle sanitário do rebanho do estado desde janeiro de 2006, nem qualquer outro órgão estadual possuem os controles apropriados das operações pecuárias feitas até 2005.
O controle em Alagoas
As operações são controladas pelas Guias de Trânsito de Animais (GTAs), mas, segundo apurou a reportagem, elas só começaram a ser de fato exigidas dos pecuaristas alagoanos após a criação da Adeal, em 4 de janeiro de 2006.
As GTAs trazem informações sobre os rebanhos, incluindo a origem e destino das rezes nas transações comerciais de pecuaristas, prática que deveria garantir a sanidade da carne vendida em Alagoas e em todo o país. Em julho de 2006, o Ministério da Agricultura padronizou o modelo do documento que registra o trânsito de animais vivos em território nacional.
O presidente da Adeal, Hibernon Cavalcante, confirmou ao Congresso em Foco que a agência ainda não tem um sistema informatizado das GTAs e das declarações de vacinação dos proprietários, que deveriam ser prestadas a cada seis meses, revelando o tamanho do rebanho de cada um dos pecuaristas de Alagoas. O estado, aliás, é considerado pelo Ministério da Agricultura “área desconhecida para aftosa”.
Sem entrar no mérito quanto à data dos registros disponíveis, Hibernon Cavalcante disse ter condições de entregar os dados sobre a movimentação das fazendas de Calheiros em no "máximo uma semana". Mas, condicionou, somente se os dados fossem requeridos judicialmente ou pelo Conselho de Ética do Senado.
“Só posso repassar essa informação com ordem judicial. Esses dados são como contas bancárias. Mas se for requerido pela Justiça, temos as guias para apresentar. Somos obrigados a ter isso, pois somos auditados pelo Ministério da Agricultura”, afirmou.
O Ministério da Agricultura, por meio de sua assessoria de imprensa, informou a este site que os dados são mesmo de responsabilidade da Adeal e a delegacia do ministério em Alagoas não tem um registro digital deles. Por esse motivo, a busca pelas informações teria “tempo indeterminado” para ser apurada. O “prazo”, não custa registrar, difere daquele citado pelo presidente da Adeal.
A gerente-geral da Agência de Defesa e Fiscalização Agropecuária de Pernambuco (Adagro), Erivânia Camelo, confirma a precariedade do controle animal no estado vizinho: "A classificação do Ministério da Agricultura é de que não existe um mínimo de controle em Alagoas. Tenho até que me reunir com eles para melhorar o controle porque os estados fazem fronteira. Antes de nossas barreiras em 2006, entravam uma média de 2 mil a 5 mil cabeças de gado ilegal de Alagoas em Pernambuco".
Pernambuco conseguiu no ano passado a classificação de nível médio com relação à aftosa, mas a situação sanitária do gado nordestino é considerada precária, segundo consultores da área.
O pecuarista Renan
Segundo informou ontem (quarta, 13) a Folha de S. Paulo, em matéria de Fernando Rodrigues, Renan Calheiros disse ao Conselho de Ética do Senado que vendeu 1.902 cabeças de gado entre 2003 e 2006. De acordo com o jornal, o preço médio do gado vendido pelo senador no período foi de R$ 59,40 por arroba (cada arroba tem 15 quilos). Mas, em 2005, ele chegou a fazer negócios com a arroba cotada a R$ 69,30.
Sem meias palavras, a gerente-geral da Adagro mostra que não engole a versão do presidente do Senado: "É um rendimento muito bom, mas é muito pouco provável que tenha acontecido, considerando os preços do gado no Nordeste". Erivânia diz nunca ter visto a arroba do boi sendo vendida por mais do R$ 60 no Nordeste. Segundo ela, historicamente, os preços têm variado até o limite de R$ 55.
Ela faz outra ressalva importante. O custo por animal vendido na região Nordeste pode chegar até a 70% do preço final da arroba do boi. Ou seja, do lucro obtido nas vendas é preciso descontar os custos de produção, como os gastos com a manutenção de pastagens, transporte etc.
Um dos seus correligionários, o senador Pedro Simon (PMDB-RS), está impressionado com as maravilhas de que Renan é capaz de fazer como pecuarista. Ex-ministro da Agricultura (no governo Sarney, entre 1985 e 1986), Simon comenta: "Estamos perdendo um baita ministro da Agricultura, considerando o rendimento declarado pelo Renan".
Procurada pelo Congresso em Foco, a assessoria de Renan respondeu que o senador nada mais tem a declarar sobre o assunto e que apresentou ao Conselho de Ética todas as explicações que lhe caberia dar a respeito. O silêncio e a falta de acesso a documentos comprobatórios deixam, assim, uma dúvida sobre a boiada do presidente do Senado: afinal, tudo não passa de um álibi ou estamos mesmo diante de um político com capacidade empresarial até então desconhecida?
Enquanto isso, no Senado...
No Senado, as coisas não vão tão bem para Renan Calheiros quanto ele gostaria. O senador preferia que o Conselho de Ética sequer tivesse aberto processo contra ele. Mas o famoso espírito de corpo da Casa continua sendo muito útil ao seu presidente.
Ontem, o senador Epitácio Cafeteira (PTB-MA), relator improvisado de última hora para cuidar do caso Renan, já pediu o arquivamento do processo (leia mais). Quem vinha cuidando antes do assunto era o corregedor do Senado, senador Romeu Tuma (DEM-SP), que se desgastou ao inocentar publicamente Renan sem sequer ter se aprofundado minimamente na apuração dos fatos.
Cafeteira optou pelo mesmo caminho. Aceitou integralmente a versão do presidente do Senado. Ou seja: o lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira Mendes Júnior, foi apenas um amigo que se ofereceu para fazer os pagamentos a Mônica Veloso; todo o dinheiro saiu das contas bancárias de Renan (embora não haja coincidência entre os valores e datas de saque e os pagamentos); e, claro, Renan Calheiros tem uma exemplar trajetória empresarial no ramo agropecuário.
Surpresas, contudo, não param de ocorrer. Durante a sessão de ontem do Conselho de Ética, o advogado de Renan, Eduardo Ferrão, trouxe outro elemento à baila: as notas fiscais de venda do gado, que, segundo ele, foram todas entregues ao relator Cafeteira. "Tive acesso a essas notas no caminho da sessão do Conselho de Ética, quando soube que os documentos tinham chegado a Brasília. Só o relator poderá repassar as notas à imprensa e se forem arroladas no processo", disse Ferrão.
A assessoria de imprensa de Cafeteira informou a este site que todos os documentos foram entregues ao presidente do Conselho, senador Sibá Machado (PT-AC), e aos senadores do colegiado. Mas acrescenta que as notas fiscais não foram entregues ainda ao relator.
Simon, que não integra o Conselho de Ética, torce para que seus membros examinem a questão com o devido cuidado. Na opinião dele, teria sido um absurdo votar o relatório na sessão de ontem, sem a análise dos dados apresentados pela defesa do presidente do Senado.
"Pelo menos tiveram o bom senso de dar mais prazo para analisar a documentação. A questão dos rendimentos agropecuários é fundamental", avalia o senador gaúcho. Dois membros do Conselho de Ética ouvidos pelo Congresso em Foco asseguram que não há documentos sobre a venda da boiada de Renan na defesa entregue aos integrantes do colegiado na noite da última da última terça-feira (12).
* Colaboraram Carol Ferrare e Edson Sardinha
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