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Congresso em Foco
4/6/2011 9:39
ÉPOCA
Os círculos do ?inferno? de Palocci
Estou no terceiro ou no quarto círculo do inferno de Dante, disse o médico Antonio Palocci em seus tempos de ministro da Fazenda do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Era sua primeira entrevista aos jornalistas depois que o caseiro Francenildo Costa o desmentira, numa Comissão Parlamentar de Inquérito. Palocci criticou o ambiente de ?recrudescimento do quadro político? e o clima de ?exacerbação?. Ao afirmar que a economia do país estava ?no céu?, a memória lhe trouxe o mote associativo com A divina comédia, a grande obra do poeta florentino, que também foi político, acusado de corrupção e até exilado. Pois, hoje, é justamente Dante Alighieri (1265-1321) o nome do edifício de alto luxo em que sua empresa de consultoria, a Projeto, comprou, em duas tacadas, o apartamento de R$ 6,6 milhões que tanta dor de cabeça está lhe dando.
O Dante Alighieri fica na Alameda Itu, 593, no Bairro Jardim América, um dos melhores endereços de São Paulo. Fica próximo à Avenida Paulista, muito perto do tradicional colégio particular que também rende homenagens ao consagrado escritor. O prédio foi erguido pela Construtora Elias Victor Nigri, com 30 anos de experiência em imóveis de altíssimo padrão, alguns deles muito mais altíssimos, no padrão e no preço, que o da Projeto Consultoria.
São 15 apartamentos ? um por andar ?, além da cobertura. A unidade do último andar tem 1.777 metros quadrados de área construída e foi vendida por R$ 11,9 milhões (leia mais na coluna Vamos Combinar, à página 39). Palocci, que não mora no local, optou por um apartamento mais modesto, com 493 metros quadrados construídos. Há um do mesmo tamanho oferecido na internet com a sugestão de preço um pouco maior, R$ 7 milhões. Um dos possíveis financiamentos permite comprá-lo com uma entrada de R$ 1,75 milhão e prestações mensais que começam em R$ 56 mil e terminam em R$ 14 mil.
Cabe muita coisa em 493 metros quadrados. Quartos, são oito. Como nem tudo é perfeito, só quatro deles são suítes. Os banheiros são meia dúzia ? parte deles com o conforto, para o inverno, de oferecer pisos aquecidos. Os braços dos moradores também foram lembrados: não há que dá-los ao trabalho com as venezianas, porque elas são motorizadas.
Dinheiro do além na eleição
Esqueça as tradicionais doações por fora de empresas em busca de favores políticos, os inesquecíveis ?recursos não contabilizados? ou, ainda, os toscos pagamentos de caixa dois em sacolas com dinheiro vivo. Nas eleições de 2010, apareceu uma nova ?tecnologia? no conspurcado mundo do financiamento de campanhas políticas: o doador que tem cadastro comercial, doa oficialmente, assina recibo ? mas ninguém sabe quem ele é. Nem quem recebe e ? só mesmo no mal-assombrado reino da política brasileira ? nem sequer quem paga. A única coisa palpável é o dinheiro que chega, limpinho, aos comitês financeiros das campanhas. É como se eles fossem doadores-fantasmas.
Só que eles acabam deixando vestígios. ÉPOCA conseguiu capturar um deles. Seu nome é M Brasil Empreendimentos, Marketing e Negócios, empresa com sede no Rio de Janeiro, registrada em nome de um motoboy e de um sargento do Corpo de Bombeiros da Bahia. Ambos moram na periferia de Salvador. Nas últimas eleições, porém, a empresa distribuiu R$ 650 mil em doações a candidatos do PT. A M Brasil deu R$ 100 mil ao Diretório Nacional do partido, R$ 300 mil ao comitê do governador eleito de Brasília, Agnelo Queiroz, e R$ 50 mil ao deputado paulista Ricardo Berzoini, ex-presidente do PT. Receberam R$ 100 mil também outros dois importantes quadros petistas: o deputado distrital Chico Vigilante, de Brasília, e o candidato derrotado a deputado federal pelo Espírito Santo Guilherme Lacerda, ex-presidente do fundo de pensão dos empregados da Caixa Econômica Federal, o Funcef.
Há recibos e há transações bancárias. Mas ninguém se recorda dessas doações ou da M Brasil. O deputado Ricardo Berzoini diz que não conhece a empresa nem seus donos. Guilherme Lacerda não se lembra deles. Chico Vigilante não lembra. E os responsáveis pela campanha de Dilma não quiseram explicar se lembram. ?O importante é que foi uma doação legal, não pedi e não sei quem fez. Essa situação só vai mudar quando for aprovado o financiamento público de campanha?, afirma Vigilante.
O motoboy e o sargento também não confirmam se lembram ou não.
ÉPOCA descobriu que quem assina as contribuições em nome da empresa é outro sócio: o radialista Jair Marchesini, um apresentador de televisão com atuação política no Rio de Janeiro. Em 2006, ele concorreu pelo PDT a um mandato de deputado federal, mas não se elegeu. Marchesini foi responsável pelo recrutamento do bombeiro e do motoboy para a criação da M Brasil e de outras quatro empresas. Marchesini nega que eles sejam, bem, laranjas: ?Não é nada disso. Eles seriam meus sócios, me ajudariam a dirigir as empresas aqui no Rio?. A acreditar nas palavras de Marchesini, o motoboy e o sargento comungariam de dons sobrenaturais. E não seria o único traço fantástico na história.
Renda suspeita
Marcelo Sereno foi assessor do ex-ministro José Dirceu e dirigente nacional do PT. Ele esteve envolvido no mensalão, foi acusado de desviar recursos de fundos de pensão, virou secretário de uma prefeitura petista e tentou, sem sucesso, ser deputado. Até que desistiu da vida pública e abriu uma consultoria. Mas ninguém sabe até hoje se obteve sucesso na nova empreitada. Nem mesmo a Receita Federal. Agora, Sereno é alvo de uma investigação no Supremo Tribunal Federal (STF) sob a suspeita de sonegação de impostos. Seus sigilos fiscal e bancário foram quebrados. Os papéis revelam rendimentos modestos, aparentemente incompatíveis com seu estilo de vida. Sereno mora desde 2006 numa cobertura alugada na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, com quatro vagas na garagem. O aluguel, segundo corretores, não sai por menos de R$ 4 mil. Em 2008, Sereno declarou rendimento anual de R$ 46.400, recebido exclusivamente de sua consultoria. Ou seja, menos de R$ 4 mil por mês.
Em novembro de 2008, Sereno virou presidente da companhia Grandiflorum Participações, criada pelo Grupo Andrade Magro, do setor de combustíveis. Um mês depois, a companhia comprou por R$ 7 milhões a Refinaria de Petróleo Manguinhos, que, no exercício seguinte, faturou R$ 320 milhões. No fim de 2009, Sereno deixou a empresa. Mesmo depois de ele passar a ser remunerado como alto executivo de uma grande empresa, nada aconteceu com seu patrimônio. Pelo menos perante a Justiça Eleitoral. Em 2009 (ano-calendário 2008), ele declarou à Receita um total de R$ 280.900. Em 2010, como candidato, declarou os mesmos R$ 280.900 à Justiça Eleitoral.
?Fui contratado em 17 de dezembro de 2008 e comecei a receber em janeiro de 2009. Portanto, só declarei (à Receita) os rendimentos da empresa em 2010?, diz.
As investigações sobre Sereno começaram a partir de um inquérito da Polícia Civil do Rio de Janeiro para apurar corrupção na Agência Nacional de Petróleo (ANP). Segundo a polícia, Sereno usava de sua influência no PT para beneficiar o grupo Magro. O relatório não detalha as andanças de Sereno no mundo político, mas informa que o grupo Magro obteve decisões favoráveis na ANP no período em que ele esteve por lá. A empresa conseguiu postergar por mais de um ano o cancelamento do registro de uma distribuidora. Obteve também o direito a comercializar uma quantidade maior de gasolina no mercado. E recebeu o aval para importar, em caráter excepcional, um material exclusivo da indústria química.
Da gasolina ao shopping Center
Há duas semanas, ÉPOCA acrescentou algumas linhas à extensa ficha do líder do governo ? qualquer governo ? no Senado, o peemedebista Romero Jucá, parlamentar pernambucano que representa Roraima e mora em Brasília. Entre as principais novidades da reportagem, constavam evidências de que o senador ganhara um apartamento de uma empreiteira, relatos de como ele recorrera a laranjas tanto para abrir empresas quanto para buscar dinheiro vivo com doleiros ? e, finalmente, documentos comerciais que demonstravam o inusitado crescimento recente do patrimônio de sua família. Jucá, um espécime raro de político ? que aprendeu não só a pairar acima das rivalidades ideológicas entre PT e PSDB, como a lucrar (politicamente) com elas ?, não quis falar sobre o assunto.
Apesar do silêncio perante a opinião pública e seus pares, Jucá tratou de desmentir, em nota, o lobista Geraldo Magela, que concedera entrevista a ÉPOCA revelando ilegalidades cometidas ao lado do senador. Jucá mantinha havia anos amizade e negócios com Magela, relação rompida somente no fim de 2009, em razão de um calote estimado por Magela em R$ 3 milhões. Diante da reação de Jucá, o lobista Magela resolveu dar nova entrevista a ÉPOCA. Ratificou o que já dissera e contou outros episódios envolvendo sua convivência com o senador. ?Estou ansioso para ser chamado pelos órgãos competentes e mostrar as provas das quais disponho?, diz Magela.
Magela contou que sua proximidade com Jucá era tamanha que, no segundo semestre de 1998, o senador lhe pediu que registrasse dois carros em nome da Pool Comunicações, empresa de Magela. Eram dois Peugeots 206, presentes para os filhos de Jucá. ?Não posso aparecer?, disse Jucá, segundo o relato de Magela. Magela aquiesceu e repassou os dados da empresa aos assessores de Jucá. ?Dias depois, recebi as notas fiscais na sede da minha empresa. Os carros foram comprados por Álvaro Jucá (irmão do senador) em São Paulo, à vista, e emplacados em Brasília?, afirma Magela. ?Como em outros episódios, fui apenas laranja do senador. Não gastei um tostão.? Cerca de um ano e meio depois, Magela afirma ter passado procuração para que os filhos de Jucá vendessem os carros.
Nesse período, enquanto ainda tinham uma relação de absoluta confiança, Jucá teria pedido um estranho favor a Magela: queria usar o telefone e o fax de seu escritório. ?Preciso mandar um fax para a Suíça, e só posso fazer isso na sua casa ou em Roraima?, disse Jucá, de acordo com Magela. O senador valeu-se do escritório de Magela em três ocasiões, sempre com o mesmo propósito. Com quem Jucá falava na Suíça? Qual foi o teor dos documentos enviados pelo fax? Jucá não quis responder a ÉPOCA. Magela prefere não fazer ilações: ?Deduzi, é claro, que se tratava de um banco. Mas não perguntei, nem ele comentou, naturalmente?.
Além das negociatas relatadas por Magela, a família Jucá também tocou prósperos negócios com o setor público. Nas últimas semanas, ÉPOCA investigou uma nova história desse segundo tipo de negócio. A família Jucá obteve autorização do Ministério da Cultura para revitalizar, com R$ 3,8 milhões em recursos obtidos por meio da Lei Rouanet, uma área histórica do Recife, em Pernambuco, terra dos Jucás. Uma empresa da família Jucá levantou o dinheiro com estatais e empresas amigas. Em seguida, a mesma empresa da família Jucá repassou a maior parte dos recursos a uma empreiteira cujo dono era sócio do filho do senador ? e, com o que sobrou dos investimentos, a família Jucá abriu um shopping center na área.
Cezar Peluso: "A Justiça pode ser muito mais ágil" (trecho de entrevista)
Por dever de ofício, há 44 anos o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso, tem de conviver com a lentidão gerada pelo sem-número de recursos usados nos processos judiciais. Peluso é o mentor de uma Proposta de Emenda Constitucional inovadora. O texto estabelece que os réus terão de cumprir as sentenças quando condenados a partir da segunda instância. Hoje, 37 tipos de recursos arrastam o cumprimento dessas penas por anos. Muitas delas caducam antes de ser cumpridas. O atraso é um aliado da impunidade. ?É um serviço público ineficiente?, diz. Nesta entrevista, Peluso defende a atuação do Supremo em questões em que o Congresso se omite, como o caso da união estável entre homossexuais e a questão das cotas raciais.
ÉPOCA ? Por que a emenda dos recursos pode tornar a Justiça mais ágil?
Cezar Peluso ? Não mais ágil. Muito mais ágil! Temos um sistema em que, enquanto não se exaurem todos os recursos possíveis e admitidos, não há o trânsito em julgado, portanto não há execução. Na área cível, isso significa que quem ganhou uma indenização não pode receber. Na área criminal, quem foi condenado não pode ir para a cadeia. Então, o que acontece? As pessoas usam todos os recursos disponíveis, transitam por quatro juízos sucessivos ? o juízo onde começa a causa, o juízo dos Tribunais locais e regionais, aí vem dos Tribunais Superiores (TST, STJ etc.) e depois chegam até o Supremo (Tribunal Federal). O Supremo e os Tribunais Superiores não podem decidir rapidamente o recurso, porque há muitos recursos ? e há muitos recursos porque a admissibilidade do recurso é ampla e, até o Tribunal examinar, a causa fica parada. Um exemplo: em matéria de desapropriação, em São Paulo, o expropriado raramente recebe a indenização. Os recursos são tantos que ou a indenização ? se confirmada ? vai para os filhos ou para os netos. Um processo de expropriação, às vezes, dura mais de 20 anos.
ÉPOCA ? Quem mais usa os recursos?
Peluso ? Depende da área. Na área cível, publicamos a lista dos 100 maiores litigantes: Caixa Econômica Federal, Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), bancos, telefônicas, a União propriamente dita, a Fazenda nacional e as (secretarias da) Fazendas estaduais também, a administração pública em geral. São os responsáveis por 70% dos recursos. Mais interessante: nenhum deles está fazendo oposição à proposta. Porque ela também é vantajosa para o Executivo. Nas varas de execuções fiscais, há milhares de execuções paralisadas. Enquanto isso, o Erário não recebe.
ÉPOCA ? Esse princípio de não esperar a decisão de última instância para que o réu já comece a cumprir a pena não é, de certa forma, o princípio da Lei da Ficha Limpa?
Peluso ? A questão da condenação em segundo grau como causa de inelegibilidade (como diz a Lei da Ficha Limpa) ainda não foi apreciada pelo Supremo. Mas o princípio é o mesmo. Isto é: se minha proposta estivesse em vigor, a Ficha Limpa nem chegaria ao Supremo. Uma condenação em segundo grau, num sistema geral, é o ideal. No mundo ocidental, o uso do terceiro grau de jurisdição é raríssimo. Quarto grau, não conheço nenhum país. Uma das objeções é que estaríamos desvalorizando as garantias constitucionais. Será que o Brasil é o único país do mundo ocidental que, por ter quatro jurisdições, cuida dos direitos e das garantias individuais? Dizer que França, Inglaterra, Estados Unidos, Portugal, Espanha não respeitam direitos constitucionais só porque têm dois graus de jurisdição... Tenha santa paciência.
ÉPOCA ? Isso não tiraria dos réus nenhum tipo de direito constitucional?
Peluso ? Não tiraria nada, nada, nada. A gente está propondo só a antecipação do trânsito em julgado.
Fernando Henrique Cardoso - O Al Gore da maconha
Fernando Henrique Cardoso não é Al Gore. O ex-vice-presidente americano foi derrotado por George W. Bush nas controversas eleições de 2000, afastou-se da política diária e inventou para si mesmo uma causa: o combate ao aquecimento global. Correu o mundo defendendo essa ideia. Sua peregrinação foi registrada no filme Uma verdade inconveniente, que chegou às salas de cinema em 2006. Fernando Henrique derrotou Lula nas eleições para a Presidência em 1994 e 1998, fez dois governos que entraram para a história e afastou-se das disputas eleitorais. Como Gore, descobriu uma causa: a discriminalização do consumo de drogas. Tem corrido o mundo em defesa da ideia. Sua peregrinação foi registrada no filme Quebrando o tabu, um documentário que estreará em 12 salas de cinema neste fim de semana. Em 2007, o filme de Al Gore ganhou o Oscar de melhor documentário e ele mesmo recebeu o Prêmio Nobel da Paz. O que Fernando Henrique espera ganhar com sua campanha?
?Em uma periferia de São Paulo, num bairro chamado Cidade Tiradentes, uma senhora se aproximou e disse, ?É verdade que você vai botar a maconha no lanche das crianças???, conta o ex-presidente, esboçando uma resposta. ?Uma infâmia dessas tem efeito devastador.? Conhecido nos anos 1990 como ?pai do Plano Real?, entre as novas gerações o ex-presidente começa a ser chamado de THC, um trocadilho afetuoso que liga a principal substância ativa da maconha à sigla FHC, que se tornou quase seu segundo nome. O novo ativismo do Príncipe dos Sociólogos ? outro de seus títulos informais ? desperta estranhamento até dentro de casa: ele contou à Folha de S.Paulo que suas netas de 25 anos estavam ansiosas para ver o documentário do ?avô maluco?.
Fernando Henrique fará 80 anos no próximo dia 18. Se parece ter menos, talvez seja por causa de uma vida comedida. Ele diz que nunca experimentou cocaína. Maconha? ?Eu dei uma tragada, achei horrível. Acho que é porque nem cigarro eu fumo?, disse numa entrevista em 1985. Ainda assim, está defendendo a liberação do consumo, com proibição do tráfico, para todas as drogas. Sim, todas as drogas, especialmente aquela da sigla THC. ?Se a maconha faz um dano equivalente, ou às vezes menor que o do álcool, é preciso dar a ela um tratamento diferenciado?, ele afirma em Quebrando o tabu. É uma postura liberal, em tudo diferente daquela mantida nos oito anos de seu governo. ?Na Presidência eu não dispunha das informações que tenho hoje e compartilhava da visão predominante de que o problema da droga se resolvia sobretudo com repressão?, afirma. ?Só quem é burro não muda de opinião diante de fatos novos. Eu errei.? Talvez o suave ostracismo a que o presidente foi exposto durante o governo Lula o tenha ajudado a mudar de opinião e ligar-se a uma causa de grande visibilidade.
O Exército se arma para a Copa
O rúgbi é o principal esporte da África do Sul. Em 1995, o país foi sede da Copa do Mundo de Rúgbi. O torneio foi cercado de grande simbolismo. Era o primeiro grande evento esportivo realizado no país, que pouco antes se libertara do regime do apartheid. O jogo final entre África do Sul e Nova Zelândia foi realizado no Ellis Park, em Johannesburgo, com a presença do então presidente, Nelson Mandela. De repente, um jato Boeing 747 fez um voo rasante, não autorizado, sobre o estádio. O avião tinha a mensagem ?Para frente, Springboks!? (um tipo de antílope, símbolo da seleção sul-africana) pintada nas asas. Quem assistiu ao filme Invictus, do diretor Clint Eastwood, conhece essa cena. Em 2014, o Brasil vai sediar uma Copa do Mundo de Futebol, o maior evento esportivo no país em décadas. Em sigilo, o Exército se prepara para tornar impossíveis surpresas como a da África do Sul.
O Exército iniciou uma licitação internacional para a compra de equipamentos de defesa antiaérea. A previsão é gastar de US$ 1,5 bilhão a US$ 4,5 bilhões em mísseis, canhões antiaéreos e radares para proteger contra atentados os estádios durante a Copa das Confederações, em 2013, os 64 jogos da Copa do Mundo de 2014 e as competições das Olimpíadas de 2016, no Rio de Janeiro. ÉPOCA teve acesso a um documento de 15 páginas de 26 de janeiro, com o selo ?confidencial?, no qual o Comando Logístico do Exército detalha a fornecedores internacionais o Projeto do Sistema Integrado de Artilharia Antiaérea do Exército Brasileiro (Projeto Siaaeb). ?(O projeto é) destinado à atualização do sistema existente, já bastante defasado, com vistas a atender às exigências da Estratégia Nacional de Defesa e às do Sistema de Defesa Aeroespacial Brasileiro, particularmente em face das obrigações decorrentes da realização no Brasil da Copa das Confederações, em 2013, da Copa do Mundo de Futebol, em 2014, e dos Jogos Olímpicos de 2016?, diz o texto.
Desde que terroristas da al-Qaeda sequestraram e jogaram dois aviões contra as torres do World Trade Center, e outro contra o prédio do Pentágono, nos Estados Unidos, em 11 de setembro de 2001, os organizadores de grandes eventos esportivos internacionais adicionaram a exigência de proteção antiaérea ao planejamentos de segurança. Nas Olimpíadas de Pequim, em 2008, o Exército chinês cercou os principais centros de competição, inclusive o Estádio Ninho de Pássaro, com seus mais avançados equipamentos.
A intenção dos militares brasileiros é aproveitar a oportunidade aberta pela Copa para modernizar a obsoleta força antiaérea nacional. O Exército pretende comprar cinco baterias de mísseis de médio alcance, mísseis de curto alcance, que podem ser lançados do ombro por um soldado, novos radares de detecção e centros de comunicação. O investimento inclui a modernização de cinco grupos de artilharia antiaérea, equipados com canhões de 35 mm e 40 mm, adquiridos ainda nas décadas de 1970 e 1980. O Exército também vai comprar canhões antiaéreos de calibre 30 mm e complexos de mísseis de curto raio de ação para os novos veículos blindados Guarani e os velhos blindados M-113, usados na ocupação do Morro do Alemão, no Rio de Janeiro. Os velhos canhões antiaéreos ganharão novos motores elétricos, geradores e sistemas de comunicação em rede de última geração.
ISTOÉ
Palocci no limite
Depois de 20 dias de silêncio, o ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, admitiu se pronunciar publicamente sobre a notável multiplicação de seu patrimônio e sobre as atividades de sua empresa de consultoria, a Projeto. No entanto, Palocci, ao contrário do que esperavam até mesmo seus colegas de governo e partido, não revelou valores de negócios, lista de clientes ou a natureza dos serviços que prestou entre 2006 e 2010, quando era deputado federal e coordenou a campanha eleitoral da presidente Dilma Rousseff.
Em vez de falar em cláusulas de confidencialidade, desta vez, para manter seus clientes no anonimato, Palocci alegou que não pode expôr as empresas que o contrataram a um jogo de caráter político, como acontece agora. Citou, inclusive, as acusações que a oposição fez contra um de seus únicos clientes conhecidos. Palocci, porém, afirmou que todas as informações já foram repassadas aos órgãos de controle financeiro e à Procuradoria Geral da República. O ministro negou que tenha feito tráfico de influência, tratado de interesses privados junto ao governo ou colocado dinheiro de arrecadação eleitoral em sua empresa. ?Não existe nenhum centavo que se refira à política ou campanha eleitoral?, afirmou Palocci em entrevista ao Jornal Nacional, na noite da sexta-feira 3.
Palocci falou com a TV Globo por determinação da presidente Dilma Rousseff. Na noite da quinta-feira 2, ela havia telefonado para o ministro e teve um diálogo delicado e definitivo. Sugeriu que ele desse entrevista a um meio de comunicação para esclarecer, de forma cabal, as dúvidas sobre a origem da multiplicação de seu patrimônio nos últimos quatro anos. Dilma disse que não havia tempo a perder. O desgaste de Palocci já atingiu o governo como um todo e seria um grave erro aguardar os acontecimentos. Sugestão de presidente da República é para ser cumprida e Palocci escolheu a sexta 3 para a derradeira tentativa de convencer a opinião pública sobre a lisura dos negócios da Projeto. Dilma não deu outra opção ao ministro da Casa Civil. Segundo ela, era preciso quebrar o silêncio para estancar a prematura sangria do governo. Na entrevista ao Jornal Nacional, Palocci disse que ?não ofereceu seu cargo? à presidente Dilma Rouseff. ?Não conversamos sobre esse assunto, mas não é isso que me prende ao governo?, disse o ministro. De acordo com interlocutores próximos à Palocci, ele não deverá mesmo tomar a iniciativa de entregar seu posto. Uma eventual saída só será decidida pela presidente Dilma que, nos últimos dias, devido à crise, se distanciou de seu ministro.
A manifestação pública de Palocci, na sexta-feira, não teve o efeito imediato de arrefecer a crise. Ao mesmo tempo em que os aliados de praxe se perfilavam num apoio entusiasmado, seus críticos seguiram cobrando as mesmas explicações dos últimos dias. ?Palocci deixou claro que isto é um assunto pessoal dele e não do governo?, disse o líder do governo da Câmara dos Deputados, Cândido Vaccarezza (PT-SP). ?O Palocci tem direito de abrir ou não os dados de sua empresa. É uma questão de sigilo profissional?, afirmou o deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), líder do partido na Câmara. ?Este é o único caso do mundo em que uma firma noticia que vai fechar e o faturamento aumenta?, criticou o deputado Antônio Imbassahy (PSDB-BA), se referindo às declarações do ministro que confirmaram o recebimento de cerca de R$ 10 milhões nos últimos dois meses de 2010 como fruto de antecipação de pagamento em razão de encerramento de contratos. ?Palocci não deu explicações, deu desculpas?, atacou o senador Demóstenes Torres (DEM-GO). O senador Pedro Simon (PMDB-RS) que, no meio da semana, havia sugerido o afastamento de Palocci, manteve sua posição: ?Na verdade ele não disse nada de diferente?, afirmou Simon. ?Continuo achando que Palocci deveria se afastar?.
O esquema hemograna
Em 2004 os brasileiros se assombraram com a descoberta de uma modalidade de corrupção que há anos se instalara no Ministério da Saúde: uma quadrilha formada por funcionários de diversos escalões e grandes laboratórios fraudava licitações e o governo comprava derivados de sangue para distribuição a hospitais públicos e doentes carentes com um sobrepreço superior a 100%. Para evitar que casos como esse, que ficou conhecido no Brasil como a Máfia dos Vampiros, voltasse a ocorrer, o governo decidiu, com a aprovação do Congresso, criar a Hemobrás, uma estatal dedicada à produção de hemoderivados. Passados sete anos, o projeto já consumiu pelo menos R$ 138 milhões, emprega cerca de 90 pessoas, financiou mais de 40 viagens ao Exterior a seus executivos ? sendo 26 delas apenas para Paris ?, não produziu uma só gota de derivados de sangue e teve apenas 2,9% das obras de construção de sua fábrica construída. Ou seja, no lugar da Hemobrás se tem uma Hemograna, um esquema que suga dinheiro público há quase uma década.
No Tribunal de Contas da União encontram-se alguns elementos que ajudam a explicar como a Hemobrás se transformou em Hemograna. Ao longo dos últimos anos, por quatro vezes o TCU contestou contratos firmados entre a estatal e seus fornecedores. Na maior parte dos casos, as ações de fiscalização do tribunal encontraram indícios de sobrepreço, que se transformariam em superfaturamento caso os contratos fossem cumpridos. Ainda na primeira fase de construção da fábrica de Goiana (PE), que irá produzir 500 mil litros de plasma por ano quando estiver em pleno funcionamento, o TCU anulou duas concorrências. De acordo com o tribunal, foram encontrados indícios de restrição à competitividade entre os concorrentes e sobrepreço. Com isso, as obras só foram licitadas em 2009, um ano antes da previsão inicial da conclusão da fábrica.
Mesmo assim, a Hemobrás decidiu licitar a segunda parte da construção, orçada em mais de R$ 269 milhões. No mês passado, antes mesmo de os operários iniciarem as obras, mais uma vez o TCU encontrou irregularidades. De acordo com o tribunal, um dos contratos estava superfarturado em R$ 21 milhões e determinou a revisão em toda a planilha de preços para evitar prejuízo aos cofres públicos. A Hemobrás, por sua vez, diz que, antes mesmo de conhecer o resultado da auditoria, já havia revisado a planilha, reduzindo o valor do contrato em R$ 8,6 milhões. O resultado pode ser ainda mais atraso.
Como se não bastassem os casos clássicos de superfaturamento em contratos com empreiteiras, a Hemobrás também chamou a atenção do TCU por um termo aditivo que, senão inédito, bastante raro. A Hemobrás, sem consultar os órgãos reguladores, simplesmente aprovou um aditivo que ampliou de R$ 9 milhões para incríveis R$ 230 milhões um contrato firmado em 2007 com o laboratório francês LFB. Além disso, a estatal simplesmente mudou o objeto do contrato original, sem realizar nova licitação, como determina a lei. Pelo acordo original, a LFB receberia os R$ 9 milhões para fornecer a tecnologia para fracionamento do sangue, o processo básico para a produção de hemoderivados. No aditivo, além de receber R$ 220 milhões a mais do que o previsto inicialmente, os franceses ficaram responsáveis eles mesmos por fracionar o sangue.
A volta de Bené, o operador
Empresas, Gráfica Brasil, Dialog e Projects Brasil, Bené conseguiu, em apenas quatro anos (2005-2009), sair de um faturamento de R$ 494 mil para R$ 87,3 milhões. Não apenas em razão de seu tino comercial, porém, ele ocupou no ano passado o centro dos holofotes da capital. Como um dos responsáveis por montar a estrutura da campanha petista, Bené tornou-se personagem da eleição presidencial quando foi flagrado num controvertido episódio. Ele participou da famosa reunião do restaurante Fritz, em Brasília, onde representantes do partido contratavam uma equipe de contrainformação para a batalha eleitoral. Na esteira do escândalo, o empresário viveu dias amargos. Virou alvo do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria-Geral da União (CGU) e teve de submergir. A saída de cena provocou uma redução de quase 60% no seu faturamento em 2010.
Mas foi um recuo estratégico. Este ano Bené voltou a operar com toda a força na capital federal. O empresário tem um modo peculiar de trabalho. Atua por intermédio de uma rede de influências, com indicação de pessoas ligadas a ele para áreas estratégicas de ministérios. E costuma fechar negócios com base na prorrogação de contratos antigos. Alguns de seus métodos, entre eles a prática de adesões à ata de preços (contratos fechados a partir de outros pregões), já foram condenados por órgãos de fiscalização. Segundo o TCU, essa é uma forma de driblar licitações. Só nos primeiros cinco meses de 2011, Bené embolsou R$ 6,3 milhões em negócios com o governo e com aditivos já acertados que lhe permitem prever um faturamento de pelo menos R$ 51 milhões. Será um aumento de 40% em relação ao período de vacas magras do ano passado.
De janeiro a maio, os negócios do empresário fluíram como mel. Em 1º de abril, ele fechou contrato de R$ 3 milhões com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). Quatro dias mais tarde, assinou outro de R$ 1,5 milhão com a Agência Nacional de Transportes Aquaviários, com vigência a partir de 6 de abril. Nos dois negócios, Bené foi beneficiado pela prorrogação de contratos antigos. Mas o maior empreen¬dimento viria em 4 de maio. A gráfica receberá da Fundação Universidade de Brasília até R$ 23,3 milhões até o final do ano para prestação de serviço de produção, geração e desmaterialização de documentos. Nesse caso, houve a adesão a uma ata de preços de 2009. Essa fórmula foi criticada pelo TCU em acórdão publicado em 2007. Em seu voto, o relator-ministro Valmir Campelo solicita que o Ministério do Planejamento ?adote providências de forma a estabelecer limites para a adesão a registros de preços realizados por outros órgãos e entidades visando preservar os princípios da competição, da igualdade de condições entre os licitantes e da busca da maior vantagem para a Administração Pública?. Apesar de recomendação do TCU, o drible continua sendo utilizado em benefício das empresas de propriedade do operador Bené.
Grileiro de Cristo
Até o início da década passada a ação missionária internacional era um dos principais pilares da diplomacia não oficial do Canadá, país de maioria cristã. Iniciativas como a de fundar instituições assistenciais em outros países sempre tiveram o apoio das embaixadas. Foi assim que a Canadian Baptist Mission, braço da Igreja Batista Canadense, decidiu fundar em uma área agrícola de Brasília uma organização de recuperação de dependentes químicos, o Ministério Servo ? serviço evangélico de reabilitação e vocação. Com apoio diplomático e milhares de dólares em doações internacionais, a instituição recuperou mais de 700 pessoas e, há poucos anos, passou para as mãos de pastores brasileiros. A partir daí, tudo mudou. Além de fechar as portas, o Ministério Servo virou alvo de uma disputa judicial. Seu presidente, o pastor André Ananias Ferreira, é acusado de falsificar documentos e vender sem autorização o terreno onde funcionava a sede da própria ONG, em Vicente Pires (DF). Como ocorrem nas frequentes grilagens de terra no Distrito Federal, as áreas foram parceladas e os lotes, vendidos a terceiros. O dinheiro da venda, em vez de ir para a conta do Ministério Servo, foi parar no bolso de Ananias.
?Ele desmantelou todo o trabalho da instituição, mandou destruir a sede e vendeu os lotes sem autorização?, acusa o pastor Marco Aurélio, que foi destituído da vice-presidência do Ministério Servo no ano passado, pelo próprio Ananias. Os dois, aliás, se enfrentam na Justiça. Ananias registrou queixa de tentativa de agressão por parte de Marco Aurélio. Este, por sua vez, ingressou com um pedido de investigação no Ministério Público e na Polícia Civil por conta da venda ilegal do terreno e do suposto desvio de R$ 230 mil ? valores relativos a dois lotes de R$ 25 mil e um de R$ 180 mil. Na denúncia, Marco Aurélio também pede que seja apurada a falsificação de assinatura da missionária canadense Joyce Hancok, uma das mais antigas integrantes da Missão Batista Canadense e fundadora do Ministério Servo. ?Ele vendeu os terrenos em nome do Ministério Servo e falsificou minha assinatura como se eu tivesse autorizado a venda?, afirma Hancok.
Com a repercussão do caso, Ananias foi pressionado pela Ordem dos Pastores do Distrito Federal, e pela Convenção Batista do DF (CBDF), a devolver o dinheiro para o Ministério Servo. Ele mostrou à reportagem um depósito de R$ 66,5 mil efetuado no dia 19 de maio, na conta da missão. Não soube informar, porém, sobre o destino dos R$ 163,5 mil restantes.
"Novos assassinatos vão acontecer"
Na última semana o poder público se esmerou em buscar origens distantes, analisar complexos problemas estruturais e imaginar peculiaridades antropológicas e culturais para explicar uma questão objetiva: por que não consegue dar proteção a ativistas jurados de morte. Um País que, no passado, viu a morte de Chico Mendes e Dorothy Stang e, nos últimos dias, de cinco lideranças ligadas à defesa da Amazônia debruça-se, agora, sobre a discussão de um plano de ação que não merece grande crédito nem das autoridades envolvidas.
Em entrevista à ISTOÉ (leia abaixo), Simão Jatene (PSDB), governador do Pará, Estado recordista em assassinatos e conflitos no campo, se declarou pessimista sobre o futuro. ?Tenho uma só certeza: da maneira como essas coisas têm historicamente ocorrido, o final não é feliz,? declarou. ?Novos assassinatos vão acontecer? disse ele. Na mesma linha de resignação, a ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, en¬tende que já é um imenso avanço o Brasil ser ?o único país do mundo com um programa de proteção aos defensores dos direitos ¬humanos?.
A resposta do Estado brasileiro ao faroeste amazônico é pouco mais que retórica. Um grupo interministerial foi criado na segunda-feira 30 para acompanhar a investigação das últimas mortes ocorridas nas regiões de conflito e acelerar ações de regularização de terras. Como o governo se declarou incompetente para dar proteção a uma lista de 165 ativistas jurados de morte por fazendeiros, foi adotada uma solução mambembe. A Polícia Federal foi convocada para proteger os 30 líderes mais vulneráveis. ?Seria ilusório dizermos que vamos proteger todas essas pessoas. Não poderia prometer isso ao Brasil,? declarou Maria do Rosário. Ela chega a alegar que ?viver permanentemente sobre escolta é uma violação aos direitos humanos?.
Quem vive sob o medo pensa o contrário. A sindicalista de Rondon do Pará, Maria Joel Dias da Costa, 48 anos, desabafa: ?Estamos sozinhos nessa luta.? Desde o assassinato de seu marido, o ativista José Dutra da Costa, em 2000, e de outros três amigos nos anos seguintes, ela sabe que pode ser a próxima vítima. Seu nome consta na lista dos ?marcados para morrer? elaborada pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) e entregue ao poder público. Mas Maria segue desamparada. A garantia de sua vida parece ser uma impossibilidade administrativa.
Os calotes de Chávez
O presidente venezuelano Hugo Chá¬vez desembarca em Brasília na segunda-feira 6 para realizar sua primeira visita oficial ao Brasil desde que a presidente Dilma Rousseff assumiu o cargo. Além da animação que demonstra todas as vezes que visita o País, Chávez chega disposto a conquistar com Dilma o mesmo espaço que teve durante os oito anos do governo Lula. Mas os tempos são outros. O Itamaraty já recomendou ao Planalto não fechar novos acordos com a Venezuela fiando-se apenas nas conversas do loquaz comandante bolivarianista. Dilma tem a tarefa de apertar o colega para que os compromissos já firmados sejam honrados.
O Itamaraty chegou a encaminhar uma lista de pendências ao Planalto. A expectativa é de que Dilma faça Chávez passar por situação semelhante à de Barack Obama, intimado publicamente a suspender as históricas barreiras às exportações brasileiras para os Estados Unidos. No caso venezuelano, serão cobradas as promessas de investimento, nunca cumpridas, feitas por Chávez em visitas semelhantes. Encabeçam a lista a participação da Venezuela na refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco, e a encomenda de dez navios petroleiros feita ao estaleiro carioca Eisa. Por exigência de Chávez, a refinaria pernambucana foi batizada com o nome do general brasileiro que lutou ao lado de Simon Bolívar na independência venezuelana.
Os dois projetos integravam uma lista de 22 acordos firmados entre o presidente venezuelano e Lula em 2006. Era um plano ousado, que hoje mais parece devaneio, e incluía a construção do chamado ?Gasoduto do Sul?, uma extensa rede de tubulações para transporte de petróleo e gás que cortaria a Amazônia de alto a baixo. Depois de vários encontros bilaterais, em nome da segurança energética continental e ao custo de diárias e passagens, o projeto foi abandonado. Bem mais factível, e viável economicamente, o investimento na refinaria de Pernambuco também não se concretizou. Os venezuelanos criaram problemas desde o início.
Primeiro não concordavam com a participação de 40% no empreendimento, orçado em US$ 13 bilhões. Depois condicionaram a parceria a uma parcela do mercado de distribuição de combustível no Nordeste. Recentemente, no entanto, ficou claro que o real motivo era a falta de dinheiro. Chávez chegou a pedir um empréstimo de R$ 500 milhões ao BNDES, mas não apresentou as garantias exigidas. ?Se a PDVSA ? a companhia estatal de petróleo da Venezuela ? não entrar no negócio até agosto, entenderemos que ela perdeu o interesse em participar?, diz o diretor de abastecimento da Petrobras, Paulo Roberto Costa.
Chávez será cobrado ainda por ter suspendido a encomenda de dez navios ao estaleiro Ilha AS (Eisa), no Rio de Janeiro, um negócio de US$ 670 milhões. Em novembro de 2009, o estaleiro entregou o primeiro navio, também batizado de Abreu e Lima a pedido do presidente venezuelano. Apesar de toda a festa, pouco tempo depois Caracas resolveu suspender os pagamentos e pediu tempo para renegociar o contrato. Até hoje, no entanto, não houve decisão. A direção do estaleiro brasileiro ainda tem esperança de que a encomenda seja retomada. ?As negociações estão em curso?, afirma a assessoria de imprensa do Eisa. ?Queremos encontrar a melhor solução para atender às necessidades da PDVSA diante do novo cenário internacional do mercado de petróleo.?
VEJA
Apartamento em que Palocci mora pertence a empresa de fachada, em nome de uma laranja, que diz: ?Não tenho como brigar com ele?
Se a situação do ministro da Fazenda, Antônio Palocci, já parecia enrolada, ela se complica bastante a partir de hoje. Reportagem de Leonardo Coutinho na VEJA desta semana mostra que o mega-apartamento que o ministro aluga há quatro anos, em São Paulo, de 640 metros quadrados, pertence a uma empresa de fachada que está em nome de um laranja de 23 anos, que mora em um casebre de fundos na periferia de Mauá, no ABC paulista, ganha R$ 700 por mês e teve o celular bloqueado por falta de pagamento. Não obstante, ele é ?donos? de um apartamentaço com quatro suítes, três salas, duas lareiras, todo ladeado por varandas, avaliado em R$ 4 milhões. Não se aluga um igual por menos de R$ 15 mil; o condomínio chega R$ 4.600, e a parcela mensal de IPTU é de R$ 2.300.
O leitor é uma pessoa boa e luta para pensar sempre o melhor. Que culpa tem Palocci se a empresa que é dona de seu apartamento é de fachada e se aquele que aparece formalmente como dono é um laranja? Pois é? Um ?consultor? da sua estatura, com a sua experiência, um dos mais bem pagos DO PLANETA, ex-ministro de estado ? o que valorizou muito seu passe, como ele insistiu ontem no Jornal Nacional ? deveria ter mais cuidado para saber onde se mete, não é mesmo? As coisas poderiam parar por aqui, e teríamos só uma história de um ministro imprudente, que aluga um apartamento de luxo, cuja soma de gastos supera o seu salário. Mas as coisas não param por aqui!
Preste atenção!
- VEJA resolveu saber quem era o dono do apartamento que o ministro aluga. De acordo com 14º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo, ele pertence à Lion Franquia e Participações Ltda.
- E quem é o dono da Lion? São dois sócios: Dayvini Costa Nunes, com 99,5%, e Felipe Garcia dos Santos, com 0,5%. Felipe tem 17 anos e foi emancipado no ano passado.
- Dayvini e Felipe são laranjas. Leia na revista como ele acabou ?dono? do imóvel. A Lion não existe. Usou endereços falsos nos últimos três anos.
- A Lion recebeu o apartamento de um certo Gesmo Siqueira dos Santos, tio de Dayvini, que responde a 35 processos, incluindo falsificação de documentos.
VEJA encontrou Dayvini com os dados sobre a posse do imóvel e a tal Lion. Ele afetou surpresa, disse que não sabia de apartamento nenhum e até ironizou: afirmou que sua vontade era pegar o imóvel que estava em seu nome, vender, pagar as contas e comprar uma boa casa para a família. Certo!
Ontem, no entanto, Dayvini telefonou para a VEJA para mudar a sua versão. Sim, ele é laranja da Lion, mas afirmou que participou da fraude. Reproduzo trecho da sua segunda entrevista:
VEJA - Um homem ligou dizendo ser seu tio. O que ele quer?
Dayvini - Desde que você falou comigo, não consigo dormir, por causa dessas coisas que envolvem pessoas com quem não tenho como brigar, como o Palocci, entendeu? Eu não tenho como bater de frente com essas pessoas. Sou laranja.
VEJA - O seu fio disse que o senhor sabia que era laranja.
Dayvini - Ontem, quando você chegou na minha casa, estava um pouco nervoso.
VEJA - O senhor mentiu ontem ou está mentindo agora?
Dayvini - Eu menti ontem.
Lula, o impertinente
Além da intervenção visível e registrada em fotos, Lula tem interferido nos bastidores do governo. Ultrapassando, como é sua característica, o bom-senso e os limites. Recentemente, ele pegou o telefone e ligou para a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, que ocupava o mesmo cargo no fim de seu governo.
Exigiu ? repetindo: exigiu ? que ela apressasse a licença ambiental definitiva de Belo Monte, prometida há tempos pelo Ibama e, afinal, liberada na quarta-feira passada. Em determinado momento da conversa, o impertinente disse: - P?, Izabella, você está me prometendo isso desde agosto.
Hugo Chávez vem ao Brasil em momento ruim - para ele e para Dilma
Na segunda-feira, a presidente Dilma Rousseff recebe a visita de um vizinho incômodo: o coronel Hugo Chávez. O presidente-ditador da Venezuela acaba de ter suas ligações com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) descortinadas pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, na sigla em inglês). E tudo o que Dilma não precisa neste momento - em que enfrenta a pior crise de seu governo por causa da mal explicada multiplicação do patrimônio de seu ministro da Casa Civil, Antonio Palocci - é que as ligações dos narcoguerrilheiros também com figuras do seu partido, o PT, fiquem ainda mais em evidência. O primeiro encontro político com Chávez, portanto, deverá dar o tom de como Dilma vai tratar o caudilho venezuelano em seu governo ? se com a mesma reverência que seu antecessor, o ex-presidente Lula, ou com um distanciamento crítico.
O visitante falastrão sempre teve ideais, no mínimo, ousados. Desde que assumiu o comando da Venezuela, em 1999, Chávez tenta se colocar como uma liderança capaz de mobilizar todos os governantes da América Latina a seguirem seu modelo de política, o que ele chama de ?socialismo do século XXI? ou ?Revolução Bolivariana?. Em nome da união dos países vizinhos, ele queria implantar a igualdade social e a democracia moderna. No entanto, a versão chavista da romântica ideologia de Simon Bolívar, assim como a original, ficou só na utopia. E ele acabou se aproximando mais da figura de um fascista. ?Chávez é hoje o Mussolini tropical?, comenta Norman Gall, diretor executivo do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, estudioso da América Latina que viveu seis anos na Venezuela.
Ex-senador desvia verba para ocultar amante
John Edwards, ex-candidato democrata à Presidência dos Estados Unidos, foi indiciado por uma corte federal nesta sexta-feira em uma investigação sobre uso de recursos de campanha para esconder uma relação extraconjugal. O ex-senador enfrenta seis acusações por suposta participação em um plano que viola as leis federais de financiamento de campanha, anunciou o Departamento de Justiça em um comunicado.
As acusações, anunciadas após dois anos de investigações, envolvem centenas de milhares de dólares proporcionados por duas doações que Edwards teria usado para pagar a residência da amante, Rielle Hunter, com quem teve um filho. Edwards, de 57 anos, confessou sua relação amorosa com Hunter em agosto de 2008, mas apenas em 2010 reconheceu a paternidade da criança. Sua mulher, Elizabeth Edwards, figura bastante conhecida da esquerda americana, ficou sabendo do romance em 2006, quando já enfrentava uma batalha contra o câncer, que a levou à morte. Ainda assim, ela desempenhou um importante papel na campanha presidencial do seu marido em 2008.
Ex-senador pelo estado da Carolina do Norte, Edwards também foi o candidato democrata à vice-presidência dos Estados Unidos na campanha de 2004 na chapa encabeçada por John Kerry. Na ocasião, a dupla foi derrotada nas urnas pelo republicano George W. Bush.
CARTACAPITAL
Grupo quer investigar Aécio
O procurador-geral da República, Roberto Gurgel, terá duas preocupações a mais além de sua reeleição à frente do Ministério Público Federal nos próximos dias. Escalado para analisar ? e dizer se são convincentes ? as explicações sobre a evolução patrimonial do ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, Gurgel recebeu, no começo da semana, um pedido para que ele avalie também o enriquecimento do senador Aécio Neves (PSDB). Tucanos e petistas esperam que o procurador decida em breve se caberá investigação sobre a ampliação do poder de compra do ministro (no caso da oposição), que recentemente adquiriu dois apartamentos no valor total de 7,5 milhões de reais, e do principal nome da oposição para a disputa presidencial de 2014.
O auto-intitulado Bloco Minas Sem Censura argumenta que Aécio também deve explicações sobre seu estilo de vida nada franciscano ? segundo eles, regada a viagens Brasil, aparições no jet set e carro de luxo. O bloco, formado por deputados estaduais do PT, PC do B, PMDB e PRB de Minas, afirma que existem indícios de sonegação fiscal, ocultação de patrimônio e crime eleitoral nas atividades do senador fora de Brasília. Em dezembro passado, ele se tornou dono da rádio Arco-Íris, numa compra que, segundo os parlamentares, é incompatível com o patrimônio declarado pelo senador (de 617 mil reais). Os deputados querem também que seja investigada a participação de Aécio em outras empresas.
O grupo, encabeçado pelo deputado Sávio Souza Cruz (PMDB), nega que o pedido de investigação seja um contra-ataque às suspeitas levantadas sobre Palocci. Ele argumenta que os pedidos de esclarecimentos são feitos desde que o senador foi multado no Rio de Janeiro ao se negar a fazer um teste do bafômetro, em 17 de abril ? evento anterior à revelação do enriquecimento do ministro.
PT hesita em manifestar apoio público a ministro
Fragilizado desde a revelação de sua evolução patrimonial, o chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, terá nesta quinta-feira 2 uma nova demonstração de seu isolamento político. Reunida em Brasília, a Executiva Nacional do PT, seu partido, descartou na véspera a hipótese de manifestação em apoio de Palocci. Questionado sobre a hipótese de divulgação de nota em favor do ministro, o presidente do PT, deputado Rui Falcão, disse que o caso não está na pauta do partido. ?O governo tem tratado de forma adequada o caso. Ele [Palocci] também. Não cabe ao PT se manifestar sobre isso.? Secretário de Comunicação do PT, o deputado André Vargas (PR), endossa o argumento de que ?essa não é uma questão partidária?.
Segundo o secretário-geral do PT, Eloi Pietá, ?os fatos importantes da política, e a questão do ministro Palocci é um deles, serão abordados? na análise de conjuntura. Mas não há qualquer texto preparado sobre o assunto. A omissão do partido é apontada entre petistas como um mau sinal para Palocci. Petistas reclamam do crescimento de patrimônio de Palocci, que, segundo revelou a Folha, foi multiplicado por 20 em quatro anos.
Ainda segundo Pietá, a montagem de outros pontos a serem debatidos na reunião será: reforma política (com a presença de nossos líderes na Câmara e Senado, e do relator da Comissão de Reforma Política na Câmara), reforma do Estatuto do PT, encaminhamentos relacionados às eleições de 2012. Presidente do PT de São Paulo, o deputado estadual Edinho Silva chamou de equívoco o ?PT fazer coro com a oposição?. ?O PT tem de sair da defensiva. Se Palocci não fosse importante para o governo Dilma, não seria tão atacado.?
O futebol da bandalheira (trecho de editorial de Mino Carta)
Já enxerguei no futebol o ópio do povo brasileiro, embora na adolescência chutasse com gosto não somente a bola, mas também tudo aquilo que se postava diante dos meus pés, inclusive pedras e latas, para desespero dos sapatos e da minha mãe. Que o futebol se prestou e se presta aos jogos da política e favoreceu e favorece o sossego dos herdeiros da casa-grande é inegável. Se Corinthians ou Flamengo ganham, a senzala exulta e esquece seus males.
Hoje a minha visão mudou. Espanta-me a trágica simbiose entre futebol e corrupção. Futebol e interesses torpes. Futebol e dinheiro imundo e exorbitante. Futebol e crime, para ser mais preciso. O fenômeno é mundial antes de ser brasileiro, é extraordinária, porém, a contribuição que alguns nativos ofereceram à metamorfose. João Havelange é primeiro motor, como diria Aristóteles, da transformação comandada do trono da Fifa, é o autor do big-bang.
Foi Havelange quem introduziu e consagrou as manobras, os ardis, as artimanhas pelas quais alguém pode manter o cetro e multiplicar a bandalheira por intermináveis mandatos, e, na hora da aposentadoria, fazer seu sucessor previamente treinado para a tarefa. No caso, o suíço Joseph Blatter. Para ficar em perfeita afinação com este esquema de poder, contamos no Brasil com Ricardo Teixeira, fortalecido pelo apoio do ministro Orlando Silva, com o possível condão de não perceber a diferença entre uma sociedade mafiosa e uma entidade honrada e competente.
O ministro talvez seja cidadão ingênuo. Temo, contudo, que se Totò Riina estivesse no lugar dos atuais próceres (aprendi a palavra ao ler, priscas eras, a Gazeta Esportiva e os monumentais comentários de Thomaz Mazzoni) certamente não faria melhor do que eles. Quero deixar claro que meu tempo de torcedor (do Palmeiras), encerrado ainda na juventude, remonta a uma fase do futebol mais ou menos romântica. Não me sai da memória uma foto que retrata Djalma Santos, finíssimo lateral-direito bicampeão do mundo (58 e 62), a caminhar para o vestiário com as chuteiras debaixo do braço enroladas em papel jornal.
O desmonte da Infraero
Na terça-feira 31 de maio, a presidenta Dilma Rousseff anunciou a concessão de três aeroportos, Guarulhos, Viracopos (Campinas) e Brasília, que passarão ao controle societário da iniciativa privada, que, também, será responsável pela operação desses locais. Dois dias depois, foi anunciado que também serão privatizados os aeroportos do Galeão, no Rio de Janeiro, e Confins, em Belo Horizonte.
A presidenta Dilma Rousseff ignorou o documento elaborado pela Infraero e encaminhado às autoridades competentes pelo conselho de administração da empresa, que aniquila inteiramente o relatório da multinacional McKinsey, que, contratada pelo governo, elaborou o relatório Estudo do Setor do Transporte Aéreo no Brasil, que norteia as decisões tomadas agora.
Uma observação à parte: a iniciativa mostra um descaso absoluto com a engenharia nacional.
Se o governo supôs que os técnicos nacionais optariam pela manutenção do modelo (estatal) existente, deveria considerar que as empresas estrangeiras, como a McKinsey, estão inevitavelmente comprometidas com o processo de privatização. O modelo da concessão prevê a entrega de 51% do controle dos aeroportos para os investidores privados. A Infraero ficará com 49%. Isso marca uma mudança de modelo que, na prática, significa a implosão da Infraero, uma das mais bem-sucedidas empresas aeroportuárias do mundo.
Economia agora deve desaquecer, diz analista
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) divulgou, nesta sexta-feira 3, que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu 6,2% no acumulado dos últimos 12 meses, em comparação com os quatro trimestres anteriores. Nos primeiros três meses de 2011, o aumento foi de 1,3% sobre o ano passado. Porém, uma queda no ritmo da economia já é esperada, em decorrência das medidas do governo para conter a inflação, por exemplo.
?O governo quer ter um controle mais eficaz da inflação agora, para poder crescer mais no futuro sem pressão?, afirma o mestre em Controladoria e Contabilidade e membro da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais (Anbima).
Essa desaceleração pôde ser notada nos dados do IBGE na indústria, com a queda no crescimento de 4,3% no quarto trimestre de 2010 para 3,5% no primeiro trimestre de 2011. Movimento que deve afetar também o setor primário (agricultura), segundo Cambria. ?Medidas como a elevação da taxa básica de juros e o controle de dólares ? em menor escala ? tornam mais caro para o empresário investir nessas áreas da economia?, diz. ?O fim dos incentivos do governo durante a crise, como redução no IPI, e a arrecadação de impostos também influenciaram nessa queda?, completa.
O setor de serviços, que no primeiro trimestre de 2010 cresceu 4,2%, deve ser a exceção. ?O povo está com dinheiro para gastar e em algumas áreas o trabalhador tem até poder de barganha no salário, devido à escassez de mão-de-obra?, avalia. No entanto, a diminuição do consumo das famílias após três períodos seguidos pode indicar uma mudança neste cenário no futuro. ?Foram registrados seguidos aumentos na alimentação e aluguel, o que leva as famílias a cortarem gastos?, explica Marcelo Cambria.
No olho mecânico
Na semana anterior ao segundo turno da eleição presidencial peruana de 5 de junho, era impossível arriscar um palpite sobre o vencedor. Ollanta Humala venceu o primeiro turno e saiu à frente nas primeiras pesquisas para o segundo turno até a primeira semana de maio. Keiko Fujimori ultrapassou-o na maioria das pesquisas divulgadas a partir de 8 de maio, mas sua vantagem se estreitou para um empate técnico (com vantagem de Humala em uma das cinco) nas últimas publicadas antes da proibição legal, em 29 de maio.
Nos últimos dias, Humala teve uma marcha a seu favor, organizada por -ONGs, para lembrar as violações de direitos humanos na era Fujimori, com 15 mil participantes em Lima. A maioria dos indecisos está entre os pobres e o eleitorado é volátil: dos cinco principais candidatos, quatro tiveram vez de liderar as pesquisas antes do primeiro turno e todos chegaram a ser pelo menos vice-líderes. Segundo informações extra-oficiais, várias pesquisas não publicadas indicam que Humala de fato passou à frente durante a última semana.
No último debate entre os candidatos, também no dia 29, Humala manteve Keiko Fujimori sob pressão o tempo todo, lembrando os abusos cometidos por seu pai, Alberto, principalmente a esterilização forçada de 300 mil mulheres e o desvio provado de 600 milhões de dólares. Keiko perdeu a calma: ?A candidata sou eu, não Alberto Fujimori. Sou eu quem tomará as decisões. Se quer debater com ele, vá à Diroes (o quartel da polícia onde o pai está preso)?. Não é convincente: poucos no Peru duvidam de que ela seria uma ?laranja? do pai.
O contra-ataque concentrou-se na tese de que Humala seria ?ameaça aos investimentos? e em uma denúncia por suposta violação de direitos humanos por Humala quando capitão do Exército, em 1992. Se verdadeira, teria sido sob as ordens do então presidente Alberto Fujimori. O candidato respondeu que foi absolvido ?pela mesma Justiça que condenou seu pai?. Ganhou por pontos: a maioria não viu um vencedor contundente.
Distorções ideológicas
Existe uma piada maravilhosamente dialética em Ninotchka, de Ernst Lubitsch-: o herói visita uma cafeteria e pede café sem creme; o garçom responde: ?Desculpe, mas o creme acabou. Posso lhe trazer café sem leite?? Em ambos os casos o cliente recebe somente café, mas este é sempre acompanhado de uma negação diferente, primeiro café sem creme, depois café sem leite. O que encontramos aqui é a lógica da diferencialidade, em que a própria ausência funciona como uma característica positiva.
Por que perder tempo com piadas dialéticas? Porque elas nos permitem compreender em seu sentido mais puro como funciona a ideologia em nossos tempos supostamente pós-ideológicos. Para detectar as chamadas distorções ideológicas, devemos notar não apenas o que é dito, mas a complexa interação entre o que é dito e o que não é dito: o não dito está implícito no que é dito. Recebemos café sem creme ou café sem leite?
Vamos tomar um exemplo do Oriente Médio: em 1º de março de 2009, foi divulgado que o governo israelense tinha planos de construir mais de 70 mil novas unidades habitacionais em assentamentos judeus na Cisjordânia ocupada. Se implementados, os planos poderiam aumentar o número de colonos nos territórios palestinos em cerca de 300 mil, medida que não apenas minaria gravemente as possibilidades de um Estado árabe viável, como também impediria a vida cotidiana dos palestinos. Um porta-voz do governo desmentiu a reportagem, afirmando que os planos tinham relevância limitada: a construção real de novas casas nos assentamentos exigia a aprovação do ministro da Defesa e do primeiro-ministro.
No entanto, 15 mil projetos já foram totalmente aprovados. Além disso, quase 20 mil das unidades planejadas estão em assentamentos distantes da ?linha verde? que separa Israel da Cisjordânia, isto é, em áreas que Israel não pode pretender manter em qualquer futuro acordo de paz com os palestinos. A conclusão é óbvia: enquanto diz defender a solução de dois Estados, Israel cria ativamente no terreno a situação que de fato tornará impossível uma solução de dois Estados. O sonho subjacente a esta política é mais bem representado pelo muro que separa a cidade dos colonos da cidade palestina em um morro em algum lugar da Cisjordânia. O lado israelense do muro é pintado com a imagem da paisagem campestre além do muro, mas sem a cidade palestina, mostrando apenas a natureza, capim, árvores? Não é isto limpeza étnica no mais puro grau, imaginar a paisagem além do muro como deveria ser, vazia, virginal, esperando para ser colonizada?
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