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Congresso em Foco
10/10/2009 6:20
Jamais pensei em entrar numa livraria e não querer comprar nenhum título em exposição, mas foi exatamente o que aconteceu ao passear pela book shop da sala de embarque do aeroporto Santos Dummont, voltando para São Paulo da Bienal do Livro no Rio. À vista, nenhum elemento de ficção em meio a dezenas de auto-ajudas fajutíssimas, market neoliberal, cem mil maneiras de gastar papel, tinta e jogar meu dinheiro fora no formato 14X21, pocket ou capa-dura.
Naturalmente nem pensar em revistas tipo Caras, Poderosos, Bons Fluidos, Boa Forma, Bravo, Criativa, Cosmopolitan, Casamento, Corpo, Cabelos, Casamento, Exame, Época, IstoÉ, Veja, Vida & Saúde, Vida Simples, Women's Health, Car, Cool, Running, VIP, Uma. Me senti literalmente desesperada no meio disso e a perspectiva de duas tediosas horas sem nada para ler. Até porque ler isso te deixa besta.
A escritora Marina Colasanti definiu bem essa sensação quando, diante da estante promocional da Barnes & Noble na Sétima Avenida em Nova York[1], sob o rótulo "Fábulas da Mulher Moderna", proliferavam os seguintes títulos: Slave of fashion (Escrava da moda), Good in bed (Boa de cama), Filthy rich (Terrivelmente rica), The accidental virgin (A virgem acidental), I do but I don't (Eu faço, mas não faço), The dominant blonde (A loura dominadora), The dictionary of failed relationships (Dicionário das relações fracassadas), ao todo 36 livros na mesma linha. De deixar qualquer um maluco, uma lobotomização definitiva a preços imperdíveis.
E todos prometendo "muita diversão", dizendo-se "engraçadíssimos", que as leitoras iriam "morrer de rir". Naturalmente, eu e Marina não achamos graça nenhuma, porque só podemos interpretar tais títulos como sismógrafos da presente "falta de espírito de época", ou ausência absoluta de "presença de espírito" - e isso seria um mero jogo de palavras não fosse a "presença de espírito" a pré-condição do humor genuíno.
Marina comenta que ninguém nos prometia gargalhadas nas décadas de 70 e 80 quando procurávamos na livrarias títulos, por exemplo, sobre a modernidade do feminino. Aliás, ninguém esperava que Simone de Beauvoir fosse "engraçada". "Buscar a seção 'Mulher' equivalia a um encontro com a Antropologia, Sociologia, História, Psicologia. (...) Hoje essa seção foi substituída por 'Estudos de Gênero', onde as mulheres aparecem mais vinculadas ao homossexualismo do que a qualquer outra coisa. As mulheres foram transferidas para o setor 'Comportamento', uma vaga mistura de auto-ajuda e aconselhamento amoroso".
Pois é. Voltamos ao consultório sentimental. De onde nunca deveríamos ter saído. Antes a palavra de ordem era "pensar", agora é "divertir-se". Se antes a mulher refletia sobre sua condição, hoje ri dela. Não sem poucos motivos, embora a maioria esteja rindo por todas as razões erradas. Colasanti considera que se tornou cômica "a busca feminina pelo amor, como se o amor fosse um resíduo ridiculamente romântico a ser descartado com a modernidade".
Mas quantas vezes não cantei a bola de que houve um retrocesso na sociedade contemporânea, não só no feminismo, mas nos costumes de maneira geral? Porque o fato é que essa busca estéril, ridícula, inútil e estúpida do amor é algo que castiga a todos, homens e mulheres.
Assim, como Marina, finalizo com a reflexão de Octavio Paz: "Acho que o amor virou uma abstração. A alma tornou-se um departamento do sexo, e o sexo se tornou um departamento da política [e da mídia pop, digo eu]. Se a nossa sociedade vai se recuperar, temos que recuperar a ideia de amor, essa é a coisa mais importante. Se não encontrarmos isso, a vida será um deserto".
Podem apostar.
[1] In Fragatas para Terras Distantes: Rio, Record, 2004.
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