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Congresso em Foco
8/2/2006 | Atualizado 17/2/2006 às 5:13
Diego Moraes
Considerada a nova "ameaça global" pela União Européia, a gripe aviária começa a despontar como a primeira grande epidemia do novo século. Até agora, das 169 pessoas infectadas, 91 morreram. A Organização Mundial de Saúde (OMS), órgão das Nações Unidas, deu início às pesquisas para desenvolver uma vacina e conter o avanço da doença. Mas, por conta de um entrave legislativo, o Brasil pode não recebê-la e ficar ilhado no caso de um surto da chamada gripe do frango.
O alerta é do biólogo e professor da Universidade de São Paulo (USP) Fernando Reinach. Ele explica que, por enquanto, o H5N1 - vírus causador da gripe aviária - só passa de aves para pessoas. A perspectiva é de que, em breve, o vírus possa sofrer mutações que o tornem capaz de ser transmitido entre humanos.
Adiantando-se às mutações do vírus, a OMS está produzindo uma vacina que combate os microorganismos antes mesmo de a transmissão começar a ocorrer entre humanos. Mas, para fabricar o medicamento, os cientistas precisam alterar a estrutura genética do H5N1, procedimento que o tornaria um organismo geneticamente modificado (OGM) - ou seja, um transgênico.
O receio de alguns especialistas, como Reinach, é que o país tenha dificuldade para receber a vacina transgênica, cuja importação depende do aval da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, a CTNBio. O colegiado, vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia, foi criado pela antiga Lei de Biossegurança e é composto por 12 representantes da comunidade científica.
Restrições em nome da saúde
Aprovada após intenso debate no Congresso há pouco mais de um ano, a nova Lei de Biossegurança impõe restrições para a produção e a importação de organismos geneticamente modificados. Não é à toa que se pretende controlá-los. Muitos especialistas ainda temem por eventuais danos causados ao consumidor pelos transgênicos, como a possível potencialização dos efeitos de substâncias tóxicas e o aumento das alergias alimentares. Por causa dessa incerteza, a lei estabelece que a importação e a produção de OGMs só podem ser liberadas com o aval da CTNBio.
O problema é que a comissão - que não delibera há oito anos, por causa de problemas burocráticos - só voltou a funcionar na última quarta-feira, quando se reuniu para escolher o seu novo presidente. As deliberações só devem ser retomadas no fim de março. A paralisação gerou atraso no andamento de pesquisas e, por isso, a pauta do órgão está abarrotada, com mais de 500 processos na fila. Desses, cerca de 90 são pedidos de liberação de estudos com transgênicos.
"A lei privilegiou a segurança em vez da agilidade. Não digo que a segurança é desnecessária, mas é preciso haver um balanço. Já se tentou trazer vírus para testar o processo de liberação e não foi aprovada a entrada", afirma Reinach. "Se a epidemia começar, a OMS vai querer mandar a vacina. Daí, ou a comissão acelera a importação ou teremos de usar uma vacina ilegal", alerta o biólogo.
Além do atraso no funcionamento da CTNBio, a burocracia e a demora na análise dos processos são outros entraves que o professor da USP considera cruciais para a entrada da vacina no país. Segundo ele, a Lei de Biossegurança estabelece critérios muito rígidos para a importação de transgênicos, o que faz a comissão técnica demorar meses para analisar um processo.
A preocupação de Reinach é compartilhada pela presidente da Associação Nacional de Biossegurança (ANBio), Leila Oda. "É uma observação oportuna e pertinente. A lei no Brasil é avançada, mas pode criar uma burocratização na avaliação", sustenta.
Cientistas divergem
Mas nem todos os cientistas pensam assim. Para o professor da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Silvio Valle, especialista em biotecnologia, não há chance de a burocracia inviabilizar a importação da vacina caso a gripe aviária chegue ao Brasil. "Não há a menor chance de uma burocracia impedir a importação. A CTNBio não vai criar problema nesse caso", acredita.
O coordenador de Biossegurança do Departamento de Defesa Agropecuária do Ministério da Agricultura, Marcus Coelho, também aposta na sensibilidade da CTNBio. Ele considera remota a possibilidade de o país ficar sem vacina no caso de um surto de gripe aviária. "Se for um caso de calamidade pública, a CTNBio vai parar tudo o que estiver fazendo para analisar esse processo", pondera.
Marcus lembra, no entanto, que a entrada da vacina no país precisará enfrentar os mesmos critérios a que estão submetidos os demais OGMs. "A importação depende do aval da CTNBio", ressalta. O coordenador alerta que, do contrário, a vacina chegará ao Brasil de forma ilegal, o que pode resultar em pena de um a três anos de detenção, além de multa de R$ 1,5 mil a R$ 2,5 milhões para os importadores.
Congresso
De acordo com o relator da Lei de Biossegurança na Câmara, Darcísio Perondi (PMDB-RS), os parlamentares pouco podem fazer nesse caso, já que o aval da CTNBio é uma exigência da legislação aprovada. "Não temos o poder de interferir porque a lei já foi aprovada e tem que ser cumprida dessa forma. Só que o Palácio do Planalto demorou nove meses para colocá-la em vigor, o que atrasou dezenas de pesquisas", afirma o deputado. Segundo ele, somente a Casa Civil tem autoridade para acelerar o processo de legalização de OGMs.
De acordo com estudo publicado nesta sexta-feira por cientistas australianos do Lowy Institute, uma eventual pandemia de gripe aviária poderia matar 142 milhões de pessoas e custar US$ 4,4 trilhões. O relatório indica que, mesmo se uma pandemia for moderada, a propagação do vírus entre os humanos teria um impacto notável. No melhor cenário, ressalta a publicação, 1,4 milhão de pessoas morreriam, e o custo da doença ficaria em cerca de US$ 330 bilhões.
Desde o primeiro registro, em 2003, no Vietnã, a gripe aviária já passou por Nigéria, Indonésia, Camboja, China, Filipinas, Japão, Tailândia, Iraque, Turquia, Alemanha, Áustria, Itália, Romênia, Suécia, Sérvia e Montenegro, Grécia, Colômbia e Estados Unidos. O vírus foi encontrado primeiramente em frangos, mas já se confirmou a infecção de aves migratórias, que, durante o período de frio no hemisfério norte, migram para a região Sul. O continente sul-americano costuma ser um dos destinos preferidos desses animais.
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