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Armas e gênero
25/6/2025 10:42
Arma de fogo é poder e, nas mãos erradas, é também sentença de morte. Para milhares de mulheres na América Latina, a presença de armas dentro de casa transforma o espaço que deveria ser de proteção em um território de medo. Há gênero na política de liberação de armas: em quem ambiciona sua posse e em quem sofre com seu uso. Homens matam homens, mas também matam mulheres, esposas, namoradas, ex-companheiras, mães e filhas. O homicídio é uma categoria penal genérica e nesse contexto o feminicídio é um grito de socorro na América Latina: somos de uma região do mundo em que as mulheres mais morrem por seus vínculos afetivos com os agressores.
A relação entre o acesso facilitado a armas de fogo e o aumento da violência de gênero tem sido cada vez mais evidenciada por dados e estudos internacionais. Nesse contexto, a realização da quarta edição do Encontro Parlamentar sobre Armas e Gênero, no Ceará, representa um marco significativo na agenda de políticas públicas que visam à proteção das mulheres na América Latina. O evento é fruto de articulação diplomática entre o nosso mandato, parlamentares latino-americanos e o Secretariado do Tratado sobre o Comércio de Armas (TCA), sediado em Genebra.
Desde que o Brasil ratificou o TCA em 2018, após sua assinatura pela então presidenta Dilma Rousseff em 2013, o nosso país tem buscado alinhar sua legislação aos princípios do tratado, com foco na redução da circulação de armas e no enfrentamento à violência armada. As estatísticas demonstram que quanto maior o número de armas, mais vítimas temos entre mulheres e crianças, evidenciando como o armamento da sociedade civil pode agravar quadros de violência doméstica e feminicídio.
O fortalecimento da cooperação regional é um passo estratégico: promove o intercâmbio de experiências entre países que compartilham realidades semelhantes e permite identificar boas práticas que podem ser adaptadas ao contexto de cada país. O controle de fronteiras, o rastreamento de armas e o combate ao desvio de armamentos em transações internacionais são medidas urgentes, sobretudo em territórios marcados pelo crime organizado, onde mulheres estão mais expostas à violência.
Muitas das armas utilizadas por facções criminosas vêm do comércio irregular e de falhas no controle internacional, em flagrante descumprimento ao TCA. Conter esse fluxo ilegal é indispensável para promover a paz e garantir a segurança de mulheres, crianças e famílias inteiras.
A realização do encontro no Ceará reforça o compromisso do Brasil com uma agenda de desarmamento responsável, com recorte de gênero, e abre caminhos para uma cooperação mais sólida entre os países da região. O combate à violência de gênero passa, necessariamente, pelo controle rigoroso da circulação de armas, um desafio que é político, cultural e humanitário.
É importante frisar que políticas de liberação da posse de armas têm consequências gravíssimas, com risco potencial de aumento da violência inter e intrapessoal, elevando o número de óbitos, bem como o de pessoas com sequelas físicas e mentais. Essa é uma realidade que afeta a todos, mas atinge com mais força os grupos vulneráveis, já impactados pelas desigualdades sociais, econômicas e culturais.
Mesmo em nações reconhecidas por sua tranquilidade, como o Uruguai, as armas de fogo continuam sendo o principal meio utilizado em casos de feminicídio. No Brasil, estima-se que, anualmente, cerca de 2.200 mulheres sejam assassinadas com o uso de armas de fogo no país, numa média de seis por dia. Em 2023, foram registradas 3.946 mortes de mulheres, das quais metade ocorreu por disparos. Mulheres negras compuseram 68% desse total de vítimas.
Outro dado alarmante: em um a cada três casos de violência não letal com arma, a vítima já havia registrado denúncia prévia de violência doméstica. Essa constatação reforça a urgência de integrar uma perspectiva de gênero nas políticas públicas de controle de armas.
Por isso, este Encontro Parlamentar é mais do que simbólico, é ação concreta para salvar vidas. Estamos aqui para fortalecer a cooperação parlamentar e interinstitucional na implementação do Tratado sobre o Comércio de Armas, buscando prevenir desvios, reduzir a circulação de armamentos e, sobretudo, diminuir a violência armada contra as mulheres.
Este é um compromisso com a paz, a justiça e os direitos humanos.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].