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Direito

Reforma do Código Civil: liberdade patrimonial e riscos sociais na sucessão do cônjuge

Excluir o cônjuge da herança obrigatória garante autonomia, mas pode deixar mulheres em situação de vulnerabilidade.

Fernanda Pederneiras

Fernanda Pederneiras

7/10/2025 17:00

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A instalação da comissão especial no Senado para discutir a reforma do Código Civil recoloca em pauta um dos debates mais polêmicos e sensíveis do Direito de Família e Sucessões: a posição do cônjuge e do companheiro na ordem sucessória. Trata-se de um tema que, há anos, provoca intensas discussões acadêmicas, insegurança jurídica e grande repercussão social.

Desde a entrada em vigor do atual Código Civil, em janeiro de 2003, a sociedade tem demonstrado rejeição à condição do cônjuge como herdeiro necessário, sobretudo diante da possibilidade de concorrer com os descendentes, especialmente nos casos em que o regime de bens pactuado é o da separação total. Na prática, a lei acabou se distanciando da realidade social, criando situações de conflito e frustração, principalmente em famílias recompostas ou em uniões de curta duração.

O projeto de reforma apresentado ao Senado busca enfrentar esse desconforto, promovendo mudanças profundas na sucessão legítima. Entre as principais alterações, estão a exclusão do cônjuge e do companheiro do rol de herdeiros necessários - o que significa que eles não terão mais direito à herança em caráter obrigatório - e o afastamento da concorrência sucessória com descendentes e ascendentes, medida que pretende evitar disputas patrimoniais entre os filhos e genitores do falecido com o consorte sobrevivente. Além disso, há o reposicionamento do cônjuge e do companheiro na ordem de vocação hereditária, que passam a ocupar o terceiro lugar, herdando apenas na ausência de filhos e pais.

A proposta também prevê a possibilidade de renúncia à herança por meio de pacto antenupcial, pós-nupcial ou escritura pública em caso de união estável. Essa renúncia, porém, será considerada ineficaz quando o sobrevivente não possuir patrimônio ou renda suficiente para a própria subsistência - nesses casos, ele poderá requerer ao juiz, no prazo de 180 dias, a fixação dos limites e da extensão da renúncia. Por fim, o texto assegura ao cônjuge ou companheiro sobrevivente em situação de vulnerabilidade econômica o usufruto de determinados bens da herança, garantindo meios mínimos de subsistência.

Essas alterações caminham no sentido de prestigiar a autonomia da vontade dos casais, permitindo que eles definam os efeitos patrimoniais não apenas em caso de dissolução da relação em vida, mas também após a morte. A escolha pelo regime de bens, que hoje interfere diretamente na posição sucessória do consorte, deixaria de produzir impacto automático na herança.

Reforma do Código Civil privilegia a liberdade patrimonial, mas requer cautela diante das desigualdades de gênero e renda.

Reforma do Código Civil privilegia a liberdade patrimonial, mas requer cautela diante das desigualdades de gênero e renda.Freepik

Mais do que um ajuste técnico, a mudança dialoga com os novos arranjos familiares. O modelo de família baseado no casamento indissolúvel, com pai e mãe casados por toda a vida, deixou de ser predominante. Relações menos longevas, uniões em que cada parceiro já possuía patrimônio prévio, famílias recompostas com filhos comuns e unilaterais, casais financeiramente independentes e diferenças significativas de idade entre os cônjuges compõem um cenário plural, que demanda novas respostas jurídicas.

Contudo, se por um lado o projeto atende aos anseios de liberdade e adaptações às novas realidades culturais, por outro suscita preocupações legítimas. Uma delas é a desigualdade econômica ainda presente entre homens e mulheres. Muitos casamentos e uniões estáveis ainda são marcados por assimetrias de renda e pela dependência financeira de um dos parceiros, em geral da mulher. Nesses casos, a supressão da condição de herdeira necessária pode resultar em vulnerabilidade extrema, com queda abrupta no padrão de vida da sobrevivente.

Outro ponto a ser considerado é a necessidade de maior conscientização sobre o planejamento patrimonial. Ao retirar do cônjuge a condição de herdeiro necessário, a reforma transfere para os casais a responsabilidade de organizar de forma preventiva seus bens e direitos. Isso exige não apenas informação jurídica acessível, mas também políticas públicas que incentivem a educação patrimonial e financeira da população.

Não se trata, portanto, de uma mera alteração técnica, mas de uma mudança estrutural na forma como o Estado regula a sucessão familiar. A proposta busca conciliar liberdade individual e segurança patrimonial, mas precisa ser conduzida com cautela para não ampliar vulnerabilidades sociais.

A reforma do Código Civil deve ser compreendida, acima de tudo, como um retrato da transformação social. O direito de família e sucessões não pode permanecer alheio às novas configurações familiares, mas também não deve ignorar que ainda vivemos em um país marcado por desigualdades econômicas, de gênero e de oportunidades.

É indispensável que as leis acompanhem o caminhar dos avanços da sociedade, mas com equilíbrio e responsabilidade. O desafio do Senado será encontrar esse ponto de convergência: assegurar maior liberdade patrimonial sem comprometer a função protetiva do direito sucessório.


O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].

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