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Cultura
12/11/2025 | Atualizado às 15:01
A abertura da consulta pública pelo Ministério da Cultura, em 1º de novembro de 2025, para "aprimorar o normativo da Lei Rouanet" (MinC, 2025), medida marca o reconhecimento tardio da atual gestão de uma crise que é antiga. A lei, essencial ao fomento cultural, tornou-se símbolo de críticas, polarização política, desigualdade estrutural e falhas administrativas. O prazo aberto até 15 de novembro mobiliza o setor, mas impõe uma dúvida: bastará uma revisão normativa para corrigir um modelo corroído por contradições jurídicas e sociais?
Desde os anos 1990, a Rouanet foi defendida como mecanismo liberal de descentralização cultural. Na prática, consolidou-se como política de concentração. O Observatório Ibira30 em parceria com a Universidade Federal do ABC (UFABC) mostrou que o bairro de Pinheiros, em São Paulo, concentra mais recursos do que metade da cidade, e não chega na periferia, enquanto em estudo da OCB Mérito no julgamento de projetos nas leis de incentivo à cultura, havia revelado que 80% dos recursos de todo Brasil ficam concentradas em bairros nobres de duas capitais do centro-oeste (2012). Um padrão também visto na Lei Aldir Blanc, na série "A Crise da Cultura".
Reportagens de Eduardo Moura e Matheus Rocha somam com análises de Mário Pragmácio e Cecília Rabelo, que apontam o paradoxo central do funcionamento da lei: são as empresas que decidem o que é cultura com recursos públicos, convertendo incentivo fiscal do governo em marketing.
O livro 40º Aniversário do Ministério da Cultura, lançado pelo Observatório da Cultura do Brasil (OCB) em 2025, reforçou o diagnóstico. Estudo baseado em acórdãos do TCU e CGU, revelou o passivo de 26 mil projetos sem prestação de contas e a falta de governança do órgão, enquanto apenas 2% da população acessa aos produtos culturais resultantes. Em relação à gestão de contas, um dos maiores jornais do Brasil noticiou que o Ministério da Cultura enfrenta "crise aguda", enquanto Manoel Neto e Rodrigo Duarte, no mesmo jornal, afirmaram que o ministério "oculta um passivo que se arrasta há décadas.
Pragmácio e Rabelo, no mês de outubro passado, lembraram que o MinC tem promovido iniciativas para distribuir melhor os recursos, como os programas Rouanet: Juventude, Norte, Favelas, Nordeste e Rio Grande do Sul, porém, além de muito específicos, não dão cobertura a diversidade da social, artística ou regional, além disso não são editais perenes, muito menos o montante de recursos é significativo, ficando como medidas paliativas.
A reação do MinC começou tardiamente, e só começou apenas após as críticas ganharem repercussão pública. Artigo divergente assinado pela ministra da cultura, Margareth Menezes, defendendo avanços administrativos, com informações incompletas, foram expostas por Manoel Neto e Rodrigo Duarte, em resposta denunciando maquiagem institucional, revelando o embate entre gestão e controle social. O OCB em parceria com Passa Palavra analisou o comunicado oficial do MinC e concluiu que a reportagem que o ministério mantém opacidade nos dados e nos critérios de avaliação, faltando transparência sobre investimentos na lei Rouanet, e tendência de ampliação de crise do passivo, que agora se confirma com a ampliação da crise de prestação de contas, já que pelo terceiro ano, MinC bate recorde histórico e recebe mais de 22,5 mil novas propostas culturais na Lei Rouanet.
Agora, com a abertura de consulta pública o MinC chamuscado pela crise da Lei do Streaming, avalia custos da participação democrática e riscos políticos, tentando mostrar disposição ao diálogo, mas é vista como resposta política, devido a aproximação de 2026. Pragmácio e Rabelo lembram que as melhorias propostas pela atual gestão, não foram incluídas na raiz da Lei Rouanet, mas estariam em meras normativas. Segundo o livro sobre os 40 anos do MinC, sem reforma legal ampla, a revisão normativa não enfrentará as raízes do problema.
Segundo o cientista político Manoel J. de Souza Neto, as distorções da Rouanet são estruturais, envolvendo a renúncia fiscal, publicidade privada e ausência de regulação efetiva. E complementa que "sem compatibilizar a lei ao Sistema e ao Plano Nacional de Cultura, o MinC corre o risco de tratar sintomas sem curar a doença, um sistema que, há três décadas, distribui desigualmente o direito de fazer cultura no Brasil, ao mesmo tempo sendo o principal mecanismo de fomento à cultura. Não, não é pra acabar com a Rouanet, mas uma reforma total da lei é necessária". Algumas propostas foram apresentadas pelos especialistas, por exemplo, a proposta de projeto de lei 1.730/23, que tramita na Câmara dos Deputados, permitirá que qualquer cidadão possa utilizar seu IR para escolher que projeto cultural poderá patrocinar. Outra questão pendente é a obrigatoriedade da equidade e distribuição proporcional dos recursos entre os estados brasileiros. Uma normativa resolve, ou a legislação inteira é que precisa ser atualizada?
Referências
BRASIL. Ministério da Cultura. MinC realiza consulta pública para aprimoramento de normativo da Lei Rouanet. Brasília: MinC, 01 nov. 2025. Disponível em: [https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/noticias/minc-realiza-consulta-publica-para-aprimoramento-de-normativo-da-lei-rouanet](https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/noticias/minc-realiza-consulta-publica-para-aprimoramento-de-normativo-da-lei-rouanet). Acesso em: 7 nov. 2025.
BRASIL. Ministério da Cultura. Pelo terceiro ano, MinC bate recorde histórico e recebe mais de 22,5 mil propostas culturais da Lei Rouanet. Brasília: MinC, 05 nov. 2025. Disponível em: [https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/noticias/pelo-terceiro-ano-minc-bate-recorde-historico-e-recebe-mais-de-22-5-mil-propostas-culturais-da-lei-rouanet-1](https://www.gov.br/cultura/pt-br/assuntos/noticias/pelo-terceiro-ano-minc-bate-recorde-historico-e-recebe-mais-de-22-5-mil-propostas-culturais-da-lei-rouanet-1). Acesso em: 7 nov. 2025.
CÂMARA DOS DEPUTADOS. Comissão aprova proposta que prevê doação para cultura na declaração do Imposto de Renda (PL 1.730/2023). Brasília, 2025. Disponível em: [https://www.camara.leg.br/noticias/986570-comissao-aprova-proposta-que-preve-doacao-para-cultura-na-declaracao-do-imposto-de-renda/](https://www.camara.leg.br/noticias/986570-comissao-aprova-proposta-que-preve-doacao-para-cultura-na-declaracao-do-imposto-de-renda/). Acesso em: 7 nov. 2025.
DUARTE, Rodrigo Juste. Funcionários públicos e agentes influentes são premiados em editais de cultura que têm pareceres frágeis. Le Monde Diplomatique Brasil, São Paulo, 2022. Disponível em: [https://diplomatique.org.br/funcionarios-publicos-e-agentes-influentes-sao-premiados-em-editais-de-cultura-que-tem-pareceres-frageis/](https://diplomatique.org.br/funcionarios-publicos-e-agentes-influentes-sao-premiados-em-editais-de-cultura-que-tem-pareceres-frageis/). Acesso em: 7 nov. 2025.
DUARTE, Rodrigo Juste. Lei Aldir Blanc e os editais do Cercadinho de Curitiba. Le Monde Diplomatique Brasil, São Paulo, 2022. Disponível em: [https://diplomatique.org.br/lei-aldir-blanc-e-os-editais-do-cercadinho-de-curitiba/](https://diplomatique.org.br/lei-aldir-blanc-e-os-editais-do-cercadinho-de-curitiba/). Acesso em: 7 nov. 2025.
DUARTE, Rodrigo Juste. Lei Aldir Blanc: má distribuição e erros de gestão confirmados pelo TCE-PR. Le Monde Diplomatique Brasil, São Paulo, 2023. Disponível em: [https://diplomatique.org.br/lei-aldir-blanc-ma-distribuicao-e-erros-de-gestao-confirmados-pelo-tce-pr/](https://diplomatique.org.br/lei-aldir-blanc-ma-distribuicao-e-erros-de-gestao-confirmados-pelo-tce-pr/). Acesso em: 7 nov. 2025.
DUARTE, Rodrigo Juste. TCE-PR confirma concentração de premiações repetidas na Lei Aldir Blanc. Le Monde Diplomatique Brasil, São Paulo, 2022. Disponível em: [https://diplomatique.org.br/tce-pr-confirma-concentracao-de-premiacoes-repetidas-na-lei-aldir-blanc/](https://diplomatique.org.br/tce-pr-confirma-concentracao-de-premiacoes-repetidas-na-lei-aldir-blanc/). Acesso em: 7 nov. 2025.
LE MONDE DIPLOMATIQUE BRASIL. Dossiê: A Crise da Cultura. São Paulo, 2022-. Disponível em: [https://diplomatique.org.br/crise-cultura/](https://diplomatique.org.br/crise-cultura/). Acesso em: 7 nov. 2025.
MENEZES, Margareth. O fim do passivo de prestação de contas do Ministério da Cultura. Folha de S.Paulo, São Paulo, 08 abr. 2025. Disponível em: [https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/04/o-fim-do-passivo-de-prestacao-de-contas-do-ministerio-da-cultura.shtml](https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/04/o-fim-do-passivo-de-prestacao-de-contas-do-ministerio-da-cultura.shtml). Acesso em: 7 nov. 2025.
MOURA, Eduardo; ROCHA, Matheus. Margareth Menezes, nos 40 anos do MinC, enfrenta crise aguda na prestação de contas. Folha de S.Paulo, São Paulo, 15 mar. 2025. Disponível em: [https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2025/03/margareth-menezes-nos-40-anos-do-minc-enfrenta-crise-aguda-na-prestacao-de-contas.shtml](https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2025/03/margareth-menezes-nos-40-anos-do-minc-enfrenta-crise-aguda-na-prestacao-de-contas.shtml). Acesso em: 7 nov. 2025.
MOURA, Eduardo; ROCHA, Matheus. Ministério da Cultura completa quatro décadas confrontado por pressões. Folha de S.Paulo, São Paulo, 15 mar. 2025. Disponível em: [https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2025/03/ministerio-da-cultura-completa-quatro-decadas-confrontado-por-pressoes.shtml](https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2025/03/ministerio-da-cultura-completa-quatro-decadas-confrontado-por-pressoes.shtml). Acesso em: 7 nov. 2025.
NETO, Manoel J. de Souza. Mérito no julgamento de projetos nas leis de incentivo à cultura. Observatório da Cultura / Vermelho.org.br, 10 ago. 2012. Disponível em: [https://vermelho.org.br/2012/08/10/merito-no-julgamento-de-projetos-nas-leis-de-incentivo-a-cultura/](https://vermelho.org.br/2012/08/10/merito-no-julgamento-de-projetos-nas-leis-de-incentivo-a-cultura/). Acesso em: 7 nov. 2025.
NETO, Manoel J. de Souza; DUARTE, Rodrigo Juste. Ministério da Cultura oculta realidade de passivo gigante que se arrasta há décadas. Folha de S.Paulo, São Paulo, 21 abr. 2025. Disponível em: [https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/04/ministerio-da-cultura-oculta-realidade-de-passivo-gigante-que-se-arrasta-ha-decadas.shtml](https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/04/ministerio-da-cultura-oculta-realidade-de-passivo-gigante-que-se-arrasta-ha-decadas.shtml). Acesso em: 7 nov. 2025.
OBSERVATÓRIO DA CULTURA DO BRASIL. 40º Aniversário do MinC: uma análise da gestão diante de condenações do órgão em auditorias do TCU e CGU. Curitiba: Observatório da Cultura do Brasil, 2025.
OBSERVATÓRIO DA CULTURA DO BRASIL. Livro 40º Aniversário do MinC. Curitiba: Observatório da Cultura do Brasil, 2025.
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PRAGMÁCIO, Mário; RABELO, Cecília. O que há de novo na velha Rouanet? Folha de S.Paulo, São Paulo, 21 out. 2025. Disponível em: [https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/10/o-que-ha-de-novo-na-velha-rouanet.shtml](https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2025/10/o-que-ha-de-novo-na-velha-rouanet.shtml). Acesso em: 7 nov. 2025.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC (UFABC). UFABC na Mídia: Bairro de Pinheiros em São Paulo captou mais pela Lei Rouanet do que as regiões Norte e Nordeste juntas. Santo André, 2025. Disponível em: [https://www.ufabc.edu.br/ufabc-na-midia/bairro-de-pinheiros-em-sao-paulo-captou-mais-pela-lei-rouanet-do-que-as-regioes-norte-e-nordeste-juntas](https://www.ufabc.edu.br/ufabc-na-midia/bairro-de-pinheiros-em-sao-paulo-captou-mais-pela-lei-rouanet-do-que-as-regioes-norte-e-nordeste-juntas). Acesso em: 7 nov. 2025.
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