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Poetas brasileiros falam de democracia, conforme destaca coluna de Paulo José Cunha.

Paulo José Cunha

Paulo José Cunha

25/10/2021 | Atualizado às 7:22

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Carolina Maria de Jesus foi uma das primeiras autoras negras com obras publicadas no Brasil.  Os textos dela ganharam edição em mais de 40 países. Foto: Acervo IMS

Carolina Maria de Jesus foi uma das primeiras autoras negras com obras publicadas no Brasil. Os textos dela ganharam edição em mais de 40 países. Foto: Acervo IMS

"A democracia está perdendo os seus adeptos. No nosso paiz tudo está enfraquecendo. O dinheiro é fraco. A democracia é fraca e os políticos fraquíssimos. E tudo que está fraco morre um dia".

O texto acima bem poderia estar sendo escrito hoje, neste momento, referindo-se ao Brasil que Bolsonaro está afundando e cuja derrocada atordoa e chama a atenção do mundo. Mas a grafia da palavra "paiz" denuncia a época em que foi escrito: 1955, mais de meio século atrás, ainda na fumaça do tiro que Getúlio deu no próprio peito, naquele Brasil que, em outubro do mesmo ano, elegeria um tal de Juscelino Kubitscheck, filho de uma professorinha primária, como presidente da república. O menino de Diamantina trouxe uma lufada de alegria, de bom-humor, de esperança, de otimismo e de entusiasmo a um Brasil exaurido pelo Estado Novo de Getúlio. O governo feliz de JK, visto à distância, representa exatamente o inverso dos ares fétidos e deprimentes que temos respirado ultimamente por aqui.

A autora do texto/diagnóstico não é cientista política nem alguma irada comentarista de jornal. É Carolina de Jesus, uma favelada que catava papéis para sustentar a família, e que escreveu grande parte de sua obra nos cadernos encontrados no lixo. Obra que a transformou numa das mais importantes escritoras deste "paiz". Ezra Pound dizia que os poetas são "as antenas da raça".  Chico Buarque, na belíssima letra de "Choro Bandido", garante que "os poetas, como os cegos, podem ver na escuridão". Pois é a eles que vamos apelar na coluna de hoje para refletir sobre a atual situação em que fomos enfiados.

Se formos ao poeta Agostinho Neto, porta-voz do povo angolano na busca da liberdade, que viria a presidir seu país e escreveu a maior parte da sua obra nos presídios da PIDE, a temida polícia política do Portugal colonial em plena ditadura salazarista, encontraremos a verdade lancinante de versos como: "teus filhos / com fome / com sede / com vergonha de te chamarmos Mãe / com medo de atravessar as ruas /  com medo dos homens / nós mesmos". Ou então, esta conclamação à resistência, no sonho com a vida e com a luz: "Sou um dia em noite escura / sou uma expressão de saudade". "Esta é a hora de juntos marcharmos /corajosamente/para o mundo de todos / os homens". "O meu desejo / transformado em forças/ inspirando as consciências desesperadas".

Agostinho, hoje considerado uma das mais vibrantes forças da poesia universal em prol da liberdade,  apela aos seus contemporâneos (que bem somos também nós, os brasileiros de hoje): "Acabemos com essa  mornez de palavras e de gestos / e sorrisos escondidos atrás de capas de livros / e o resignado gesto bíblico de oferecer a outra face // Inicie-se a acção vigorosa máscula inteligente / que responda dente por dente olho por olho / homem por homem / venha a acção vigorosa / do exército popular pela libertação dos homens / venham os furacões romper esta passividade"

O poeta angolano, ainda assim, oferece-se à concórdia e ao perdão, apesar das atrocidades que o regime colonial português impôs a seu povo: "- Eis as nossas mãos / abertas para a fraternidade do mundo / pelo futuro do mundo / unidas na certeza / pelo direito /  pela concórdia / pela paz".

A aguda sensibilidade dos poetas, que aliam a capacidade de arrancar das palavras muito mais do que seu sentido original para exprimir significados insuspeitados e que, assim, nos remetem a universos imaginários inexprimíveis pela narrativa convencional, talvez ajudem a nos impulsionar rumo à transformação e à mudança de nossos rumos.

Para finalizar, o belo e definitivo "Poema do Aviso Final", do piauiense Torquato Neto, uma das vozes mais vigorosas do movimento tropicalista. Dele, escreveu J. A. Rodrigues: "Este poema, que muito provavelmente foi redigido durante a ditadura militar que vigorou dos anos 60 aos 80 do século passado em Pindorama, novamente tem validade no presente momento, quando milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza tomaram novamente conta das ruas ou entraram na mais completa informalidade econômica, tudo como resultado das políticas de desmantelamento de bem-estar social pelo atual governo. São miríades de pedintes que, pelo menos há duas décadas, não se viam tão facilmente, mas que não possuem o mínimo poder de arregimentação coletiva para fazerem valer os seus direitos de cidadania, assentes no princípio da dignidade da pessoa humana. E olhe que muitos deles votaram nesse troglodita que tomou o poder, tornando-se massa manipulável que agora é atirada sem apelo à margem".

 Justamente por isso, numa homenagem à indignação dos leitores e como combustível para manter acesa a nossa luta por um país alegre, solidário e livre do assanhamento fascista que nos assola, deixo com você este...

Poema do aviso final 

Torquato Neto 

É preciso que haja alguma coisa 

alimentando o meu povo; 

uma vontade 

uma certeza 

uma qualquer esperança. 

É preciso que alguma coisa atraia 

a vida 

ou tudo será posto de lado 

e na procura da vida 

a morte virá na frente 

a abrirá caminhos. 

É preciso que haja algum respeito, 

ao menos um esboço 

ou a dignidade humana se afirmará 

a machadadas. 

O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected]. > Leia mais textos do autor
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