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Orçamento público

A boa luta contra as emendas impositivas

É hora de enfrentar o abuso das emendas parlamentares.

José Dirceu

José Dirceu

6/8/2025 18:00

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Se quiser de fato agir de forma republicana, nesta volta do descanso do recesso parlamentar o Congresso Nacional terá como uma de suas missões retomar o diálogo com o governo e desfazer a imagem de que boa parte dos deputados e senadores tem agido sob inspiração do revanchismo e dos próprios interesses. Poucas horas antes do recesso, afinal, vendo-se derrotado por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da validação do decreto que altera a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), e diante do veto do presidente Lula ao projeto que amplia o número de cadeiras na Câmara dos Deputados - um projeto injustificável do ponto de vista político, econômico e fiscal - a retaliação veio em forma de uma pauta-bomba, com a concessão de R$ 30 bilhões em crédito para o agronegócio, com verba do petróleo e do pré-sal, e da aprovação das novas regras afrouxando o licenciamento ambiental.

Não foi a primeira nem provavelmente será a última retaliação até que seja resolvido o conflito de fundo, raiz de muitas das crises políticas que temos assistido. Não podemos nos enganar: as tensas relações políticas entre Executivo e Legislativo, com efeito sobre os conflitos envolvendo também o STF, não serão aplacadas enquanto não houver uma solução definitiva para um problema infinitamente maior do que qualquer pauta específica em votação no Congresso no segundo semestre. A contenção, pelo STF, da hipertrofia do Congresso, decorrente da explosão de emendas impositivas e o chamado modelo PIX de liberação de recursos, transferidos a municípios e estados sem necessidade de projeto, convênio ou justificativa, é o grande fator motivador das retaliações do Legislativo em relação ao governo.

Três ações levadas ao STF em 2024, pelo PSOL, pela Procuradoria-Geral da República e pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, defendem a inconstitucionalidade das emendas parlamentares impositivas e o formato PIX, um modo de liberação a jato dessas verbas do Orçamento da União. Essas ações, como se sabe, estão sob relatoria do ministro Flávio Dino, que vem conduzindo com firmeza a discussão sobre as emendas e seus efeitos. E os efeitos são claros: o avanço do Poder Legislativo sobre as atribuições constitucionais do Executivo; negociações de recursos em leilões por intermediários nas portas das prefeituras ou nos corredores da Câmara dos Deputados, com esses intermediários se transformando em verdadeiros cabos eleitorais para eleger prefeitos e vereadores, como foi em 2024, e deputados e senadores, no ano que vem; casos de desvio de recursos, má aplicação ou simples desperdício; indícios de enriquecimento ilícito de parlamentares, assessores e intermediários; e riscos de degradação do nosso sistema eleitoral e da própria democracia.

A audiência pública convocada no fim de junho pelo ministro Flávio Dino para debater as três ações em curso no STF mostrou algumas das principais consequências desse quadro gravíssimo. Chamo a atenção, primeiro, do seu impacto sobre o presidencialismo brasileiro. O excessivo domínio parlamentar sobre o Orçamento é disfuncional porque o Congresso assume funções típicas de governo sem a correspondente responsabilidade. O aumento desmedido dos custos de coalizões inviabiliza o sistema presidencialista, pois o Executivo, além de perder espaço de decisão, fica pressionado a pagar rapidamente as emendas, sujeitando suas próprias escolhas ao Congresso ou ao contingenciamento, resultando numa distribuição injusta do ônus da responsabilidade fiscal.

O segundo ponto grave é o eleitoral. Durante a audiência pública, mostrou-se um número inquestionável: em 2024, a taxa de reeleição de prefeitos nos municípios que receberam mais emendas parlamentares atingiu 98%. Ou seja, a correlação entre volume de recursos e reeleição demonstra claramente ser um fator dificultador de alternância no poder. Com um modelo excludente e desequilibrador, o abuso de poder político e eleitoral passa a ser regra, não exceção.

Por fim, mas não menos importante, a impositividade das emendas e sua baixa transparência afetam a própria integridade do sistema federativo. Uma das funções do governo, e certamente uma das preocupações dos governos do PT, é justamente trabalhar segundo a lógica redistributiva, num esforço de redução das desigualdades regionais e garantia de autonomia de estados e municípios segundo suas prioridades. Mas com investimentos públicos e despesas correntes atreladas a oligarquias políticas, com parlamentares livres para fazer jogo duro contra o governo e agir com base exclusivamente em seus interesses, desprezando inclusive as contas públicas, mergulha-se num vale-tudo excessivamente descentralizado. Perde-se a visão ampla no manejo do Orçamento. Diferentes análises das emendas liberadas mostram que municípios com graves problemas de infraestrutura e pobreza receberam menos recursos por habitante do que cidades com características semelhantes e melhores índices de desenvolvimento.

O Congresso sequestrou 25% do orçamento do governo.

O Congresso sequestrou 25% do orçamento do governo.Freepik

Já se vão dez anos desde o início da obrigatoriedade da execução de emendas individuais e, em seguida, das emendas de bancada. Desde então, o Congresso foi abocanhando fatias cada vez mais expressivas do orçamento discricionário do governo federal, alterando a Constituição para obrigar o governo a direcionar às emendas uma parcela da receita e a liberar o dinheiro sem interferência ou negociação. Em 2014, as emendas individuais representavam 5% das despesas discricionárias do Executivo, segundo levantamento da assessoria da liderança do PT na Câmara dos Deputados. Em 2017, subiram para 12%. Em 2020, entraram em cena as emendas de bancada e a pandemia, e assim a participação das emendas passou para 30%. No ano seguinte, ficou em 29%. No ano passado, as emendas responderam por R$ 51 bilhões, ou seja, cerca de 25% das despesas discricionárias (eram R$ 9 bilhões em 2015). Se limitarmos o recorte aos investimentos, o percentual está próximo a 50%. E os valores não param de crescer nominalmente.

Pouca gente parece ser contra as emendas parlamentares. Nem poderia, pois se trata de um recurso legítimo e necessário para o exercício parlamentar de representação de suas bases. Mas é preciso impor um teto em relação ao total do orçamento discricionário e, sobretudo, estabelecer critérios objetivos de transparência, que contemplem os principais projetos traçados para o desenvolvimento do Brasil em nível nacional e regional.

Mas há algo de muito desequilibrado quando se constata que o Legislativo controla 1 de cada 4 reais que o governo tem para gerir livremente. Como já afirmou o presidente Lula, é muito difícil planejar o desenvolvimento do país e administrar adequadamente os investimentos, que são limitados, se o Congresso sequestra parte relevante do Orçamento da União. Com isso, aprofundou-se a crise do nosso presidencialismo e criou-se um parlamentarismo disfarçado, tornando muito mais penosa a construção de maiores legislativas.

Para completar o cenário adverso - para o governo e para o país - o êxito da eleição presidencial de 2022 não se traduziu numa composição favorável no Congresso. Ali predominam o conservadorismo e o fisiologismo, com uma correlação de forças adversa, que tem exigido ainda maior capacidade de negociação de nossas lideranças e bancadas.

Caberá ao governo manter um equilíbrio fino nessa relação. Ao mesmo tempo em que precisa respeitar e dialogar com o Congresso, precisa também mostrar, com firmeza e transparência, os efeitos dessa hipertrofia insustentável, cujo prejudicado não é o governo de ocasião mas o Brasil como um todo. A decisão para sair desse impasse se dará no âmbito do STF, a quem caberá julgar as ações em curso, mas do governo se espera algo imprescindível, ou seja, demonstrar capacidade de informar, sensibilizar e mobilizar a sociedade para compreender e resistir a esse desequilíbrio institucional.

E à sociedade, caberá responder nas ruas e nas urnas, como vez demonstrando nas pesquisas de opinião, ao reagir positivamente ao apelo do governo: segundo a Genial/Quaest, 82% dos brasileiros dizem que emendas têm desvios ou corrupção, 51% desaprovam o Congresso Nacional. É preciso rejeitar o prejuízo econômico e social trazido pelas emendas impositivas e eleger um renovado Congresso Nacional.


O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].

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