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Meio ambiente
22/10/2025 12:00
Faltam pouco mais de 20 dias para o maior evento ambiental da história do Brasil, talvez do mundo: a COP 30, em Belém, no Pará. A COP 30 superará, em muito, o que a Rio 92, ou Eco92, em 1992, representou para o nosso país e o mundo. Anos antes, em 1972, a Organização das Nações Unidas, no âmbito da primeira grande conferência sobre meio ambiente do mundo, a Conferência de Estocolmo, realizada naquele ano, reconhecidamente um dos pontos de partida para a proteção internacional do meio ambiente. Parte dos resultados da Conferência foi a instituição de bases para o surgimento de políticas de gerenciamento e proteção ambiental, iniciando a mobilização dos países para as questões ambientais.
Cinquenta anos depois da Conferência de Estocolmo, em 2022, durante o governo mais nocivo para o meio ambiente desde a redemocratização do país, uma pesquisa apontou que 77% dos brasileiros priorizam a proteção ambiental em relação ao avanço econômico e que 96% tinham a convicção de que as mudanças climáticas estavam acontecendo. Mais recentemente, em março de 2023, uma pesquisa do DataFolha mostrou que nove a cada 10 brasileiros acham que sofreram impactos das consequências das mudanças climáticas em suas vidas.
Em dezembro de 2023, pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) indicou que 91% dos brasileiros consideram grave ou gravíssimo os efeitos das mudanças climáticas em suas vidas. Em maio de 2024, pesquisa da Genial/Quaest identificou, entre outros dados, que 92% do povo brasileiro considerava muito grave as enchentes no Rio Grande do Sul (RS) e esta mesma pesquisa identificou que 70% dos brasileiros, de todo o país, considera que algo poderia ter sido feito para evitar tamanha tragédia. No entanto, o dado mais relevante da pesquisa é que 99% dos brasileiros acreditam que a tragédia no RS teve ligação com as mudanças climáticas. E, falando em dados e proteção ambiental, é preciso destacar que os dados do MapBiomas Brasil mostraram que nos últimos 30 anos, as Terras Indígenas perderam apenas 1% de sua área de vegetação nativa, enquanto nas áreas privadas a perda foi de 20,6%.
Contrariando os resultados da Conferência de Estocolmo, as preocupações e a vontade popular, a cada semana que vivemos uma nova investida do Congresso Nacional contra o meio ambiente e aqueles que o protegem. Recentemente, vimos a aprovação do chamado "PL da Devastação". O nome foi dado pelas consequências que o projeto de lei trará à vida das pessoas, aos biomas brasileiros, se aprovado. Às pessoas? Sim. Com a aprovação do PL, empreendimentos de alto impacto ambiental, social e à saúde das pessoas terão seu licenciamento - ou o processo que exige que o empreendimento não seja um risco à sociedade e reduza seus impactos socioambientais - afrouxado - para não dizer outra coisa. Um exemplo? Barragens como as que romperam em Brumadinho, em janeiro de 2019, serão licenciadas de maneira frouxa, sem o devido cuidado.
Ao falarmos do papel do Congresso Nacional na destruição das leis de proteção socioambiental do Brasil, é preciso, sempre, trazer à luz a memória das 272 vidas perdidas pela tragédia-crime da Vale, em Brumadinho, quando uma empresa optou pelo lucro, não pela vida dos seus trabalhadores, e permitiu que duas barragens rompessem e tirassem tantas vidas, de maneira imediata, naquele 25 de janeiro de 2019. Relembro que investigação da Polícia Federal revelou que a empresa fez falsas declarações de condição de estabilidade perante a Agência Nacional de Mineração (ANM) e a Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM). E é isso que o Congresso Nacional tem feito: em favor do lucro de algumas empresas, em prol de uma falsa dicotomia entre desenvolvimento econômico e preservação ambiental, parlamentares aprovam leis que têm como resultado o risco imediato à vida de brasileiros e brasileiras, além da destruição dos nossos biomas.
Voltando a Brumadinho, um exemplo exponencial de como a flexibilização do licenciamento ambiental pode ser fatal, lembremos que além das mais de 270 pessoas - sim, pessoas - mortas, a tragédia-crime resultou na contaminação do rio Paraopeba por rejeitos de mineração, metais pesados e outros poluentes. Também como parte da investigação da Polícia Federal, foi apurado que houve a prática de diversos crimes ambientais de poluição e contra a fauna terrestre e aquática, a flora, os recursos hídricos, unidades de conservação e sítios arqueológicos. A contaminação do rio, do solo, fauna e flora gerou incontáveis violações de direitos, com consequências trágicas na vida de comunidades que utilizavam as águas fluviais para atividades cotidianas, pesca e reprodução da cultura: adoecimento físico e mental das pessoas, autoextermínios, destruição de sonhos e planos de vida, inviabilização de práticas espirituais e culturais, entre outras.
É o caso da comunidade indígena Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe que vivia - e agora luta pela sobrevivência - no município de São Joaquim de Bicas, vizinho de Brumadinho. A comunidade viu o rio que integrava a aldeia sem perspectivas de uso, de uma hora para a outra, sem aviso prévio. Ao contrário, o Paraopeba, que antes era vida, passou a ser fonte de preocupação para a segurança, bem-estar, saúde e morte de indígenas. Conforme relatório preliminar de violações de direitos humanos da comunidade indígena, publicado pela Amazon Watch em 2021, o rompimento gerou danos ambientais, sociais, de saúde física e mental, à segurança alimentar e nutricional.
Passados mais de seis anos, a comunidade sequer sabe quais são os danos que sofreram, no que tange, por exemplo, à saúde, o que tem contribuído para a sobreposição de danos e outras violações - que se repetem e acumulam em razão da ineficiência e negação da Vale em garantir a reparação integral - e ágil - à comunidade indígena. Para a elaboração deste artigo, foram realizadas conversas com lideranças indígenas, as quais não serão identificadas por razões de segurança para elas. Uma dela disse que:
"Antes do dia 25 de janeiro de 2019 a gente tinha um projeto [de vida], agora nós não temos mais esse projeto, nossa vida ficou parada, nossos Kijemes (casas), a organização da comunidade... eles mataram o sonho da gente, onde tirou o nosso Txopai, que é o rio, que é o rio Paraopeba. Tirou o nosso sonho de viver em nossos costumes, que foram violados e estão sendo violados pela justiça".
Uma das consequências das mudanças do clima em Minas Gerais é o aumento da quantidade e da intensidade dos eventos extremos climáticos, como as ondas de calor e o aumento do volume de chuvas, em curtos períodos de tempo, conforme alerta 4º Inventário de Emissões e Remoções Antrópicas de Gases de Efeito Estufa. Em 2020, estudo identificou que as históricas chuvas daquele ano, em Minas Gerais, eram consequência das mudanças climáticas. Diversos estudos mostram que comunidades mais pobres, periféricas, sofrerão mais impactos e têm menos condições de reagir, ou resistir, aos efeitos das mudanças climáticas. Isso foi observado no Brasil durante a pandemia e as mudanças do clima seguem o mesmo padrão. O próprio Plano Estadual de Ação Climática de Minas Gerais reconhece isso, alertando para a necessidade de se ter ações específicas para os diversos contextos territoriais do estado, em diversas passagens do Plano, tal qual os Pataxó.
Em 2022, fortes chuvas atingiram, novamente, diversos municípios de Minas Gerais, incluindo São Joaquim de Bicas e resultaram no transbordamento do Paraopeba, intensificando o contexto de vulnerabilidade ao qual estão submetidos os Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe. A enchente revolveu os rejeitos de mineração depositados no leito do Paraopeba, desde a tragédia-crime e a lama contaminada foi parar nos espaços comuns e casas da aldeia Naô Xohã. Essa constante de estar exposto ao risco de contaminação não tem fim na vida das pessoas atingidas e que moram às margens do Paraopeba. Isso foi verificado na pesquisa "Saúde Brumadinho", de 2022. Os resultados mostraram que há desconformidades na concentração de metais pesados, como Manganês e Arsênio, em pessoas atingidas pelo rompimento da barragem da Vale, em 2019. Ou seja, a espera pela justiça pode ser ainda mais fatal para quem mora na região. Uma outra liderança fez uma fala emocionante.
"A gente tem reparado o quanto que esperar dói, o quanto que esperar está doendo na e - para - a comunidade. E pior ainda do que esperar é esquecer. Não tem como esquecer. E isso porque o tempo, em vez de ajudar na cura, ele só tem aumentado a nossa dor, a cada dia que passa".
São seis anos passados, desde a tragédia-crime. O que você fez nos últimos seis anos? Quantas pequenas e grandes conquistas você teve? Quantos sonhos viraram realidade? No caso dos indígenas, eles vivem quase que em função de um objetivo: lutar cotidianamente pela reparação justa, inclusiva e integral. Conforme foi dito por uma liderança:
"A cada dia que vem, a gente vem percebendo que a reparação está um pouquinho mais longe do que a gente acreditou que ela estaria. E por mais que a gente entenda o que a é reparação, ela não vai vir da forma que a gente imagina, porque não existe processo de reparação no mundo que trará de volta tudo que a gente perdeu dentro da nossa comunidade. Então, a gente luta e deseja uma reparação que seja justa, estando ciente que não tem como voltar ao que era, mas que a reparação seja feita da melhor forma com que ela pode ser construída."
Nosso mandato segue, preocupado, acompanhando o processo de reparação das comunidades e atuando para a garantia dos direitos dos povos e comunidades tradicionais do país. Um exemplo foi a indicação que fizemos ao Governo Federal para construção da Casa de Apoio à Saúde Indígena (CASAI), em 10/05/2023, a qual reforcei no Programa de Governo que apresentei quando estive candidata à Prefeitura de Belo Horizonte, e que virou realidade em 12 de dezembro de 2024. Também contribuímos com o Relatório Temático de Brumadinho, produzido pela Comissão Externa destinada a fiscalizar os rompimentos de barragens, da qual faço parte, com a inclusão das questões ligadas a estas comunidades indígenas.
O artigo 29 da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas traz que "os Povos Indígenas têm direito à conservação e proteção do meio ambiente e à capacidade produtiva de suas terras ou territórios e recursos. Os Estados estabelecerão e implementarão programas de assistência aos povos indígenas para tal conservação e proteção, sem discriminação".
Nós, legisladoras(es), precisamos atuar para a efetivação de direitos, como o direito à saúde, ao diagnóstico e à informação, como no caso dos indígenas. É o caso do projeto de lei que apresentei para a incorporação do exame de sangue Mineralograma no Sistema Único de Saúde (SUS), com acesso para todas as pessoas, sem discriminação, para a detecção da quantidade de minerais essenciais e tóxicos no organismo. É fundamental o Estado brasileiro garantir o acesso a procedimentos que detectem agravos que podem comprometer seriamente ou impossibilitar a sobrevivência das pessoas que tenham sido expostas, voluntária ou involuntariamente, à contaminação por metais pesados.
A esperança e a crença nas instituições, e na Justiça, contribuem para que o sonho pela reparação, imposto a estas comunidades, não fique mais distante. Esse texto, além de contribuir com a rota do nosso mandato para COP 30, é uma forma de trazer à luz a sombria história da reparação destas comunidades, com falhas do Estado e da empresa responsável pelas barragens, sobrepondo crimes que destroçam as comunidades cotidianamente e prolongam a permanência da comunidade em território contaminado, correspondendo à dinâmica sistêmica da política da morte que - historicamente - domina, controla e promove a morte das culturas e das pessoas.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].
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