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Congresso em Foco
Autoria e responsabilidade de Edson Sardinha
29/7/2016 | Atualizado 9/8/2016 às 15:36
[fotografo]Lúcio Vaz/Congresso em Foco[/fotografo][/caption]
A BR-080 foi projetada como parte do Plano de Integração Nacional, criado em 1970, no governo Médici - auge da ditadura militar. Era o tempo das obras faraônicas, como a Transamazônica e a Ponte Rio Niterói. Pelo projeto original, megalomaníaco, a BR-080 ligaria Brasília a São Gabriel da Cachoeira (AM), na fronteira com a Colômbia, numa extensão 3.250 quilômetros. Hoje, a parte construída vai da capital federal a São Miguel do Araguaia (GO). Pouco mais de 500 quilômetros. O trecho implantado no Mato Grosso, entre Matupá e Alô Brasil, com extensão de 470 quilômetros, foi transformado numa estrada estadual, a MT-322. Por falta de recursos, ou por não ser considerada prioritária, ainda não foi asfaltada, embora seja uma alternativa ao escoamento de grãos e gado para a região Norte, pela BR-158.
A estrada estadual desafia e oferece aos viajantes muitas curvas, areais, poeira, trepidação e pontes traiçoeiras. No trecho mais crítico, de 80 quilômetros, cortando o Parque Indígena do Xingu, as pontes sobre riachos são feitas de toras de árvore, o que tem provocado seguidos acidentes, segundo relatos dos motoristas que se aventuram nessa rota em meio à Floresta Amazônica.
Na localidade do Jarinã, distante 110 quilômetros de Matupa, há buracos na lateral de um bueiro capazes de capotar carros. Paro no boteco do povoado para buscar informações. O proprietário afirma que aquilo "não é nada".
- Tem uma ponte logo adiante onde já caíram vários carros. Eu cai lá no meu Fenemê (FNM) em 84, transportando adubo. Acontece que tem uma curva em cima do pé da ponte. Fiquei oito dias com o caminhão lá. Uns tratores tiraram - relata o dono do bar, que prefere não se identificar.
- Depois, aperseguem [sic] a gente.
Mas prossegue nos seus relatos:
- Faz um ano, caiu um Palio ali. Caiu de manhã. Quando o dono voltou de tarde, tinham levado os pneus. Na mesma semana, caiu uma F-1000. Foram procurar recurso. Quando voltaram, tinham retirado o som do carro. Uns 15 dias atrás, caiu um caminhão Mercedes carregado de lascas (de madeira). Veio soldar o chassi. Quando voltou, tinham tirado as lascas dele. Aqui, anoiteceu, não amanhece.
A ponte está realmente localizada logo após uma longa reta, seguida de uma curva à esquerda. Como é de madeira, estreita, sem proteção na cabeceira, se o motorista se descuida, cai direto no riacho. Ainda há marcas de resgate de carros nas margens.
[caption id="attachment_253736" align="aligncenter" width="580" caption="Depois da curva, a ponte surpresa já provocou vários acidentes"]
[fotografo]Lúcio Vaz/Congresso em Foco[/fotografo][/caption]
Pontes de toras
Muitos quilômetros adiante, há o último bar/restaurante antes de São José do Xingu. O seu Juvenal serve um prato feito de muita "sustância", com ovo frito, salada de alface e tomate. Ele ri, quando falo das "péssimas" condições da estrada e das pontes.
- Você não viu nada. Toma cuidado com as pontes dentro da reserva, são muito perigosas. E cuidado para não perder a balsa dos índios. Eles fecham às cinco da tarde.
Motoristas que também almoçavam alertam sobre a travessia na balsa. O serviço é administrado pelos indígenas do Parque Xingu. O parque nacional, idealizado pelos irmãos Villas Boas, foi criado em 1961 com uma área bem maior, mas conta hoje com 27 mil quilômetros quadrados. Situado numa zona de transição entre o cerrado e a Floresta Amazônica, abriga cerca de 5 mil índios de 15 etnias.
- Eles cobram quanto querem. Já peguei R$ 200,00 para passar a carreta - conta um caminhoneiro.
Almoço concluído, um cafezinho e a estrada. Poucos quilômetros adiante, uma ponte de tábuas sobre toras de árvore, com parte da madeira podre, tem a largura exata do eixo dos caminhões carregados com dezenas de toneladas. Se errarem a rota por 30 centímetros, caem no riacho. A estrada de terra batida é boa. Pelo caminho, há trechos de matas entrecortadas por campos e regiões alagadas.
[caption id="attachment_253676" align="aligncenter" width="580" caption="Ponte de tábuas sobre toras tem a largura de um caminhão "]
[fotografo]Lúcio Vaz/Congresso em Foco[/fotografo][/caption]
O carro de passeio segue a cerca de 70 km/h, numa reta longa. A minha preocupação é com as pontes, mas elas não aparecem. De repente, surge um pontilhão à frente. Como não há sinalização e a ponte está no nível da estrada, preciso frear bruscamente. Os pneus arrastam na terra solta, e o carro não para. Percebo que é melhor tirar o pé do freio. Com cerca de 10 metros, o pontilhão é formado por cinco toras de árvores em sentido longitudinal, um pouco afastadas uma das outras. Pela posição do carro, decido alinhar a roda direita com a tora da extremidade e a roda esquerda na tora do meio. O carro passa numa velocidade acima do recomendável, mas sai intacto do outro lado.
[caption id="attachment_253678" align="aligncenter" width="580" caption="Sem sinalização, ponte de toras é avistada a poucos metros"]
[fotografo]Lúcio Vaz/Congresso em Foco[/fotografo][/caption]
Passado o susto, aguardo a passagem de outros carros, posicionado para fazer fotos e vídeos. O primeiro carro também chega rapidamente, freia e tenta alinhar as rodas com as toras. Percebo que a roda esquerda vai cair num vão entre duas toras. Instintivamente, grito:
- Para, para, para!
O motorista para, engata uma ré e logo avança na direção correta, passando pelo pontilhão. Uma foto perdida, mas um acidente a menos. Registro a passagem de caminhões carregados, ônibus cheio de passageiros. Uma roda do ônibus afunda num vão, mas é larga o suficiente para evitar o tombamento. Um caminhoneiro brinca, dizendo que já passou ali à noite.
Mais alguns quilômetros e surge a segunda ponte. Pode ser avistada a uma distância maior que a primeira, mas as frestas entre as toras chegam a 30 centímetros. Não parece possível que o carro passe por ali. Desço, pego uma vara verde e meço a distância entre as rodas dianteiras. Depois, procuro duas toras que tenham a mesma distância. Outro motorista para e ajuda, fazendo sinais com a mão do outro lado do pontilhão:
- Para, para! Mais pra esquerda, endireita, agora vem, vem!
[caption id="attachment_253751" align="aligncenter" width="580" caption="No caminho para Confresa, a ponte mais perigosa"]
[fotografo]Lúcio Vaz/Congresso em Foco[/fotografo][/caption]
[caption id="attachment_253761" align="aligncenter" width="580" caption="A lateral da ponte está quebrada"]
[fotografo]Lúcio Vaz/Congresso em Foco[/fotografo][/caption]
Após registrar em fotos e vídeos a passagem de vários caminhões, peço para um deles parar e me conceder uma entrevista. Ele e o colega que vem em comboio descem para conversar.
O motorista Adilson Pereira dos Santos, 32 anos, de Confresa, fala que aquele é o único caminho possível para quem segue para o norte do Mato Grosso. Ele caminha sobre a ponte e mostra os perigos.
- Olha aí, tudo quebrado! Tem outra que já caiu caminhão. A gente se arrisca aqui todo dia. De noite, tem que passar devagarzinho, porque, se errar o pneu aqui, quebra tudo. Aqui, não tá firmando mais nada. Aqui o cara passa arriscando a vida. Olha, pau tudo podre! Se cai, a culpa é do motorista.
Mostro um pedaço de madeira solta sobre um buraco. Ele reage:
- Isso aqui é brincadeira. Um motoqueiro cai aqui e morre. E o governo não tá nem aí, ó!
[caption id="attachment_254454" align="aligncenter" width="580" caption="Caminhoneiros passam pela ponte com até 50 toneladas"]
[fotografo]Lúcio Vaz/Congresso em Foco[/fotografo][/caption]
Afirma que ali é município de São José do Xingu. Pergunto o peso da carga que a carreta transporta.
- Isso é 18 mais 30 (trata-se de uma bitrem), quase 50 toneladas. Carrega boi. Mas aqui é lavoura.
O paraibano Josenildo Barbosa dos Santos, de 57 anos, diz que a maioria das cargas é de soja e milho, muitas com até 60 toneladas. Fala dos acidentes:
- De vez em quando, acontece. A ponte não resiste, cai uma parte. Fecha o trânsito, não passa ninguém. Mais de 20 caminhoneiros parados três dias, pegando galinha dos vizinhos pra comer, até chegar a máquina e a caçamba pra fazer a obra. Tem colega que tá fora da empresa porque levou tranco quando a ponte caiu. Afeta a coluna do camarada. Teve caso em que morreram 15, 16 bois na carreta. Ficaram três dias parado, um sobre o outro, não tem como socorrer.
Josenildo tem a sua explicação para tanto descaso dos governos.
- Mas sabe o que é isso? Eu sou do Nordeste, uma região que tem muita estrada boa. Nordeste não tem riqueza como aqui, mas acontece que láJosenildo1.png">Tags
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