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Congresso em Foco
15/8/2020 | Atualizado 10/10/2021 às 17:33
O segundo trimestre de 2020 registrou recorde negativo (- 9,6%) no número de pessoas ocupadas no Brasil, de acordo com levantamento do IBGE. No total, 8,9 milhões de pessoas perderam seus postos de trabalho de abril a junho, em relação ao período de janeiro a março. Com isso, a população ocupada ficou em 83,3 milhões, o menor nível da série histórica. Na comparação com o mesmo período de 2019, a queda foi de 10,7%.
Foi nesse cenário, ainda no início do isolamento, que Intervozes e Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) foram à Anatel exigir medidas de apoio aos consumidores mais vulneráveis. O Intervozes protocolou pedido para que, em caráter liminar, a agência proibisse, por 90 dias, a suspensão de serviços ou a cobrança de excedente caso sejam ultrapassados os limites de franquia, mas a Anatel concluiu que não seria o caso de forçar as empresas a garantirem conexão. Em vez disso, optou por pedir a elas que tomassem medidas, por meio de "compromissos", para garantir a continuidade dos serviços neste momento excepcional. Contudo, também nesta frente o resultado foi altamente insuficiente, como demonstra relatório do Idec enviado à agência e ao então MCTIC.
Agora, a Câmara dos Deputados, ao optar por não analisar e discutir a MP 952/2020, também se omite em relação à necessidade de garantir a conectividade dos cidadãos durante os momentos mais agudos da crise. A mesma Casa que votou a liberação da telemedicina, sob o argumento de facilitar o acesso aos profissionais de saúde no contexto da pandemia, tinha a oportunidade de exigir contrapartidas às empresas beneficiadas pela prorrogação de pagamento de tributos de forma a assegurar a conexão dos usuários. Uma delas, a mais óbvia, seria estender aos consumidores a possibilidade de parcelamento do pagamento dos serviços em caso de inadimplência, com os mesmos juros prometidos às empresas, pelo mesmo período em que elas fizessem o parcelamento dos tributos devidos à União. Havia inúmeras emendas de plenário propostas neste sentido. O raciocínio é simples: se as operadoras podem negociar o pagamento de tributos bilionários à União, os consumidores devem ter o direito de parcelar seus débitos com as operadoras. Foi justamente isso o que fizeram inúmeros países.
Ainda, havia disposição inicial do relator, André Figueiredo (PDT-CE), de alterar a Lei do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Lei do FUST) e a Lei Geral de Telecomunicações (LGT) para permitir a aplicação destes recursos na expansão da infraestrutura que suporta a conexão à Internet. Não se poderia esperar milagres imediatos de universalização do acesso à Internet no país, mas avançaria no sentido da construção de uma política pública sustentável e de longo prazo para assegurar o direito de acesso a internet a todos, objetivo que deve orientar a disciplina da Internet no Brasil, de acordo com o Marco Civil da Internet.
A essencialidade do acesso à Internet ficou mais evidente nos últimos meses, principalmente em face à necessidade de isolamento social. Hoje, é possível afirmar de forma inequívoca que o acesso às telecomunicações é essencial para garantir o trabalho de milhares de pessoas que estão em home office, o acesso a ferramentas de Educação a Distância (EaD) - por exemplo, como forma de garantir o estudo para o Enem e viabilizar o Enem Digital 2020 - e para garantir a comunicação de pessoas que estão longe de suas famílias, bem como para promover lazer e cultura para quem não pode sair de casa. Trata-se, de forma evidente, de um serviço que deve ser considerado essencial, sem o qual a dignidade dos consumidores é fortemente comprometida. Tapar os olhos para essa situação significa compactuar com o aprofundamento das desigualdades em nosso país.
No entanto, mesmo uma proposta bastante favorável às empresas de telecomunicações e com possibilidade de apoiar a conexão das famílias cadastradas no Bolsa Família, apresentada pelo relator, foi descartada sem apreciação dos parlamentares. A proposta consistia na troca de uma oferta de R$ 5 de crédito em serviço móvel aos mais vulneráveis, as empresas ganhassem, em troca, R$ 15 em crédito tributário (também destinados aos usuários) - ou seja, reduziriam o montante de recursos a serem pagos, se assim desejassem, oferecendo algo que em nada - ou quase nada - onera suas operações. Nem isso as fez apoiar a análise da matéria.
Foi mais uma oportunidade perdida para o avanço das políticas de garantia de direitos e cidadania por meio desse serviço essencial que é a Internet. E desta vez, infelizmente, com a omissão dos parlamentares brasileiros.
*Marina Pita é coordenadora executiva do Intervozes e integra o Comitê de Defesa dos Usuários dos Serviços de Telecomunicações da Anatel
**Diogo Moyses é coordenador do programa de telecomunicações do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC)

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