Entrar
Cadastro
Entrar
Publicidade
Publicidade
Receba notícias do Congresso em Foco:
Congresso em Foco
28/11/2018 7:30
Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, Rogério da Veiga lembra que, como qualquer ação humana complexa, o Mais Médicos não é um programa perfeito - Foto: Mais Médicos / Reprodução[/caption]
No eixo do provimento emergencial de médicos, a partir do diagnóstico da necessidade de profissionais em cada um dos municípios brasileiros, os municípios foram convidados e declarar seu interesse em receber médicos do programa. As vagas foram ofertadas primeiramente para médicos brasileiros, em seguida para médicos brasileiros formados no exterior e, por fim, a médicos estrangeiros de países com mais médicos que o Brasil.
Segundo o Ministério da Saúde, há 18.240 vagas em 4.058 municípios no provimento emergencial do Programa Mais Médicos, das quais 8.469 são ocupadas por médicos no âmbito do acordo de cooperação com a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS). Os cubanos não vieram ao país por motivações ideológicas, mas para atender as necessidades da população brasileira. Cuba é o único país que tem condições de exportar médicos com boa formação, em grande número, sem desfalcar seu próprio sistema[3].
O programa apresenta resultados importantes: reduziu a escassez de médicos em regiões do país[4], é bem avaliado pela população usuária[5] e se observa melhora nos indicadores de saúde, em especial aqueles mais afetados pela atenção básica. O Mais Médicos é monitorado e avaliado sistematicamente pelo Ministério e pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS)[6], os médicos estrangeiros, antes de iniciarem sua atuação, passam por uma formação de quatro semanas em universidades públicas e ficam sob supervisão permanente de universidades públicas, secretarias estaduais e municipais de saúde.
É um programa sério, tecnicamente embasado e com resultados consistentes[7], informações que não foram suficientes para sensibilizar o governo eleito, que provocou a atual situação e justifica-se da seguinte maneira:
1. Parte dos recursos do convênio vai para o médico e parte é repassada para o Governo Cubano e proibição de vinda das famílias
É verdade que os recursos do convênio são divididos entre a família e o governo cubano, mas isso não justifica as alegações de trabalho escravo ou de condições de trabalho subumanas. O contrato segue as normas estabelecidas pelo Código Global sobre a Prática de Recrutamento Internacional de Pessoal de Saúde[8], que define direitos e deveres de contratantes e contratados. Outros países mantém convênios semelhantes com a OPAS e Cuba e essa questão não foi levantada em nenhum outro país. Isso não quer dizer que não existam problemas no regime político de Cuba. Significa, apenas, que a escravidão de médicos não é um desses problemas e demonstra, mais uma vez, que o presidente eleito e sua equipe trabalham com desinformação, sem compromisso com a verdade e a realidade.
Só acredita no argumento da escravidão quem nunca viu um médico cubano e trabalha com um imaginário que apresenta os médicos ora como guerrilheiros comunistas disfarçados, ora como pobres coitados escravizados por um regime ditatorial cruel. Esse discurso tem pouca aderência para as pessoas atendidas pelos cubanos, muitas delas extremamente pobres, que conhecem e se beneficiam do trabalho do médico. Para estas pessoas, um salário de R$ 3 mil por mês é um sonho e ter um médico para se consultar um direito que lhes foi negado por toda a vida.
2. O governo não tem como atestar a qualidade dos médicos cubanos (exigência do exame do Revalida)
"Os médicos recrutados são, em sua maioria, profissionais que já tiveram atuação humanitária em diversos países do mundo (como a crise do ebola na África ou países centro-americanos). Cerca de 25 mil profissionais atuam fora do país atualmente" (via Lara Stahlberg) [9],[10]. A formação em saúde comunitária em Cuba é referência internacional.
Além disso, os médicos não chegam no Brasil e são abandonados. Eles passam por um período de formação inicial e são acompanhados por universidades, secretarias estaduais e municipais. Os resultados do programa em termos de indicadores de saúde e satisfação da população não corroboram o argumento da baixa qualidade dos profissionais.
É justo que o governo queira ter maiores garantias sobre a qualidade do profissional que atuam no país, mas é fundamental que seja feito com base em estudos, dados e evidências, não por razões puramente ideológicas, sem dialogar respeitosamente com as partes envolvidas - o governo cubano, OPAS, municípios, estados.
O Brasil e os brasileiros têm agora um problema nas mãos: como selecionar, treinar e enviar 8.500 médicos para mais de quatro mil municípios, em um país que forma anualmente 17 mil médicos, majoritariamente nos grandes centros e que, historicamente, não têm demonstrado interesse em se mudar para territórios com estruturas precárias e alta concentração de pobreza.
Um problema criado por colocar a ideologia acima da vida das pessoas. Na história, sempre que isso acontece, seja com ideologia de direita ou de esquerda, a população é quem sai perdendo.
Nesse caso, as pessoas com diabetes, pressão alta, febre, vermes, malária, doença de chagas, tuberculose, diarreia, asma, pneumonia, câncer, etc que não terão mais um lugar para buscar orientação, tratamento e encaminhamento para casos mais complexos.
* Mestre em Política Científica e Tecnológica e especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental. Possui experiência em políticas públicas na área de Educação, Primeira Infância e Combate à Pobreza no níveis federal e municipal.
[1] https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/eleicao-em-numeros/noticia/2018/08/26/saude-e-o-problema-mais-citado-pelos-eleitores-nos-estados-do-pais-apontam-pesquisas-ibope.ghtml
[2] http://maismedicos.gov.br/conheca-programa
[3] https://www.ted.com/talks/gail_reed_where_to_train_the_world_s_doctors_cuba
[4] http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-81232016000902675&script=sci_abstract&tlng=pt
[5] http://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento/download/d21dba5d-bab8-450a-8aa9-52c696008ebf
[6] https://simm.campusvirtualsp.org/sites/default/files/Marco%20Monitoramento%20e%20Avalia%C3%A7%C3%A3o%202016.pdf
[7] http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232016000902925
[8] http://apps.who.int/gb/ebwha/pdf_files/WHA63/A63_R16-sp.pdf?ua=1
[9] https://www.facebook.com/lara.stahlberg.9/posts/10212615785501960?__tn__=K-R
[10] https://www.viomundo.com.br/denuncias/arthur-chioro-tiro-de-bolsonaro-contra-medicos-cubanos-saira-pela-culatra-a-maioria-dos-medicos-brasileiros-nao-quer-ir-para-longe-e-nao-sabe-fazer-atencao-basica.html
> Temer minimiza saída de médicos cubanos do Brasil e diz que Bolsonaro não herdará problema
> Bolsonaro diverge de futuro ministro e diz que médico não precisa de exame como o da OAB
Tags
Temas
Povos tradicionais
Câmara recebe projeto que amplia ensino técnico a povos tradicionais