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Congresso em Foco
26/5/2006 | Atualizado às 2:44
Sylvio Costa e Edson Sardinha
Ofuscada pelas investigações sobre o mensalão e outras irregularidades no governo federal, a CPI do Tráfico de Armas funciona na Câmara dos Deputados desde 16 de março de 2005 de modo relativamente discreto. Só passou a merecer atenção pública depois que depoimentos prestados à comissão, em sessão reservada no último dia 10, suscitaram um inusitado caso de corrupção envolvendo dois advogados de criminosos ligados ao PCC e um funcionário terceirizado da Câmara, que vendeu por R$ 200 a gravação que deveria ter permanecido sob sigilo.
Mas o fato é que a CPI acumula extraordinário volume de testemunhos, provas e indícios sobre a indústria do crime organizado no país. Das 67 reuniões que a comissão já realizou, merece destaque, por exemplo, a sessão ocorrida em 25 de agosto do ano passado. Embora tenha sido público, o encontro foi ignorado pela imprensa, à época integralmente dedicada à cobertura da denúncia do pagamento irregular a parlamentares da base governista e a seus desdobramentos.
Naquela sessão, o delegado Celso Ferro, da Polícia Civil do Distrito Federal, descreveu em detalhes como são praticadas fraudes em concursos públicos que, segundo ele, têm permitido a pessoas desqualificadas - algumas delas, suspeitas de vinculação com organizações criminosas acusadas de promover o tráfico de armas e drogas - assumir posições estratégicas em órgãos policiais e judiciários do país. É o que o técnico judiciário e bacharel em Direito Hélio Garcia Ortiz, ouvido pela CPI no mesmo dia, chamou de "caminho das pedras".
Suspeita sem tamanho
Responsável pelas investigações que resultaram na prisão da chamada máfia dos concursos públicos há um ano, Celso Ferro disse que é impossível contabilizar o número de pessoas ligadas a organizações criminosas que entraram no quadro de corporações policiais e judiciárias do serviço público. "Nós não temos, aqui, a capacidade de mensurar, de forma nenhuma, quantos milhares de pessoas que adentraram no concurso público, adentraram na administração pública mediante fraude."
Em seu depoimento, o delegado contou que houve fraude no último concurso da Polícia Militar do DF e que os policiais acusados de terem comprado a vaga estão em pleno exercício profissional. Questionado se poderia haver policiais militares membros de organizações criminosas e envolvidos com o esquema de Ortiz, Celso respondeu: "É possível". E disse que essa possibilidade também se estendia às polícias civil e federal. "(Ortiz) Relatou, não só da Policia Federal, Polícia Civil do Distrito Federal, outras polícias estaduais. Foram inúmeros concursos em que ele atuou", afirmou (leia mais).
A relação entre as facções criminosas e a máfia dos concursos também foi apontada com preocupação à CPI pelo delegado Ruy Ferraz Fontes, do Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic), de São Paulo. "Marcola (Marcos Willians Herba Camacho, principal líder do PCC) com certeza geriu a questão dos concursos públicos. Eles formam, pagam pela formatura de pessoas nas escolas de Direito. Está lançado no livro, está escriturado em livro. Então, a organização é muito séria mesmo, e a tendência é crescer", disse o delegado em depoimento reservado à comissão, reproduzido com exclusividade pelo Congresso em Foco na semana passada (leia mais).
Outras frentes de investigação
As fraudes em concurso público são apenas uma das várias frentes de investigação perseguidas pela CPI do Tráfico de Armas. Contando com a cooperação da Polícia Federal e do Ministério Público, a comissão também tem avançado na identificação de quadrilhas que vendem ilegalmente armamentos, drogas e munições.
Dessa colaboração resultaram várias operações, planejadas sigilosamente, que levaram à prisão inclusive de policiais acusados de envolvimento com o tráfico de armas e drogas ilícitas. A CPI também tem progredido no mapeamento das principais quadrilhas que agem nessa área.
Segundo um dos integrantes da comissão, deputado Neucimar Fraga (PL-ES), a participação do Rio Grande do Sul no comércio ilegal de armamentos é uma das conclusões já consolidadas. "O estado se tornou um dos grandes problemas do tráfico de armas no Brasil porque as fronteiras lá estão abertas", afirma o parlamentar. "Chegam armas de países vizinhos e há envolvimento de clubes de tiro e colecionadores na venda de armas e munições adquiridas dentro da lei, mas depois comercializadas ilegalmente".
Por isso mesmo, as restrições à venda de armas e munições para clubes de tiro e colecionadores estão entre as propostas de alterações legais que a comissão pretende apresentar, como revelou o Congresso em Foco.
De acordo com Neucimar Fraga, o Rio Grande do Sul é a ponta de uma das principais rotas brasileiras de tráfico de armas: "De lá, as armas seguem dois caminhos. Uma rota vai até Ribeirão Preto (SP), onde as armas são distribuídas para São Paulo, Rio de Janeiro e outras grandes cidades. Na outra, o transporte é feito diretamente do Rio Grande do Sul para o Nordeste, onde há dois pólos importantes de distribuição: Feira de Santana (BA), de onde as armas são transportadas para Bahia e Sergipe; e Recife, de onde elas vão para a Paraíba, o Rio Grande do Norte e outros estados próximos".
No referendo sobre a comercialização de armas e munições, ano passado, o Rio Grande do Sul foi usado como argumento contra novas restrições ao comércio legal desses bens. Afinal, dizia-se, o estado tinha grande quantidade de armas legais e baixo índice de homicídios. O que a comissão identificou é que, na realidade, boa parte dessas armas - embora permaneçam registradas no Rio Grande do Sul - foram vendidas para outros estados, onde agora são usadas para alimentar a guerra urbana brasileira.
Quase sempre, explica Neucimar, o transporte das armas é feito em caminhões com fundo falso. Uma terceira rota, prossegue o deputado, se dá a partir do Paraguai, passando pelo Mato Grosso e chegando até São Paulo. E outra começa na Colômbia, atravessa o estado de Amazonas e também tem São Paulo como destino final.
A CPI coleciona evidências sobre a participação de brasileiros na rota colombiana. As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) usam drogas como moeda para comprar armas de brasileiros, explica Neucimar. "E, além de armas e munição, o Brasil fornece para a Colômbia mão-de-obra e alimentos", afirma ele. "Como as Farc estão isoladas em razão das operações desenvolvidas pelo governo colombiano, são navios brasileiros que levam comida para os locais controlados pelas Farc, que estão ilhada ali. Temos indícios de que as Farc também estão recrutando brasileiros para atividades militares".
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