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Gastos públicos
6/8/2025 12:00
Imagine um grande barco navegando por águas turbulentas. Cada remo precisa estar em sintonia para avançarmos em direção ao progresso. Mas e se colocarmos mais remadores, sem aumentar o espaço disponível ou reorganizar a tripulação? Em vez de avançar mais rápido, o barco pode se tornar instável, suas manobras mais difíceis e sua jornada mais cara.
A boa notícia é que ainda há tempo para corrigir o rumo. Com o retorno do recesso parlamentar, a Câmara dos Deputados terá a prerrogativa de analisar o veto presidencial ao projeto de aumento do número de deputados de 513 para 531 cadeiras. O Brasil não precisa de mais deputados. Trata-se do pior cenário possível: uma medida que eleva o potencial de despesas e, ao mesmo tempo, aprofunda distorções históricas na representação popular.
Do ponto de vista econômico, o projeto tem efeito cascata: abre margem para a criação de cerca de 30 novas vagas em Assembleias Legislativas estaduais, com impacto estimado em ao menos R$ 150 milhões por ano. Tudo isso em um momento em que o país já enfrenta desafios fiscais severos e tenta equilibrar contas públicas com crescimento sustentável.
A proposta estipulava que as despesas da Câmara deveriam se manter congeladas até 2030, mas a realidade institucional do Brasil indica que essa promessa é frágil. A criação de novos cargos impõe pressões indiretas sobre o orçamento: mais gabinetes, mais pessoal de apoio, mais demandas por infraestrutura. Como na velha máxima orçamentária, quando todos têm direito a uma fatia maior do bolo, o forno precisa trabalhar mais - ou o tamanho das fatias diminuirá para os que mais precisam.
Estudos acadêmicos robustos, tanto no Brasil quanto em outros países, mostram que legislativos maiores tendem a intensificar a fragmentação partidária. Em assembleias mais numerosas, a quantidade de partidos representados se multiplica, tornando o processo decisório mais lento e custoso. Esse fenômeno, conhecido como a "lei de 1/n", revela que quanto mais atores há à mesa, maiores são os incentivos ao aumento de gastos públicos para atender a interesses pontuais. É a política transformada em um buffet de demandas setoriais, onde o prato principal - o interesse coletivo - corre o risco de esfriar.
Além do impacto fiscal indireto, há um agravamento de um velho conhecido do nosso sistema político: o desequilíbrio representativo entre os estados. Roraima, com apenas 0,3% da população brasileira, manteria seus oito deputados - cerca de 1,5% da Câmara. Enquanto isso, São Paulo, onde vivem 22% dos brasileiros, seguiria com menos de 14% das cadeiras. Já estados intermediários, como Pará e Ceará, que poderiam ser beneficiados por uma redistribuição mais justa, receberiam apenas aumentos simbólicos. O projeto, portanto, não corrige injustiças - apenas as redistribui sob nova roupagem. A conta não fecha e a democracia perde em legitimidade.
Precisamos, sim, de reformas no sistema político, mas que caminhem junto com a eficiência, o controle de gastos e o respeito ao contribuinte. O veto presidencial, nesse contexto, não é apenas uma decisão política - é um freio de arrumação. Um convite à reflexão. Que essa discussão sirva de bússola para um debate mais profundo sobre a eficiência dos Três Poderes.
Em um país que precisa encarar com urgência seus desafios fiscais, sociais e ambientais - e que ainda pode voltar a enfrentar barreiras comerciais impostas pelos Estados Unidos - a última coisa que se pode justificar é o aumento no número de deputados. Em vez de inflar o Parlamento, deveríamos estar enxugando estruturas, revisando privilégios e concentrando esforços em políticas públicas com alto impacto socioeconômico. É hora de as instituições brasileiras remarem na mesma direção: rumo a um Estado mais eficiente.
Cabe agora à Câmara dos Deputados mostrar sintonia com essa direção. Ao manter o veto presidencial e barrar o aumento do número de parlamentares, os deputados têm a chance de dar um recado claro à sociedade: de que é possível priorizar responsabilidade com o dinheiro público, melhorar a representação e fortalecer a democracia sem inflar ainda mais o sistema.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].
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