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Conscientização digital
23/10/2025 17:00
A internet, criada para unir o mundo, acabou crescendo sozinha - trancada no quarto, praticamente sem supervisão. Ganhou um tanto de comida (dados), muita atenção (likes) e inúmeros brinquedos (apps), mas nunca lhe ensinaram o básico: o que é responsabilidade, o que é empatia. Agora, chegada à adolescência, tornou-se inquieta - cheia de energia, capaz de tudo, mas sem saber direito o que fazer com tanto poder.
Muito se discute sobre como disciplinar esse adolescente. Alguns defendem deixá-lo livre, como se o tempo e os tombos fossem suficientes para ensiná-lo. Outros preferem a repressão, acreditando que o confronto e o medo resolvem o que o diálogo não alcança. Mas quem já criou um adolescente sabe: nenhum dos extremos funciona. É preciso presença, paciência e limite - na medida certa - para transformar rebeldia em aprendizado.
É nesse cenário que se fortalece o projeto de lei da Conscientização Digital (PL 2.656/2025), apresentado pelo senador Flávio Arns. A proposta determina que as grandes plataformas digitais reservem espaço em seus próprios ambientes para campanhas informativas e educativas sobre os riscos e desafios do mundo online - sem custos para o Estado.
Afinal, é justamente ali - onde os problemas nascem e se multiplicam, nas timelines, nos vídeos e nos comentários - que temas como desinformação, manipulação de dados, imagens e vídeos, fraudes, golpes, uso excessivo das telas e bolhas digitais, entre tantas outras questões críticas da atualidade, podem ser enfrentados de forma mais efetiva e duradoura.
O caso Felca provocou grande comoção e deu origem à Lei nº 15.211/2025 (ECA Digital), reforçando a urgência de discutir a proteção de crianças na internet. A legislação é um passo importante, mas insuficiente se não vier acompanhada de educação e conscientização.
O episódio também revelou um vazio de orientação: pais e responsáveis muitas vezes não sabem reconhecer os riscos aos quais seus filhos estão expostos. E o perigo não se resume a conteúdos inapropriados ou à exposição de imagens. Ele inclui o assédio disfarçado de amizade, os grupos que incentivam comportamentos autodestrutivos e a pressão por visibilidade, que leva crianças e adolescentes a transformarem tudo em conteúdo. Há ainda o risco mais sutil - o da solidão digital, quando o jovem, mesmo cercado de telas e seguidores, se sente invisível para quem realmente importa.
Ao mesmo tempo, muitos adultos não se sentem preparados para estabelecer limites - como regras de uso, tempo de tela e limites de exposição. Acabam oscilando entre a vigilância excessiva e a liberdade total, como se apenas uma das pontas resolvesse o problema. Mas, como mostram os especialistas, o equilíbrio está em outro lugar: na proximidade, escutando, orientando, criando pactos de convivência e ajudando crianças e adolescentes a compreender o mundo digital e seus reflexos na vida real.
Esse aprendizado, porém, não é automático. A verdade é que ninguém nasceu sabendo lidar com o mundo digital. Talvez, daqui a algumas gerações, isso se torne natural. Por enquanto, estamos todos no mesmo barco - e o mar, convenhamos, está revolto. É justamente por isso que as campanhas previstas no PL da Conscientização Digital se tornam essenciais: pontos de reflexão e aprendizado contínuos sobre desafios reais e cotidianos que já moldam a vida de todos nós.
Por fim, é importante destacar que a solução apresentada pelo projeto de lei é adequada e justa, atendendo de forma equilibrada a todos os lados envolvidos. As campanhas deverão ser veiculadas no primeiro e no terceiro trimestre de cada ano, por um período de sete dias corridos, correspondendo a 1% do total de anúncios exibidos pela plataforma digital. Trata-se de uma medida razoável e proporcional, que reconhece - sem onerar o setor - a corresponsabilidade das plataformas na construção de um ambiente online mais saudável e seguro.
Além disso, as campanhas deverão ser fundamentadas em pesquisas científicas ou estudos acadêmicos, podendo ser elaboradas pelas próprias plataformas digitais, por órgãos governamentais ou por entidades da sociedade civil. Todas serão avaliadas e aprovadas por um grupo consultivo formado por especialistas, acadêmicos e representantes da sociedade, o que garante equilíbrio, legitimidade e rigor técnico ao processo.
Educar um adolescente é mais difícil, mas ainda é possível. O PL da Conscientização Digital é um chamado para que a sociedade se reaproxime dessa criação - a internet que deixamos crescer sozinha. É também um convite à conciliação entre governo e plataformas, para que participem juntos da formação de cidadãos digitais mais críticos e conscientes, capazes de usar a tão defendida liberdade com a tão necessária responsabilidade.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].
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