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Ricardo de João Braga
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Disputa de narrativas
1/9/2025 9:00
Políticos são altamente engenhosos. Como regra produzem situações que escapam a nós, seres humanos civis. Para ligar os pontos A e B, passam por etapas, fases, sendas ora claras ora obscuras, e se imaginamos que uma linha reta seria o melhor caminho a seguir, logo aprendemos que erramos.
No mesmo dia (27/08/2025) a imprensa trouxe duas notícias que me pareceram incoerentes entre si. De um lado o presidente Lula teria começado a anunciar que o candidato da direita à presidência em 2026 seria o governador de São Paulo Tarcísio de Freitas. Lula contaria com Bolsonaro condenado pelo STF, inelegível, e pretenderia expor logo Tarcísio ao desgaste natural da candidatura. O petista somaria à análise a crítica acerca da família Bolsonaro, particularmente os filhos Eduardo e Carlos, ao governador, o que lhe tornará a vida difícil no seio do bolsonarismo.
De outro lado, os bolsonaristas animaram-se com a nova pauta pró-anistia e pró-blindagem de políticos que o presidente da Câmara dos Deputados Hugo Motta vê ser-lhe tirada das mãos. A rebelião bolsonarista de semanas atrás agora cobraria a fatura da distensão ao ter oportunidade de aprovar a anistia e outros projetos de interesse à blindagem jurídica dos parlamentares. Segundo as notícias, o fiador do acordo seria o ex-presidente da Câmara Arthur Lira. Bolsonaristas animam-se com seu candidato natural elegível logo ali adiante.
Vê-se então que de um lado Lula conta com Bolsonaro inelegível em 2026, enquanto os bolsonaristas sentem-se de volta ao jogo com seu candidato indiscutível. Há uma óbvia contradição aí, pois para um, Bolsonaro estará inelegível enquanto para outros, elegível. Do ponto A vamos ao B pela reta C, assim apenas um pode estar certo. Mas se ambos os grupos estão avançando e felizes, provavelmente errado estou eu. Como interpretar então essa aparente impossibilidade?
Pode ser que Lula conte com Bolsonaro inelegível não devido à tentativa de golpe, o que ocorre com a anistia, mas sim devido à sentença já em vigor proferida pelo TSE - condenação do ex-presidente por abuso de poder político exercido naquela reunião com embaixadores estrangeiros voltada a deslegitimar as eleições brasileiras. Nesse caso teríamos anistia para o golpe, contudo Bolsonaro permaneceria inelegível por outra razão.
A segunda possibilidade reside no futuro do projeto de anistia. Talvez Lula conte com o malogro da iniciativa na Câmara. Pode-se pensar também que a Câmara dos Deputados compõe-se hoje de uma força de direita, incluídos bolsonaristas puro-sangue e outros de ocasião, maior do que aquela no Senado. Conjectura-se então que a proposta prospera entre os deputados e não entre os senadores, pelo menos não a tempo de salvar o ex-presidente para a eleição de 2026. Outra possibilidade de natureza similar refere-se ao teor de uma provável anistia vencedora.
Entre "sem anistia" e "anistia total e irrestrita" há um infinito de possibilidades e gradações, inclusive defendidas abertamente por vários políticos. Sondagens junto a parlamentares não descartam a possibilidade de uma anistia que diminua a pena da arraia-miúda, mas não salve os graúdos. Essa é uma possibilidade interessante para aqueles que pretendem ter um candidato de direita em 2026 diferente de Bolsonaro - possibilidade hoje difícil de sustentar à luz, mas que deve encantar muitos políticos mais pragmáticos que não se alinham ao PT.
A terceira possibilidade pode derivar de um cálculo de Lula que leva em conta o impacto do tarifaço e da ação estabanada do deputado Eduardo Bolsonaro nos EUA. As pesquisas têm mostrado que a tentativa de usar o poder dos EUA de Trump para proteger o ex-presidente afastou um pequeno grupo de potenciais eleitores do voto em Bolsonaro. Hoje o Brasil tem um eleitorado bastante cristalizado em que a disputa efetiva recai de fato sobre um grupo espremido entre lulistas e bolsonaristas, eleitores que ainda vão definir em quem votar e que definirão a eleição. Talvez Lula considere que abriu vantagem nesse grupo estratégico, e mesmo que Bolsonaro volte ao jogo o ex-presidente não seria um candidato capaz de tirar o incumbente de seu cargo em 2026.
Políticos veem torto por caminhos retos, o que é uma forma de lidar com as estratégias dos adversários e os múltiplos empecilhos legais, jurídicos, etc que encontram para seus projetos. Quanto a nós, tentamos dar sentido às formas aparentes sabendo que há um mundo velado que nos é quase inalcançável.
As notícias do dia abriram vários caminhos. Veremos nas próximas semanas como os jogadores movimentam-se e quem detinha mais informações de alcova, mais estratégias sólidas e mais fortuna política.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].
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