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Congresso em Foco
9/12/2016 8:00
 [fotografo]Marcello Casal Jr/Agência Brasil[/fotografo][/caption]Com efeito, o texto aprovado não prevê um sistema de credenciamento ou registro obrigatório dos lobistas, mas facultativo, o que impede que, para ocorrerem à luz do dia, os contatos de lobby sejam sujeitos a mecanismos de controle sobre a sua atuação que, inclusive, são fundamentais para que os que agirem nas sombras e cometam impropriedades sejam afastados dessa atividade. Soa, assim, inócua a previsão de que será negado o registro - que os lobistas não são obrigados a requerer - ao agente de relações governamentais que tenha sido condenado por ato de corrupção, tráfico de influência, concussão, advocacia administrativa ou improbidade administrativa, enquanto durarem os efeitos da condenação.
A definição de quem é lobista é gravemente prejudicada. A uma, porque muda-se o foco da lei de regulamentação do lobby para a simples disciplina da "atividade de representação de interesses nas relações governamentais"; a outra, porque se limita o escopo dessa disciplina às relações entre Administração e administrado ou processos decisórios que impliquem sugestão, modificação, interpretação, revogação ou extinção de norma jurídica. Ou seja, estão excluídos da regulamentação todos os demais processos de tomada de decisão onde o lobby é comum, intenso e, frequentemente, espúrio, em especial quanto à formulação ou implementação de políticas públicas, pois a busca da influência nessas atividades frequentemente se confunde com o tráfico de influência e a busca de vantagens indevidas.
A prestação de contas dessas atividades aos órgãos de controle, mediante relatórios periódicos que sejam publicados on line, é totalmente ignorada e omitida.
Em outra direção, porém, a lei assegura, aos lobistas, que passam a ser denominados "profissionais de relações governamentais", prerrogativas especiais de atuação, mediante a garantia do direito de apresentar análises de impacto de proposição legislativa ou regulatória; estudos, notas técnicas, pareceres e similares, com vistas à instrução do processo decisório; sugestões de emendas, substitutivos, requerimentos e demais documentos no âmbito do processo legislativo ou regulatório; e sugestão de requerimento de realização ou de participação em audiências públicas.
Ainda que tais propostas não tenham caráter vinculativo, é nítida a mudança de escopo da norma, que passa, de meio de controle, escrutínio e transparência do lobby, a veículo de seu empoderamento na busca da influência.
Nenhuma norma do projeto opera no sentido da garantia da igualdade de acesso, ou seja, não se estabelece qualquer regramento que obrigue o decisor a, ouvido um grupo de interesse específico, oferecer igual oportunidade de acesso ao interesse contraposto, como é necessário numa sociedade pluralista e democrática. Nem há qualquer regramento que atinja a atuação dos lobistas governamentais, ou seja, aqueles que representam os interesses de órgãos e entidades da Administração Pública, e que já contam com prerrogativas especiais de acesso aos decisores públicos.
É fato que um sistema de regulação do lobby deve ser ajustado às possibilidades de sua implementação e compliance pelos envolvidos, às garantias constitucionais do direito de associação e de petição aos poderes públicos, e não pode se converter em uma barreira à atuação legítima de representação de interesses, que é inerente à democracia.
Mas a proposição aprovada, na forma do substitutivo, não cumpre praticamente nenhum dos objetivos que uma Lei de Lobby deve cumprir. Parece ser mais uma cortina de fumaça na linha do "eu finjo que regulamento, você finge que obedece a regulamentação".
Erigir uma legislação equilibrada, que favoreça a transparência e integridade do lobby, amplie a igualdade de acesso e o escrutínio sobre o processo decisório governamental, é um desafio. Vários países adotam regulamentações rígidas e detalhistas, das quais os Estados Unidos é o principal exemplo, fruto que são de contextos com elevados graus de corrupção no lobby. Argumenta-se que o excesso de rigor pode acabar por impedir a aplicação das regras e produz soluções de contorno para a sua burla. É verdade. Por outro lado, uma lei frouxa é, como se apontava até 1995, nos EUA, sobre a lei aprovada em 1946, então vigente, um "leão sem dentes", que pouco ou nenhum efeito tem para legitimar o lobby e evitar práticas espúrias.
Países como o Canadá já aprovaram, mediante sucessivas revisões, uma legislação equilibrada e compreensiva, que atende a todos os princípios e objetivos de uma Lei de Lobby de forma consistente. Outros, como o Chile, adotaram "leis mínimas", com caráter meramente formal, desperdiçando a oportunidade política que a introdução das leis de lobby produz para o aperfeiçoamento institucional. A Comunidade Europeia, que adota regulamentação branda, discute, neste momento, meios para tornar mais ampla, efetiva e consistente a sua legislação, notadamente pela exigência de registro obrigatório e ampliação da transparência do lobby, definido de forma compreensiva.
A matéria ainda será apreciada pelo Plenário da Câmara dos Deputados, oportunidade em que poderá ser aperfeiçoada e resgatados aspectos essenciais que se perderam pelo caminho. Há, ainda, no Senado Federal, o Projeto de Lei nº 336, de 2015, do Senador Walter Pinheiro, sob a relatoria do senador Ricardo Ferraço, que, em bases mais atuais, oferece ao debate uma legislação completa e detalhada, mas suficientemente flexível, para a disciplina do lobby, em consonância com debates travados ao longo de anos, sob a liderança da Casa Civil, Controladoria-Geral da União e Ministério da Justiça, para atender recomendação do Conselho de Transparência e Combate à Corrupção e da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (ENCCLA).
Assim, para que não se perca a oportunidade histórica de produzir uma lei adequada, e que não esteja contaminada pelo viés corporativista e defensivo dos que não almejam, de fato, o controle e transparência sobre a atividade, será essencial que os membros do Parlamento, sensíveis às demandas da sociedade por maior transparência, integridade e equidade, revejam o texto em discussão e evitem, afinal, a concretização da expressão de Horácio "parturient montes, nascetur mus", frustrando as expectativas há tanto alimentadas.
* Consultor legislativo do Senado Federal e advogado, é mestre em Administração, doutor em Ciências Sociais e professor da EBAPE/FGV. Foi subchefe de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais da Casa Civil da Presidência da República (2003-2014).
 
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[fotografo]Marcello Casal Jr/Agência Brasil[/fotografo][/caption]Com efeito, o texto aprovado não prevê um sistema de credenciamento ou registro obrigatório dos lobistas, mas facultativo, o que impede que, para ocorrerem à luz do dia, os contatos de lobby sejam sujeitos a mecanismos de controle sobre a sua atuação que, inclusive, são fundamentais para que os que agirem nas sombras e cometam impropriedades sejam afastados dessa atividade. Soa, assim, inócua a previsão de que será negado o registro - que os lobistas não são obrigados a requerer - ao agente de relações governamentais que tenha sido condenado por ato de corrupção, tráfico de influência, concussão, advocacia administrativa ou improbidade administrativa, enquanto durarem os efeitos da condenação.
A definição de quem é lobista é gravemente prejudicada. A uma, porque muda-se o foco da lei de regulamentação do lobby para a simples disciplina da "atividade de representação de interesses nas relações governamentais"; a outra, porque se limita o escopo dessa disciplina às relações entre Administração e administrado ou processos decisórios que impliquem sugestão, modificação, interpretação, revogação ou extinção de norma jurídica. Ou seja, estão excluídos da regulamentação todos os demais processos de tomada de decisão onde o lobby é comum, intenso e, frequentemente, espúrio, em especial quanto à formulação ou implementação de políticas públicas, pois a busca da influência nessas atividades frequentemente se confunde com o tráfico de influência e a busca de vantagens indevidas.
A prestação de contas dessas atividades aos órgãos de controle, mediante relatórios periódicos que sejam publicados on line, é totalmente ignorada e omitida.
Em outra direção, porém, a lei assegura, aos lobistas, que passam a ser denominados "profissionais de relações governamentais", prerrogativas especiais de atuação, mediante a garantia do direito de apresentar análises de impacto de proposição legislativa ou regulatória; estudos, notas técnicas, pareceres e similares, com vistas à instrução do processo decisório; sugestões de emendas, substitutivos, requerimentos e demais documentos no âmbito do processo legislativo ou regulatório; e sugestão de requerimento de realização ou de participação em audiências públicas.
Ainda que tais propostas não tenham caráter vinculativo, é nítida a mudança de escopo da norma, que passa, de meio de controle, escrutínio e transparência do lobby, a veículo de seu empoderamento na busca da influência.
Nenhuma norma do projeto opera no sentido da garantia da igualdade de acesso, ou seja, não se estabelece qualquer regramento que obrigue o decisor a, ouvido um grupo de interesse específico, oferecer igual oportunidade de acesso ao interesse contraposto, como é necessário numa sociedade pluralista e democrática. Nem há qualquer regramento que atinja a atuação dos lobistas governamentais, ou seja, aqueles que representam os interesses de órgãos e entidades da Administração Pública, e que já contam com prerrogativas especiais de acesso aos decisores públicos.
É fato que um sistema de regulação do lobby deve ser ajustado às possibilidades de sua implementação e compliance pelos envolvidos, às garantias constitucionais do direito de associação e de petição aos poderes públicos, e não pode se converter em uma barreira à atuação legítima de representação de interesses, que é inerente à democracia.
Mas a proposição aprovada, na forma do substitutivo, não cumpre praticamente nenhum dos objetivos que uma Lei de Lobby deve cumprir. Parece ser mais uma cortina de fumaça na linha do "eu finjo que regulamento, você finge que obedece a regulamentação".
Erigir uma legislação equilibrada, que favoreça a transparência e integridade do lobby, amplie a igualdade de acesso e o escrutínio sobre o processo decisório governamental, é um desafio. Vários países adotam regulamentações rígidas e detalhistas, das quais os Estados Unidos é o principal exemplo, fruto que são de contextos com elevados graus de corrupção no lobby. Argumenta-se que o excesso de rigor pode acabar por impedir a aplicação das regras e produz soluções de contorno para a sua burla. É verdade. Por outro lado, uma lei frouxa é, como se apontava até 1995, nos EUA, sobre a lei aprovada em 1946, então vigente, um "leão sem dentes", que pouco ou nenhum efeito tem para legitimar o lobby e evitar práticas espúrias.
Países como o Canadá já aprovaram, mediante sucessivas revisões, uma legislação equilibrada e compreensiva, que atende a todos os princípios e objetivos de uma Lei de Lobby de forma consistente. Outros, como o Chile, adotaram "leis mínimas", com caráter meramente formal, desperdiçando a oportunidade política que a introdução das leis de lobby produz para o aperfeiçoamento institucional. A Comunidade Europeia, que adota regulamentação branda, discute, neste momento, meios para tornar mais ampla, efetiva e consistente a sua legislação, notadamente pela exigência de registro obrigatório e ampliação da transparência do lobby, definido de forma compreensiva.
A matéria ainda será apreciada pelo Plenário da Câmara dos Deputados, oportunidade em que poderá ser aperfeiçoada e resgatados aspectos essenciais que se perderam pelo caminho. Há, ainda, no Senado Federal, o Projeto de Lei nº 336, de 2015, do Senador Walter Pinheiro, sob a relatoria do senador Ricardo Ferraço, que, em bases mais atuais, oferece ao debate uma legislação completa e detalhada, mas suficientemente flexível, para a disciplina do lobby, em consonância com debates travados ao longo de anos, sob a liderança da Casa Civil, Controladoria-Geral da União e Ministério da Justiça, para atender recomendação do Conselho de Transparência e Combate à Corrupção e da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro (ENCCLA).
Assim, para que não se perca a oportunidade histórica de produzir uma lei adequada, e que não esteja contaminada pelo viés corporativista e defensivo dos que não almejam, de fato, o controle e transparência sobre a atividade, será essencial que os membros do Parlamento, sensíveis às demandas da sociedade por maior transparência, integridade e equidade, revejam o texto em discussão e evitem, afinal, a concretização da expressão de Horácio "parturient montes, nascetur mus", frustrando as expectativas há tanto alimentadas.
* Consultor legislativo do Senado Federal e advogado, é mestre em Administração, doutor em Ciências Sociais e professor da EBAPE/FGV. Foi subchefe de Análise e Acompanhamento de Políticas Governamentais da Casa Civil da Presidência da República (2003-2014).
 
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