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Aldemario Araujo Castro
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25/4/2018 | Atualizado 10/10/2021 às 12:06
[fotografo]Reprodução ONU[/fotografo][/caption]Compete ao Senado Federal fixar uma série de limites relacionados com a dívida pública. São eles, segundo o art. 52 da Constituição: a) para o montante da dívida consolidada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; b) para as operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal; c) para a concessão de garantia da União em operações de crédito externo e interno e d) para o montante da dívida mobiliária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.
Élida Graziane Pinto, José Roberto Afonso e Lais Khaled Porto, no artigo "É inconstitucional a omissão em limitar a dívida pública federal", afirmam com propriedade: "A dívida pública federal é o mais sensível termômetro das relações cada vez mais intrincadas e complexas entre instrumentos de política econômica: fiscal, monetária, cambial e, depois da crise global de 2008, creditícia (...) Com quase 30 anos de vigência, o desiderato constitucional de balizar a dívida pública federal - ainda que a LRF, há 17 anos, tenha dado um ultimato de 90 dias para que o tema ingressasse na pauta de debates do Congresso - sofre um impasse político travestido de omissão supostamente discricionária".
É isso mesmo. São quase 30 anos sem a realização da determinação constitucional de estabelecer limites para a dívida pública da União (mobiliária e consolidada). Temos, nessa área, situação similar e igualmente surreal. São quase 40 anos sem a efetivação do comando constitucional que estabelece a auditoria da dívida pública brasileira.
Uma das principais questões econômico-financeiras do Brasil permanece distante do noticiário da grande imprensa e do paupérrimo debate em torno dos nossos problemas mais relevantes. Tratam-se das "operações compromissadas" realizadas pelo Banco Central do Brasil. O volume dessas operações cresceu tanto nos últimos anos que foi responsável por parte significativa do aumento do endividamento público.
Os condutores da política econômica brasileira transformaram um instrumento secundário de política monetária num monumental mecanismo de transferência de riqueza da maioria da sociedade para segmentos altamente privilegiados do intocável mercado financeiro.
Essas operações funcionam como "compras" de dinheiro dos bancos, realizadas pelo Banco Central, em troca de títulos da dívida pública com cláusula de revenda e pagamento de juros em patamares altíssimos. Esta é a evolução dos montantes das "operações compromissadas", em bilhões de reais e em dezembro de cada ano: 2011 - 311,86; 2012 - 497,50; 2013 - 508,54; 2014 - 791,57; 2015 - 894,54; 2016 - 1.026,39 e 2017 - 1.113,15 (http://www.bcb.gov.br > Economia e Finanças > Notas econômico-financeiras para a imprensa > Histórico > Política Fiscal > Dez/2017 > Quadro XXXVII - Operações compromissadas - Mercado aberto). Simplesmente não existem limites ou restrições para a realização dessas operações, como bem demonstram os números de sua evolução.
Registre-se a tramitação, na Câmara dos Deputados, do inusitado Projeto de Lei n. 9.248, de 2017. A proposição busca "legalizar" a trilionária prática das "operações compromissadas" sob a nomenclatura do "acolhimento, pelo Banco Central do Brasil, de depósitos voluntários à vista ou a prazo das instituições financeiras".
O projeto simplesmente autoriza o expediente e remete para o BC a regulamentação da remuneração, das condições, dos prazos e formas de negociações. Limites? Não foram cogitados, claro. Além de inusitado, o projeto é inconstitucional. Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não é juridicamente válida a delegação de regulamentação na forma de um "cheque em branco", sem a definição de parâmetros ou padrões a serem seguidos.
As reservas internacionais brasileiras chegam perto da impressionante cifra de 1,3 trilhão de reais. A maior parte desse estoque corresponde a títulos americanos que rendem juros baixíssimos. Não são poucos os economistas que condenam o nível exageradamente alto dessas reservas. O elevado custo de formação (ou de carregamento) também é objeto de fortes críticas.
Com efeito, o Brasil lança títulos remunerados por juros SELIC para captar os recursos a serem utilizados na formação das reservas em títulos americanos e dólares. Nos últimos anos, essas operações foram responsáveis por parte significativa do aumento da dívida pública. Nessa área, sintomaticamente, não existem limites (para o tamanho do estoque das reservas e para as operações com títulos públicos para formá-las).
Importa destacar um ponto especialmente curioso. Advoga-se uma tal "independência do Banco Central". Independência de quem? É a pergunta. Só pode ser independência da soberania popular e das instâncias políticas eleitas.
Afinal, o atual BC, totalmente dependente do mercado, notadamente financeiro, sem a necessidade de nenhum arcabouço jurídico para tanto, opera com as "operações compromissadas", formação de reservas internacionais, swaps cambiais e vários outros instrumentos bilionários e trilionários sem qualquer limite jurídico. Se for independente ...
Segundo dados do Ministério da Fazenda, divulgados pelo jornal Folha de São Paulo do dia 6 de agosto de 2017, de 2003 a 2016 os subsídios embutidos em operações de crédito e financeiras alcançaram quase R$ 1 trilhão. Desse total, cerca de 420 bilhões foram destinados para o setor produtivo. Deve ser destacado que a maior parte desses benefícios não aparecem expressamente no orçamento debatido e aprovado pelo Congresso Nacional. Como é de se imaginar, o tamanho desses subsídios não possui qualquer restrição. Literalmente, o céu é o limite ...
Dados da Receita Federal e do Tribunal de Contas da União (TCU), divulgados pelo portal G1, indicam que as renúncias tributárias em 2017 chegaram a 406 bilhões de reais. Em 2016, o montante apurado foi de 378 bilhões de reais. Esses números não contemplam o benefício de cerca de 1 trilhão de reais para o setor de petróleo e gás. Essa é outra área, onde são "perdidos" centenas de bilhões de reais por ano, sem qualquer tipo de limitação ou restrição.
É possível afirmar, a partir do panorama traçado, que sequer esgota a análise, que as abissais desigualdades socioeconômicas brasileiras são resultados de instrumentos cuidadosamente construídos para favorecer alguns poucos em detrimentos da grande maioria. Nesse triste cenário, a grande mídia e o rasteiro debate político e econômico visível esconde boa parte desses mecanismos e expõe, com insistência e intensidade, os gastos públicos relacionados com servidores públicos, seguridade social e políticas públicas de interesse popular.
Na minha modesta opinião, a superação aceitável e legítima deste quadro socioeconômico dantesco envolve uma profunda intervenção. A complexa e demorada intervenção popular a partir da conscientização e mobilização crescentes. Intervenção divina, militar, ditadura, enfraquecimento substancial do papel do Estado, salvadores da Pátria e outras soluções rápidas e mágicas são ilusões pueris e infantis ou manifestações transversas dos poderosos e condenáveis interesses dominantes já.
Do mesmo autor:
<< Não reeleja ninguém? >> Fim do político profissional ou políticos mais profissionais?
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