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Paulo José Cunha
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14/7/2020 | Atualizado 10/10/2021 às 16:58
Igualmente, devem ser reconhecidas as dificuldades trazidas pela pandemia. Tudo isso justifica esta proposta radical. Que consiste basicamente em três medidas:
- que na volta às aulas não-presenciais sejam oferecidas exclusivamente as disciplinas teóricas cujos conteúdos sejam minimamente adaptáveis ao formato de aula remota;
- que se transfiram todas as demais disciplinas, sobretudo as práticas, para os semestres seguintes, assumindo corajosamente o ônus que tal decisão acarreta. E que se faça a conversão do semestre para formatos compactados como os dos cursos de verão;
- e, por último, que sejam oferecidas de forma massiva aos estudantes de todas as áreas novas disciplinas, ou até disciplinas já existentes, mas todas as áreas de humanidades, com ênfase naquelas cujos conteúdos sejam atraentes e dinâmicos, como os de arte e cultura (teatro, música, literatura, cinema, artes plásticas etc.). Que tal propiciar o acesso a grandes obras do cinema nacional tanto de ficção quanto aos documentários premiados? Grandes concertos de nossa música popular e erudita? Visitas virtuais a museus e bibliotecas? Grandes acervos de nossa pintura, de nossas artes gráficas, de nossa arquitetura, de nosso patrimônio histórico? Obras-primas de nossa literatura? Conhecimento dos momentos decisivos de nossa história? Já pensou poder oferecer aos estudantes a chance de assistir "Bye Bye Brasil", de Cacá Diegues, com comentários de um professor de cinema? Ou "Rock Brasília", comentado pelo próprio autor, o ex-professor da UnB, Vladimir Carvalho? Nessas aulas à distância será possível empregar muitos daqueles recursos utilizados pelos media, lembrados lá no início. Com chances bem maiores de atração e retenção da audiência.
O momento, com todos os seus percalços, permite - e até recomenda - tal ousadia. Se puser a ideia em prática, a universidade estará ofertando tanto um básico mínimo dos conteúdos "hard" dos diversos cursos como, simultaneamente, estará preenchendo uma lacuna histórica: a dos conteúdos de humanidades, essenciais para a formação integral em todos os campos.
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Não estou sozinho nessa ideia, tenho boa companhia. Na aula em que recepcionou os calouros do primeiro semestre de 2019 na UnB, o escritor Milton Hatoum afirmou:
"Nós tendemos muito à especialização e deixamos de lado a formação humanista. Esse é um caminho para a barbárie, porque você não entende o funcionamento de uma sociedade se não faz uma leitura da história, do país em que você vive. A barbárie está basicamente em relação aos outros".
E lembrou um exemplo local - o do engenheiro Joaquim Cardoso, responsável pelo cálculo estrutural das obras revolucionárias de Oscar Niemeyer, como a Catedral e o Congresso Nacional. E que foi, ao mesmo tempo, um grande poeta, com uma sólida formação humanística. Hatoum apresentou um testemunho baseado em suas vivências na Universidade da Califórnia, onde notou grande interesse de alunos de medicina, engenharia, física e química, pela literatura latino-americana. "A boa literatura tem uma dimensão ética e estética, e a ausência disso pode tornar os jovens profissionais pessoas conformistas e alienadas. E não se trata de ideologia, trata-se de formar o aluno com uma visão crítica".
Melhor pecar por excesso do que por omissão. Por isso reuni coragem para tomar a decisão de trazer a lume essa ideia de uma overdose de humanidades durante a pandemia, iniciativa atrevida mas que pode até ter desdobramentos futuros e permanentes, quando o dia claro da normalidade nascer de novo.
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