Entrar
Cadastro
Entrar
Publicidade
Publicidade
Receba notícias do Congresso em Foco:
José Dirceu
José Dirceu
José Dirceu
Política global
12/11/2025 13:30
As cassandras de plantão bem que tentam, pregando um falso fracasso antes da hora, mas a COP30, realizada neste momento em Belém, está ajudando a mostrar quem é quem. De um lado, a parcela do mundo que busca assumir compromissos reais para enfrentar a emergência climática, conter o aumento da temperatura global do planeta, avançar numa transição justa e iniciar um novo ciclo de prosperidade colocando os mais vulneráveis no centro das preocupações. Do outro lado, a parcela negacionista e obscurantista, que se ausenta dos debates sobre a mudança do clima, rejeita as evidências da ciência e trabalha contra qualquer perspectiva de fortalecimento do multilateralismo. Como disse o presidente Lula em seu discurso durante a abertura da COP30, "é o momento de impor uma nova derrota ao negacionismo".
Se o mundo enfrentou e venceu o negacionismo durante a pandemia de covid-19, o desafio presente, como lembrou Lula, é derrotar o negacionismo climático. E esse negacionismo, sabemos, é uma das principais bandeiras da extrema-direita internacional, liderada por Donald Trump, presidente daquele que é o segundo país que mais emite gases de efeito estufa no mundo, respondendo por cerca de 30% das emissões globais. Chamou a atenção a sua ausência em Belém. Ou melhor, mais do que ausência, foi um boicote: Trump não só faltou como não enviou delegação oficial, consumando o que já havia iniciado ao deixar o Acordo de Paris, o acordo internacional lançado na COP21, em 2015, e que reúne ações globais em resposta à ameaça da mudança climática, como a redução das emissões de gases de efeito estufa para limitar o aquecimento global a um nível bem abaixo dos 2ºC em relação aos níveis pré-industriais - ou, no mínimo, manter em 1,5ºC.
Mas seria um movimento esperado ante sua decisão de fazer os EUA deixarem o Acordo de Paris. Como bons negacionistas, Trump e seus aliados ignoram o fato de que essa ameaça climática não diz respeito mais ao futuro, é um problema do presente. Mas, no fundo, o negacionismo trumpista não deseja que os países estejam preparados para lidar com seus impactos. Que os brasileiros se recordem disso ao observar a conduta das principais lideranças da direita brasileira, como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que não hesitaram em bajular o presidente norte-americano, vestir o boné do MAGA (Make America Great Again, como ficou conhecido o slogan originado na campanha presidencial republicana de Ronald Reagan, em 1980, e popularizado por Trump desde 2016) e servir de ventríloquos do bajulador-mor de Trump no Brasil, Jair Bolsonaro. Hoje tentam ao máximo esconder essa proximidade.
É a mesma turma que desacredita instituições, a ciência e a democracia. Que, sob inspiração fascista, prefere desmontar o governo de leis (rule of law) e trocá-lo pelo que se convencionou chamar rule by men, ou seja, o governo do arbítrio. Um governo de leis, não de homens, era a promessa norte-americana de que as decisões do governo não se vinculariam à vontade ou conveniência de quem governa. Hoje, porém, no lugar de uma norma jurídica geral, estável e impessoal, Trump governa como se ele fosse a própria lei e impõe um duro teste à democracia dos EUA. No paralelo, tenta impor testes igualmente duros ao multilateralismo. Sair do Acordo de Paris e se manter distante das negociações na COP30 são parte desse jogo.
Embora a ausência dos EUA e de líderes de alguns países seja sentida e imponha mais dificuldades às negociações em torno do clima, a COP da Amazônia resistiu. Como lembrou o presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, a grande presença de delegações em Belém já foi, por si, altamente simbólica, e significativa do apoio ao tema. O lançamento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF, na sigla em inglês), uma iniciativa brasileira, também pode ser considerado uma outra vitória. Ainda que parte da mídia tente a todo custo reduzir seu impacto - transformando o fundamental debate sobre o fundo que visa preservar e valorizar as florestas tropicais do planeta numa corrida numérica sobre quantos países fizeram seus aportes - o fato concreto é que a COP30 consolidou o apoio à ideia, exemplo típico de implementação que a Conferência pode sacramentar. Mais de 50 países deram apoio político ao TFFF, e os aportes financeiros são um processo que não brota da noite para o dia.
Reconhecer esses méritos não significa ignorar o tamanho do desafio em curso. É uma dificuldade planetária, com negociações complexas em três frentes: acelerar a transição energética, ampliar o financiamento climático e proteger as florestas tropicais. Uma tarefa fundamental é impulsionar o compromisso dos países com suas respectivas reduções de emissões, com a chamada NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada). O Brasil assumiu a meta de reduzir as emissões entre 59% e 67% até 2035, em comparação com o nível de 2005. No início da COP30, 111 países apresentaram suas novas metas.
Uma atenção especial para as negociações em curso é enxergar o financiamento climático como um dispositivo de justiça climática. Pelo seu papel de poluidores por séculos, cabe aos países desenvolvidos dar uma contribuição financeira maior. Não faz sentido, nem do ponto de vista ético nem do ponto de vista financeiro, exigir dos países em desenvolvimento que paguem para combater o aquecimento global e responder aos seus efeitos.
O próprio regime climático da ONU reconhece o princípio das "responsabilidades comuns porém diferenciadas", segundo o qual todos os países devem agir, mas os desenvolvidos devem liderar e apoiar financeiramente aqueles com menos recursos, dado que têm mais capacidade tecnológica, fiscal e institucional para fazê-lo. Como lembra o UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas), sem ampliar significativamente o volume e a previsibilidade do financiamento vindo das economias ricas - tanto para mitigação quanto para adaptação e perdas e danos - muitos países em desenvolvimento ficarão presos ao injusto dilema entre combater a pobreza hoje ou proteger o clima amanhã, o que torna impossível cumprir as metas do Acordo de Paris com justiça climática.
Para dar certo, será preciso, por fim, avançar numa governança global mais robusta - o que, sabemos, enfrenta resistência de países acostumados a um modelo que já ruiu, baseado na concentração de poderes entre EUA e Europa. Há um mundo novo, porém, e ele passa pelo BRICS, pela Ásia e por uma diversidade de países e visões que a visão negacionista é incapaz de enxergar.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].
Temas
Política
Eleições e território
Serviços públicos
Política global