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Congresso em Foco
19/10/2016 | Atualizado às 8:08
[fotografo]Rovena Rosa/Agência Brasil[/fotografo][/caption]Há quem diga também que, agora que o impeachment passou e o período eleitoral está terminando, o presidente temerário poderá fazer as reformas de que o país tanto precisa, a começar pela lei que fixa um teto para os gastos públicos. Pasmem: tem gente toda alegrinha porque testemunhou deputados trabalhando em plena segunda-feira, até altas horas, a fim de aprovar a tal PEC 241. Estaria aí a prova de que, pelo bem do Brasil, Congresso e Planalto voltaram a se entender.
Posso lhes contar uma coisa, fofildos? Voltaram a se entender (leia-se: negociar cargos e vantagens) para congelar investimentos em saúde e educação por vinte anos, causando um baita prejuízo aos que mais carecem dos serviços públicos. Querem repassar a conta da crise apenas para a parcela mais vulnerável da população. Enquanto isso, nossos trumps e suas megafortunas - que proporcionalmente sempre foram menos taxados por estas bandas - se safam mais uma vez, protegidos pelos legisladores que eles mesmos ajudaram a eleger com suas doações de campanha.
Como nada é tão ruim que não possa piorar, amiguitos chegam a corroborar o neopentecostalismo de coalização que paira sobre nossa titubeante democracia ao rogarem a Deus que o pai do Michelzinho conclua, até o fim de seu mandato, a reforma da Previdência e a trabalhista. Dizem que só com a modernização de nossas leis - antigas e tão fascistas quanto um Mussolini, segundo eles - os empresários retomarão a confiança, a economia voltará a crescer e os pais de família recuperarão seus empregos.
Cá entre nós, estou tentando entender não só de onde vem tanta compaixão pelos senhores de engenho, essas vítimas da ditadura do proletariado, como também de que maneira cortar direitos - no lugar de investir em infraestrutura, qualificar a mão de obra e estimular o consumo - vai transformar recessão em retomada.
No caso das reformas, de novo são os mais pobres e a classe média - só eles, amores - os escolhidos para o abate. O que se planeja é um cenário que rivaliza com a mais cruel distopia: homens e mulheres trabalhando até a última idade, CLT "flexibilizada" (com a terceirização das atividades-fim e a prevalência do negociado sobre o legislado) e saúde ainda mais deficiente. Tudo isso justamente quando os estudos demográficos apontam para o envelhecimento dos brasileiros, contexto em que a demanda por médicos, remédios e hospitais só tende a aumentar. É a antecipação do Apocalipse (para usar um termo bíblico, tão caro a uma parcela cada vez maior do eleitorado).
Sério: o olhar encantado diante do engajamento decorativo da primeira-dama ou a expressão apática frente aos jornais pendurados nas bancas alimenta minhas melhores teorias da conspiração; entre elas, a de que uma novela das seis cujo protagonista (Candinho) tinha como lema "Tudo que acontece de ruim na vida da gente é pra meiorá" - e cuja exibição se deu nos meses imediatamente anteriores a essas PECs e picas no povo - não pode ter sido mera coincidência.
É nessas horas que me lembro do romance A casa das sete torres, de Nathaniel Hawthorne. Lá pelas tantas, um personagem afirma que "o mundo deve todo o seu progresso a homens infelizes, enquanto os felizes se confinam em moldes antigos". A frase completa à perfeição o sentido de um meme que tem circulado nas redes sociais, segundo o qual PEC é a sigla para "Pobres, Enganados e Contentes".
Não é difícil fazer o link entre esses textos e o conformismo daquele garçom - convencido de que só ele é responsável pela própria condição e de que o perfume da carne assando é sinal de que tudo cheira bem ao seu redor.
* Cronista residente no Rio de Janeiro, Fábio Flora mantém o blog Pasmatório e perfil no Twitter.
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