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INVESTIGAÇÃO DE PARLAMENTARES
Congresso em Foco
5/9/2025 7:32
A Câmara dos Deputados voltou a discutir duas propostas de emenda à Constituição (PECs) que podem mudar a forma como parlamentares são investigados e julgados no Brasil. Uma delas, a PEC 3/2021, que reaparecceu após a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro, restringe a prisão em flagrante de deputados e senadores apenas a crimes inafiançáveis (como homicídio e tráfico) e condiciona a abertura de investigações à autorização da Mesa Diretora da Casa. Chamada por seus apoiadores de PEC das Prerrogativas, ganhou dos seus críticos o apelido de PEC da Blindagem.
A outra, a PEC 333/2017, reduz o foro privilegiado, mantendo a prerrogativa de ser julgado no Supremo apenas para os presidentes da República, da Câmara, do Senado e do STF e o vice-presidente. Para o advogado criminalista Bruno Salles Ribeiro, mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP) e um dos coordenadores do Grupo Prerrogativas, as propostas representam um risco de retrocesso institucional. Ele destaca que, no caso da chamada PEC da Blindagem, "nem os próprios autores sabem direito o que estão propondo", o que, segundo ele, revela a falta de clareza no debate.
O assunto perdeu força há uma semana, quando os líderes chegaram à conclusão de que não havia os 308 votos necessários para aprovação das propostas. A possibilidade de votação dos textos repercutiu negativamente na opinião pública e o tema foi trocado pela anistia política dos acusados de participação em uma tentativa de golpe entre 2022 e 2023. A oposição defende anistia para o ex-presidente Jair Bolsonaro e demais acusados de participar da chamada trama golpista.
O papel do foro privilegiado
Salles lembra que o foro privilegiado surgiu como um mecanismo de proteção dos parlamentares contra perseguições políticas locais.
"Para que os parlamentares não fiquem na mão de um juiz de primeira instância que pode ter interesses regionais, ou até de um juiz que queira se colocar como super-herói e criminalizar a política, como vimos na Lava Jato", explica.
O advogado reconhece que o foro também funcionou como instrumento de procrastinação: processos demorados, renúncias estratégicas e idas e vindas entre o Supremo e a primeira instância favoreceram a impunidade. Ele observa, porém, que o STF modulou essa interpretação nos últimos anos: limitou o alcance do foro a crimes relacionados ao mandato e garantiu que, mesmo após a saída do cargo, o processo continuasse na Corte se tivesse começado lá.
"Isso fez com que os processos ficassem mais efetivos, mais céleres. E aquele foro que era visto como uma benesse começou a ser considerado um peso por alguns parlamentares", avalia.
O risco de transferir julgamentos para a primeira instância
Mesmo com as mudanças recentes, Salles alerta para os riscos de levar processos de parlamentares a juízes de primeira instância, sem as garantias institucionais do Supremo.
"Nós estamos falando da maior corte do país, com ministros que têm apoio institucional e segurança para resistir à pressão. Mas será que um juiz de primeira instância teria independência para julgar parlamentares extremamente populares, como Nicolas Ferreira, diante de campanhas de ódio e difamação?", questiona.
Para ele, a discussão sobre o foro não pode ignorar o contexto político atual, em que magistrados enfrentam ataques diretos e ameaças por julgarem casos sensíveis envolvendo autoridades.
"Carta branca para impunidade"
O ponto mais grave, na avaliação do advogado, está na previsão da PEC da Blindagem que condiciona a abertura de qualquer investigação ao aval do Congresso.
"Aí é fácil saber o que vai acontecer. É só ver como funciona o Conselho de Ética da Câmara e do Senado. Processos graves ficam parados. Nesse caso, a polícia e o Ministério Público ficariam manietados, sem poder investigar sem aval político. Aí sim ia ser mais que blindagem, seria carta branca para impunidade total", adverte.
O que está em jogo
Um levantamento exclusivo do Congresso em Foco mostra que, desde 2010, ao menos 25 parlamentares federais foram condenados pelo STF durante o exercício do mandato - entre eles, a deputada Carla Zambelli, presa na Itália após fugir da pena imposta. Antes da mudança constitucional de 2001, o cenário era outro: mais de 250 pedidos do STF para abrir processos contra deputados e senadores foram simplesmente engavetados pelo Congresso.
Ao condicionar investigações à autorização política, as propostas em discussão podem reaproximar o país daquele modelo de blindagem, que impedia até mesmo o julgamento de crimes violentos. Quando valia a antiga regra, a Câmara vetou, por exemplo, a investigação de dois deputados por homicídio.
Para Bruno Salles, o recado é claro: a aprovação das PECs não significaria apenas mudar regras processuais, mas restaurar um sistema de impunidade que o Brasil levou duas décadas para superar.
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